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Procº nº 490/93-B.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Após ter sido notificado do Acórdão nº 324/2000, lavrado na sequência dos Acórdãos números 240/2000, 595/99, 519/97, 395/97, 292/97, 765/97,
476/96, 459/94 e 325/94) veio o Licº CS deduzir incidente de suspeição, já que - disse - o que se decidiu nos dois primeiros indicados arestos 'são prova inequívoca de violação do comando do art. 234.º 3.º par., do Tratado instituinte da Comunidade Económica Europeia, em detrimento óbvio dos legítimos direitos e interesses' dele, oponente, pois que, de um lado, consubstanciam a
'intransigente recusa de aplicação no caso das normas de direito comunitário especificamente invocadas, qualquer que seja a respectiva interpretação correcta' e, de outro, 'continua este Tribunal a condenar o Recorrente em custas exorbitantíssimas, quando é outrossim por demais manifesto que a gratuitidade consagrada no art. 72.º do Regulamento de Processo do TJCE se impõe, necessariamente, aos processos de constitucionalidade', motivos pelos quais apresentou na Procuradoria-Geral da República denúncia contra os Juízes intervenientes nos aludidos acórdãos pelo cometimento dos crimes de denegação de justiça e prevaricação de juiz.
Requereu, ao abrigo da parte final do nº 1 do artº 303º do Código de Processo Civil, que este Tribunal solicitasse decisão pré-judicial do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias com vista a saber qual a 'correcta interpretação do normativo jus- -comunitário controvertido no caso'.
Em face do suscitado incidente, o relator proferiu nos autos o despacho a seguir transcrito (fls. 16 e 17 dos autos):-
'Após ter sido notificado do Acórdão nº 324/2000, que indeferiu o pedido de reforma do Acórdão nº 240/2000, veio o Licº CS deduzir incidente de suspeição, já que, na sua óptica, o que foi decidido naqueles dois arestos consubstancia ‘prova inequívoca de violação do comando do art. 234.º 3.º par., do Tratado instituinte da Comunidade Económica Europeia, em detrimento óbvio dos legítimos direitos e interesses’ dele, oponente, pois que, de um lado, traduzem uma ‘intransigente recusa de aplicação no caso das normas de direito comunitário especificamente invocadas, qualquer que seja a respectiva interpretação correcta’ e, de outro, ‘continua este Tribunal a condenar o Recorrente em custas exorbitantíssimas, quando é outrossim por demais manifesto que a gratuitidade consagrada no art. 72.º do Regulamento de Processo do TJCE se impõe, necessariamente, aos processos de constitucionalidade’, o que tudo levou a que o mesmo oponente viesse a apresentar na Procuradoria-Geral da República denúncia contra os Juízes intervenientes nos aludidos acórdãos pelo cometimento dos crimes de denegação de justiça e prevaricação de juiz.
Não é esta a primeira vez que o ora oponente lança mão de incidente como o ora em causa, por isso que, em muitos e muitos outros processos, pendentes por este Tribunal, em que ele figura como «parte» e em que intervieram outros Juízes para além dos que, neste processo, tiveram intervenção, se tem assistido à dedução de incidentes semelhantes.
Nos termos do nº 3 do artº 29º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, compete ao Tribunal Constitucional a apreciação da suspeição dos respectivos Juízes.
Por outro lado, comanda-se no nº 3 do artº 127º do Código de Processo Civil que, nos casos das alíneas c) e d) do n.º 1 é julgada improcedente a suspeição quando as circunstâncias de facto convençam de que a acção foi proposta [sendo que nesta se haverão de abranger as causas criminais quando o juiz nelas seja arguido - cfr. mencionado nº 2 desse artigo] ... para se obter o motivo de recusa do juiz.
Não podendo o deduzido incidente, como é óbvio, ser decidido pelo relator, o que é certo é que se afigura como plausível que o Tribunal venha a decidir, ex vi do citado nº 3 do artº 127º, pela improcedência do presente incidente com base num raciocínio segundo o qual a respectiva dedução teve por
única finalidade a obtenção da impossibilidade de os Juízes do Tribunal Constitucional (ou, ao menos, da sua maioria, o que redundaria na impossibilidade de se obter o quorum legal de funcionamento) poderem intervir nos processos em que o oponente figura como «parte», e isso tendo em conta, por um lado, a circunstância, já acima referida, de o ora oponente ter desencadeado incidente semelhante ao ora em apreço em outros processos e, por outro, a circunstância de se afigurar que a suspeição ora oposta não assentar em qualquer substracto fáctico com um mínimo de consistência.
Neste contexto de plausibilidade, é igualmente plausível que o Tribunal, considerando o disposto na parte final do nº 3 do artº 130º do Código de Processo Civil, venha a considerar que o ora oponente agiu movido no único propósito de prosseguir um uso manifestamente reprovável do processo, com vista a obter um objectivo ilegal, qual seja o de entorpecer ou protelar a acção decisória por parte deste órgão de administração de justiça, o que redundará na sua condenação como litigante de má fé.
É, pois, em face desta figuração que, ponderando a plausibilidade de condenação do oponente como litigante de má fé, desde já e para os efeitos do disposto no nº 7 do artº 84º da dita Lei nº 28/82, se determina a sua audição por dois dias'.
Sobre esse despacho pronunciou-se o Licº CS dizendo que:-
- já efectuou uma 'série de denúncias-crime pelo comprovável cometimento por Juízes do Tribunal Constitucional identificados dos delitos de denegação de justiça e prevaricação e, em concurso real, de infidelidade';
- pediu à Presidente do Parlamento Europeu que promovesse 'o necessário paa que uma comissão de inquérito europarlamentar eventual inspeccione, inclusive, um número considerável dos processos de constitucionalidade controvertidos';
- pediu à aludida Presidente que 'aquele aerópago supranacional proceda junto do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, supletivamente, ao reenvio pré-judicial a que o Tribunal Constitucional de Portugal, flagrantemente, faltou na generalidade dos processos controvertidos';
- se permite convidar o Tribunal Constitucional, 'desde logo na pessoa do Ilustre Relator, a dar uma prova inequívoca da sua boa fé, dirigindo prontamente ao Tribunal da União Europeia, ademais, as questões pré-judiciais', para, depois, poder 'não só o Ilustre Relator ter a hombridade de deduzir no foro competente a única acusação ‘in abstractu’ pertinente -- a de denúncia caluniosa do recusante no foro criminal, o que, tanto quanto sei, se escusou de promover --, como também poderá esse Alto Tribunal -- quem quer que os seus membros sejam --, se o requerendo acórdão daquele Alto Tribunal europeu lhe for favorável, decidir licitamente sobre o tão ilegitimamente quão estultamente deduzido incidente de ‘má fé’ ora respondido'.
Cumpre decidir.
2. De harmonia com o que se prescreve nas disposições combinadas dos artigos 127º, números 1, alínea c), e 2, e 122º, nº 1, alínea g), ambos do Código de Processo Civil, resulta que a pendência de causa criminal na qual seja arguido o juiz por factos praticados no exercício das suas funções, e em processo no qual ainda não tenha sido deduzida acusação, pode levar as «partes» a opor-lhe suspeição.
De outra banda, o nº 3 do aludido artº 127º estatui que nos casos das alíneas c) e d) do n.º 1 é julgada improcedente a suspeição quando as circunstâncias de facto convençam de que a acção foi proposta [sendo que nesta se haverão de abranger as causas criminais quando o juiz nelas seja arguido - cfr. mencionado nº 2 desse artigo] ... para se obter o motivo de recusa do juiz.
Independentemente da questão de saber se, em face da estatuição literal do nº 2 do artº 127º, a mera apresentação de denúncia crime, antes da constituição do juiz como arguido, poderá permitir às «partes» oporem suspeição
àquele, o que é certo é que a situação que resulta do relato que acima se efectuou - onde avulta a circunstância de o ora oponente ter desencadeado incidente semelhante ao ora em apreço em muitos outros processos, por forma a obter a suspeição ainda de outros Juízes para além dos ora intervenientes nas decisões tomadas nestes autos - aponta inequivocamente para que, como se discorreu no despacho de fls. 16 e 17 e acima transcrito, é desiderato do oponente, ao lançar mão do incidente de suspeição, obter a impossibilidade de os Juízes do Tribunal Constitucional (ou, ao menos, da sua maioria, o que redundaria na impossibilidade de se obter o quorum legal de funcionamento) poderem intervir nos processos em que o mesmo oponente figura como «parte».
Não deixará, entretanto, de se pôr em relevo que, tendo em conta o modo como constitucional e legalmente é estabelecido o modo de escolha dos juízes deste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa, julgada que fosse procedente a suspeição, isso implicaria, na prática, que, enquanto perdurasse o actual mandato dos Juízes em exercício, fosse impossível obter uma decisão nas causas em que o oponente assumisse posição de «parte».
Releva ainda, por outro lado, a circunstância de se entender que a actividade dos Juízes levada a efeito nos presentes autos ter sido pautada exclusivamente, como, aliás, não poderia deixar de ser, por critérios de imparcialidade e de estrita obediência aos ditames legais e constitucionais, pelo que, de todo em todo, na perspectiva que agora assume este Tribunal, não se poderia desenhar a prática de actos que pudessem ser indiciariamente subsumidos ao cometimento dos crimes de denegação de justiça e de prevaricação.
Deverá, desta arte, concluir-se que o incidente de suspeição ora oposto não assenta em qualquer substracto fáctico com um mínimo de consistência com vista a se atingirem as garantias de imparcialidade que devem ser apanágio dos juízes, antes tendo por única finalidade obter a mera recusa dos Juízes intervenientes nestes autos, por forma a que as causas onde o oponente seja
«parte» não venham a obter decisão por banda do Tribunal Constitucional.
3. Em face do exposto, ponderado o prescrito no nº 3 do artº 127º do Código de Processo Civil, julga-se - sem necessidade de proceder a qualquer diligência de prova, o que, consequentemente, acarreta o indeferimento do solicitado na parte final do requerimento corporizador do vertente pedido - improcedente a oposição ora deduzida, condenando-se o oponente nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em dez unidades de conta.
Ponderando o que se veio de dizer e o que se consagra na parte final do nº 3 do artº 130º daquele diploma adjectivo, porque se afigura ao Tribunal inquestionável que a actuação do oponente, consistente na dedução do incidente ora decidido teve por único móbil a prossecução de um uso manifestamente reprovável do processo, com vista a obter um objectivo ilegal, qual seja o de entorpecer ou protelar a acção decisória por parte deste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade, condena-se o mesmo, como litigante de má fé, em 10 unidades de conta. Lisboa, 13 de Dezembro de 2000 Bravo Serra Messias Bento Guilherme da Fonseca Luís Nunes de Almeida Maria dos Prazeres Pizarro Beleza José de Sousa e Brito José Manuel Cardoso da Costa