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Processo n.º 257/2012
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Por Acórdão de 21 de junho de 2011, proferido no processo comum singular n.º 748/05.3TASTR.E1, decidiu o Tribunal da Relação de Évora conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido A., ora reclamante, da sentença condenatória, julgando prescrito o procedimento criminal pelo crime de contrafação de que o mesmo vinha acusado, e julgar improcedentes os recursos interlocutórios e o recurso da decisão final em tudo o que não respeitasse aos efeitos da prescrição, mantendo, no mais, o decidido pela primeira instância.
O arguido veio, então, requerer a aclaração do acórdão e arguir a sua nulidade, por excesso de pronúncia, o que foi indeferido por Acórdão de 8 de novembro de 2011.
Inconformado, recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), «(…) do Acórdão proferido por essa mesma Relação (…) que decidiu o recurso interposto (…), assim como do posterior despacho no seguimento do pedido de aclaração, uma vez que o mesmo confirma a decisão proferida no anterior aresto mencionado», conforme esclarecimento prestado perante o Tribunal recorrido, a fim de ver apreciada a inconstitucionalidade dos seguintes normativos legais: artigos 196.º, n.º 3, alínea b), e 63.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), por violação do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa (CRP); artigos 332.º, n.º 1, e 61.º, n.º 1, alínea a), do CPP, por violação do artigo 32.º, nºs. 1, 5 e 6, da CRP; e artigos 196.º, n.º 3, alínea b), 63.º, n.º 1, 332.º, n.º 1, e 61.º, n.º 1, alínea a), do CPP, por violação das garantias de defesa do arguido constitucionalmente consagradas.
O Tribunal recorrido, por decisão de 6 de março de 2012, indeferiu, por intempestivo, o requerimento de interposição do recurso, tendo o arguido dela reclamado, nos termos do artigo 76.º, n.º 4, da LTC, invocando que, à luz das disposições aplicáveis, o recurso foi interposto tempestivamente.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido do indeferimento da reclamação, não pelo fundamento em que assenta a decisão reclamada, mas por inobservância do ónus de prévia suscitação de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa atinente aos preceitos legais ora sindicados.
O reclamante, convidado a pronunciar-se sobre o parecer do Ministério Público, nos termos do n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil, aplicável, nada disse.
2. Cumpre apreciar e decidir.
Decidiu o Tribunal da Relação, no despacho ora em reclamação, indeferir, por intempestivo, o requerimento de interposição do recurso, considerando que, não pretendendo o arguido recorrer autonomamente do acórdão que apreciou o incidente pós-decisório por si deduzido, mas apenas do acórdão que julgou do mérito do recurso, embora complementado ou integrado por aquele último, o prazo de recurso (artigo 75.º, n.º 1, da LTC), contado desde a notificação da decisão recorrida nos termos do n.º 1 do artigo 685.º do CPC, aplicável, já havia decorrido, sendo certo que o Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, revogou o artigo 686.º do CPC cujo número 1 determinava que «o prazo para o recurso só começava a correr depois de notificada a decisão proferida sobre o requerimento para retificação, aclaração ou reforma da sentença», não consagrando a norma do artigo 669.º, n.º 3, do CPC, na versão revista, idêntica solução legislativa.
Cumpre, pois, apreciar e decidir, num primeiro momento, da tempestividade do recurso, sendo de aferir posteriormente, caso se venha a concluir pelo infundado da decisão reclamada, nesse particular, se estão verificados os restantes pressupostos processuais do recurso, desde logo o que respeita à observância do ónus legal de prévia suscitação, que o Ministério Público alega não ter sido cumprido.
A decisão reclamada parte do pressuposto de que ao caso se aplica o Código de Processo Civil, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, pelo que não seria de aplicar, por revogada, a solução legal que reportava o início do prazo de recurso da decisão objeto de pedido de retificação, aclaração ou reforma, à data da notificação da decisão proferida sobre tais requerimentos.
Sucede que, independentemente da correção do entendimento perfilhado pela decisão reclamada em face das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, às invocadas normas dos artigos 686.º e 669.º do CPC, a verdade é que, estando os presentes autos pendentes à data da sua entrada em vigor (01.01.2008), a invocada alteração não se aplica ao caso sub judicio, sendo certo que às referidas disposições legais, na versão revista, não é aplicável o disposto na norma excecional do n.º 2 do artigo 11.º do citado decreto-lei (artigo 11.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/2007).
Por isso que, em face das disposições conjugadas dos artigos 75.º, n.º 1, da LTC, e do artigo 686.º, n.º 1, do CPC, na redação anterior à entrada em vigor do referido decreto-lei, aplicável, é de concluir que, tendo o ora reclamante sido notificado em 15 de novembro de 2011 (fls. 43) do Acórdão que indeferiu os incidentes pós-decisórios por si deduzidos, foi tempestivo o recurso interposto, em 24 de novembro de 2011 (fls. 29 e 33), do Acórdão de 21 de junho de 2011, sobre que tais incidentes recaíram.
Assim sendo, resta verificar se o recorrente observou o ónus de prévia suscitação de que, nos termos dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da LTC, depende, além do mais, a admissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional.
O reclamante indicou, no respetivo requerimento de interposição do recurso, como peças processuais onde suscitou as três questões de inconstitucionalidade nele identificadas, os recursos interlocutório constantes de fls. 68-70 (conclusão 2.ª) e 82-85 (conclusão 4.ª) e o recurso interposto da sentença da primeira instância constante de fls. 50-53 (conclusão 3.ª), respetivamente.
Contudo, analisado o teor das motivações dos indicados recursos, em particular o que se invoca nas especificadas conclusões, verifica-se que nelas o recorrente não observou o ónus de prévia e adequada suscitação das questões de inconstitucionalidade identificadas no requerimento de interposição do recurso.
Com efeito, quer no recurso interlocutório de fls. 68-70, quer no recurso da sentença condenatória de fls. 50-53, o reclamante limitou-se a invocar a inconstitucionalidade das próprias decisões recorridas, por violação das garantias de defesa do arguido (cf. conclusões 2ª e 3ª, respetivamente), e não de qualquer norma que nelas veio a ser aplicada, pelo que, na verdade, não suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade normativa suscetível de ser reapreciada no recurso de constitucionalidade ora interposto.
Por outro lado, resultando apenas da conclusão 4.ª do recurso interlocutório de fls. 82-84, que o que o ora reclamante reputava inconstitucional era o entendimento, ou a interpretação, que o Tribunal de primeira instância extraiu das normas dos artigos 332.º, n.º 1, e 61.º, n.º 1, alínea a), do CPP, a verdade é que nela não se delimita positivamente a concreta dimensão normativa que, tendo por fonte legal os referidos normativos legais, violava, na sua perspetiva, a Constituição, não se adiantando, por outro lado, quaisquer razões que argumentativamente suportassem tal conclusão, o que seria exigível.
Não observou, pois, pela forma processualmente adequada, o ónus de prévia suscitação legalmente previsto como condição de interposição do recurso, pelo que, em rigor, não recaía sobre o Tribunal recorrido qualquer dever de pronúncia sobre tal questão.
Assim sendo, e ainda que por diferentes razões da invocada pelo Tribunal recorrido, é de confirmar a decisão de rejeição do recurso.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 31 de maio de 2012.- Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral – Gil Galvão.