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Processo n.º 32/14
3.ª Secção
Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA, em que são reclamante A., S.A. (antes denominada A1, S.A.), B. e C. e reclamada D., os primeiros vêm reclamar, ao abrigo dos artigos 76.º, n.º 4, e 78.º, n.º 2, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), do despacho do Tribunal da Relação de Lisboa que, segundo os reclamantes, rejeitou a admissão do recurso interposto para o Tribunal Constitucional.
2. O despacho do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) ora reclamado, proferido em 4/11/2013, tem o seguinte teor (cfr. fls. 1010-1011):
«- Considerando o disposto no art.º 70.º, n.º 1, b) e n.º 2 da Lei do Tribunal Constitucional (Lei 28/82, de 15-11 e respetivas atualizações) e o trânsito do acórdão proferido nesta Relação de Lisboa, baixem os autos ao tribunal da 1ª Instância.
- Considera-se ainda prejudicado o requerido a fls. 994, atento ao também requerido a fls. 1001.».
3. Os reclamantes apresentaram reclamação da não admissão do recurso para este Tribunal, nos termos seguintes (cfr. fls. 2):
«(…) A. S.A., antes com a denominação social A1. S.A., B. e C., RR nos autos,
Vem:
- Fundamento:
- arts. 76,4 e 78,2 - Lei 28/82 de 15/11
- Reclamar:
- da não admissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional que foi interposto no Tribunal da Relação de Lisboa, e por este Tribunal rejeitada a sua admissão,
porquanto:
a) mesmo que se entenda que cabia recurso nos autos para o Supremo Tribunal de Justiça, o simples decurso do prazo para interposição, sem que ela tenha lugar, permite que se interponha para o Tribunal Constitucional;
b) por isso não procede o motivo invocado no Tribunal da Relação de Lisboa:
-o disposto - citado DLei - art. 70, 1, b) e nº 2 e trânsito do Acórdão da Relação, e o requerido a fls. 1001;
c) os RR interpuseram recurso na forma própria e por isso deve se recebido. (…)».
4. Notificada para o efeito (fls. 11-12), a parte contrária não se pronunciou tendo os autos subido a este Tribunal por despacho do TRL de 20/12/1013 (fls. 13).
5. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal conclui pelo indeferimento da reclamação, nos termos e com os fundamentos seguintes (cfr. fls. 16 a 18):
«1. Nos presentes autos, a jornalista D. intentou ação declarativa de condenação, sob forma de processo ordinário, contra B., A1, C. e E., requerendo a sua condenação na «inibição de, por intermédio de revistas, de que sejam proprietários, concessionários de edição, ou diretores publicarem factos e fotografias relativas à vida privada da autora e dos seus filhos» (cfr. fls. 930 dos autos).
Requereu, igualmente, indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, alegando que «foram publicadas nas revistas … e …, ambas da propriedade do primeiro réu, e concessionadas ao segundo réu, reportagens com texto e fotografias que afetaram o seu bom nome, a sua imagem enquanto pessoa e jornalista e bem assim a sua credibilidade profissional» (cfr. fls. 930 dos autos).
2. Por sentença de 13 de dezembro de 2012 (cfr. fls. 738-777 dos autos), a Meritíssima Juíza, da 8ª Vara Cível de Lisboa, julgou a ação parcialmente procedente, condenando os 3 primeiros réus a pagar à Autora a quantia de 10.000 €, a título de indemnização por danos patrimoniais e a quantia de 14.000 €, a título de danos morais (cfr. fls. 776 dos autos).
3. Inconformados, os Réus vieram interpor recurso desta sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa (cfr. fls. 781-791, 796-806, 808-818, 826-836 dos autos).
Pelo seu lado, a Autora apresentou as suas contra-alegações (cfr. fls. 844-906 dos autos).
4. O Tribunal da Relação de Lisboa prolatou Acórdão, em 17 de setembro de 2013 (cfr. fls. 930-976 dos autos), tendo julgado o recurso parcialmente procedente, quanto aos danos não patrimoniais arbitrados a favor da Autora, que foram, assim, reduzidos para o valor de € 12.000, em vez dos 14.000 € anteriormente fixados (cfr. fls. 962 dos autos).
Houve, de qualquer modo, um extenso voto de vencido neste Acórdão (cfr. fls. 964-976 dos autos).
5. Os Réus vieram, então, interpor recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa para o Tribunal Constitucional, em requerimento com data de entrada de 30 de setembro de 2013 (cfr. fls. 981, 984, 988, 994, 995-A, 1002, 1004 dos autos).
Em requerimento posterior, porém, com data de 3 de outubro de 2013, deram tal requerimento sem efeito (cfr. fls. 987, 993, 998, 999, 1001, 1003, 1007-1009 dos autos).
6. Compreensivelmente, o Ilustre Desembargador Relator, por despacho de 4 de novembro de 2013 (cfr. fls. 1010-1011 dos autos), considerou prejudicado o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, dado o facto de os próprios Réus terem abundantemente manifestado a sua intenção de darem o seu requerimento de recurso sem efeito.
