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Proc. nº 417/99
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que figura como recorrente A... e como recorridos o Ministério Público e AS.., foi proferida decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso, em virtude de a norma impugnada não integrar a ratio decidendi de um dos fundamentos alternativos da decisão recorrida.
A... reclamou para a Conferência da decisão sumária, ao abrigo do artigo 78º-A, nº 3, da Lei do Tribunal Constitucional, sustentando que o artigo
78º-A da Lei do Tribunal Constitucional 'não elenca a inutilidade da decisão do Tribunal Constitucional (...) como fundamento do não conhecimento do objecto do recurso', não podendo este Tribunal pronunciar-se, 'depois de admitido o recurso, sobre se o mesmo pode produzir efeitos na decisão recorrida'. O recorrente considera, por outro lado, que não existe 'prioridade' entre os fundamentos da decisão recorrida, tendo, antes, sido determinante para a formação da decisão impugnada a norma do artigo 328º, nº 6, do Código de Processo Penal, uma vez que se referiu então que 'tendo, anteriormente, o Acórdão do mesmo Tribunal de 12 de Fevereiro de 1998 decidido apenas que se anulasse o acórdão da 1ª Instância (...) já se estava a interpretar o mencionado artigo 328º, nº 6, como só tendo aplicação à continuidade da audiência', pelo que 'não contou - na fundamentação da decisão - essencialmente a questão da arguição de nulidade aquando da leitura do acórdão do Tribunal do Círculo de Paredes, mas a prévia decisão' que ao anular o 1º acórdão daquele Tribunal já estava a interpretar o artigo 328º, nº 6, do C.P.P.. O recorrente refere, ainda, não ser pacífico o entendimento expresso pelo Supremo Tribunal de Justiça relativo à questão da arguição de nulidade, invocando arestos dos Tribunais das Relações do Porto e Évora, afirmando, noutra linha argumentativa, que caberia ao Supremo Tribunal de Justiça decidir 'sobre o que fazer' depois do julgamento da questão de constitucionalidade, sendo 'prematuro' apreciar agora a utilidade do recurso, tanto mais que o tribunal recorrido proferiu uma decisão de admissão. Consequentemente, requereu o deferimento da reclamação.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da improcedência da reclamação.
Por seu turno, AS... pronunciou-se, igualmente, pela improcedência da reclamação.
2. O artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional não elenca os casos de não conhecimento do objecto do recurso, uma vez que não contém qualquer norma taxativa. Nessa medida, todos os fundamentos de não conhecimento do objecto do recurso são naturalmente abrangidos, entre os quais, e no que respeita ao recurso de constitucionalidade, se encontra a inutilidade do recurso, em virtude de a norma impugnada não constituir a ratio decidendi da decisão recorrida (cf., entre muitos, o Acórdão nº 155/95, de 15 de Março - D.R., II Série, de 20 de Junho de 1995).
Por outro lado, se é verdade que, nos termos do artigo 76º, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional, cabe ao tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão do respectivo recurso, também é certo que a decisão que admite o recurso não vincula o Tribunal Constitucional (nº 3 do mesmo preceito). Assim, o Tribunal Constitucional tem competência para decidir sobre a admissibilidade do recurso (e, portanto, sobre a sua utilidade), não obstante o mesmo ter sido admitido pelo tribunal a quo.
3. O reclamante afirma que o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça se funda na prévia decisão que anulou o primeiro acórdão do tribunal de 1ª instância interpretando já o artigo 328º, nº 6, do Código de Processo Penal.
Ora, o reclamante pretende, no presente processo, a repetição da prova, invocando, para tanto, a aplicação do disposto no artigo 328º, nº 6, do Código de Processo Penal. O Supremo Tribunal de Justiça entendeu, porém, que o arguido tinha de arguir a nulidade decorrente da omissão da repetição da prova antes de o acto de leitura da decisão da 1ª instância ter terminado. Uma vez que tal arguição não se verificou, considerou a nulidade sanada.
Não compete ao Tribunal Constitucional apreciar a bondade de tal solução (pelo que a invocação de arestos discordantes é irrelevante). Apenas se retira desta fundamentação que, no contexto da decisão recorrida, um eventual juízo de inconstitucionalidade sobre a norma questionada (norma que não impõe a produção da prova no caso dos autos) sempre teria a sua eficácia in casu prejudicada pela sanação da nulidade decorrente da omissão da repetição da prova. Uma vez que o reclamante não questionou as normas subjacentes a este
último fundamento, aquele juízo de inconstitucionalidade seria, portanto, inútil, como se referiu, aliás, na decisão sumária reclamada.
O reclamante procura, contudo, atribuir um carácter essencial à parte da fundamentação que se refere à aplicação, pelo anterior acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, da norma impugnada. No entanto, e este é o aspecto decisivo, tal circunstância em nada colide com o que se deixou dito acerca da inutilidade do juízo de inconstitucionalidade sobre a norma questionada, uma vez que, como se demonstrou, subjazem às fundamentações em apreço normas diferentes, as quais justificam autonomamente a decisão recorrida.
Conclui-se, assim, pela improcedência da presente reclamação.
4. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando, consequentemente, a decisão sumária de fls.
744 e ss..
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs. Lisboa, 10 de Novembro de 1999 Maria Fernanda Palma Bravo Serra Luís Nunes de Almeida