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Processo nº 238/99 ACÓRDÃO Nº 665/99
3ª Secção Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Inconformada com a decisão sumária de fls. 556, na qual foi decidido não conhecer do objecto do recurso, C... – SOCIEDADE DE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS, SA, veio reclamar para a conferência, 'nos termos do disposto no art. 78º-A, nº
3, da lei do Tribunal Constitucional'. O objecto do recurso interposto consistia no pedido de julgamento da
' – inconstitucionalidade da norma do artigo 421º, nº 1, do Código Civil, na redacção anterior à que lhe foi introduzida pelo DL nº 379/86, de 11/11 (...) interpretada com o sentido que lhe foi atribuído pelo Supremo Tribunal de Justiça, no presente caso concreto, isto é, por forma a excluir da sua previsão
‘o pacto de preferência com eficácia real alargada a subadquirentes referido em
4. (nas palavras e na estrutura do acórdão do STJ)’, e a fazer caber nessa mesma previsão um direito de preferência cuja eficácia real apenas pode ser exercida
‘com referência à venda referida em 12 (nas palavras e estrutura do douto acórdão recorrido)’ e não a vendas posteriores, como aquelas que estão em causa nos presentes autos, apesar de estas terem sido realizadas estando o direito de preferência definitivamente registado, e de terem os demandados ‘subadquirentes’ adquirido o imóvel com o registo do direito de preferência em vigor';
– e da norma do 'artigo 286º do C. Civil' interpretada 'por forma a permitir a declaração, pelo Supremo Tribunal de Justiça, da nulidade da cláusula de um pacto de preferência, com eficácia real – que prevê a eficácia ‘erga omnes’ do direito de preferência convencionado, isto é, que o direito abrange toda e qualquer alienação futura do imóvel a que o mesmo direito é inerente –, depois de, quer a 1ª instância, quer a Relação, haverem julgado procedente e provado o pedido de declaração da existência do aludido direito de preferência, e declarado a referida eficácia ‘erga omnes’, bem como a inerência do direito ao imóvel em causa, nessa conformidade condenando os réus no pedido (...). (...) tendo, ainda, o mesmo Supremo, julgado existir uma nulidade que, segundo a interpretação acolhida pelas instâncias, foi por estas, tacitamente, decido não existir'.
(...) Assim, o Supremo Tribunal de Justiça interpretou o artigo 286º do C. Civil por forma a abranger ‘nulidades’ incompatíveis com os próprios fundamentos do julgamento das instâncias, sendo essa a interpretação normativa cuja inconstitucionalidade a recorrente pretende suscitar'. Quanto à 'alegada inconstitucionalidade da norma contida no nº 1 do artigo 421º do Código Civil', a decisão afastou a possibilidade do seu conhecimento por não ter sido 'invocada durante o processo', como se exige na al. b) do nº 1 do artigo 70º e no nº 2 do artigo 72º da lei nº 28/82; no que toca à 'norma contida no artigo 286º do Código Civil', interpretada 'no sentido de que abrangia nulidades incompatíveis com os próprios fundamentos do julgamento das instâncias', foi recusado o conhecimento porque o Supremo Tribunal de Justiça não a aplicou com esse sentido. No requerimento de reclamação para a conferência, a reclamante abandona a questão da eventual inconstitucionalidade da norma contida no artigo 286º do Código Civil; sustenta, todavia, que a primeira questão deveria ser julgada, por ter sido adoptada pelo Supremo Tribunal de Justiça uma interpretação de tal forma inesperada que não lhe era exigível ter invocado a inconstitucionalidade em momento anterior àquele em que a suscitou (no requerimento em que arguiu a nulidade do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça). Notificados para o efeito, os recorridos vieram pronunciar-se no sentido da manutenção da decisão reclamada.
2. Não tem, porém, razão a reclamante. Com efeito, o Supremo Tribunal de Justiça, para conceder provimento ao recurso de revista e absolver os réus do pedido, fundamentou-se, essencialmente, na ideia de que o nº 1 do artigo 421º do Código Civil não podia ser interpretado no sentido de permitir que um pacto de preferência, ainda que com eficácia real, pudesse vincular os réus, subadquirentes do prédio a que o pacto respeita, porque essa interpretação implicaria a validade de uma oneração real ao direito de propriedade não permitida por lei. Ora essa interpretação esteve sempre presente ao longo da discussão no processo; interpretando diferentemente a mesma norma, as instâncias aceitaram a validade da preferência convencionada nos termos pretendidos pela reclamante; esta, por sua vez, como se pode ver, por exemplo, das contra-alegações apresentadas no recurso de revista, nomeadamente nos pontos citados na decisão reclamada, para sustentar a procedência da acção que instaurara rebateu por diversas vezes a tese, defendida pelos réus, de que a preferência os não abrangia, enquanto subadquirentes. Acrescente-se, apenas, que não é exacto que a interpretação perfilhada pelos réus contrarie a que o Supremo Tribunal de Justiça atribuiu ao nº 1 do artigo
421º, como diz a reclamante. Na verdade, ao afirmar que 'o pacto de preferência com eficácia real alargada a subadquirentes referido em 4. viola norma imperativa', e que tal direito de preferência apenas poderia ter sido exercido
'com referência à venda referida em 12.' – ou seja, a que fizera a sucessora mortis causa do proprietário que convencionara a preferência – o Supremo Tribunal de Justiça está, justamente, a distinguir os sucessores mortis causa dos subadquirentes por outra via para o efeito da eficácia do pacto de preferência. Não se verifica, pois, qualquer motivo que leve a considerar a reclamante dispensada do ónus de ter invocado a inconstitucionalidade que pretende que este Tribunal julgue 'durante o processo', como se decidiu na decisão reclamada. Assim, julga-se improcedente a reclamação e confirma-se a decisão de não conhecimento do recurso. Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 ucs. Lisboa, 9 de Dezembro de 1999 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida