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Processo nº 445/2000 Conselheiro Messias Bento
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
Recorrente(s): Empreendimentos Imobiliários de OL..., Ldª Recorrido(s): OT...
I. Relatório:
1. A recorrente interpõe o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão da Relação de Lisboa, de 11 de Maio de 2000, para apreciação da constitucionalidade da norma constante do § único do artigo 15º do Decreto nº 37.021, de 21 de Agosto de 1948, aditado pelo Decreto Regulamentar nº 1/86, de 2 de Janeiro, que veda o recurso da decisão final do Tribunal de 1ª Instância proferida em recurso da decisão da comissão de avaliação.
Por se tratar de questão simples, uma vez que o Tribunal a decidira já várias vezes, a última das quais no acórdão nº 202/99, tirado em Plenário, o relator proferiu decisão sumária a negar provimento ao recurso – e, em consequência, a confirmar o julgamento de não inconstitucionalidade contido na decisão recorrida.
Da decisão sumária do relator reclama, agora, a recorrente para a conferência, formulando as seguintes conclusões:
1. Pretende-se com o presente recurso alcançar a declaração de inconstitucionalidade do injuntivo contido no § único do artigo 15º do Decreto nº 37.021, de 21 de Agosto de 1948, aditado e com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto Regulamentar nº 1/86, de 2 de Janeiro, que veda aos tribunais superiores, em via de recurso e em processo com valor superior à alçada do tribunal recorrido, a discussão da admissibilidade legal da realização de avaliação fiscal extraordinária que fixe as rendas a praticar em imóveis.
2. Este comando, da lei ordinária, foi já julgado inconstitucional, pelo Tribunal Constitucional, em 4 (quatro) casos concretos, decisões tomadas pelos Acórdão 124/98/T. Const. de 05 de Fevereiro, publicado na IIª Série do DR, nº
100 de 30.04.1998, págs. 5.840 e ss e no BMJ – 474 págs. 48 e ss e no Acórdão
383/98/T.Const. de 19 de Maio, publicado na IIª Série do Diário da República, nº
276 de 28.11.1998, págs. 16.973 e ss e no BMJ – 477, págs. 66 e ss; Acórdão
695/98/t.Const. e Acórdão 696/98/T.Const., estes últimos ainda por publicar.
3. Em cumprimento com o princípio constitucional contido no nº 3 do artigo 281º da CRP e de acordo com o artigo 82º da LTC, por iniciativa de qualquer dos seus Juízes ou do Ministério Público, nos termos dos artigos 62º e ss da LTC o Tribunal Constitucional deveria ter promovido a organização de processo com vista à fiscalização abstracta sucessiva, e declarar a inconstitucionalidade da norma, com força obrigatória geral. Com o muitíssimo respeito por divergente opinião superior, não o ter feito desvirtuará o conteúdo útil, a ratio e o fim da previsão do nº 3 do artigo 281º, bem como o artigo 282º, ambos da CRP.
4. A norma de que se requereu a declaração de inconstitucionalidade respeita a uma pura questão de natureza jurídica que excede e ultrapassa a apreciação do juízo de discricionariedade técnica a que está limitada a competência da Comissão de Avaliação em processo, de natureza administrativa, quanto à avaliação das rendas a praticar em imóveis.
5. Numa primeira observação poderia avançar-se a hipótese que aquela mera questão de direito poderia ser objecto de uma acção de simples apreciação (nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 4º do Código de Processo Civil (CPC)), onde o acesso aos sucessivos graus de jurisdição dependia exclusivamente do valor da causa, nº 1 do artigo 678º do CPC. No entanto, essa hipotética acção de simples apreciação colidiria com o princípio de economia processual, consagrado na nossa lei processual, o que a inviabilizaria liminarmente.
6. Pelo que a lei não poderá admitir o recurso em toda uma categoria de casos e vir a excluí-lo apenas em relação a um sector dessa categoria, sem que qualquer razão objectiva se verifique para tal discriminação.
7. A Decisão Sumária proferida pelo Mui Ilustre Juiz Conselheiro Relator, que confirmou o juízo do tribunal a quo, ao não declarar a inconstitucionalidade da norma sub judice, viola o princípio constitucional da igualdade, consagrado no nº 1 do artigo 13º da CRP e, por reflexo, o princípio contido no artigo 204º da nossa Constituição. Princípios que determinam a inconstitucionalidade do § único do artigo 15º do Decreto 37.021 supra referido. Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas e com a vénia devida, deverá o presente recurso obter provimento e por via dele: a) ser decidido inconstitucional, também neste processo, o conteúdo do § único do artigo 15º do Decreto 37.021 de 21 de Agosto de 1948, aditado pelo Decreto Regulamentar 1/86 de 2 de Janeiro. b) sugerindo ainda a recorrente que se dê cumprimento ao disposto no artigo 82º, nos termos dos artigos 62º e ss., ambos da LTC, que aplica o normativo constitucional contido no nº 3 do artigo 281º e artigo 282º, ambos da CRP, quanto à repetição de julgados, promovendo a fiscalização abstracta sucessiva da norma sub judice, por forma a obter decisão com força obrigatória geral
(atendendo a que a norma foi já anteriormente declarada inconstitucional em 4
(quatro) casos concretos).
O recorrido não respondeu à reclamação apresentada.
2. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
3. Na decisão sumária escreveu o relator o seguinte: Trata-se de uma questão simples, porque já decidida por este Tribunal. Na verdade, no acórdão nº 270/95 (Diário da República, II série, de 21 de Julho de 1995), o Tribunal concluiu que tal norma não violava o direito de acesso aos tribunais, nem o princípio da igualdade, nem invadia a reserva parlamentar atinente à competência dos tribunais. Posteriormente, nos acórdãos nºs 124/98 e 383/98 (publicados no Diário da República, II série, de 30 de Abril e 28 de Novembro de 1998), o Tribunal julgou tal norma inconstitucional – por violação do princípio da igualdade -, mas tão-só na medida em que ela não permite o acesso aos tribunais superiores em via de recurso, em processo com valor superior à alçada do tribunal recorrido, para discussão de questão atinente à admissibilidade legal da avaliação extraordinária requerida. E esse julgamento de inconstitucionalidade repetiu-o o Tribunal nos acórdãos nºs 695/98 e 696/98 (ambos por publicar). Mais recentemente ainda, no acórdão nº 638/99 (publicado no Diário da República, II série, de 15 de Maio de 1999), o Tribunal voltou à tese da não inconstitucionalidade da norma em causa, concluindo não haver violação do referido princípio da igualdade, mesmo nos casos em que o valor do processo é superior à alçada do tribunal recorrido. Tendo sido interposto recurso para o Plenário do Tribunal daquele acórdão nº
696/98, foi a tese da não inconstitucionalidade que aí fez vencimento. Na verdade, o Tribunal decidiu, no acórdão nº 202/99 (ainda por publicar), não julgar inconstitucional 'a norma constante do § único do artigo 15º do Decreto n.º 37021, de 21 de Agosto de 1948, na redacção do Decreto Regulamentar nº 1/86, de 2 de Janeiro, na parte em que não permite o acesso aos tribunais superiores em via de recurso, em processo com valor superior à alçada do tribunal recorrido, para discussão da questão atinente à admissibilidade legal da avaliação extraordinária'. Na sequência deste acórdão nº 202/99, já o Tribunal tirou o acórdão nº 310/99
(também por publicar), no qual, fazendo aplicação da doutrina fixada em Plenário naquele acórdão nº 202/99, concluiu pela não inconstitucionalidade da norma em causa.
É a jurisprudência firmada no mencionado acórdão nº 202/99 que aqui se reitera, concluindo-se que a norma constante do referido § único do artigo 15º do Decreto nº 37.021, de 21 de Agosto de 1948, aditado pelo Decreto Regulamentar nº 1/86, de 2 de Janeiro, não é inconstitucional. Há, por isso, que negar provimento ao recurso, confirmando-se o juízo de não inconstitucionalidade constante do acórdão recorrido.
4. É este juízo de não inconstitucionalidade, a que se chegou no acórdão nº
202/99, de que se encontra junta cópia nos autos, que aqui há que reiterar. De facto, este Tribunal já sopesou devidamente toda a argumentação desenvolvida a favor de um juízo de inconstitucionalidade, não a considerando, obviamente, procedente.
É certo que, na sequência dos julgamentos de inconstitucionalidade proferidos em três casos concretos, não foi promovida por quem tem legitimidade para o efeito a organização de processo com vista à declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma aqui sub iudicio, embora pudesse tê-lo sido
(cf. artigo 82º da Lei do Tribunal Constitucional). De resto, se, acaso, tivesse sido promovida a organização de um tal processo – o que, contudo, e contrariamente ao que o recorrente sustenta, não era obrigatório que tivesse sucedido -, como tal processo seria julgado pelo mesmo Plenário que tirou o acórdão nº 202/99, a norma em causa continuaria a não ser julgada inconstitucional.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, decide-se:
(a).confirmar a decisão reclamada – e, assim, negar provimento ao recurso, confirmando o julgamento de não inconstitucionalidade que no acórdão recorrido se contém.
(b). condenar a recorrente nas custas, com quinze unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 11 de Outubro de 2000 Messias Bento José de Sousa e Brito Luís Nunes de Almeida