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Proc. nº 455/99 TC – Plenário Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
1 – O Provedor de Justiça requer ao Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 281º nº. 2 alínea d) da Constituição da República Portuguesa
(CRP), a fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade das normas contidas nos artigos 13º nº. 3 e 14º nº. 2 do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (EPARAA), na redacção constante da Lei nº. 39/80, de 5 de Agosto e na numeração da Lei nº. 61/98, de 27 de Agosto.
O pedido é fundamentado nos seguintes termos:
'1º - O art. 13º, nº. 3, do EPARAA prevê a existência de dois círculos adicionais para a eleição da Assembleia Legislativa Regional, um correspondendo aos 'açorianos' residentes noutras parcelas do território português e outro aos residentes no estrangeiro, cada um elegendo um deputado.
2º - O art. 14º, nº. 2, por sua vez, define que são eleitores naqueles círculos, ou seja, são 'açorianos' os cidadãos portugueses residentes na área em causa e que tenham nascido no território da região autónoma.
3º - Faz-se assim participar na identificação do âmbito subjectivo de uma pessoa colectiva de população e território não o critério da residência mas sim o da naturalidade, com a criação de um arremedo de dupla cidadania.
4º - Normas idênticas constavam da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores (decreto-lei 267/80, de 8 de Agosto), tendo sido declaradas inconstitucionais pela resolução do Conselho da Revolução nº. 68/82
(DR, I, 1982.04.22), com suporte em parecer no mesmo sentido da Comissão Constitucional (Parecer 11/82, publicado nos Pareceres da Comissão Constitucional, 19º volume, pg. 57 e segs.).
5º - Contudo, pelo princípio do pedido, não é possível estender a eficácia dessa declaração de inconstitucionalidade às normas constantes do EPARAA, apesar de ser evidente que a mesma ratio decidendi é aplicável em ambas as situações.
6º - Norma de idêntico alcance, em decreto que aprovava o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, foi já objecto de uma pronúncia no sentido da inconstitucionalidade por esse Tribunal Constitucional, através do acórdão nº. 1/91 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 18º volume, pg. 7 e segs.), tirado em fiscalização preventiva, considerando violados os arts. 4º, 6º e 227º, nº. 1 e 3, (hoje o 225º), da Constituição, com argumentação que se acompanha e que aqui se tem como reproduzida.
7º - Além das normas constitucionais que o citado acórdão considera como violadas, julga-se ainda estar a ser infringido o princípio da igualdade, visto se estar perante a atribuição de direitos políticos em função do local de nascimento, sem que haja norma constitucional que tal permita.
8º - No mesmo sentido aponta o Parecer da Comissão Constitucional acima citado (cfr. Pareceres da Comissão Constitucional, 19º volume, pgs.
75-76), que mereceu a concordância do Conselho da Revolução.
9º - É certo que as normas em causa nunca foram aplicadas, mercê da declaração de inconstitucionalidade das disposições do decreto-lei 267/80, de 8 de Agosto, a que se fez referência, o que no entanto em nada afecta o seu desvalor constitucional nem a possibilidade de serem sindicadas por esse Tribunal em sede de fiscalização abstracta sucessiva de constitucionalidade, importando expurgá-las do EPARAA.
Nestes termos, requeiro ao Tribunal Constitucional a declaração da inconstitucionalidade com força obrigatória geral, de acordo com o art. 281º, 2, d) e para os efeitos do art. 282º da Constituição, das normas contidas nos artigos 13º, nº. 3, e 14º, nº. 2, do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (EPARAA), na redacção constante da Lei 39/80, de 5 de Agosto, e na numeração da Lei 61/98, de 27 de Agosto, por violação do princípio da igualdade e das normas dos artigos 4º, 6º e 225º, nº. 3, da Constituição.'
Notificado o Presidente da Assembleia da República, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 54º e 55º nº. 3 da Lei do Tribunal Constitucional, ofereceu o merecimento dos autos.
2 - Dispõem as normas em causa:
'Art. 13º
1-
..........................................................................................................
2-
.........................................................................................................
3 – Haverá ainda mais dois círculos, um compreendendo os açorianos residentes noutras parcelas do território português e outro os açorianos residentes no estrangeiro, cada um dos quais elegerá um Deputado.
Art. 14º
1-...........................................................................................................
2 – São eleitores nos círculos referidos no nº. 3 do artigo anterior os cidadãos portugueses residentes na área desses círculos e que tenham nascido no território da Região.'
Estas normas correspondem, sem alteração de redacção, às que constavam, respectivamente, dos artigos 11º nº. 3 e 12º nº. 2 da Lei nº. 39/80, de 5 de Agosto, mantidas com a mesma redacção e numeração na 1ª Revisão do Estatuto (Lei nº. 9/87, de 26 de Março).
Como diz o requerente, normas substancialmente idênticas constavam também dos artigos 3º nº. 2 e 12º nº. 3 do DL nº. 267/80, de 8 de Agosto (Lei Eleitoral da ALR dos Açores).
Cabe ainda referir que igual normação constava, ainda, dos artigos
17º nº. 4 e 18º alínea b) do Decreto nº. 322/I de 27 de Junho de 1980 (Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira) e dos artigos 10º nº. 4 e
11º nº. 2 do Decreto nº. 293/V (Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira), ambos da Assembleia da República.
A convocação destas normas de diferentes diplomas justifica-se, no caso, pelo facto de sobre elas terem já incidido três juízos de inconstitucionalidade, os dois primeiros da Comissão Constitucional sobre as normas dos artigos 17º nº. 4 e 18º alínea b) do Decreto nº. 322/I da Assembleia da República (Parecer nº. 26/80 in 'Pareceres da Comissão Constitucional', 13º vol., pp. 184 e segs. que deu lugar à Resolução do Conselho da Revolução nº.
293/80) e sobre os artigos 3º nº. 2 e 12º nº. 3 do DL nº. 267/80 (Parecer nº.
11/82 in 'Pareceres da Comissão Constitucional', 19º vol., p. 57 e segs. que deu lugar à Resolução do Conselho da Revolução nº. 68/82) e o último do Tribunal Constitucional, em fiscalização preventiva, sobre os artigos 10º nº. 4 e 11º nº.
2 do Decreto nº. 293/V da Assembleia da República.
Estas normas criavam, para a eleição das assembleias legislativas regionais dos Açores ou da Madeira, círculos eleitorais fora do território da região, onde eram eleitores os cidadãos portugueses residentes na área desses círculos e naturais da região (dois círculos eleitorais, um para os residentes no território nacional e outro para residentes no estrangeiro, salvo no caso do Decreto nº. 293/V em que se previa um único círculo para todos os residentes fora da região).
Em qualquer dos casos a Comissão Constitucional e o Tribunal Constitucional proferiram juízos de inconstitucionalidade: no Parecer nº. 26/80, por violação do princípio da unidade da cidadania consagrado no artigo 4º da Constituição e 'segundo certa perspectiva' por infracção ao princípio da unicidade do recenseamento (artigo 116º nº. 2 da CRP, versão original), no Parecer nº. 11/82, por violação dos princípios da soberania popular, da unidade da soberania e da igualdade e, no Acórdão nº. 1/91, por violação dos artigos 4º
(unicidade da cidadania), 6º (forma unitária do Estado) e 227º nºs. 1 e 3
(incidência territorial da autonomia, limitação da autonomia pela integridade da soberania do Estado) da CRP, versão de 89.
3 - As normas agora em causa, idênticas às que constavam do Decreto-Lei nº. 267/80 e apesar do juízo de inconstitucionalidade formulado no Parecer nº. 11/82, ínsito na Resolução nº. 68/82 do Conselho da Revolução que declarou com força obrigatória geral tais normas, provindo já da Lei nº. 39/80, de 5 de Agosto (EPARAA) – anterior, portanto, ao Decreto-Lei nº. 267/80 – mantiveram-se incólumes na 1ª revisão do Estatuto (Lei nº. 9/87, de 26 de Março).
Já então, aquando da discussão parlamentar sobre o Estatuto, alguns deputados formularam reservas quanto à possibilidade da matéria eleitoral constar dos estatutos das regiões autónomas e 'quanto ao que poderá ser considerado como uma criação de uma nova nacionalidade, ou melhor de uma sub-nacionalidade de cidadãos residentes no território continental ou no estrangeiro' (Deputado Luís Catarino do MDP/CDE (DAR/I nº. 70 de 26/6/80, p.
3362).
Mas as reservas não encontraram eco na maioria dos parlamentares e foram rejeitadas propostas de eliminação das normas e mesmo de substituição por outra que limitava os círculos eleitorais fora do território da região aos residentes no estrangeiro (propostas do PCP e do PS, respectivamente).
Não obstante a evidência dada à matéria na intervenção do Deputado Mota Amaral, aquando da discussão parlamentar da Proposta de lei nº. 163/VII, que dá lugar à Lei nº. 61/98, onde se inseriam as normas em apreciação ('Quanto
à manutenção dos círculos de não-residentes coberta pela mesma força soberana, a opção do parlamento açoriano merece o meu entusiástico apoio. Quando a Constituição passou a reconhecer já um grau superior de cidadania dos portugueses emigrantes, admitindo-os à eleição do Presidente da República, impõe-se manter a reivindicação açoriana para a participação dos não-residentes nas eleições para a assembleia legislativa regional' – DAR/I nº. 53 de 27/3/98, p. 1810), nenhuma proposta de alteração ou de substituição dessas normas veio agora a ser apresentada.
A verdade, porém, é que o Tribunal Constitucional não vê razões para abandonar a tese subjacente ao juízo de inconstitucionalidade que, em parte na linha do Parecer nº. 11/82 da Comissão Constitucional sobre as normas similares dos artigos 3º nº. 2 e 12º nº. 3 e 13º nº. 2 do DL nº. 267/80, formulou no citado Acórdão nº. 1/91, não tendo, entretanto, ocorrido qualquer alteração constitucional que substancialmente legitime uma mudança de orientação.
4 - A questão de inconstitucionalidade material que o requerente suscita visa, fundamentalmente, a atribuição de capacidade eleitoral activa aos cidadãos residentes fora do território da região mas naturais do arquipélago dos Açores, nas eleições para a respectiva Assembleia Legislativa Regional.
É no artigo 14º nº. 2 do EPARAA que a norma se contém, traduzindo a norma do artigo 13º nº. 3 do mesmo diploma num mero instrumento para a exercitação da referida capacidade eleitoral activa.
O juízo de constitucionalidade incidirá pois sobre aquela primeira norma com necessária projecção na segunda.
5 - Do artigo 225º da CRP (anteriormente, artigo 227º) resulta que o regime político-administrativo dos Açores e da Madeira (a sua autonomia) se funda em razões específicas atinentes à realidade económica, social e cultural do respectivo território e visa, em primeira linha, a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses da região.
Aquelas razões e estes fins surgem, assim, intimamente conexionados com o espaço territorial da região e a população que aí reside.
São os interesses próprios da comunidade regional, constitucionalmente reconhecidos, que fazem elevar a região ao estatuto de autonomia político-administrativa.
Se dúvidas houvesse sobre a correcta caracterização das regiões, elas estão hoje resolvidas pelo disposto no artigo 227º nº. 1 da CRP que as qualifica de 'pessoas colectivas territoriais' (anteriormente, o correspondente artigo 229º nº. 1 qualificava-os apenas como 'pessoas colectivas de direito público').
O limite dos poderes dos órgãos próprios regionais define-se, pois, pelo território, constituindo o substracto humano da pessoa colectiva os cidadãos, naturais ou não da região, que residam nesse território (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, 'Constituição da República Portuguesa Anotada', 3ª ed., nota IV ao artigo 227º, p. 845).
Desde logo e por isto não se conforma à natureza de pessoa colectiva territorial a eleição de deputados à Assembleia Legislativa Regional por naturais da região residentes fora do território.
6 – O princípio da unidade do Estado é afirmado no artigo 6º nº. 1 da CRP.
Este princípio nos termos do mesmo preceito coexiste na sua organização e funcionamento com o regime autonómico insular que o Estado deve respeitar.
Por outro lado, o artigo 225º nº. 3 estabelece que a autonomia político-administrativa regional não afecta a integridade da soberania do Estado; a autonomia é exercida no 'quadro da Constituição'.
Isto significa, tal como se afirma no Acórdão nº. 1/91 que 'a Constituição garante a descentralização política das regiões, mas proíbe qualquer forma de pluralismo estadual, de autonomia constitucional'.
Ora, ao atribuir capacidade eleitoral activa a naturais dos Açores mas residentes fora do território da Região, a norma do artigo 14º nº. 2 do EPARAA, confere direitos políticos de 'cidadania' a um conjunto de cidadãos em razão do seu nascimento em determinado território.
É o que faz o Acórdão nº. 1/91 dizer, então reportado a norma idêntica do supra citado Decreto nº. 293/V, que 'as normas em apreço supõem a existência de novas categorias jurídico-políticas, como as de 'povo madeirense' ou 'cidadão madeirense' [aqui 'povo açoriano' ou 'cidadão açoriano'], dando lugar à atribuição de direitos políticos a um determinado conjunto de cidadãos em razão do seu nascimento na Região da Madeira [aqui 'Região dos Açores']. Assumem o entendimento de uma comunidade normal 'fragmentada', de todo incompatível com a estrutura constitucional do Estado, operam em sentido contrário ao que Rudolf Smend chama 'efeito de integração'.
Citando Jorge Miranda ('O Direito Eleitoral na Constituição' in
'Estudos sobre a Constituição', 2º vol., p. 484): 'admitir o voto de cidadãos não residentes equivaleria a criar uma qualidade pessoal, uma espécie de subcidadania regional, incompatível com a unicidade da cidadania portuguesa
(artigo 4º) e com a unidade do Estado'.
Acrescente-se que não pode justificar-se qualquer analogia com o que, a partir da revisão constitucional de 97, se passa com a atribuição de capacidade eleitoral activa, nas eleições para Presidente da República, aos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro (artigo 121º nº. 1).
Para além de constar do texto constitucional, não há aqui nem
'alargamento' nem 'fragmentação' do conceito de cidadania – o Presidente da República é um órgão de soberania do Estado que representa todos os cidadãos, não em função da sua residência em território português mas da sua nacionalidade, sendo ainda de salientar que, mesmo neste caso, a Constituição manda atender, na regulamentação do exercício de direito de voto, à 'existência de laços de efectiva ligação à comunidade nacional'.
Também no Parecer nº. 11/82 se defendeu e agora se reitera:
'Alargou-se a população dos Açores, juridicamente definível em função da residência no território que lhe concerne e criou-se artificialmente um outro vínculo - idêntico ao que vincula os cidadãos ao Estado – e através dele captaram-se para a região portugueses dali naturais, mas nela não residentes.'
Assim violado o princípio constitucional da unicidade da cidadania, reflexamente se põe também em causa o princípio da unidade do Estado, afectando a situação jurídica de um dos seus elementos estruturais – a população.
Na verdade, e voltando a citar o Parecer nº. 11/82 da Comissão Constitucional, a 'criação de um vínculo de cidadania regional, em tudo semelhante ao vínculo da cidadania estadual, como que duplicou o posicionamento político de certos cidadãos portugueses dentro do Estado, solicitados então, quase que com a mesma intensidade, por dois pólos diferentes de poder', cidadania essa que 'não só se sobrepõe ao vínculo que já ligava os açorianos não residentes na região ao Estado, como ainda, pela sua simples presença, delimita este último nexo jurídico'.
Mostram-se, pois, violados pela norma do artigo 14º nº. 2 da Lei nº.
39/80, com a numeração dada pela Lei nº. 61/98, - e, consequentemente, pela norma do artigo 13º nº. 3 da mesma Lei – os princípios da unicidade da cidadania e da unidade do Estado, tendo em conta a incidência territorial da autonomia e a limitação desta pela integridade da soberania do Estado (artigos 4º, 6º e 225º da CRP).
Resta acrescentar que nos termos em que se formula o juízo de inconstitucionalidade se 'absorve' um outro, com o mesmo sinal, relativo à criação de uma situação de desigualdade entre os cidadãos portugueses em razão do território de origem.
7 - O juízo que se acaba de formular, aliado ao facto de o requerente não suscitar outros fundamentos de inconstitucionalidade, dispensa o Tribunal de ponderar a questão da inconstitucionalidade formal das normas por excesso ou desvio de forma.
Poderia, na verdade, colocar-se a questão – já equacionada no Acórdão nº. 1/91 – relativa à constitucionalidade formal das normas em causa, enquanto inseridas em lei estatutária da Região Autónoma dos Açores.
Com efeito, tratando-se de regime eleitoral regional e integrando-se na reserva absoluta de competência da Assembleia da República legislar sobre eleições dos deputados às Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira (artigo 164º alínea j) da CRP), poderia objectar-se à inclusão de tais normas em lei estatutária com o regime de iniciativa procedimental, aprovação e alteração a que esta está sujeita (artigo 226º da CRP) conferindo-lhe um valor formal agravado.
Afirmando-se no Acórdão nº. 1/91 a 'natureza marcadamente organizatória' dos estatutos e uma 'vertente organizatória' das normas sobre eleições regionais 'que afirma a sua conexão funcional com a matéria do Estatuto', ele não responde – e nem era necessário no caso, - à questão de saber qual a força jurídica e o regime de aprovação e alteração dessas normas, muito embora se deixe apontado que a inclusão das mesmas normas nos estatutos 'não implica necessariamente uma identidade de força jurídica e de regime de aprovação e alteração'.
A questão merecia, e merece ainda, respostas de sinal divergente
(Jorge Miranda 'Funções, órgãos e actos do Estado' pp. 301 e segs., 'Manual de Direito Constitucional', tomo V, pp. 364 e segs.; Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., 3ª edição, nota V ao artigo 228º; Rui Medeiros 'Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, anotado', pp. 19 e 20; desenvolvidamente Carlos Blanco de Morais 'As Leis Reforçadas...' pp. 919 e segs.), sendo maioritária a tese de que a matéria eleitoral não é matéria de estatuto regional, mas dividindo-se quanto ao (des)valor de norma de estatuto que a inclua e aos efeitos desse (des)valor relativamente a posterior lei ordinária comum que a revogue.
Não se encerra esta nota final sem dar conta de que, posteriormente ao Acórdão nº. 1/91, já a nova 1ª Secção deste Tribunal, de algum modo na esteira das posições mais recentes de Jorge Miranda (cit. 'Manual...', tomo V, pág. 367), se pronunciou – aqui sem qualquer ambiguidade – no sentido de que a norma 'em excedência de Estatuto' (que o legislador teria qualificado erradamente como norma estatutária) com valor ou força formalmente superior ao de norma incluída em apropriado acto legislativo comum, carece de valor formal agravado, não vinculando assim, o legislador sucessivo competente, que não incorrerá em ilegalidade se dispuser em contrário (Acórdão nº. 460/99 de
13/7/99, ainda inédito).
De todo o modo e tendo até em conta o que sobre a forma dos actos se estabelece no artigo 166º nº. 2 da CRP relativamente às leis eleitorais para as assembleias legislativas regionais, esta é uma questão que se deixa aqui inteiramente em aberto.
8 – Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, o Tribunal decide declarar, a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas dos artigos 13º nº. 3 e 14º nº. 2 do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, na redacção da Lei nº. 39/80, de 5 de Agosto e na numeração da Lei nº.
61/98, de 27 de Agosto, por violação dos princípios da unicidade da cidadania portuguesa e da unidade do Estado (artigos 4º, 6º e 225º da Constituição da República Portuguesa).
Lisboa, 17 de Novembro de 1999 Artur Maurício Messias Bento Guilherme da Fonseca Vítor Nunes de Almeida Paulo Mota Pinto Alberto Tavares da Costa Maria Fernanda Palma Bravo Serra Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Luís Nunes de Almeida Maria Helena Brito José Manuel Cardoso da Costa