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Proc. nº 612/99
1ª Secção Relatora: Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A. S., notificado da decisão sumária que, por não estarem verificados os pressupostos processuais exigidos no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº
28/82, decidiu não tomar conhecimento do recurso por ele interposto para o Tribunal Constitucional, veio reclamar para a conferência, com os seguintes fundamentos:
'[...] parece-nos que o requerimento de interposição para este Alto Tribunal reúne todos os requisitos exigidos para a interposição de recurso previstos nos nºs. 1 e 2 do art. 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional.
[...] mesmo que se considerasse que o requerimento de interposição do recurso para este Tribunal não preenchia os requisitos exigidos o Juiz no Tribunal recorrido ou o Relator no Tribunal Constitucional deveriam convidar o recorrente para prestar os esclarecimentos ou indicação em falta.
[...] não se pode considerar que as normas que o recorrente vem submeter à apreciação deste Tribunal Constitucional não foi aplicada na decisão recorrida – o Acórdão de 1 de Julho de 1999, através do qual o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a nulidade imputada no acórdão anterior por A. S..
[...] tendo o, ora, reclamante arguido nulidade da decisão do Supremo Tribunal de Justiça e tendo arguido a inconstitucionalidade do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça ao interpretar como interpretou a norma que o recorrente, aqui, reclamante submeteu à apreciação deste Tribunal Constitucional não se pode considerar como considerou que «a norma que o recorrente vem submeter à apreciação do Tribunal Constitucional não foi aplicada na decisão recorrida – o acórdão de 1 de Julho de 1999...» e assim não se dever conhecer do recurso interposto pelo recorrente. Pois Parece-nos injusta tal decisão, já que o recorrente invocou a inconstitucionalidade da norma tal como foi interpretada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça a fls. ... que se pretende submeter à apreciação deste Tribunal Constitucional e o mesmo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de fls.
... pronunciou-se embora contra o pretendido pelo recorrente – sobre tal inconstitucionalidade. Assim, salvo melhor opinião não se pode referir que tal norma com a interpretação dada e que o recorrente pretende submeter à apreciação deste Tribunal não foi aplicada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.
[...] Deve a presente reclamação para a conferência ser decidida no sentido de se conhecer do objecto do recurso e consequentemente ordenar-se o respectivo prosseguimento dos autos para que se faça JUSTIÇA.'
2. Notificada para se pronunciar sobre a reclamação apresentada, a recorrida Companhia de Seguros F...., respondeu que a mesma deveria ser indeferida.
3. Sustenta o ora reclamante que não deveria ter sido proferida decisão sumária sem previamente se ter notificado o recorrente nos termos dos nºs 5 e 6 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional.
Ora, a este respeito, importa distinguir entre os pressupostos do recurso de constitucionalidade, tal como se encontram enunciados nas várias alíneas do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, e os requisitos do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, a que se refere o artigo 75º-A da mesma Lei.
No caso sub judice, decidiu-se não tomar conhecimento do recurso por não estarem verificados os pressupostos de admissibilidade do recurso interposto
– o recurso previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional –, tal como se prevê no artigo 78º-A, nº 1, da mesma Lei.
Ainda que o ora reclamante tivesse explicitado no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade qual a interpretação da norma então mencionada que considerava contrária à Constituição (requisito do requerimento de interposição do recurso), o recurso não poderia ser admitido, por falta de pressupostos processuais.
Com efeito, e como se ponderou na decisão sumária impugnada, sendo o recurso interposto do acórdão de 1 de Julho de 1999 (fls. 223 e seguinte), através do qual o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a nulidade imputada ao acórdão anterior, verifica-se que a decisão recorrida não aplicou a norma que o recorrente pretendia submeter à apreciação do Tribunal Constitucional – a norma do artigo 19º, alínea c), do Decreto-Lei nº 522/85, de 31 de Dezembro (ou uma dada interpretação dessa norma). Na verdade, o acórdão recorrido limitou-se a aplicar as normas do Código de Processo Civil sobre as nulidades – no caso, a norma do artigo 668º, nº 1, alínea d), invocada pelo então recorrente para fundamentar a alegada nulidade do acórdão anteriormente proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça (acórdão de 29 de Abril de 1999, fls. 191 e seguintes). Por isso se considerou que seria inútil ordenar a notificação do ora reclamante, nos termos do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, para completar o requerimento de interposição do recurso. Ao reclamante seria porventura possível indicar aquele elemento em falta no requerimento, mas não seria certamente possível suprir a falta de um pressuposto processual típico do recurso interposto: isto é, a aplicação, na decisão recorrida, da norma submetida ao julgamento do Tribunal Constitucional.
4. Reafirma-se que, nas peças processuais em que fez referência a eventuais questões de violação da Constituição [o requerimento em que arguiu a nulidade do acórdão de 29 de Abril de 1999 (fls. 203 e seguintes) e o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional (fls. 227 e seguinte) – que, de todo o modo não constituíam já momentos adequados para suscitar a questão de inconstitucionalidade 'durante o processo'], o ora reclamante imputou o vício de inconstitucionalidade à decisão judicial.
E fê-lo novamente na reclamação da decisão sumária (fls. 244 e seguintes), quando escreveu:
'[...] tendo o, ora, reclamante arguido [...] a inconstitucionalidade do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça [...]' (fls. 249).
Ora, as decisões judiciais não podem, em si mesmas, ser objecto de controlo de constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional.
5. Conclui-se assim que a decisão do Tribunal Constitucional foi proferida com total observância das regras legais aplicáveis, pois que:
– se entender que não pode conhecer-se do objecto do recurso, o relator, no Tribunal Constitucional, profere decisão sumária (artigo 78º-A, nº
1, da Lei do Tribunal Constitucional);
– se o requerimento de interposição do recurso não indicar algum dos elementos previstos nos nºs 1 a 4 do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, o relator, no Tribunal Constitucional, convidará o requerente a prestar essa indicação (nºs 6 e 5 do artigo 75º-A da mesma Lei);
– não é lícito realizar no processo actos inúteis (artigo 137º do Código de Processo Civil).
6. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, não tendo o reclamante aduzido razões susceptíveis de modificar a decisão anteriormente proferida, o Tribunal Constitucional decide confirmar a decisão reclamada, de 8 de Novembro de 1999, que não tomou conhecimento do recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta.
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2000 Maria helena brito vítor nunes de almeida luis nunes de almeida