Imprimir acórdão
Processo nº 150/00
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A. Nos presentes autos , vindos do Tribunal Central Administrativo, proferiu o Relator a seguinte Decisão Sumária:
'1. O Ministério Público veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional, ‘nos termos dos artºs 70º n° 1 al. a) e 72° nos 2 al. a e 3 da Lei do Tribunal Constitucional, Lei n° 28/82 de 15 de Novembro’, do acórdão da secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo, de 3 de Fevereiro do ano 2000, ‘com vista à apreciação da declarada inconstitucionalidade material do artº 15° da LPTA, por violação do disposto no artº 20°, n° 4 da CRP’. Aquele Tribunal Central Administrativo, na verdade, acordou ‘em recusar a aplicação, nos presentes autos, do disposto no art 15°do Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho, na redacção do Decreto-Lei n° 229/96, de 29 de Novembro, por violação do artº 20º nºs 1 e 4, da Constituição’, com a consideração essencial de que se afigura ‘pacifico o entendimento de que a prática judiciária consubstanciada na presença e audição do agente do Ministério Público, por virtude do disposto no artº 15° do Decreto-Lei n° 267/85, de 16 de Julho, na redacção do Decreto-Lei n° 229/96, de 29 de Novembro, viola o direito a um processo equitativo consagrado no artº 20º nos 1 e 4, da Constituição, o que já foi declarado pelo Acórdão n° 345/99, de 15-6. 9, do Tribunal Constitucional’.
2. E assim é, na linha do decidido no citado acórdão do Tribunal Constitucional n° 345/99, publicado no Diário da República, II Série, n° 40, de 17 de Fevereiro de 2000, aí se entendendo, em jeito de conclusão, o seguinte:
‘Quanto ao artigo 15°do Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho, na redacção dada pelo Decreto-Lei n° 299/96 de 29 de Novembro, há que julgá-lo inconstitucional, por violação do n° 4 do artigo 20° da Constituição, uma vez que não permite às partes tomar conhecimento e discutir qualquer elemento da intervenção do Ministério Público no processo que possa influenciar a decisão. Não tem cabimento qualquer restrição aos casos de pronúncia possivelmente desfavorável. Mesmo quando o Ministério Público nada diga na sessão de julgamento, basta a possibilidade de dizer sem controlo do facto pela parte para tornar a intervenção inadmissível, em face das exigências de transparência ligadas ao correcto entendimento do principio do contraditório, implicado pelo n° 4 do artigo 20° da Constituição. A referida exigência de transparência é uma consequência do papel das aparências na apreciação do respeito pelo principio do contraditório e, mais geralmente, do carácter equitativo do processo, noção que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem considerado 'marcada em particular pela importância atribuída às aparências e à sensibilidade acrescida do público às garantias de uma boa justiça '(acórdão Borgers contra a Bélgica de 30 de Outubro de 1991; Cour Européenne des Droits de l'Homme, série A, nº 214-B, § 29, pp.8-9). Tem-se invocado aqui um dictum de Lord Hewart: «It is not merely of some importance, but it is of fundamental importance that justice should not only be done, but should manifestly and undoubtedly be seen to be done». Despido de acentos retóricos, o principio tem sido formulado pelo Tribunal Europeu nestas palavras:
«justice must not only be done; it must be seen to be done» (a justiça não só deve ser feita; deve parecer que é feita) '. Já foi com base nestas considerações que o Tribunal Europeu decidiu no referido Acórdão Borgers, «tendo em vista as exigências dos direitos da defesa e da igualdade das armas assim como o papel das aparências na apreciação do respeito delas» haver violação do artigo 6°, § 1º, da Convenção pela legislação belga
(artigos 1107 e 1109 du Code judiciaire) que permite ao ministério público em recurso perante a Cour de cassation apresentar as mesmas conclusões na audiência, «após o que nenhuma nota será recebida», e ainda assistir à deliberação sem voto deliberativo. Foi esta jurisprudência em matéria penal que o Tribunal Europeu agora generalizou com o acórdão Lobo Machado, quanto à legislação portuguesa, e com o caso Vermeulen. quanto à legislação belga’. Aderindo às razões invocadas nesse acórdão e não se vendo motivos para dele divergir, há apenas que repetir aqui o mesmo juízo d.e inconstitucionalidade.
3. Termos em que, DECIDINDO, ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo 78°-A, n° 1, da Lei n° 28/82, de 15 de Novembro, aditado pelo artigo 2°, da Lei n°
85/89, de 7 de Setembro, e na redacção do artigo 1º, da Lei n° 13-A/98, de 26 de Fevereiro, nego provimento ao recurso.' B. Dela veio o 'representante do Ministério Público neste Tribunal, (...) reclamar para a conferência nos termos do artigo 78º-A, nº 3', invocando que a
'questão a que se reporta o presente recurso foi, até ao momento, objecto de um
único acórdão, proferido por este Tribunal em processo em que o Ministério Público não teve oportunidade processual de se pronunciar sobre a questão de constitucionalidade suscitada, por nele não figurar como recorrente ou recorrido' e, neste circunstancialismo, não se 'verificam os pressupostos para prolação da decisão sumária, devendo ordenar-se a normal tramitação do recurso – como, aliás, tem ocorrido com os vários recursos análogos, versando sobre a mesma questão, em que se já produziram alegações'. C. Acontece que no recente acórdão nº 412/2000, em sessão plenária, publicado no Diário da República, II Série, nº 269, de 21 de Novembro de 2000, decidiu-se julgar 'inconstitucional a norma constante do artigo 15º do Decreto-Lei nº
267/85, de 16 de Julho (LPTA), na redacção do Decreto-Lei nº 229/96, de 29 de Novembro', exactamente a norma que vem questionada nos presentes autos. Remetendo, portanto, agora para a fundamentação e a doutrina desse acórdão nº
412/2000, há apenas que repetir in casu o mesmo juízo de inconstitucionalidade, com a consequência de se negar provimento ao presente recurso. D. Termos em que, DECIDINDO, indefere-se a reclamação e nega-se provimento ao recurso. Lisboa, 28 de Novembro de 2000 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto Luís Nunes de Almeida