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Proc. n.º 613/00
2ª Secção Relator - Paulo Mota Pinto
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1. M. J. e L. P., notificados da decisão proferida nos autos de instrução n.º
268/99, que correu termos no Tribunal de Instrução Criminal do Porto e que os pronunciou, em co-autoria material com outros, pela prática de 59 crimes de abuso de confiança fiscal, previstos e punidos pelo artigo 24º, n.º 1 e 4 do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/89, de 15 de Janeiro, interpuseram recurso da mesma para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, para apreciação da inconstitucionalidade orgânica do referido Decreto-Lei n.º 20-A/89. Por despacho de 27 de Setembro de 2000 o Exmo Magistrado do Tribunal de Instrução Criminal do Porto admitiu o recurso interposto, 'a subir a final e com efeito devolutivo.' Inconformados, dirigiram os recorrentes reclamação ao Presidente do Tribunal Constitucional na qual, em suma, invocaram que o despacho de pronúncia não admite recurso ordinário e 'não quadra, manifestamente, qualquer das hipóteses contempladas nos n.ºs 1 a 3 do art. 78º da lei orgânica do Tribunal Constitucional,' pelo que 'sendo assim, aplicar-se-á ao caso o disposto no seu n.º 4, (...) que manda atribuir efeito suspensivo ao recurso interposto em todas as outras situações, e confere como regime de subida, que o mesmo se processe nos próprios autos.' O Ministério Público pronunciou-se no sentido do deferimento da reclamação. Cumpre decidir. II. Fundamentos
2. Como reiteradamente se decidiu (por exemplo, nos Acórdãos n.ºs 268/94 e
569/95, publicados respectivamente no Diário da República, II Série, de 7 de Junho de 1994 e de 13 de Março de 1996, e no Acórdão n.º 516/96, ainda inédito), o facto de a competência para a decisão das reclamações caber 'ao Tribunal Constitucional, em secção' (n.º 1 do artigo 77º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro), vindo a reclamação (como a presente), todavia, dirigida ao seu Presidente, não obsta à sua apreciação. E também o facto de se tratar de uma reclamação contra a retenção do recurso, que não estava contemplada na redacção do n.º 4 do artigo 76º da mesma lei, até
à alteração que lhe foi introduzida pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, não suscita agora nenhuma reserva.
3. Na presente reclamação está em causa, portanto, decidir sobre a retenção de recurso já admitido no tribunal a quo, embora com subida a final. Mas está em causa apenas isso. Ou seja, não deve efectuar-se uma reaferição dos pressupostos que levaram à admissão do recurso. Não porque o Tribunal Constitucional esteja vinculado à decisão que admitiu o recurso – que não está
(artigo 76º n.º 3) –, mas porque está vinculado ao princípio do pedido. Aliás, entender de outro modo poderia funcionar como dissuasor da utilização do mecanismo da reclamação para proporcionar a este Tribunal a reapreciação do efeito e regime de subida fixados no tribunal recorrido para os recursos aí admitidos, em oposição ao sentido da referida reforma de 1998. Assim, fica circunscrito o objecto da presente reclamação ao apuramento da correcção do regime estabelecido no tribunal a quo para um recurso que, quando vier a ser apreciado pelo Tribunal Constitucional, até pode, porventura, vir a ser de considerar manifestamente infundado (cfr. Acórdão n.º 294/99, publicado no Diário da República, II Série, de 15 de julho de 1999), ou, de outro modo, de não admitir por falta de pressupostos.
4. Delimitado desta forma o objecto de análise, pode esta ser expeditamente conduzida. O n.º 4 do artigo 78º da Lei do Tribunal Constitucional contempla a regra residual na determinação dos efeitos e regime de subida dos recursos que lhe são dirigidos, aplicável onde não seja caso de fazer intervir os anteriores três números desse artigo. Segundo esta regra, nesses 'restantes casos, o recurso tem efeito suspensivo e sobe nos próprios autos.' Ora, o despacho sob recurso, sendo irrecorrível por força do que dispõe o n.º 1 do artigo 310º do Código de Processo Penal, não o é 'por razões de valor ou alçada' (n.º 1 do artigo 78º da Lei n.º 28/82), pelo que não se subsume a situação ao disposto no n.º 1 do artigo 78º da mesma lei. E porque de tal decisão não há recurso, também não pode ser contemplada no n.º 2 do mesmo artigo 78º, tal como não pode sê-lo no seu n.º 3, por se não tratar de decisão proferida 'já em fase de recurso'. Assim sendo, a situação em causa só encontra cobertura no disposto no citado n.º
4 do artigo 78º, que determina que o recurso 'tem efeito suspensivo e sobe nos próprios autos.' Daqui decorre necessariamente que o presente recurso tenha de subir imediatamente. A presente reclamação deve, pois, ser deferida. III. Decisão Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se deferir a reclamação, determinando-se a subida imediata do recurso.
Lisboa, 28 de Novembro de 2000 Paulo Mota Pinto Guilherme da Fonseca Luís Nunes de Almeida