Considerou, por outro lado, que o Acórdão de que se pretendia recorrer já tinha transitado em julgado, pelo que determinou a baixa dos autos ao tribunal de 1ª instância.
7. Os Réus vieram, então, reclamar do despacho de não admissão de recurso (cfr. fls. 2, 6, 9 dos autos de reclamação), invocando, designadamente, «porquanto: a) mesmo que se entenda que cabia recurso nos autos para o Supremo Tribunal de Justiça, o simples decurso do prazo para interposição, sem que ela tenha lugar, permite que se interponha para o Tribunal Constitucional».
8. Uma tal argumentação não invalida, porém, desde logo, que foram os próprios Réus que deram sem efeito o seu recurso de constitucionalidade.
Depois, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, do qual se pretendia recorrer, transitou, entretanto, em julgado, como se disse.
Por último, o prazo de interposição de recurso para este Tribunal Constitucional é de 10 dias, nos termos do art. 75º, nº 1 da LTC, prazo esse que se encontra, há muito, excedido.
12. Pelo exposto, não se deve conhecer da presente reclamação por não admissão de recurso».
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
6. Resulta dos autos, com relevo para a decisão, o seguinte:
6.1 Em 27/9/2013 (fls. 982-983 e 985-986) e, reiteradamente, em 30/9/2013 (fls. 981) e 2/10/2013 (fls. 984) os ora reclamantes apresentaram requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, datado de 27/9/2013, com o seguinte teor:
«(…) Os RR nos autos B., C. e E., por não aceitarem, pretendem recorrer para o Tribunal Constitucional do Acórdão que nos autos foi proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa
- e com os fundamentos da Lei 28/82 de 15/11- art. 70, l, b):
a) Preceitos que se consideram violados da CRP:
- arts. 2/ 18, 1/ 20, 1/ 37, 1/38, 1.
b) Preceitos aplicados e cujo segmento de interpretação viola as ditas disposições legais da CRP:
- CC, arts. 70 e 335.
Requer se digne admiti-lo seguindo-se os demais termos.
Data 27.9.2013 (…)»
6.2 Em 3/10/2013 e, reiteradamente, em 7/10/2013, os ora reclamantes apresentaram no TRL requerimento, datado daquele, com o seguinte teor (fls. 987-988, 991-992, 993-994, 995-996, 998, 999, 1000 e 1001, 1002, 1003, 1004, 1007, 1008 e 1009, respetivamente):
«(…) Os RR nos autos B., C. e E., RR nos autos, sem prescindirem do direito a interpor recurso para o Tribunal Constitucional, e por isso sem a ele renunciarem, vem declarar que fica sem efeito o requerimento pelo qual teve lugar a interposição do recurso para esse Tribunal através do requerimento junto aos autos e datado de 27.9.2013.
Data 3.10.2013 (…)».
6.3. O TRL proferiu, em 4/11/2013, o despacho de não admissão do recurso interposto para este Tribunal supra transcrito em 2, considerando o disposto no artigo 70.º, n.º 1, b) e n.º 2 da LTC e o trânsito em julgado do acórdão proferido pelo TRL em 17/09/2013 e considerando prejudicado o requerido a fls. 994 – requerimento de interposição de recurso para este Tribunal de 27/9/2013 – atento ao referido a fls. 1001 – requerimento datado de 3/10/13 dando sem efeito o recurso para o Tribunal Constitucional apresentado em 27/9/2013.
7. Os recorrentes alegam, em defesa da sua pretensão, que o motivo invocado pelo TRL para não admissão do recurso para este Tribunal não procede, porquanto «(…) mesmo que se entenda que cabia recurso nos autos para o Supremo Tribunal de Justiça, o simples decurso do prazo para interposição, sem que ela tenha lugar, permite que se interponha para o Tribunal Constitucional». Considerando que «interpuseram recurso na forma própria e por isso deve se recebido. (…)».
Não assiste razão aos reclamantes.
Por um lado, decorre claramente dos autos, como invoca o despacho reclamado na sua fundamentação, que os ora reclamantes – e por diversas vezes – declararam que ficava sem efeito o requerimento de interposição de recurso para este Tribunal apresentado em 27/9/2013.
Por outro lado, e sem prejuízo da referida declaração considerada pelo despacho recorrido, a verificação dos pressupostos da admissibilidade do recurso para este Tribunal deve reportar-se ao momento da sua interposição. Ora à data de interposição do recurso para este Tribunal (27/9/2013), ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, não se encontrava preenchido – como aliás os ora reclamantes admitem na sua reclamação (cfr. alínea a), fls. 2) – o pressuposto do esgotamento dos recursos ordinários, tal como previsto no n.ºs 2 do artigo 70.º da LTC, aplicável aos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade interpostos com fundamento na alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo 70.º, como invoca o despacho reclamado.
E o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, do qual se pretendia recorrer, transitou entretanto, em julgado, como se invoca também no despacho reclamado.
Pelo que não pode proceder a reclamação apresentada.
III – Decisão
8. Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) UC, nos termos dos artigos 7.º e 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro.
Lisboa, 13 de fevereiro de 2014. – Maria José Rangel de Mesquita - Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral.