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Proc. nº 1130/98 TC – 1ª Secção Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 – Por acórdão de fls. 548, o Tribunal Constitucional não tomou conhecimento do objecto do recurso interposto pela Dra. M.... com fundamento em que, relativamente à norma do artigo 334º do Código Civil, a sua aplicação não fora recusada pelo acórdão então recorrido e, relativamente à norma do artigo
1170º nº. 1 do Código Civil, ela, na interpretação que a recorrente imputou ao mesmo acórdão, não fora aplicada como 'ratio decidendi'.
Deste acórdão reclama a recorrente, concluindo que o 'Acórdão deve ser declarado nulo por erro de julgamento/ilogismo e abstenção de pronúncia, pelo que deve ser revogado/anulado'.
A impugnação da recorrente centra-se no trecho do julgado em que não se conheceu da (in)constitucionalidade da norma do artigo 39º do CPC.
A censura assenta na hipotética incongruência de no acórdão se ter dito que, nas conclusões das alegações, a recorrente 'omite qualquer referência
à norma do artigo 39º do CPC' quando no relato em que se transcrevem aquelas conclusões se verifica que essa referência é feita.
Tal constituiria contradição ou incongruência geradora de nulidade do acórdão ou erro de julgamento; numa outra perspectiva, verificar-se-ia omissão de pronúncia, igualmente geradora de nulidade da decisão, por se não ter conhecido da invocada inconstitucionalidade.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
2 – Impõe-se, antes do mais, interpretar o requerimento da recorrente.
A este propósito a invocação expressa do artigo 668º nº. 1 alínea d) do CPC e a imputação, também expressa, de 'abstenção de pronúncia' apontam para uma arguição de nulidade da decisão, o que se reforça pela formulação do pedido de 'o acórdão ser declarado nulo'.
E aqui a omissão residiria no não conhecimento da inconstitucionalidade do artigo 39º do Código de Processo Civil.
Por outro lado, porém, a recorrente alude a 'ilogismo' e a
'contradição' da decisão por discrepância entre a transcrição feita das conclusões das alegações e a afirmação feita de não constar destas últimas a invocação de inconstitucionalidade do artigo 39º do CPC o que motivou o seu não conhecimento.
Neste ponto a reclamação parece fundar-se no artigo 668º nº. 1 alínea b) do CPC ou em erro de julgamento.
Para que não subsistam quaisquer dúvidas, o Tribunal apreciará a questão nas várias vertentes indicadas.
3 – Começa por se reconhecer que o acórdão reclamado entendeu não haver referência à norma do artigo 39º do CPC nas conclusões das alegações, o que constituiu o fundamento do não conhecimento da inconstitucionalidade por se considerar tacitamente abandonada a arguição; e não se oculta que nessas conclusões, conforme transcrição feita no acórdão, a recorrente cita aquele preceito legal.
Sendo, pois, claro que, em contrário do que, de facto, se julgou no acórdão reclamado, as conclusões das alegações da recorrente faziam referência ao artigo 39º do CPC, impor-se-á julgar verificada a nulidade prevista na alínea b), ou na alínea d), do nº. 1 do artigo 668º do CPC?
Seguramente que não.
Na verdade não há qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão, necessária para se verificar a nulidade prevista na citada alínea b) do nº. 1 do artigo 668º do CPC.
No acórdão reclamado, a decisão de não conhecimento – disse-se já – teve como fundamento o abandono tácito da arguição de inconstitucionalidade da norma do artigo 39º do CPC por esta não ser referida nas conclusões das alegações.
É, pois, inequívoco que entre os fundamentos e a decisão existe uma perfeita adequação lógico-formal, o que nada tem a ver com a incorrecção dos fundamentos.
E também não se verifica qualquer omissão de pronúncia já que o acórdão reclamado justificou – ainda que incorrectamente – o não conhecimento da inconstitucionalidade.
O que se deixa dito faz situar a questão suscitada no âmbito do erro de julgamento quando, no acórdão reclamado, se dá por verificado um fundamento que de facto não ocorre, como resulta das conclusões constantes da peça de alegações apresentada pela reclamante.
Será, então, caso de reforma de decisão, prevista no artigo 669º nº.
2 alínea b) do CPC, dando de barato que a reclamante também formula, implicitamente, o pertinente pedido?
Entende-se que não.
A reforma só se justifica se a correcção do lapso verificado implica decisão diversa da reclamada.
Ora, no caso, a correcção altera o fundamento do decidido mas não a decisão de não conhecimento, como se demonstrará.
Recorda-se que a recorrente arguia a inconstitucionalidade da norma do artigo 1170º nº. 1 do Código Civil na interpretação que teria sido dada no acórdão recorrido no sentido de que 'cabe à parte processual, mesmo com abuso de direito, arbitrária e desrazoavelmente, revogar a procuração forense (...)'.
Mas, decidiu-se no acórdão reclamado que aquela norma, com tal interpretação, não fora aplicada como 'ratio decidendi' no aresto recorrido, pelo que se não verificava um dos requisitos do recurso previstos no artigo 70º nº. 1 alínea b) da Lei nº. 28/82.
Acontece que a referência feita à norma do artigo 39º do CPC – que apenas regula a tramitação processual da revogação do mandato forense – em conjunto com a indicação da norma do artigo 1170º nº. 1 do Código Civil, não tinha qualquer relevância autónoma nas alegações da recorrente, fazendo parte do bloco normativo composto pelas duas normas, que teria sido interpretado pelo acórdão recorrido nos termos apontados.
E, sendo assim, deve reconhecer-se que o mesmo juízo de não conhecimento relativo à norma do artigo 1170º nº. 1 do CC se impõe também no que respeita à norma do artigo 39º do CPC que, tal como a primeira, não foi aplicada, como razão de decidir, com a aludida interpretação.
4 – Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 10 Ucs. Lisboa, 10 de Novembro de 1999 Artur Maurício Vítor Nunes de Almeida Luís Nunes de Almeida