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Processo n.º 440/96
1ª Secção Relator - Paulo Mota Pinto
Acordam em conferência no Tribunal Constitucional: I. Relatório
1. C... apresentou, em 6 de Maio de 1996, no Tribunal da Relação do Porto, reclamação contra o despacho, aí proferido, que lhe não admitira o recurso de constitucionalidade interposto em 9 de Abril de 1996, com fundamento no disposto no n.º 2 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (falta de esgotamento dos recursos ordinários). No Tribunal Constitucional, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se pela manifesta improcedência da reclamação, não só por não preencher o requisito do prévio esgotamento dos recursos, legalmente fixado para o recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, como também por tal recurso se revelar manifestamente infundado (n.º 2 do artigo
76º do mesmo diploma). No decurso dos vistos, o reclamante veio requerer lhe fosse concedido apoio judiciário, sob a forma de dispensa total de preparos e de pagamento das custas
– ao que o Ministério Público se opôs, com base na então vigente redacção do n.º
2 do artigo 26º do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro, segundo a qual tais pedidos deviam ser liminarmente indeferidos quando fosse evidente que a pretensão do requerente, na causa para que era solicitado o apoio judiciário, não podia proceder. A 28 de Fevereiro de 1997, a relatora solicitou informação à Ordem dos Advogados sobre o estado da inscrição nesta do recorrente, tendo recebido um ofício do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados informando que tal inscrição se encontrava suspensa desde 10 de Novembro de 1995. Tendo em conta o disposto no artigo 83º da Lei do Tribunal Constitucional, ordenou a notificação do reclamante para constituir advogado, por despacho de 26 de Maio de 1997 . Em resposta, veio o reclamante apresentar requerimento pedindo a revogação de tal decisão por entender – e já o ter suscitado noutros processos – que as normas que impõem a obrigatoriedade do mandato judicial eram ilegais e inconstitucionais. Tal requerimento foi indeferido pela relatora, invocando jurisprudência constitucional em contrário (Acórdãos deste Tribunal n.ºs 332/97 e 294/97), por despacho de 9 de Março de 1998. Deste último despacho veio o requerente interpor reclamação para a conferência, ao abrigo do artigo 700º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 69º da Lei do Tribunal Constitucional.
2. Após mudança de relator, na sequência de alteração na composição do Tribunal Constitucional, o novo relator do processo proferiu despacho a ordenar a notificação do reclamante para constituir advogado, no prazo de dez dias, sob pena de não ter seguimento a reclamação (artigo 83º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional e artigos 32º e 33º do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 69º da Lei do Tribunal Constitucional). O reclamante veio então, por requerimento de 19 de Maio de 1998, apresentar reclamação para a conferência deste despacho do relator, por, segundo diz, almejar 'poder usufruir – e não por ser jurista – do elementar direito legal a escusar, ‘ad libitum’, porta voz oficioso'. A este requerimento seguiu-se despacho do relator considerando, nos termos do artigo 33º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 69º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e conjugado com o artigo 83º, n.º 1 da mesma lei, não poder a presente reclamação ter seguimento, 'ficando a aguardar que o reclamante constitua advogado'. Por requerimento de 6 de Julho de 1998, o reclamante veio reclamar para a conferência deste despacho, nos termos do artigo 700º, n.º 3, do Código de Processo Civil, considerando nula 'a bondade, a validade intrínseca, da decisão repetitivamente proferida para que ‘o reclamante constitua advogado’', 'decisão
‘a non domino’, juízo absolutamente incompetente, um acto judicial írrito e nulo, de nenhum efeito', defendendo ainda 'a ilegalidade e a inconstitucionalidade do patrocínio judiciário obrigatório'. II. Fundamentos
2. Dispõe o artigo 83º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional que 'nos recursos para o Tribunal Constitucional é obrigatória a constituição de advogado', sendo de equiparar as reclamações para o Tribunal Constitucional aos recursos no que diz respeito a esta exigência (neste sentido, o Acórdão deste Tribunal n.º 17/95, publicado no Diário da República, II série, de 19 de Abril de 1995). Por sua vez, nos termos do artigo 33º do Código de Processo Civil
(aplicável por força do artigo 69º da Lei do Tribunal Constitucional), 'se a parte não constituir advogado, sendo obrigatória a constituição, o tribunal, oficiosamente ou a requerimento da parte contrária, fá-la-á notificar para o constituir dentro de prazo certo, sob pena de o réu ser absolvido da instância, de não ter seguimento o recurso ou de ficar sem efeito a defesa.' São, pois, legítimas dúvidas sobre a possibilidade, à face da lei, de dar seguimento à própria reclamação para a conferência, prevista no artigo 700º, n.º
3 do Código de Processo Civil (aplicável por força do citado artigo 69º), do despacho que notificou o reclamante para constituir advogado, enquanto este o não fizer. É certo que, dizendo a questão de constitucionalidade suscitada pelo reclamante respeito à própria exigência de patrocínio judiciário, a eventual procedência deste recurso poderia ter como consequência que, afinal, o reclamante não careceria de constituir advogado. Diga-se, todavia, que a circunstância de o preenchimento pelo recorrente de um pressuposto processual como o patrocínio judiciário obrigatório poder depender da solução da questão de fundo quanto à constitucionalidade não parece bastar para, no momento da interposição do recurso de constitucionalidade, se dever dispensar a verificação desse pressuposto – sob pena de se frustrar, ainda que só no que respeita ao recurso que tem por objecto tal questão, a ratio da sua exigência. Será, pois, de exigir a constituição de advogado, sendo certo, aliás, que – pelo menos, no que toca ao pressuposto consistente na exigência de patrocínio judiciário – nem sequer se encerra deste modo o recorrente num inextricável círculo vicioso, impedindo-o de ver apreciada a questão de constitucionalidade que lhe interessa. O pressuposto processual em causa poderá
– ainda que eventualmente sob protesto – ser facilmente preenchido pelo recorrente simplesmente através da constituição de advogado para o recurso que tem a apreciação da constitucionalidade de tal exigência por objecto. De todo o modo, em face das dúvidas que a questão poderá eventualmente suscitar, e considerando a existência de várias decisões, tomadas em conferência, em que se tomou conhecimento de reclamações de despachos do relator a ordenar a notificação para a constituição de advogado, sem que esta tenha ocorrido, decide-se submeter à conferência a presente reclamação.
3. A questão de constitucionalidade do artigo 83º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional – norma na qual se baseou o despacho reclamado – foi já apreciada várias vezes pelo Tribunal Constitucional, designadamente no Acórdãos n.ºs
17/95, 252/97 (o primeiro já citado e o segundo publicado no Diário da República, II série, de 20 de Maio de 1997) e n.º 294/97 (inédito), nos quais se decidiu não julgar inconstitucional a mencionada norma que exige a constituição de advogado nos recursos para o Tribunal Constitucional. Como se salientou no primeiro daqueles arestos, 'afigura-se correcta uma equiparação entre recursos e reclamações para efeitos do disposto no artigo 83º, n.º 1, da Lei n.º 28/82, sendo de exigir a intervenção de advogado na reclamação para o Tribunal Constitucional'. A exigência de patrocínio judicial obrigatório em recurso de constitucionalidade foi igualmente considerada não inconstitucional nos Acórdãos n.ºs 245/97 e 326/97 (publicados, respectivamente, no Diário da República, II série, de 16 de Maio de 1997 e de 2 de Julho de 1997).
É esta jurisprudência, para cuja fundamentação se remete, que cumpre reiterar sem mais no presente caso. Ora, sendo obrigatória a constituição de advogado (artigo 83º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional) e concluindo-se, em face de ofício do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados disponível no processo, que, no momento de apresentação da presente reclamação, o reclamante se encontrava com a sua inscrição na Ordem dos Advogados suspensa, não gozando do direito de advogar em causa própria, há que desatender a presente reclamação e confirmar o despacho reclamado. III. Decisão Pelos fundamentos expostos, decide-se desatender a presente reclamação e, nos termos do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 149-A/83, de 5 de Abril, na redacção do Decreto-Lei n.º 72-A/90, de 3 de Março, condenar o reclamante em custas, fixando-se a taxa de justiça em 8 unidades de conta. Lisboa, 7 de Dezembro de 1999 Paulo Mota Pinto Maria Fernanda Palma Vítor Nunes de Almeida Alberto Tavares da Costa Artur Maurício Maria Helena Brito José Manuel Cardoso da Costa