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Proc. nº 652/99 TC – 1ª Secção Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 – A. P., com os sinais dos autos, reclama da decisão sumária de fls. 388 que não tomou conhecimento do recurso por ele interposto, por não se mostrarem preenchidos os requisitos do recurso previsto no artigo 70º nº. 1 alínea f) da Lei nº. 28/82 – as normas ditas violadas não revestiam as características das enunciadas nas alíneas c) d) e e) do mesmo artigo 70º nº. 1.
Depois de considerar 'com inteira pertinência' os fundamentos da decisão reclamada, entende, em síntese, o recorrente que:
· o requerimento de interposição de recurso labora em lapso ou erro manifesto;
· é demasiado pesado o sancionamento desse lapso ou erro;
· o julgador deveria convidar o recorrente a corrigir o erro ou corrigi-lo ele próprio, no uso de poderes oficiosos de 'convolação' e em obediência ao 'dever de cooperação na sua vertente de dever de prevenção'.
Não houve resposta à reclamação.
Cumpre decidir.
2 – Escreveu-se na decisão sumária reclamada:
'1 - A. P., com os sinais dos autos, recorre do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (fls. 367) que confirmou o despacho de não admissão do recurso por ele interposto para o tribunal pleno com fundamento em oposição de julgados.
No requerimento de interposição de recurso, que delimita o âmbito deste, o recorrente diz, em síntese, que:
a. o recurso é interposto ao abrigo da alínea f) do nº. 1 do artigo 70º da Lei nº. 28/82; b. a norma cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada é a que consta do nº. 3 do artigo 17º do Decreto-Lei nº. 329-A/95, de 12 de Dezembro; c. os princípios constitucionais que se consideram violados são os da igualdade e do acesso aos tribunais – artigos 13º e 20º (por manifesto lapso escreve-se '28') nº. 1 da CRP. d. suscitou a questão de inconstitucionalidade e ilegalidade na reclamação deduzida contra o despacho confirmado pelo acórdão recorrido.
Cumpre decidir, o que se faz ao abrigo dos poderes concedidos pelo artigo 78º-A nº. 1 da Lei nº. 28/82.
2 - Nos termos do artigo 70º nº. 1 alínea f) da Lei nº. 28/82, é admissível recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais 'que apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e)'.
Trata-se, portanto, de um recurso com fundamento em ilegalidade de norma aplicada, previsto no artigo 280º nº. 2 alínea d) da CRP.
Por mera hipótese de raciocínio supõe-se aqui que a referida norma contida no artigo 17º nº. 3 do DL nº. 329-A/95 foi aplicada pelo acórdão recorrido com a interpretação que o recorrente atribuiu ao despacho confirmado na aludida reclamação (nº. 16).
Alegando o recorrente que a questão de inconstitucionalidade e ilegalidade foi suscitada na mesma reclamação, importa agora averiguar se os fundamentos aí aduzidos correspondem aos que se prevêem nas citadas alíneas c), d) e e) do nº.
1 do artigo 70º da Lei nº. 28/82.
Ora, em parte alguma da dita reclamação se fundamentou a arguição de
'ilegalidade' da referida norma do artigo 17º nº. 3 do DL nº. 329-A/95 em
'violação de lei com valor reforçado' ou em 'violação do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República'.
Na verdade e em primeiro lugar a arguição feita é de 'inconstitucionalidade' e não de 'ilegalidade'.
Por outro lado e decisivamente, os fundamentos aduzidos, explanados no nº. 17 da reclamação e sintetizados nas conclusões 1ª e 3ª da mesma reclamação, são de violação directa dos artigos 13º e 20º nº. 1 (uma vez mais, por lapso refere-se
'28º nº. 1') da CRP.
Tanto basta para se demonstrar que se não mostram preenchidos os requisitos do recurso previsto no artigo 70º nº. 1 alínea f) da Lei nº. 28/82.'
Não procedem os fundamentos aduzidos pelo reclamante contra esta decisão.
É, desde logo, manifesto que o artigo 75º-A nºs. 5 e 6 da Lei nº. 28/82 rege apenas e expressamente para os casos de omissão, no requerimento de interposição de recurso, das indicações impostas nos nºs. 1 a 4 do mesmo artigo 75º-A .
Sendo ao recorrente que compete indicar o tipo de recurso que pretende interpor, não confere a lei ao Tribunal qualquer poder oficioso de convolar para um outro recurso aquele que o recorrente indicou naquele requerimento; e a doutrina aplicada no caso citado pelo recorrente (Acórdão nº. 321/92 in ATC 23º vol., pp.
357 e segs.), pela sua especificidade, não é transponível para a situação em apreço.
Nem, como agora diz o recorrente, se pode afirmar que ocorreu 'um qualquer lapso ou erro manifesto'.
Na verdade, no requerimento de interposição de recurso o recorrente não se limitou a indicar a alínea f) do nº. 1 do artigo 70º da Lei nº. 28/82, podendo, se assim fosse, verificar-se aí o referido lapso, designadamente de escrita
(escrever f) quando se pretende b)); no nº. 1 do requerimento chega a ser transcrita a norma ínsita na citada alínea f), não deixando ainda de se aludir à
'fiscalização concreta de ilegalidade e/ou inconstitucionalidade'.
Tão pouco é lícito fazer apelo ao 'dever de colaboração, na sua vertente de dever de prevenção' cuja consagração expressa no artigo 266º do CPC não teve a virtualidade de eliminar os ónus processuais das partes e as cominações que a lei estabelece para o seu incumprimento, convertendo o julgador em corrector oficioso dos erros das partes.
Aliás, em bom rigor, a decisão sumária reclamada não se baseou em incumprimento de ónus processuais mas, tomando como assente a interposição do recurso ao abrigo do artigo 70º nº. 1 alínea f) da Lei nº. 28/82, na não verificação dos fundamentos que facultam este meio de impugnação.
3 - Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 Ucs.
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2000 Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa