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Processo n.º 384/12
1.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão daquele Tribunal de 14 de março de 2012.
2. Pela Decisão Sumária n.º 332/2012, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. A decisão tem a seguinte fundamentação:
«O recorrente pretende a apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 405.º do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que «muito embora a reclamação em tal artigo prevista seja dirigida ao Presidente do Tribunal a que o recurso se dirige (…) pode aferir da respetiva tempestividade o próprio Juiz reclamado».
Sucede, porém, que o Tribunal da Relação do Porto já decidiu que a reclamação apresentada pelo ora recorrente, nos termos do artigo 405.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, foi apresentada extemporaneamente. Nestas circunstâncias, revela-se inútil a apreciação da questão de inconstitucionalidade colocada nos autos. De facto, ainda que este Tribunal viesse a concluir pela desconformidade constitucional daquela norma, subsistiria sempre o entendimento do tribunal de recurso quanto à extemporaneidade da reclamação, o qual não está vinculado por decisão do presidente do tribunal superior que não confirme o despacho de não admissão (artigo 405.º, n.º 4, do Código de Processo Penal).
Este Tribunal tem entendido que a averiguação da utilidade do recurso representa uma condição da admissibilidade do próprio recurso (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 366/96, disponível em www.tribunalconstitucional.pt), justificando-se, por isso, não tomar conhecimento do objeto do presente recurso e prolatar a presente decisão (artigo 78º-A, nº 1, da LTC).».
3. Da decisão sumária vem agora o recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, através de requerimento onde se pode ler o seguinte:
«(…) não se podendo resignar, como resignar se não pode, nem se resignando pois, com a aliás douta decisão sumária número 332/2012, prolatada nos autos por V. Exa., no passado dia 27 de junho de 2012, vem, e ao abrigo da possibilidade conferida pelo número 3, do artigo 78º-A, da Lei número 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional), de tal decisão sumária reclamar para a conferência».
4. O Ministério Público respondeu nos seguintes termos:
«6º
Considerou, a Ilustre Conselheira Relatora deste Tribunal Constitucional, na Decisão Sumária 332/12, ora reclamada, para decidir como decidiu (cfr. fls. 586-587 dos autos) (destaques do signatário):
(…)
7º
Ora, concorda-se, inteiramente, com esta posição da digna Conselheira Relatora, bem como com a fundamentação, por ela apresentada, para não tomar conhecimento do objeto do presente recurso.
8º
Por outro lado, na sua reclamação para a conferência, o Réu nada alega em contrário do decidido, limitando-se a dizer que, “não se podendo resignar, como resignar se não pode, nem se resignando pois, com a aliás douta decisão sumária número 332/2012, prolatada nos autos por V. Exa., no passado dia 27 de junho de 2012, vem, e ao abrigo da possibilidade conferida pelo número 3, do artigo 78º-A, da Lei número 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional), de tal decisão sumária reclamar para a conferência' (cfr. fls. 590 dos autos)
9º
Crê-se, assim, que a reclamação para a conferência, em apreciação, não merece provimento, não havendo razões para alterar o sentido da Decisão Sumária 332/12, de 27 de junho, que determinou a sua apresentação».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
A decisão sumária reclamada concluiu pelo não conhecimento do objeto do recurso, por ser inútil apreciar a norma cuja apreciação foi requerida – a norma do artigo 405.º do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que «muito embora a reclamação em tal artigo prevista seja dirigida ao Presidente do Tribunal a que o recurso se dirige (…) pode aferir da respetiva tempestividade o próprio Juiz reclamado». O reclamante em nada contraria a fundamentação da decisão sumária.
É inútil, porque o tribunal de recurso já entendeu que a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 405.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o foi extemporaneamente, não estando tal tribunal vinculado a uma decisão do presidente do tribunal superior que a admita (artigo 405.º, n.º 4, do Código de Processo Penal). Lê-se no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14 de março de 2012 que «a decisão recorrida, que rejeitou a apresentação da reclamação por extemporaneidade mostra-se acertada, tendo o Sr. Juiz “a quo” competência funcional para o respetivo ato».
Nestas circunstâncias, ainda que o Tribunal Constitucional viesse a concluir, no âmbito dos presentes autos, pela desconformidade constitucional da norma objeto do presente recurso, subsistiria sempre o entendimento do tribunal de recurso quanto à extemporaneidade da reclamação. Na fiscalização concreta da constitucionalidade de normas (artigos 280.º da Constituição da República Portuguesa e 69.º e ss. da LTC) – diferentemente do que sucede na fiscalização abstrata (artigos 281.º da Constituição e 62.º da LTC) – “tudo se reconduz a um «recurso», que, embora limitado à questão de constitucionalidade (ou equiparada), não chega a autonomizar-se inteiramente do processo (civil, criminal, administrativo, etc.), em que se enxerta” (Cardoso da Costa, A Jurisdição Constitucional em Portugal, Almedina, 2007, p. 66). E daí a averiguação da utilidade da apreciação da questão de constitucionalidade por referência ao sentido da decisão recorrida.
Há que concluir, pois, pela confirmação da decisão reclamada.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 25 de setembro de 2012.- Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Rui Manuel Moura Ramos.