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Proc. nº 409/99
3ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. - No presente recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, por M... relativamente ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20 de Abril de último que lhe negou provimento ao recurso por si interposto da decisão da 1ª instância que o manteve na situação de prisão preventiva, foi proferido decisão sumária, em 15 de Junho, que decidiu não conhecer do objecto do recurso, pelas razões que se passam a transcrever:
'4. - Entende-se, nos termos do nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, não poder conhecer-se do objecto do recurso, pelo que desde já se profere decisão sumária.
5. - Com efeito, o recurso de constitucionalidade instaurado com fundamento na alínea b) do nº 1 do citado artigo 70º, para além dos pressupostos de admissibilidade cuja congregação exige, consoante resulta da Lei do Tribunal Constitucional e pacífica e reiteradamente é afirmado jurisprudencial e doutrinalmente, é um recurso de controlo ou fiscalização normativa: a questão de constitucionalidade há-de ser referenciada em função de alegada violação de preceito ou princípio constitucional, tendo por objecto de apreciação o critério jurídico utilizado na decisão ao aplicar (ou recusar aplicar) determinada norma jurídica, no seu todo, em algum segmento ou em dada dimensão interpretativa. Ou seja, não se discute a constitucionalidade de uma decisão, uma vez que só interessa para o julgamento do recurso o juízo que na decisão se contenha sobre a constitucionalidade da norma aplicada (ou recusada aplicar). Como é pacífico, o recurso de constitucionalidade não visa a apreciação da constitucionalidade de uma decisão judicial qua tale - e que poderia constituir amparo ou figura equivalente, não admitida entre nós - só interessando o juízo que tenha sido emitido em sede de constitucionalidade da norma. Posto que assim é, entende-se que o recorrente discute essencialmente nos autos o juízo formulado relativamente à verificação dos pressupostos de prisão preventiva que lhe foi aplicada como medida de coacção, discordando desse juízo que, em sua tese, fez uma 'interpretação errada das normas dos artigos 61º, alíneas a) e b), 140º, nº 1, 141º, nº 1, e 212º do C.P.P., na aplicação que lhe foi dada na decisão recorrida', como defende, pela primeira vez, na resposta dada na Relação ao visto do Ministério Público, nos termos do nº 2 do artigo
417º do CPP. De resto, na motivação do recurso para a Relação o recorrente é ainda mais claro ao mencionar a violação pelo despacho recorrido, 'por erro de interpretação e de aplicação, dos artigos 119º, alínea c), 191º, nº 1, 193º, nº 2, 194º, nº 2, e
213º, nº 1, do CPP, 32º, 33º, nº 2, 131º e 132º do Código Penal, 32º da Constituição e Lei nº 43/86, nº 2, alínea 38)'. Aí se diz que o magistrado a quo 'fez uma errada interpretação dos artigos
[citados], nomeadamente por ter confirmado a prisão antes dos 3 meses, não ter ordenado a audição do arguido, não ter tido em conta que a prisão preventiva tem carácter subsidiário e os elementos constantes do processo consubstanciam outra medida de coacção e deveria ter aplicado o artigo 211º do CPP, por não se verificarem os pressupostos da prisão preventiva'. Este entendimento é reafirmado na interposição de recurso para este Tribunal, onde se reafirma o seu desacordo com a fundamentação utilizada no acórdão recorrido, o que 'implica erro na apreciação da prova'.
6. - Ou seja, a problemática de constitucionalidade equacionada perante a Relação e em resposta ao visto do Ministério Público, não foi, na verdade, suscitada já intempestivamente - o que parece preocupar o recorrente -- porque dela ainda o Tribunal recorrido pôde conhecer - se bem que nada obstasse a logo na motivação do recurso ter sido utilizada, contrariamente ao que pretende - mas foi descaracterizada, na sua autonomia fundamentante do recurso, subalternizada que se encontra à divergência quanto à verificação e manutenção dos pressupostos da prisão preventiva. Assim, e decisivamente, face à alegada violação das normas impugnadas e, por conseguinte, à pretendida inconstitucionalidade da decisão, convoca-se subsidiariamente matéria de constitucionalidade como seja o princípio do contraditório e a suposta violação do artigo 32º da Constituição da República. Não houve, por conseguinte, uma adequada suscitação da questão de constitucionalidade. Melhor dizendo, o que o recorrente pretende é a reapreciação dos pressupostos da medida de coacção aplicada que, em seu entender, foram desrespeitados pela decisão recorrida, ao pronunciar-se como se pronunciou. O que não constitui objecto do recurso de constitucionalidade.'
2. - Notificado, vem M... reclamar, para a conferência , por razões que nada têm a ver com a argumentação jurídica sustentada naquela decisão sumária.
Escreve, com efeito:
'1. O reclamante, apesar de gravemente doente, foi abandonado pela então sua mulher, por a sua morte lhe trazer benefícios, por ser sua herdeira e ficar com a 'partilha feita' e com a sua pensão de reforma.
2. Mais grave do que isso a sua ex-mulher conluiou-se com o assistente, identificado nos autos, para que o reclamante pudesse passar o resto dos seus dias na cadeia.
3. O reclamante foi vítima de traição de alguns dos seus advogados ou pelo menos de negligência grave quando o patrocionaram, beneficiando assim, a parte contrária.
4. O reclamante tem conhecimento de crimes graves e por isso foi organizado um plano para o abater, e assim não poder dizer o que sabe, o que constitui associação criminosa.
5. A manutenção da prisão preventiva interessa aos seus inimigos por lhe impedir que organize a sua defesa e procure testemunhas que não tenham medo de falar e assim, prestem declarações para descobrir criminosos.
6. É impensável que, no final do século XX em Portugal, se mantenha na cadeia o reclamante que apenas se defendeu quando um grupo, de nove, o sequestrou, e, quando o mesmo estava sozinho e não havia testemunhas, entrou em sua casa para o matar.
7. Não se compreende que o processo que lhe moveram tenha determinado e mantido a sua prisão preventiva, quando o que moveu a quem o sequestrou e quis matar, apesar de correr os seus termos no mesmo juízo, que determinou a sua prisão preventiva, mantenha os denunciados a passear livremente em liberdade e a organizar o plano que tinham concebido.
8. A manutenção da prisão preventiva interessa aos seus inimigos, por na cadeia não poder tomar os medicamentos que lhe foram receitados por médicos de prestígio internacional, o que pode vir-lhe a causar a morte na cadeia, nomeadamente por ataque cardíaco.
9. O Tribunal Constitucional é para Portugal o que a DUDH e a Amnistia Internacional são para os restantes países e pessoas de toda a humanidade.
10. Com o devido respeito pela opinião em contrário não se deve deixar de apreciar o recurso por falta de algum eventual formalismo legal que ponha em causa os direitos, liberdades e garantias pessoais do reclamante.'
3. - É manifesto que as considerações aduzidas em nada contrariam a decisão sumária adoptada, nem contêm a virtualidade da sua reponderação e reforma.
Para o efeito basta confrontar o texto da reclamação com o anteriormente decidido.
4. - Nestes termos, indefere-se a reclamação, confirmando-se a decisão sumária do não conhecimento do recurso.
Custas pelo recorrente e reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta Lisboa, 8 de Julho de 1999 Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Luís Nunes de Almeida