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Processo nº 937-A/98 Conselheiro Messias Bento
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. OL... vem, neste traslado, reclamar para a conferência do despacho do relator, de 20 de Junho de 2000, dizendo que 'esse despacho não pode ser sustentado'; e pedindo que 'se proceda ao suprimento de todas as nulidades arguidas de harmonia com o disposto no artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem'.
No despacho reclamado, o relator limitou-se a determinar que se lhe abrisse conclusão nos autos, uma vez pagas as custas contadas no processo. E tal determinou, porque o Tribunal já tinha decidido (por último, no acórdão nº
256/2000) que não era possível conhecer das reclamações sucessivamente apresentadas pelo ora reclamante antes de aquele pagamento ser feito.
O relator, por entender que o comportamento processual do reclamante é susceptível de integrar o conceito de má fé processual, lançou no processo parecer nesse sentido e mandou que sobre ele fosse ouvido o reclamante.
Este parecer é do teor seguinte: O Plenário deste Tribunal, no seu acórdão nº 449/99 (de 8 de Julho de 1999), decidiu mandar extrair o presente traslado e, entre o mais, que a reclamação apresentada contra o acórdão nº 312/99 (de 25 de Maio de 1999), apenas seria decidida depois de pagas as custas em que o reclamante OL... tinha sido condenado. Tal decidiu, por força do que dispõe o nº 8 do artigo 84º da Lei do Tribunal Constitucional, depois de, em 20 de Janeiro de 1999, pelo acórdão nº 52/99, ter indeferido a reclamação apresentada contra a decisão sumária (de 18 de Novembro de 1998) que negara provimento ao recurso interposto pelo dito reclamante; depois também de, em 24 de Março de 1999, pelo acórdão nº 197/99, ter confirmado o despacho do relator (de 5 de Fevereiro de 1999) que não lhe admitiu recurso para o Plenário; e depois ainda de, em 25 de Maio de 1999, pelo acórdão nº
312/99 ter desatendido a reclamação por ele apresentada contra aquele acórdão nº
197/99, que acusou enfermar de nulidade. O reclamante não pagou as custas entretanto contadas e apresentou novas reclamações, tendo o Tribunal, novamente em Plenário, tirado o acórdão nº
256/2000 (de 26 de Abril de 2000), para reafirmar – em aplicação, naturalmente, do citado artigo 84º, nº 8 – que as reclamações apresentadas apenas seriam decididas depois de pagas as custas. O reclamante continuou a não pagar as custas e a apresentar novas reclamações. Em face disso, o relator proferiu o despacho de 20 de Junho de 2000, determinando que se lhe abrisse conclusão nos autos, uma vez pagas as custas, pois o Tribunal tinha decidido (por último, no citado acórdão nº 256/2000) que não era possível conhecer das reclamações antes de tal pagamento ser efectuado. O reclamante veio, então, apresentar nova reclamação (requerimento de fls. 323 a
334, rectificado pelo de fls. 348 a 352), pedindo que recaia acórdão sobre o citado despacho do relator (de 20 de Junho de 2000), 'no sentido de que esse despacho não pode ser sustentado e, em consequência, se proceda ao suprimento de todas as nulidades arguidas de harmonia com o disposto no artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem'. No entender do relator, o comportamento processual do reclamante, que se deixa sumariamente descrito, é susceptível de integrar o conceito de má fé processual, pois, não obstante o decidido pelo Tribunal ao abrigo do que a lei dispõe, ele insiste na pretensão de ver decididas as reclamações antes de pagas as custas. Ora, dispõe o artigo 456º, nº 2, alínea d), do Código de Processo Civil: 'diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave: d) tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de
[...] entorpecer a acção da justiça [...]'. Entendendo o relator que o reclamante deve ser condenado como litigante de má fé, ordena-se que, ao abrigo do disposto no artigo 84º, nº 7, da Lei do Tribunal Constitucional, o mesmo seja notificado, para, querendo, responder a este parecer, em dois dias.
O reclamante veio dizer, em conclusão:
1. O douto parecer de 20 de Setembro de 2000 não satisfaz as condições que permitam o exercício, em pleno conhecimento de causa, dos direitos previstos no artigo 32º, nº 10, da Constituição. a) É da essência das garantias de defesa que a operação de subsunção que conduz
à determinação da moldura de ilícito correspondente a determinados factos, seja previamente conhecida e como tal, controlável pelo arguido. b) A descrição, declaradamente sumária, da conduta processual do recorrente, feita no douto parecer, não menciona factos, alegados pelo recorrente, que não correspondam à verdade, nem contém elementos que permitam identificar a 'razão' pela qual as providências requeridas através dos meios processuais utilizados conduziriam a diligências meramente dilatórias. c) Por conseguinte, a descrição sumária contida no douto parecer de 20 de Setembro de 2000 não contém elementos que permitam tomar posição, em pleno conhecimento de causa, sobre a acusação formulada contra o recorrente.
2. Tendo em conta a factualidade que se pode surpreender através da leitura dos autos, o recorrente considera que a sua conduta processual só poderá ser qualificada de litigância de má fé à custa de uma inflexão da objectividade do direito. a) O douto parecer de 20 de Setembro de 2000 contém elementos que permitem pensar que não foram respeitadas as garantias de imparcialidade. i) Do ponto 1 do douto parecer de 20 de Setembro de 2000 decorre que foram apresentadas reclamações nos termos do artigo 668º e 669º, nº 1, alínea b), e de outras disposições do Código de Processo Civil, nomeadamente, contra os doutos acórdãos nºs 312/99, 449/99 e 256/2000. ii) Essas reclamações não foram ainda apreciadas. iii) No entanto, o douto parecer de 20 de Setembro de 2000 adopta já a premissa de que o Tribunal decidiu 'ao abrigo do que a lei dispõe'. iv) A adopção desta premissa, antes de serem apreciadas as razões de facto e de direito expostas nas reclamações apresentadas com vista a demonstrar que os doutos acórdãos e despachos contestados não foram tirados em conformidade com a lei ou com critérios por ela definidos, não se coaduna com as garantias de imparcialidade. b) Nas circunstâncias do caso, no entender do recorrente, o facto de ele insistir 'na pretensão de ver decididas as reclamações apresentadas antes de pagas as custas' nada tem de ilegal ou de reprovável. i) Tendo em conta o disposto nos artigos 677º do Código de Processo Civil e 50º do Código das Custas Judiciais, a conduta processual do interessado só poderia enquadrar-se na moldura de ilícito desenhada no artigo 456º, nº 2, alínea d), do Código de Processo Civil, se a aplicação do artigo 84º, nº 8, da Lei do Tribunal Constitucional tivesse por efeito a privação, nos recursos interpostos para o Tribunal Constitucional, dos direitos de reclamação previstos nos artigos 161º, nº 5, 700º, nº 3, 668º e 669º do Código de Processo Civil. ii) Mas tal equivaleria a deixar os particulares sem quaisquer meios de reacção contra actos dos tribunais superiores considerados ilegais, em desproporcionada homenagem ao valor da economia processual, invocado como fundamento do despacho de admissão do presente recurso, valor esse que seria promovido à custa das garantias de defesa. iii) Uma vez que a interpretação do artigo 84º, nº 8, da Lei do Tribunal Constitucional, que presidiu ao douto acórdão nº 256/2000 e ao douto parecer de
20 de Setembro de 2000, redunda numa limitação inadmissível e injustificada das possibilidades de defesa, o interessado não consegue descortinar como é que se pôde concluir que o seu pedido no sentido de que se proceda, de harmonia com o disposto no artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ao suprimento de todas as nulidades arguidas tem por finalidade entorpecer a acção da justiça. iv) No entender do recorrente, não se afigura legítimo nem razoável sugerir a condenação de alguém como litigante de má fé por insistir 'na pretensão de ver decididas as reclamações antes de pagas as custas', quando não pode ignorar-se que
- segundo o disposto no artigo 84º, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional 'os recursos para o Tribunal Constitucional são isentos de custas...',
- conforme decorre do próprio parecer de 20 de Setembro de 2000, há reclamações que ainda não foram apreciadas,
- a apreciação objectiva e imparcial das razões de facto e de direito invocadas nessas reclamações é susceptível de conduzir logicamente à alteração das decisões proferidas sobre as custas cujo pagamento é previamente exigido. Tendo em conta os elementos avançados, o recorrente considera que o douto parecer, segundo o qual 'o reclamante deve ser condenado como litigante de má fé', é desprovido de qualquer fundamento, pelo que não deve ser seguido.
Esta resposta foi expedida, pelo correio, em 29 de Setembro de 2000, como se vê do carimbo nela aposta. A secretaria, por entender que a mesma lhe foi apresentada dois dias depois do termo do prazo, avisou o reclamante para pagar a multa devida, nos termos do artigo 145º, nº 6, do Código de Processo Civil, conjugado com o artigo 18º, nº
2, do Código das Custas Judiciais. O reclamante não pagou essa multa e veio dizer, em conclusão o seguinte: Tendo em conta os elementos indicados no texto do aviso de 4 de Outubro de 2000, a interpretação e aplicação da regra da continuidade dos prazos que presidem ao acto notificado por esse aviso, além de desconhecerem por completo o disposto no artigo 254º, nº 2, do Código de Processo Civil, colidem frontalmente com o direito a um processo equitativo consagrado nos artigos 20º, nº 4, da Constituição e 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
1. No entender do reclamante o acto notificado pelo aviso da Secretaria do Tribunal Constitucional de 4 de Outubro de 2000, pelo qual lhe é aplicada uma multa, nos termos do artigo 145º, nº 6, do Código de Processo Civil, não contém uma fundamentação expressa e acessível, havendo violação do artigo 268º, nº 3, da Constituição. a) A aplicação de uma multa é susceptível de afectar direitos e interesses legalmente protegidos. b) Nem a nota de 22 de Setembro de 2000, nem o texto do referido aviso indica a data de início do 'prazo contínuo de dois dias'. c) No entender do reclamante, a indicação dessa data era indispensável para garantir a transparência do processo e da decisão.
2. No entender do reclamante, tendo em conta os elementos indicados no texto do aviso de 4 de Outubro de 2000, o acto de aplicação de uma multa ao interessado, no caso concreto, constitui violação clara do artigo 254º, nº 2, do Código de Processo Civil. a) Raciocinando a partir dos elementos que figuram no texto do aviso de 4 de Outubro de 2000, conclui-se que o 'prazo contínuo de dois dias' se extinguiu no dia 25 de Setembro de 2000. i) Com efeito, o registo da carta através da qual se enviou a fotocópia do douto parecer sobre o qual o interessado foi convidado a tomar posição, ocorreu em 22 de Setembro de 2000 (ver cópia junta). ii) No aviso de 4 de Outubro de 2000 considerou-se que o registo da carta de expedição da resposta ao douto parecer em questão tinha ocorrido em '27.09.00'. iii) Da leitura do texto desse aviso resulta também que a multa foi aplicada pelo facto de o acto processual do reclamante ter sido praticado no '2º dia útil após o termo do prazo'. b) Segue-se que a Secretaria do Tribunal Constitucional considerou que o 'prazo contínuo de dois dias', para reagir ao douto parecer de 20 de Setembro de 2000, terminou na data em que, segundo o disposto no artigo 254º, nº 2, do Código de Processo Civil, se podia considerar notificado o douto parecer a que o interessado foi convidado a reagir.
3. Tendo em conta os elementos indicados no texto do aviso de 4 de Outubro de
2000 e a data do registo da carta de expedição da fotocópia do douto parecer de
20 de Setembro de 2000, a interpretação e aplicação da regra da continuidade dos prazos que presidem ao acto notificado pelo aviso de 4 de Outubro de 2000 não se coadunam minimamente com o correcto funcionamento do contraditório. a) Com efeito, através desses elementos, conclui-se que, para a Secretaria do Tribunal Constitucional, o prazo para o interessado tomar posição sobre o douto parecer de 20 de Outubro de 2000 terminou no dia em que legalmente se podia considerar feita a sua notificação. b) Raciocinando a partir dos elementos indicados no aviso de 4 de Outubro de
2000, conclui-se que, para a Secretaria do Tribunal Constitucional, a resposta ao douto parecer de 20 de Setembro de 2000 seria necessariamente um acto processual praticado após o termo do prazo, já que a alternativa deixada , de antemão, ao interessado era: ou renunciar ao seu direito de resposta ou pagar uma multa. c) Nestas condições, a interpretação e aplicação da regra da continuidade dos prazos que presidem ao aviso de 4 de Outubro de 2000 tendem a impedir ou a perturbar o correcto funcionamento do contraditório.
4. O reclamante considera que o acto processual pelo qual respondeu ao douto parecer de 20 de Setembro de 2000 só pode ser considerado apresentado fora de prazo à custa de um grave atropelo do direito a dispor de tempo necessário para preparar a sua defesa, que se integra nas garantias de um processo equitativo. a) Pela nota de 22 de Setembro de 2000, o reclamante foi convidado a tomar posição sobre o douto parecer de 20 de Setembro de 2000, pelo qual é acusado de litigância de má fé, o que lhe pode valer uma condenação e a aplicação de uma sanção. b) Diz o artigo 32º, nº 10, da Constituição que '... em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa'. c) É do conhecimento directo da Secretaria do Tribunal Constitucional a circunstância de o reclamante se encontrar fora do país, a mais de 2.000 Km do local onde está sediado o Tribunal Constitucional. d) Nos artigos 252º-A, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil e 56º, nº 4, da Lei do Tribunal Constitucional, o legislador prevê dilações ao prazo de defesa do citando quando o réu tenha sido citado fora da área da comarca sede do tribunal onde pende a acção, e quando os actos respeitem a entidade sediada fora do continente da República. e) O reclamante considera que a sua situação é análoga às situações previstas pelo legislador nesses textos legais. f) À luz do princípio da igualdade de tratamento, não se descortina razão para que não acresça uma dilação ao prazo de defesa de dois dias previsto no artigo
84º, nº 7, da Lei do Tribunal Constitucional, em casos em que um cidadão se encontre a mais de 2.000 km de distância da sede do Tribunal Constitucional. g) Além disso, é do conhecimento geral que aos sábados e domingos os serviços postais não funcionam em pleno e que não é irrelevante expedir uma carta sexta-feira ou nos outros dias da semana. h) Assim, no caso concreto, a inexistência de uma dilação, pelo menos, equivalente ao sábado e Domingo imediatamente a seguir ao do registo da carta em que se enviou o acto a que o interessado foi convidado a reagir equivale a privar o interessado do direito a dispor do tempo necessário para organizar a sua defesa, que se integra nas garantias de um processo equitativo. Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossa Excelência, deve atender-se a presente reclamação e, por consequência, revogar-se o acto pelo qual foi aplicada ao reclamante multa nos termos do artigo 145º, nº 6, do Código de Processo Civil, considerar-se a resposta ao douto parecer de 20 de Setembro de
2000 como um acto de processo regularmente praticado, seguindo-se os restantes trâmites legais.
2. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
3. Convém começar por historiar o que se passou nos autos de recurso de que foi extraído o traslado e neste próprio. Foi o seguinte:
(a). Em 18 de Novembro de 1998, o relator proferiu decisão sumária, a negar provimento ao recurso (interposto pelo ora reclamante de um acórdão do Supremo Tribunal Administrativo) e a condenar o recorrente nas custas;
(b). Em 20 de Janeiro de 1999, a conferência da 3ª Secção, pelo acórdão nº
52/99, indeferiu a reclamação apresentada contra a referida decisão sumária e condenou o reclamante em custas;
(c). Em 5 de Fevereiro de 1999, o relator proferiu despacho a não admitir o recurso que o recorrente interpôs para o Plenário do Tribunal;
(d). Apresentada reclamação desse despacho para a conferência do Plenário, este, em 24 de Março de 1999, pelo acórdão nº 197/99, indeferiu a reclamação (e, assim, confirmou o despacho de não admissão de recurso para o Plenário) e condenou o reclamante nas custas;
(e). Arguindo o recorrente a nulidade do acórdão nº 197/99, o Plenário, em 25 de Maio de 1999, pelo acórdão nº 312/99, desatendeu a reclamação apresentada e condenou o reclamante nas custas;
(f). O recorrente veio, novamente, reclamar por nulidade, mas agora do acórdão nº 312/99. O Plenário, porém, pelo acórdão nº 449/99 (de 8 de Julho de 1999), mandou extrair traslado de várias peças do processo, a fim de a reclamação ser decidida depois de pagas as custas em que o reclamante havia sido condenado neste Tribunal, mandando, bem assim, contar tais custas e que, extraído o traslado, os autos de recurso fossem imediatamente remetidos ao Supremo Tribunal Administrativo;
(g). Contado o processo (conta nº 329/99, de 16 de Julho de 1999) e extraído o traslado, foram os autos de recurso, em 19 de Julho de 1999, remetidos ao Supremo Tribunal Administrativo. Na mesma data, foi o recorrente notificado daquele acórdão nº 449/99 e da conta de custas (cota de fls. 195);
(h). Em 4 de Agosto de 1999, apresentou o recorrente nova reclamação, a pedir a anulação do acórdão nº 449/99 e a emissão de decisão sobre a reclamação apresentada contra o acórdão nº 312/99;
(i). O relator, em 20 de Setembro de 1999, proferiu despacho, dizendo que se pronunciaria sobre a reclamação referida na alínea (h), 'depois de cumprido, nos seus precisos termos, o acórdão nº 449/99';
(j). Em 11 de Outubro de 1999, o recorrente apresentou nova reclamação, pedindo, desta vez, que se revogasse o despacho de 20 de Setembro de 1999 e se decidisse a reclamação por si apresentada em 4 de Agosto de 1999;
(l). Em 19 de Outubro de 1999, o relator proferiu despacho a não admitir a reclamação apresentada em 11 de Outubro de 1999, em virtude de ela visar um despacho (o de 20 de Setembro de 1999), que é de mero expediente;
(m). Foram, entretanto, devolvidas as guias destinadas ao pagamento das custas, com a nota de 'não pagas';
(n). Em 2 de Novembro de 1999, veio o recorrente reclamar do despacho do relator de 19 de Outubro de 1999, pedindo a sua revogação, bem como a do despacho de 20 de Setembro de 1999;
(o). O relator, em 3 de Novembro de 1999, proferiu despacho do teor seguinte:
'abrir-se-á conclusão nos autos só depois de pagas as custas contadas neste Tribunal';
(p). Em 21 de Fevereiro de 2000, o recorrente apresentou nova reclamação, dirigida ao Presidente do Tribunal, pedindo-lhe a adopção das 'medidas que entender adequadas à reparação dos prejuízos [que lhe foram] causados pelos actos da Secretaria', que considera irregulares, a saber: remessa dos autos de recurso à conta, seguida da sua remessa ao tribunal recorrido na mesma data em que se notificou ao recorrente a conta e o acórdão nº 449/99;
(q). Apresentados os autos de traslado ao Exmº Presidente do Tribunal (cf. despacho do relator de 24 de Fevereiro de 2000 e termo de conclusão de fls. 244 v.), foi por este proferido o despacho de 1 de Março de 2000, no sentido de que lhe não cabe decidir a reclamação apresentada em 21 de Fevereiro de 2000;
(r). O relator proferiu, então, despacho, em 16 de Março de 2000, dizendo que, por não terem sido pagas as custas contadas no processo, não podia – por força do que tinha sido decidido no acórdão nº 449/99 – apreciar a reclamação apresentada contra o acórdão nº 312/99, nem, obviamente, as que o ora reclamante apresentou depois de tirado aquele acórdão nº 449/99;
(s). Desse despacho (de 16 de Março de 2000) reclamou ele, novamente, para a conferência, pedindo que se decidisse que 'não é condição para se conhecer das reclamações apresentadas o prévio pagamento das custas [...]';
(t). O Tribunal, em Plenário, no acórdão nº 256/2000, indeferiu a reclamação apresentada, reafirmando, desse modo, o entendimento de que, mandando-se extrair traslado, a lei (artigo 720º do Código de Processo Civil e artigo 84º, nº 8, da Lei do Tribunal Constitucional) apenas permite que se decida o incidente pendente (e, obviamente, todos os que, posteriormente, se requererem), uma vez pagas as custas do processo;
(u). O reclamante veio, então, pelo requerimento de fls. 227, reclamar do acórdão nº 256/2000; e pelo requerimento de fls. 304, reclamar do acto da secretaria, 'pelo qual lhe foi aplicada uma multa nos termos do artigo 145º, nº
6, do Código de Processo Civil, pela apresentação daquela reclamação fora de prazo';
(v). Sobre estes requerimentos recaiu o despacho do relator, de que ora se reclama. Nesse despacho, como se referiu logo de início, o relator ordenou que se abrisse conclusão nos autos, uma vez pagas as custas, pois só então era possível conhecer das reclamações.
4. Como decorre do que se disse, não obstante o Tribunal já ter decidido – e reiterado – que, por força do que se dispõe nos artigos 720º do Código de Processo Civil e 84º, nº 8, da Lei do Tribunal Constitucional, só lhe é possível decidir os vários incidentes, que o reclamante tem vindo a suscitar, depois de pagas as custas do processo, ele continua a insistir em suscitar novos incidentes e em reclamar que sobre eles se profira decisão.
Como o Tribunal já decidiu que só pode pronunciar-se sobre os incidentes depois de o reclamante pagar as custas, esgotou-se sobre essa questão o seu poder de cognição. E, por isso, não há, sequer, que conhecer da reclamação ora apresentada, que, de resto, incide sobre um despacho de mero expediente.
O comportamento do reclamante consubstancia má fé processual, pois traduz uso
(intencional) manifestamente reprovável do processo e dos meios processuais, com o objectivo de entorpecer a acção da justiça [cf. artigo 456º, nº 2, d), do Código de Processo Civil], como tudo bem resulta do que, sumariamente, se disse no parecer e, mais desenvolvidamente, se expôs supra, sob o nº 3. Impõe-se, por isso, a sua condenação, como litigante de má fé, na multa correspondente, nos termos das disposições conjugadas dos artigo 456º, nº 1, do Código de Processo Civil, 84º, nº 6, da Lei do Tribunal Constitucional e 102º, a), do Código das Custas Judiciais. E, sendo o reclamante advogado em causa própria, há que, ao abrigo do disposto no artigo 459º do Código de Processo Civil, comunicar o facto à Ordem dos Advogados, com cópia deste acórdão.
É o que vai fazer-se.
5. Antes, porém, sublinha-se que a resposta ao parecer do relator foi apresentada dois dias depois de findo o respectivo prazo, razão por que a sua validade está dependente do pagamento da multa que a secretaria deste Tribunal liquidou (artigo 145º, nºs 5 e 6, do Código de Processo Civil). De facto, o parecer do relator (de 20 de Setembro de 2000) foi notificado ao reclamante, por carta registada de 22 desse mês de Setembro, considerando-se, por isso, a notificação feita no dia 25 de Setembro de 2000 (artigo 254º, nº 2, do Código de Processo Civil). Sendo o prazo de dois dias, o mesmo terminava no dia 27 de Setembro de 2000. Ora, a resposta foi enviada pelo correio no dia 29 de Setembro de 2000, sendo de todo irrelevante a indicação de qualquer outra data que, acaso, conste do aviso para o pagamento da multa.
Não obstante a validade da resposta ao parecer do relator estar dependente do pagamento da multa e de esta não ter sido paga, deu-se conta da mesma, do mesmo modo que se deu nota da 'reclamação' apresentada contra a liquidação da multa. Tal se fez porque, na 'reclamação' por último referida, o reclamante, entre o mais, questiona a constitucionalidade da exigência do pagamento de multa num caso como o dos autos, em que se está em presença de um prazo muito curto, a justificar, em seu entender, o acréscimo de uma dilação. Ora, há que dizer que não existe qualquer analogia entre as situações do artigo
252º-A do Código de Processo Civil, em que está em causa a citação para uma acção, e a dos presentes autos, em que se trata de ouvir o interessado sobre um parecer do relator lançado num processo em que aquele teve já múltiplas intervenções. Acresce que nem a exigência do pagamento de multa pela prática do acto processual fora de prazo, nem a curteza do prazo para responder são susceptíveis de pôr em causa o direito de defesa do reclamante.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide:
(a). não conhecer da reclamação apresentada;
(b). condenar o reclamante, como litigante de má fé, na multa correspondente a
10 unidades de conta;
(c). condenar o reclamante nas custas, com unidades de conta de taxa de justiça;
(d). mandar fazer a comunicação a que se refere o artigo 459º do Código de Processo Civil à Ordem dos Advogados, remetendo-se-lhe cópia deste aresto. Lisboa, 7 de Novembro de 2000 Messias Bento Guilherme da Fonseca Alberto Tavares da Costa Maria Fernanda Palma Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Maria Helena Brito José de Sousa e Brito Vítor Nunes de Almeida Paulo Mota Pinto Bravo Serra Luís Nunes de Almeida