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Processo n.º 421/12
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Fernando Ventura
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, em que é reclamante A., por Acórdão deste Tribunal nº 489/12, proferido em 24 de outubro de 2012, foi decidido indeferir a reclamação apresentada por aquele do despacho de 26 de abril de 2012, proferido pelo Juiz Conselheiro Relator, no Supremo Tribunal de Justiça, que não lhe admitiu o recurso que interpôs para o Tribunal Constitucional.
2. Veio o reclamante arguir a nulidade desse acórdão, nos seguintes termos:
«(…)
DA NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA
1º
Nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC ex vi artigo 69.º da LOFPTC é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
2º.
Com efeito, sempre que o juiz se deixe de pronunciar sobre questões que devesse apreciar profere uma decisão (singular ou colectiva) ferida de nulidade por omissão de pronúncia.
3º.
A nulidade que ora nos ocupa é, de resto, corolário da primeira parte do n.º 2 do artigo 660.º do CPC ex vi artigo 69.º da LOFPTC que estabelece o seguinte: o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Descendo ao caso concreto,
4º.
No âmbito dos Autos de Reclamação n.º 421/12, o Tribunal Constitucional pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação deduzida, confirmando, assim, a decisão de não admissão do recurso para aquele colendo Tribunal.
5º.
E fê-lo no seu acórdão n.º 489/2012, de 24.10.2012.
6º.
Sucede, porém, que o referido acórdão padece da nulidade prevista no artigo 668.º, n.º 1, al. d), primeira parte do CPC ex vi artigo 69.º da LOFPTC, na medida em que se verifica uma omissão de pronúncia sobre questões que o Tribunal deveria conhecer.
Senão, vejamos,
7º.
No aresto referido supra é possível ler-se o seguinte:
“2. Em resposta, o Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação, com o seguinte remate:
(...)
3. Notificado da resposta, o reclamante nada disse”.
8º.
Contudo, a constatação do Tribunal, no transcrito ponto 3, não corresponde à verdade.
Com efeito,
9º
O reclamante foi notificado, a 27.06.2012, da resposta do representante do Ministério Público, junto do Tribunal Constitucional e, bem assim, do prazo de 10 dias de que dispunha para, querendo, responder.
10º.
No dia 05.07.2012, foi expedida, por correio registado com aviso de recepção, a resposta do reclamante ao douto parecer do Ministério Público (cfr. Documentos nºs 1 e 2 que ora se juntam e se dão por reproduzido).
11º.
Que, de resto, deu entrada no Tribunal Constitucional, no dia seguinte (06.07.2012) (cfr. Documento n.º 3 que ora se junta e dá por reproduzido).
12º.
Ora, conforme acaba de se comprovar, o reclamante respondeu à pronúncia do Ministério Público.
13º.
Resposta essa que, não só não foi considerada, nem apreciada, como foi tida por inexistente juntamente com as questões nessa sede arguidas.
14º.
Facto que determina a nulidade do acórdão n.0 489/2012 do Tribunal Constitucional por omissão de pronúncia, na exacta medida em que não se pronunciou sobre questões que deveria conhecer, violando o sobredito artigo 660.º do CPC ex vi art. 69 da LOFPTC.
15º.
Nulidade essa que se invoca para todos os efeitos legais.
16º.
Nestes termos,
E nos melhores de direito que V. Excelências mui doutamente suprirão, se requer a Vossas Excelências que julguem procedente, por provada, a nulidade arguida, a qual deverá ser sanada com as devidas consequências legais».
3. O Ministério Público pronunciou-se pelo indeferimento da nulidade arguida, entendendo que toda a argumentação do requerente foi tomada em conta e que se verifica, tão só, um lapsus calami, na prolação do Acórdão nº 489/12, a retificar nos termos do artigo 667º, nº1 do Código de Processo Civil.
4. Por seu turno, a assistente e demandante civil B., notificada do requerimento de arguição de nulidade, veio prescindir do prazo para se pronunciar.
Cumpre decidir
II Fundamentação
5. A pretensão em apreço, de ver declarada a nulidade do acórdão nº 489/12, alicerça-se na circunstância de no relatório desse aresto se ter indicado que “notificado da resposta [do Ministério Público], o reclamante nada disse”. E, na verdade, por lapsus calami, essa narrativa não corresponde à realidade processual: o reclamante respondeu, efetivamente, por articulado entrado a 6 de junho de 2012 e junto a fls. 62 a 74.
Esgota-se, porém, aí a razão que assiste ao reclamante.
6. Na verdade, nesse articulado, o reclamante retoma inteiramente, apenas com outra arrumação e acréscimo de referências doutrinais, o que já sustentara nos pontos II, intitulado “Do pressuposto da aplicação das normas reputadas inconstitucionais na interpretação que lhe foi dada pelo Tribunal A Quo”; III, intitulado “Da inexistência do ónus da invocação da inconstitucionalidade durante o processo”; e IV, com o título “Da imprevisibilidade da interpretação normativa pelo STJ”, da reclamação. Basta cotejar os artigos 46º a 48º da reclamação com os artigos conclusivos do articulado de resposta (cfr. artigos 42º a 44º), para assentar na completa identidade argumentativa entre as duas peças processuais. Aliás, em consonância, o articulado de resposta termina pela procedência da reclamação, “mantendo-se tudo quanto já foi invocado”.
7. Por outro lado, e como avulta da sua natureza de resposta, o articulado em que o reclamante procura fundar a arguição de nulidade não suscita qualquer questão nova. Como salienta Alberto dos Reis (Código de Processo Civil anotado, vol. V, pág. 143), importa não confundir as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do Tribunal com os argumentos ou os pressupostos em que se funda a sua posição na questão. A questão reside, na lide em apreço, na ocorrência de decisão-surpresa, de todo imprevisível e inesperada, em termos de não ser exigível ao recorrente que suscitasse a inconstitucionalidade perante o Tribunal a quo, pelo que apenas se poderia configurar o vício de omissão de pronúncia, contemplado no artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Penal, aplicável nos termos do artigo 69º da LTC, caso essa questão não tivesse sido apreciada e decidida. Ao invés, essa questão foi cabalmente conhecida, e decidida, no Acórdão nº 489/12, nos termos dos seus pontos 7.2. e 8..
8. Face ao exposto, impõe-se concluir pela improcedência da arguição de nulidade, por omissão de pronúncia.
9. Haverá, tão-somente, e como aponta o Ministério Público, que retificar o lapso, nos termos permitidos pelo artigo 667º, nº1 do Código de Processo Civil.
III Decisão
10. Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se:
a) Julgar improcedente a arguição de nulidade do Acórdão nº 489/12;
b) Determinar a correção do mesmo acórdão, por forma a que, no ponto 3, onde se lê “3. Notificado da resposta, o reclamante nada disse”, passe a ler-se, “3. Notificado da resposta do Ministério Público, veio o reclamante responder”;
c) Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 12 (doze) unidades de conta.
Notifique.
Lisboa, 15 de novembro de 2012.- Fernando Vaz Ventura – Pedro Machete – Joaquim de Sousa Ribeiro
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc//tc/acordaos/20120542.html ]