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Processo nº 522/00 Plenário Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
1. Odílio Freitas Nóbrega e Mário José Martins de Albuquerque, com os sinais identificadores dos autos, e invocando, respectivamente, as qualidades de
'mandatário e primeiro candidato da lista ‘B’ do PSN às eleições da A.L.R.. da Madeira', vieram 'interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos dos arts. 26º e 28º do Decreto-Lei nº 318-E/76, de 30 de Abril', da decisão do Mmº Juiz da Vara Mista do Funchal, de 12 de Setembro corrente, que, relativamente ao processo de candidaturas das eleições regionais para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira (Círculo Eleitoral do Funchal), mandou afixar 'as listas de todos os partidos concorrentes sendo a do PSN a correspondente à lista A, atento o supra decidido', decidindo ainda 'o tribunal excluir a lista B'.
2. Na motivação do recurso concluem assim os recorrentes:
'A) A prática partidária, estatutária, institucional e institucionalizada, há já cerca de 25 anos, em todos os partidos, é que são os órgãos das estruturas regionais dos Partidos (nacionais), atento a autonomia das Regiões Autónomas, a indicarem os candidatos das listas às eleições legislativas regionais; B) Nenhuma estruturas partidárias de âmbito regional, nas Regiões Autónomas, possui estatuto ou regulamento registado ou anotado no Tribunal Constitucional – por ausência de disposição legal que o preveja expressamente; C) A matéria da indicação de candidatos às eleições regionais não faz parte das atribuições dos Partidos (nacionais), atentando contra a autonomia política das regiões autónomas qualquer estatuto que assim o previsse; D) O art. 35º dos Estatutos do PSN não elenca a faculdade do Presidente do Partido indicar ou apresentar candidaturas em eleições regiões regionais; E) Os regulamentos dos órgãos partidários do PSN na R.A. M., designados de estatutos, foram aprovados em Conselho Nacional de 24.02.96 e em Congresso Nacional de 23.03.96, constituindo regras internas do PSN a cumprir; F) Compete à Direcção Política Regional, tendo em conta a vontade e os pareceres dos Órgãos Locais, Freguesia-Concelho, indicar os candidatos à Assembleia Legislativa Regional';
3. A decisão recorrida é do seguinte teor:
'Compulsados os autos verifica-se existirem duas listas apresentadas em nome do PSN ao círculo do Funchal – lista A, cujo mandatário é Manuel Fernandes Pereira e lista B, cujo mandatário é Odílio Freitas Nóbrega – em clara violação do artº
11º nº 2 LE. Convidadas ambas as listas a apresentarem documentação e demais prova tida por conveniente, com vista a decidir-se – como legalmente se impõe – a legitimação de uma das listas e a exclusão da remanescente, vieram fazê-lo a lista A e a lista B, juntando actas de deliberações de órgãos nacionais e regionais, assim como os Estatutos nacionais do partido e estatutos regionais, respectivamente. Invocaram ainda ambas as partes a ilegitimidade recíproca para a apresentação de listas. A lista A invoca em súmula razões disciplinares relativas a Mário Albuquerque, que encabeça a lista B, a destituição/substituição de funções de órgãos regionais por deliberação de órgão nacional que entendem competente e finalmente a invalidade jurídica do Estatuto regional do partido. A lista B invoca em súmula o art. 33 al. f) do Estatuto regional do partido e a validade legal deste. Nos termos do art. 20º nº 4 e 21º nº 1 LE cumpre desde já decidir-se a questão uma vez que os autos se encontram instruídos com os elementos que o Tribunal reputa necessários e suficientes para a decisão. Antes de mais, e como ponto de ordem, há que salientar-se que têm legitimidade para apresentar candidaturas apenas e tão só os partidos políticos – artº 11º nº
1 – entendendo-se como tal toda a organização como tal inscrita em registo próprio existente no Tribunal Constitucional, nos termos da Lei 28/82 de 15Nov na redacção que lhe foi conferida pela Lei 13-A/98 de 26 de Fev. No âmbito – estrito – do processo eleitoral apenas cumpre aceitar candidaturas devidamente mandatadas nos termos definidos pelos Estatutos que se encontrem registados no Tribunal constitucional. Assim, deverá este Tribunal analisar os referidos estatutos apenas e tão só para apurar-se quem tem legitimidade para representar o partido na apresentação de candidaturas, in casu, à Assembleia Regional da RAM e se o mandato se encontra regular como legalmente se exige
-–art. 15º LE. Pelo ora supra exposto, o Tribunal não apreciará da legalidade de qualquer acto, decisão ou deliberação interna do próprio partido, seja a nível nacional, seja a nível regional. Em primeiro lugar porque não é o Tribunal competente – vide arts. 103º C e 103º D da Lei 28/82 de 15Nov, na redacção que lhe foi conferida pela Lei 13-A/98 de
26Fev. Se qualquer dos militantes – constantes de qualquer uma das listas – pretende impugnar os actos de outros militantes, deverá socorrer-se das disposições estatutárias – v.g. art. 41º e 96º e ss. dos Estatutos nacionais – e, em segunda instância, recorrer para o Tribunal Constitucional – vide art. 9º als. a), c) e d) Lei 28/82 de 15 Nov, na redacção aplicável – e não para o Tribunal comum. Em segundo lugar não é o processo eleitoral o processo próprio para a resolução de divergências internas de um partido político. Este processo obedece a um calendário eleitoral que se não compadece com a resolução de questões prévias litispendentes, que em nada respeitam aos outros partidos e aos cidadãos em geral. O Tribunal entende assim que os únicos estatutos válidos – para os efeitos ora em causa – são os que se encontrem registados no Tribunal Constitucional. Ora esses estatutos são unicamente os nacionais – cfr. fls. 255 e ss. – os quais não prevêem a legitimidade dos órgãos regionais para apresentarem listas às eleições da Assembleia Regional. Ao invés, apenas prevêem que o presidente do partido o representa publicamente – art. 35º nº 1. Por outro lado, ainda que prevendo órgãos para as regiões autónomas regidos por regulamentos próprios, o certo é que estes regulamentos não se encontram registados no Tribunal Constitucional, pelo que, nesta sede, não cabe analisá-los nem, por esse motivo, levá-los em conta. Prevêem ainda os estatutos nacionais que as direcções regionais do partido obedecem aos estatutos nacionais e respeitam a unidade do partido em todo o território nacional – art. 90º al. b). Tal significa que o partido é a única entidade política legítima para apresentar candidaturas – art. 103º nº 1 e 3 e artº 11º nº 1 LE – se já não bastasse o expressamente previsto no art. 51º nº 4 da Constituição da República Portuguesa. Em informação do Tribunal Constitucional cfr. doc. fls. 41, refere-se como presidente do PSN, António Barbosa da Costa. Devendo assim e em conclusão, entender-se que apenas a lista A, poderá ser admitida nos presentes autos como regularmente mandatada. Em conformidade decide o Tribunal excluir a lista B.'
4. Tudo visto cumpre decidir. Desde logo há que dizer que não se pode tomar conhecimento do presente recurso, por não ter sido apresentada previamente pelos recorrentes, como se impunha, a reclamação prevista no artigo 21º da Lei Eleitoral. De facto, o recurso previsto no artigo 26º, nº 1, da mesma Lei, só pode ser interposto depois de decidida aquela reclamação, como é jurisprudência constante deste Tribunal Constitucional (cfr., por todos, o acórdão nº 288/92, publicado nos Acórdãos, 23º Vol., págs. 615, e no Diário da República, II Série, nº 217, de 19 de Setembro de 1992). De todo o modo, ainda que se pudesse conhecer do recurso, ele nunca poderia proceder. Na verdade, à luz da Constituição, do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (na versão da Lei nº 130/99, de 21 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei nº nº 92/2000, de 21 de Junho), da Lei Eleitoral da Assembleia Legislativa Regional da Madeira (Decreto-Lei nº
318-E/76, de 30 de Abril) e da Lei dos Partidos Políticos (fundamentalmente o Decreto-Lei nº 595/74, de 7 de Novembro), ressalta o seguinte: o quanto à definição. eleição e composição da Assembleia Legislativa Regional, os deputados 'são eleitos por listas apresentadas pelos partidos políticos, isoladamente ou em coligação, concorrentes em cada círculo eleitoral'
(artigo 19º, nº 1, do Estatuto) e este monopólio partidário da apresentação de candidaturas nas eleições legislativas regionais - o monopólio de direito dos partidos na representação política, na expressão de alguns Autores - perpassa em várias disposições da Lei Eleitoral (artigos 11º, 12º, 14º, nº 1, relativamente aos 'órgãos competentes dos partidos políticos', 15º, nº 2, 3 e 6 , quanto à
'existência legal do partido proponente' e respectiva prova, e 16º, nº 1). o os partidos políticos existem juridicamente e gozam de personalidade jurídica por via de 'inscrição no registo próprio' existente no Tribunal Constitucional (artigo 5º, nº 2, da Lei dos Partidos Políticos e artigos 9º, a) e 103º, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), cabendo-lhes comunicar ao Tribunal Constitucional 'para mero efeito de anotação, os nomes dos titulares dos órgãos centrais, após a realização dos respectivos actos eleitorais' e depositar 'no mesmo Tribunal o programa, uma vez estabelecido ou modificado pelas instâncias competentes do partido' (nº 3 do artigo 8º da citada Lei). o não podem existir partidos que tenham 'índole ou âmbito regional' (nº 4 do artigo 51º da Constituição), caracterizando-se sempre como 'organizações de cidadãos de caracter permanente, constituídas com o objectivo fundamental de participar democraticamente na vida política do Pais', que abrange 'o território historicamente definido no continente europeu e nos arquipélagos dos Açores e Madeira', sendo o Estado unitário (artigos 5º, nº 1, e 6º, nº 1, da Constituição, e artigo 1º da Lei dos Partidos Políticos). Tudo isto está presente e reflectido na decisão recorrida, não merecendo censura a análise que é feita de 'quem tem legitimidade para representar o partido na apresentação de candidaturas'. Nada mais se tem de adiantar quanto ao decidido e aos fundamentos utilizados, não colhendo a argumentação dos recorrentes, assente fundamentalmente na ideia da intervenção das 'estruturas regionais dos Partidos', querendo com isso significar-se que é da competência de tais estruturas a indicação dos
'candidatos das listas às eleições legislativas regionais'. Só que esquecem os recorrentes o quadro constitucional e legal apontado – sem deixarem de reconhecer que nenhuma estrutura partidária de âmbito regional
'possui estatuto ou regulamento registado ou anotado no Tribunal Constitucional'
– e não é relevante a intervenção no processo de candidaturas de órgãos partidários ou a indicação de estatutos que escapam à anotação que tem de constar no Tribunal Constitucional.
5. Termos em que, DECIDINDO, não se toma conhecimento do recurso. Lisboa, 20 de Setembro de 2000 Guilherme da Fonseca Messias Bento Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma Maria dos Prazeres Pizarro Beleza José de Sousa e Brito Maria Helena Brito Vítor Nunes de Almeida Artur Maurício Paulo Mota Pinto Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa