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Proc. nº 381/00
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. Inconformado com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 7 de Outubro de
1999, que negou provimento ao recurso por si interposto de uma decisão do Conselho Superior de Magistratura, o ora reclamante, J..., pretendeu recorrer para o Tribunal Constitucional, tendo para o efeito apresentado o requerimento que consta de fls. 39 e 40 dos presentes autos.
2. O Relator do processo no Supremo Tribunal de Justiça decidiu não admitir o recurso para o Tribunal Constitucional. Escudou-se, para tanto, na seguinte fundamentação:
'As alegadas inconstitucionalidades não foram expressamente arguidas no recurso. A única inconstitucionalidade arguida é aquela a que se refere o acórdão de fls.
31 a 35, a qual não foi atendida pelos dois motivos aí referidos, sendo de referir, agora uma delas: não indicação da norma aplicada, nem (como é evidente) a sua interpretação e nem o princípio e a norma constitucional violada. No requerimento ora em apreciação é que se indicaram esses preceitos. Ora, o recurso para o Tribunal Constitucional incide sobre normas aplicadas pela decisão recorrida e cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, por forma a sobre ela o tribunal se pudesse pronunciar. E, não sendo o que se verifica nos autos, como acima se disse, não recebo o recurso'.
3. Contra este despacho de não admissão do recurso apresentou o requerente, em
18 de Janeiro de 1999, a reclamação para o Tribunal Constitucional que agora se aprecia, que fundamentou nos seguintes termos:
'Foi recusado o recebimento do recurso interposto pelo Requerente para este Tribunal com o fundamento de que não indicou a norma aplicada nem o princípio ou norma constitucional violada. Ora, sucede que ao longo do processo disciplinar em causa veio diversas vezes o Requerente suscitar a inconstitucionalidade da interpretação dada pelo CSM da norma que permitiu ao Sr. Inspector identificar o Arguido (ora Requerente) como
«o Juiz Preto». A norma invocada era, implicitamente, a referente no CPP à forma de identificação do arguido. Mesmo que assim não se entendesse, deveria o Requerente ter sido notificado para suprir a eventual falta, conforme o art.
75º-A do diploma citado'.
4. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que emitiu parecer no sentido da improcedência da presente reclamação, por o recurso que o recorrente pretendeu interpor não ter como objecto qualquer questão de constitucionalidade normativa, 'antes se reportando à alegada
«inconstitucionalidade» de concretos actos praticados pelo inspector judicial no
âmbito do processo disciplinar, decorrente da forma discriminatória como teria designado o magistrado ora reclamante'. Dispensados os vistos legais, cumpre decidir. II – Fundamentação.
5. O recurso previstos na alíneas b) e f) do nº 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional pressupõe, além do mais, que o recorrente tenha suscitado, durante o processo, a inconstitucionalidade ou ilegalidade de determinada norma jurídica – ou de uma sua dimensão normativa – e que, não obstante, a decisão recorrida a tenha aplicado como racio decidendi. O que vai dito implica que a questão de constitucionalidade ou de legalidade normativa tenha de ser colocada perante o tribunal recorrido em termos de aquele tribunal saber que tem essa questão para resolver, o que requer, designadamente, que a mesma tenha sido colocada de forma clara e perceptível (nesse sentido, entre muitos outros, os acórdãos nºs 269/94 e 560/94, in Diário da República, II Série, de 18 de Junho de 1994 e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 29º Volume, pp. 97 e ss., respectivamente). No requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional o ora reclamante refere que suscitou nas alegações de recurso perante o tribunal recorrido as questões de inconstitucionalidade e ilegalidade que pretende ver apreciadas. Vejamos, pois, em que termos é que tal foi feito. Sobre esta questão limitou-se o recorrente (ora reclamante), no ponto 4 da alegação de recurso, a dizer:
'Inconstitucionalidade. Todos estes recursos têm como principal fundamento a inconstitucionalidade da interpretação dada pelo Conselho Superior da Magistratura da norma que entende permitir identificar o aqui Arguido, como o Juiz Preto'.
Da transcrição feita supra decorre que o ora reclamante, ao contrário do que pretende, não colocou ai perante o tribunal recorrido, em termos idóneos e adequados, as questões de constitucionalidade e legalidade que agora pretende ver apreciadas por este Tribunal. Na realidade - como, bem, refere o despacho reclamado - verifica-se que o recorrente não identifica sequer - como devia - o preceito legal de que se extrai a interpretação normativa que considera inconstitucional e ilegal, limitando-se a referir-se, genericamente, à 'norma que entende permitir identificar o aqui Arguido, como o Juiz Preto'. Como este Tribunal tem afirmado repetidamente, quando o recorrente pretenda questionar uma certa interpretação de uma norma - como, aparentemente, era o caso – tem ele não só o ónus de identificar o preceito de que se extrai essa norma mas também o de precisar o sentido normativo que reputa de inconstitucional, de modo a que, vindo essa norma a ser considerada inconstitucional com esse sentido, o Tribunal o possa enunciar na decisão (nesse sentido, entre outros, o acórdão nº 366/96, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 33º Vol., pp. 525 e ss.). Ora, manifestamente, nada disto foi feito na motivação do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. E, não tendo as questões de constitucionalidade e legalidade normativa que o agora reclamante pretende ver apreciadas sido adequadamente colocadas perante o Tribunal recorrido não pode, efectivamente, conhecer-se do objecto do recurso, devendo, em consequência, indeferir-se a presente reclamação. III – Decisão Por tudo o exposto, decide-se indeferir a presente reclamação. Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta. Lisboa, 7 de Novembro de 2000 José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida