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Processo n.º 383/11
1ª Secção
Relator: Conselheira Maria João Antunes
Acordam na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal do Trabalho de Lisboa, em que é recorrente o Ministério Público, foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), da decisão daquele Tribunal de 15 de março de 2011.
2. A., recorrido nos presentes autos, participou um acidente de trabalho, na qualidade de sinistrado, nos serviços do Ministério Público do Tribunal de Trabalho de Lisboa (fl. 1). Na sequência de tentativa de conciliação, em que as partes não se conciliaram (fl. 112 e ss.), foi iniciada a fase contenciosa, nos termos do disposto nos artigos 117.º, n.º 1, alínea a), e 111.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo de Trabalho. Findos os articulados, o Tribunal recorrido proferiu despacho saneador, que aqui se reproduz na parte com relevo para a apreciação do presente recurso:
«DA ISENCÃO DE CUSTAS
Como adiante se verá, o Tribunal acompanha a posição manifestada pelo Ministério Público relativamente a esta questão, pelo que se pede vénia para seguir de perto o texto da alegação constante da petição inicial.
Como bem aponta o sinistrado na petição inicial, o direito à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho é um direito absolutamente irrenunciável (art. 34º da Lei nº 100/97,de 13/09) e de exercício necessário.
Nesta conformidade, e para evitar que o trabalhador diminuído ou incapacitado em consequência de lesões sofridas num acidente tenha de aguardar, durante anos, que lhe seja reconhecido o direito à reparação e lhe sejam pagas as prestações fixadas, pondo seriamente em risco a sua dignidade e a sua própria subsistência a lei determina que os processos onde se discutem estes direitos e o pagamento destas prestações (tanto na fase declarativa como na fase executiva) tem curso oficioso e natureza urgente (…).
Por outro lado, ao assumir o patrocínio do sinistrado, o Ministério Público está obrigado, por força da lei, a propor a ação destinada a efetivar tais direitos de natureza irrenunciável (arts. 117º., nº1, al. a), e 119º., nº1, do CPT).
Na verdade, o artº.119º., nº1, do CPT impõe expressamente ao Ministério Público a petição inicial prevista no art.º 117º., nº1, do CPT, devendo fazê-lo no prazo de 20 dias.
O patrocínio pelo Ministério Público surge, aqui, como “uma garantia acrescida dos trabalhadores no acesso ao direito” (…).
O patrocínio oficioso por parte do Ministério Público apresenta-se aqui como um direito das pessoas referidas na alínea a), do art.º 7º do CPT.
E face ao estatuído no art.º 219º. nº 1, da Constituição da República Portuguesa, compete ao Ministério Público representar o Estado e defender os interesses que a lei determinar.
Finalmente, cumpre salientar que nas ações por acidente de trabalho e tendo em conta a índole e a natureza dos interesses em causa, princípios de interesse e ordem pública não se verifica a interrupção da instância pois o impulso processual é oficioso e não está dependente da vontade das partes.
Esta relevância do regime substantivo e processual da reparação dos acidentes de trabalho decorre do estatuído no art.º 59º., nº1, al. f) da Constituição da República Portuguesa, o qual estabelece que todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à assistência e justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional.
No caso em apreço esta disposição constitucional deve ser objeto de uma valoração que atenda à natureza indisponível do direito em causa ou seja, o direito à reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho (art.º 1º., nº1, da Lei nº 100/97,de 13/09).
E é neste contexto que importa interpretar o art.º 4º, nº1, al. h), com referência aos arts 5º.,6º., e 7º., do Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo Decreto-Lei nº 34/2008, de 26 de fevereiro.
Ora, tendo presente todo o exposto, entende este Tribunal que o art.º 4º., nº1, al. h), do Regulamento das Custas Processuais é inconstitucional quando interpretado no sentido de exigir que relativamente aos sinistrados em acidentes de trabalho que pretendem fazer valer o seu direito constitucional à justa reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho, a isenção de custas ali prevista depende da circunstância de o seu rendimento anual ilíquido ser inferior ao limite máximo ali consignado.
Note-se que o limite decorrente do prévio recurso a estrutura alternativa de resolução de litígios é inaplicável aos processos emergentes de acidente de trabalho, dada a natureza indisponível dos interesses em jogo.
Na verdade, uma tal limitação ao exercício do direito à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho viola o disposto nos arts.º 13º.,nºs 1 e 2 e 59º., nº1, al. f), da Constituição da República Portuguesa.
Nesta conformidade, decide este Tribunal:
– Não aplicar, no caso concreto, o art. 4º, nº 1, al. h) do RCP, na parte em que impõe como limite à isenção de custas ali prevista um rendimento não superior a 200 UC, por considerar que tal preceito é inconstitucional, quando interpretado no sentido de exigir que relativamente aos sinistrados em acidentes de trabalho que pretendem fazer valer o seu direito constitucional à justa reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho, a isenção de custas consagrada no mesmo preceito depende da circunstância de o rendimento anual ilíquido do trabalhador sinistrado ser inferior ao limite máximo de 200 Unidades de Conta, por violação dos princípios constitucionais da igualdade e da justa reparação dos acidentes de trabalho consagrados nos arts. 13º e 59º, nº 1, al. f) da Constituição da República Portuguesa;
– Considerar, para todos os efeitos, que o autor dos presentes autos se encontra isento de custas, nos termos do disposto no art 4º, nº 1, al. h) do RCP, na interpretação conforme à constituição acima enunciada, pelo não tem que pagar qualquer quantia a título de taxa de justiça, custas ou encargos com o presente processo».
2. O Ministério Público interpôs o presente recurso de constitucionalidade para apreciação «da norma do artigo 4.º, n.º 1, alínea h) do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que, nas ações emergentes de acidente de trabalho em que os sinistrados sejam representados pelo Ministério Público, “impõe como limite à isenção de custas ali prevista um rendimento não superior a 200 UC”, por parte do trabalhador sinistrado».
3. O recorrente produziu alegações, onde conclui, entre o mais, o seguinte:
«5.º
A partir do momento em que a legislação ordinária consagra, com caráter geral, um regime de apoio judiciário em todas as jurisdições, a imposição da exclusividade do patrocínio oficioso dos trabalhadores, a cargo do Ministério Público, poderia consubstanciar uma discriminação arbitrária, sem fundamento bastante.
6.º
Mas, nos termos do art.º 7.º do CPT, o patrocínio do trabalhador pelo Ministério Público faz-se com respeito pelo regime de apoio judiciário, que se obtém, ou não, de acordo com a situação económica concreta.
7.º
Realidade diferente é a de isenção de custas, concedida por mero efeito da lei.
8.º
Ora, como este Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado, a imposição ao Estado do dever de assegurar que ninguém fica impedido de aceder à justiça, não implica a sua gratuitidade, cabendo ao legislador, mediante critérios de razoabilidade e de proporcionalidade, o poder de definir os custos correspondentes à utilização da máquina da justiça.
E, como refere o Ac. n.º 109/2007, «Onde, a propósito do regime de custas nos tribunais, deverão relevar situações diferenciadas, objetiva ou subjetivamente, hão de ser estabelecidas, por opção do legislador, no exercício da sua liberdade de conformação (e com respeito pelo princípio da igualdade), as exceções ao princípio geral de que os sujeitos processuais estão sujeitos ao pagamento de custas (…)».
9.º
Afigura-se, assim, não poder considerar-se arbitrária, discricionária ou destituída de razoabilidade, a solução que se traduz em diferenciar os trabalhadores/sinistrados, para efeitos de isenção de custas, em função do montante dos seus rendimentos anuais serem, ou não, superiores a 200 UC.
10.º
Por sua vez, o direito fundamental de assistência e justa reparação que o art.º 59.º, n.º 1, alínea f), da CRP, concede aos trabalhadores que sejam vítimas de acidente laboral, impõe ao Estado a criação de instrumentos que assegurem uma adequada assistência e uma justa reparação aos trabalhadores vítimas de acidente de trabalho.
11.º
Mas, como o Tribunal Constitucional já afirmou, a isenção de custas não integra o conteúdo mínimo ou constitucionalmente necessário do direito social em causa (Ac. n.º 336/2007); ou, a imposição do pagamento de custas não viola, por si só, o direito dos trabalhadores vítimas de acidente de trabalho a assistência e a uma justa reparação (cfr. Acs n.ºs 150/2000 e 109/2007).
12.º
Pelo que, a norma do artigo 4.º, n.º 1, alínea h), do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, na parte em que impõe, nas ações emergentes de acidente de trabalho em que os sinistrados sejam representados pelo Ministério Público, um limite à isenção de custas, com referência ao montante anual de 200 UC de rendimentos do trabalhador/sinistrado, não colide com o núcleo essencial do “direito à assistência e justa reparação”, nem com o princípio da igualdade.
13.º
Termos em que deverá proceder o presente recurso».
4. Não foram apresentadas contra-alegações.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
1. A este Tribunal cabe apreciar a «norma do artigo 4.º, n.º 1, alínea h) do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que, nas ações emergentes de acidente de trabalho em que os sinistrados sejam representados pelo Ministério Público, “impõe como limite à isenção de custas ali prevista um rendimento não superior a 200 UC”, por parte do trabalhador sinistrado».
A disposição legal a que se reporta a norma que constitui objeto do presente recurso tem a seguinte redação (entretanto modificada pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro):
«Artigo 4.º
Isenções
1 – Estão isentos de custas:
…………………………………………………………………….
h) Os trabalhadores ou familiares, em matéria de direito do trabalho, quando sejam representados pelo Ministério Público ou pelos serviços jurídicos do sindicato, quando sejam gratuitos para o trabalhador, desde que o respetivo rendimento ilíquido à data da proposição da ação ou incidente ou, quando seja aplicável, à data do despedimento, não seja superior a 200 UC, quando tenham recorrido previamente a uma estrutura de resolução de litígios, salvo no caso previsto no n.º 4 do artigo 437.º do Código do Trabalho e situações análogas.
2. O Tribunal recorrido recusou a aplicação daquela norma, com fundamento em inconstitucionalidade, por violação dos princípios constitucionais da igualdade e da justa reparação dos acidentes de trabalho, consagrados nos artigos 13.º, e 59.º, n.º 1, alínea f) da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Segundo a decisão recorrida, o direito à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho é um direito absolutamente irrenunciável e de exercício necessário, tendo curso oficioso e natureza urgente os processos em que se discute este direito (artigos 1.º, n.º 1, e 34.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro – Regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais, revogado pela Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro – e 117.º, n.º 1, alínea a), e 119.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho). Este regime substantivo e processual decorre do artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da CRP, o qual deve ser objeto de uma valoração que atenda à natureza indisponível do direito em causa, importando interpretar o artigo 4.º, n.º 1, alínea h), do Regulamento das Custas Processuais neste contexto.
3. Com a revisão constitucional de 1997 foi aditado ao n.º 1 do artigo 59.º da CRP o direito de todos os trabalhadores a justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho (alínea f) desta disposição legal). E foi já sublinhado por este Tribunal, que tal direito se reveste de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias (Acórdão n.º 612/2008, disponível em www.tribunalconstitucional.pt. Assim também, na doutrina, Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, anotação ao artigo 59.º, ponto I., e Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, 2010, anotação ao artigo 59.º, ponto XVIII).
A consagração constitucional daquele direito «não só habilita o legislador a adotar políticas legislativas orientadas à proteção dos direitos do trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho (…), como impõe ao Estado a criação de instrumentos que assegurem (…) uma justa remuneração aos trabalhadores em causa» (Jorge Miranda/Rui Medeiros, ob. cit., anotação ao artigo 59.º, ponto XVIII). Ora, não se vê como é que a isenção de custas nas ações emergentes de acidente de trabalho em que os sinistrados sejam representados pelo Ministério Público possa ser tida como instrumento que assegure a justa reparação a estes trabalhadores. Juízo que – diferentemente do que parece resultar da decisão recorrida – não deverá ser feito a partir do direito infraconstitucional, valorando a sua maior ou menor coerência.
Face ao direito anterior, em que a isenção abrangia todos os sinistrados em acidente de trabalho nas causas emergentes do acidente que fossem representados ou patrocinados pelo Ministério Público (alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º do Código das Custas Judiciais, na redação resultante do Decreto-Lei n.º 324/03, de 27 de dezembro), o Tribunal justificou tal generalização da isenção, não por a norma constitucional a impor, mas por invocação de uma outra razão:
«pelo objetivo de obstar a que as pessoas cuja representação ou patrocínio o Ministério Público assume oficiosamente, i.e., sem necessidade de prévia solicitação dos interessados (cfr. artigo 119.º do Código de Processo do Trabalho), venham a ser oneradas em função do resultado de tal atuação, eventualmente ligado à menor proficiência ou a contingências do desempenho da entidade que assume o patrocínio, para que os interessados podem não ter contribuído e, em todo o caso, não dominam. O legislador entendeu prevenir o risco de o sinistrado suportar um encargo de custas em cuja génese está uma atuação de um órgão do Estado cuja quota-parte de responsabilidade na iniciativa ou na condução da atividade processual de que resulta a condenação é dificilmente determinável. Diversamente, se o sinistrado constitui mandatário e age em juízo representado por este, o decaimento na atividade processual subsequentemente desenvolvida é sempre referível a essa escolha, para efeitos da tributação em custas de acordo com os princípios que regem tal condenação (artigo 446.º, n.º 1, do Código de Processo Civil)» (Acórdão n.º 336/2007, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Pelo contrário, conclui-se até neste acórdão, reiterando o entendimento constante do Acórdão n.º 109/2007, que a sujeição a custas não pode considerar-se, só por si, violadora do direito consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da CRP. Não pode «configurar-se a isenção de custas como integrando o conteúdo mínimo ou constitucionalmente necessário do direito social em causa». Dito de outra forma: a norma constitucional não proíbe que os sinistrados paguem custas, em ações emergentes de acidente de trabalho em que sejam representados pelo Ministério Público. Pelo que, a norma que, relativamente àquelas ações, limite a isenção de custas a um rendimento não superior a 200 UC não viola a alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º da CRP, enquadrando-se na liberdade de conformação do legislador. Sobre a liberdade de conformação do legislador pressuposta nesta norma constitucional, lê-se no Acórdão n.º 599/2004 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt) que:
«A norma da alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, prevendo um direito (com a configuração dos direitos económicos, sociais e culturais), não contém uma garantia de um direito a uma prestação por parte do Estado, em todos os casos de acidentes de trabalho ou doença profissional. Aquele está vinculado a prever, por via legislativa, a obrigação de reparação e a assistência, nestes casos, por parte da entidade patronal (ou de outra entidade que se lhe substitua), podendo, mesmo, admitir-se que a introdução de um sistema de garantia estatal do pagamento das referidas indemnizações por acidentes de trabalho resulta, ainda, da satisfação deste dever de proteção.
Mas o âmbito deste sistema de garantia podia ser determinado pelo Estado, em consonância com a avaliação das respetivas possibilidades e das necessidades (…). Isto, em consonância com a subordinação da concretização dos direitos sociais em questão a uma apreciação, de natureza fundamentalmente política, dos meios disponíveis e das necessidades existentes».
4. A decisão recorrida conclui também pela violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP. Com efeito, a norma cuja aplicação foi recusada diferencia os sinistrados representados pelo Ministério Público em ações emergentes de acidentes de trabalho que têm rendimento não superior a 200 UC dos que têm rendimento superior a este montante. Os primeiros, diferentemente dos segundos, estão isentos de custas.
É pacífico o entendimento de que a CRP não consagra um direito de acesso ao direito e aos tribunais gratuito ou tendencialmente gratuito, sendo admissível, por conseguinte, exigir uma contrapartida pela prestação dos serviços de administração da justiça (cf., entre muitos outros, Acórdãos n.ºs 422/2000 e 491/2003, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt. Na doutrina, Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. cit., anotação ao artigo 20.º, ponto VI., e Jorge Miranda/Rui Medeiros, ob. cit., anotação ao artigo 20.º, alínea d) do ponto VI.). A questão está, portanto, em saber se é constitucionalmente admissível, à luz do princípio da igualdade, isentar de tal contrapartida os sinistrados que têm rendimento não superior a 200 UC.
É entendimento reiterado deste Tribunal que o princípio da igualdade «não proíbe ao legislador que faça distinções – proíbe apenas diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, sem uma justificação razoável, segundo critérios objetivos e relevantes» (Acórdão n.º 187/2001, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). Manifestamente tal não sucede relativamente à norma em apreciação. A diferenciação de tratamento em causa tem fundamento material bastante, tem uma justificação razoável segundo critérios objetivos relevantes, uma vez que assenta no rendimento do trabalhador sinistrado – até 200 UC ou superior a este montante.
Diga-se, por último, que embora as custas judiciais sejam a contrapartida pela prestação de serviços de administração da justiça, este serviço público está vinculado à garantia fundamental do acesso aos tribunais, consagrada no artigo 20.º da CRP (neste sentido, Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 467/91, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). E a verdade é que aquela delimitação da incidência subjetiva das custas, em função dos rendimentos, é articulável com os mecanismos de proteção jurídica, permitindo que o sinistrado seja dispensado da taxa de justiça e demais encargos com o processo ou que os pague faseadamente, se estiver em situação de insuficiência de meios económicos (artigos 1.º, n.º 1, e 16.º, n.º 1, alíneas a) e d), da Lei n.º 34/2004, na redação da Lei n.º 47/2007, de 28 de agosto), uma vez que o patrocínio pelo Ministério Público não prejudica o regime do apoio judiciário (artigo 7.º do Código de Processo do Trabalho).
5. Impõe-se, pois, não julgar inconstitucional a norma cuja aplicação foi recusada nos presentes autos – a norma do artigo 4º, n.º 1, alínea h), do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que, nas ações emergentes de acidente de trabalho em que os sinistrados sejam representados pelo Ministério Público, impõe como limite à isenção de custas ali prevista um rendimento não superior a 200 UCs, por parte do trabalhador sinistrado – por violação dos artigos 13.º e 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa.
III. Decisão
Em face do exposto, decide-se conceder provimento ao recurso, determinando-se a reforma da decisão recorrida em conformidade com o decidido quanto à questão de constitucionalidade.
Sem custas.
Lisboa, 4 de julho de 2012.- Maria João Antunes – Carlos Pamplona de Oliveira Gil Galvão – Rui Manuel Moura Ramos.