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Proc. nº 608/2000
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que figuram como recorrentes CC, AP e AC, Lda., e como recorrido o Ministério Público, a relatora proferiu decisão sumária, em virtude de não se verificar o pressuposto do recurso da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, consistente na recusa de aplicação pela decisão recorrida de uma norma com fundamento em inconstitucionalidade.
Os recorrentes vêm agora reclamar para a Conferência, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º 3, da lei do Tribunal Constitucional, sustentando que o recurso que pretendiam interpor era o da alínea g) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, e não o da alínea a) do mesmo preceito, como por mero 'lapso' indicaram, afirmando, concomitantemente, que pretendem submeter
à apreciação do Tribunal Constitucional a conformidade à Constituição das normas dos artigos 412º, nº 1, e 420º, nº 1, do Código de Processo Penal, já anteriormente julgadas inconstitucionais pelo Acórdão nº 43/99, de 19 de Janeiro.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da improcedência da reclamação, em virtude de a reclamação para a Conferência não ser o momento adequado para corrigir o 'lapso' processual invocado e de não resultar do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade qualquer 'lapso'.
2. Cumpre decidir.
3. Os reclamantes interpuseram o recurso de constitucionalidade que pretendem ver admitido ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Afirmam, porém, que por lapso indicaram a alínea a), quando pretendiam indicar a alínea g) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
Ora, do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade não resulta que a indicação da alínea a) do nº 1 do artigo
70º da Lei do Tribunal Constitucional consubstancie um lapso. Com efeito, os recorrentes indicam a referida alínea e as normas que pretendem submeter à apreciação do Tribunal Constitucional, não fazendo qualquer referência ao Acórdão que anteriormente tivesse julgado inconstitucionais tais normas, referência essa que teria de constar do requerimento se o recurso fosse o da alínea g) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (cf. artigo
75º-A, nº 3, da Lei do Tribunal Constitucional).
Deste modo, não havia qualquer razão para proferir o despacho previsto no nº 6 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional. Na verdade, o requerimento apresentava os requisitos formais do recurso da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, nada fazendo entender que os reclamantes pretendiam interpor o recurso da alínea g) do mesmo preceito.
4. Por outro lado, e decisivamente, mesmo que se considerasse o recurso interposto ao abrigo da alínea g) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, também não se tomaria conhecimento do respectivo objecto.
O recurso da alínea g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional cabe das decisões que apliquem norma já anteriormente julgada inconstitucional ou ilegal pelo Tribunal Constitucional. Constitui, portanto, pressuposto processual de tal recurso a aplicação pela decisão recorrida da norma anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional.
As normas que os reclamantes pretendem ver submetidas à apreciação do Tribunal Constitucional são as dos artigos 412º, nº 1, e 420º, nº 1, do Código de Processo Penal, interpretadas no sentido de a falta de concisão das conclusões da motivação levar à rejeição imediata do recurso, sem que previamente seja feito o convite para aperfeiçoamento da deficiência. Essas normas foram julgadas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional no Acórdão nº 43/99, de 19 de Janeiro. Contudo, as normas impugnadas nos presentes autos não foram aplicadas pela decisão recorrida.
Como resulta claro da Decisão Sumária reclamada, o Tribunal da Relação de Coimbra decidiu rejeitar o recurso, em virtude de não ter sido indicada a norma jurídica violada, o sentido em que cada norma foi interpretada ou aplicada e o sentido em que cada norma devia ter sido interpretada ou aplicada, nos termos do artigo 412º, nº 2, alíneas a) e b), do Código de Processo Penal. As normas dos artigos 412º, n.º 1, e 420º, n.º 1, do Código de Processo Penal não fundamentaram pois a decisão recorrida. Aliás, isso mesmo é realçado pelo Tribunal da Relação de Coimbra, quando afirma que a situação então em apreciação é diferente da decidida no Acórdão nº 43/99, de 19 de Janeiro.
Afigura-se evidente, portanto, que não se verifica o pressuposto do recurso da alínea g) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, consistente na aplicação pela decisão recorrida de normas anteriormente julgadas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional. Nessa medida, ainda que se considerasse o recurso interposto ao abrigo dessa alínea, também não se tomaria conhecimento do seu objecto, por falta manifesta dos respectivos pressupostos processuais.
5. Improcede, pois, a presente reclamação.
6. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando, consequentemente, a Decisão Sumária impugnada.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs. Lisboa, 13 de Dezembro de 2000- Maria Fernanda Palma Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa