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Proc. nº 715/99 TC – 1ª Secção Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 - A. M., com os sinais dos autos, recorreu para este Tribunal dos acórdãos do STJ, de fls. 854 e 904, na parte em que o primeiro decidiu declarar liminarmente a manifesta improcedência do recurso e condenou o recorrente, sem prévia audição, no pagamento da 'multa' de 7 Ucs. e o segundo indeferiu a reclamação contra aquele deduzida e manteve, na íntegra, a anterior decisão.
De acordo com o respectivo requerimento de interposição, 'aquela decisão (...) viola o 'princípio do contraditório', ou o chamado 'due process of law' e, muito particularmente, viola o princípio da 'proibição da indefesa', consagrados nos artigos 2º e 20º da Constituição da República, indo contra, entre outros, o douto Acórdão do Tribunal Constitucional, datado de 7.06.1994, o qual foi publicado na II Série do Diário da República, nº 202, de 1.09.94, encontrando-se publicado no BMJ nº 438, pag. 98 – arts. 70º nº 1 al. g), 71º,
72º e 75º-A da Lei nº 28/82, na sua actual redacção'.
Por despacho do relator, no uso dos poderes conferidos pelo artigo
78º-A nº 1 da Lei nº 28/82, foi proferida decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso.
Escreveu-se na referida decisão:
'Por duas ordens de razões, o Tribunal não pode conhecer do presente recurso.
Em primeiro lugar, pelo teor do requerimento de interposição do recurso, o recorrente imputa a invocada inconstitucionalidade à própria decisão recorrida, o que resulta patente do trecho supra transcrito daquele requerimento.
Ora é jurisprudência pacífica que o recurso de constitucionalidade tem por objecto normas (ou uma sua interpretação) e não as decisões que as aplicam ou desaplicam – a inconstitucionalidade tem que ser reportada à norma infra--constitucional e não à decisão judicial (cfr. entre outros Ac. nº. 20/96 in DR, 2ª Série, de 16/5/96). Na doutrina, cfr. no mesmo sentido J.M. Cardoso da Costa 'A Jurisdição Constitucional em Portugal', 2ª ed., Coimbra, 1992, p. 50.
E que no caso o recorrente assim não procedeu revela-o, como se disse, não só o próprio teor literal do requerimento de interposição, como ainda a circunstância de, no mesmo requerimento, se não indicar qualquer norma de direito infra--constitucional, cuja inconstitucionalidade se pretenda ver apreciada por este Tribunal.
Em segundo lugar, o recurso vem interposto ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea g) da Lei nº 28/82, o que resulta do facto de o recorrente unicamente indicar, em termos expressos, tal preceito e ainda de, em cumprimento do disposto no artigo 75º-A nº 3 da Lei nº 28/82, mencionar a decisão do Tribunal Constitucional que teria sido infringida pelo acórdão recorrido.
Sendo certo que este último preceito impõe o ónus do recorrente indicar a decisão do Tribunal Constitucional que, com anterioridade, 'julgou inconstitucional ou ilegal a norma aplicada pela decisão recorrida' (e não obviamente a decisão que julga em contrário da decisão recorrida), mesmo a admitir-se que as normas supostamente em causa seriam as que constam dos nºs 1 e
4 do artigo 420º do Código de Processo Penal, a verdade é que a decisão indicada não julgou inconstitucional tais normas e nada sequer tem a ver com elas – ela julgou inconstitucional a norma do artigo 1º nº 1 alínea e) do Decreto-lei
387-E/87, de 29 de Dezembro, na interpretação segundo a qual, havendo pagamento voluntário da multa pela transgressão prevista no artigo 1º da Lei nº 3/82, a medida de inibição de conduzir pode ser decretada por despacho, sem prévia audiência de julgamento.
Não se verificam assim os pressupostos específicos de admissibilidade do recurso previsto no artigo 70º nº 1 alínea g) da Lei nº
28/82, nem o que, genericamente, se exige para todos os tipos de recurso previstos no mesmo artigo 70º nº 1 (ter por objecto uma norma ou uma sua interpretação).'
É desta decisão que vem deduzida a presente reclamação onde, em síntese, o reclamante intenta contrariar os fundamentos do decidido por terem ocorrido dois lapsos no requerimento de interposição do recurso que agora corrige.
O primeiro residiria no facto de ter omitido no requerimento de interposição do recurso a expressão 'tal interpretação', pretendendo com isto provar que a recurso não se dirigia contra a decisão judicial, mas contra uma interpretação normativa.
O segundo consisitiria num erro de referência da página do BMJ onde fora publicado o acórdão do Tribunal Constitucional que supostamente fundamentara o recurso interposto ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea g) da LTC.
O Exmo Magistrado do Ministério Público responde a esta reclamação sustentando que ela é manifestamente infundada.
Cumpre decidir.
2 – O reclamante não aduz qualquer fundamento suficientemente consistente para infirmar o decidido.
Na verdade, não era de modo algum patente o primeiro 'lapso' invocada pelo reclamante, sendo certo que na decisão reclamada se reforçava a interpretação resultante da letra do requerimento de interposição do recurso com o facto incontestável de no mesmo requerimento se não aludir sequer a qualquer 'norma' de direito infra-constitucional arguida de inconstitucionalidade.
Por outro lado, vindo o recurso interposto ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea g) da LTC, mesmo aceitando a correcção do referido segundo 'lapso', não se vê do acórdão publicado no BMJ nº 438, págs. 84 e segs. qualquer julgado do Tribunal Constitucional no sentido de que as 'supostas' normas cuja inconstitucionalidade se teria arguido – que seriam as contidas no artigo 420º nºs 1 e 4 do Código de Processo Penal – infringiam a Constituição; não só não há naquele aresto qualquer julgado de inconstitucionalidade, como também as normas então em causa são as que se contêm no artigo 456º nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil referentes à condenação por litigância de má-fé, que não é manifestamente em causa.
Nada mais há, pois, que confirmar a decisão sumária reclamada.
3 – Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 Ucs. Lisboa,10 de Fevereiro de 2000 Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa