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Proc. 323/99
1ª Secção Cons. Vitor Nunes de Almeida
ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
1. – O Conselho dos Oficiais de Justiça (COJ) notificado do Acórdão n.º 145/2000, veio requerer a reforma do referido Acórdão invocando
'manifesto lapso na determinação da norma constitucional face à qual se decidiu pela inconstitucionalidade material dos artigos 95º e 107º, alínea a) do D.L. n.º 376/87, de 11 de Dezembro'.
O COJ entende que no 'artigo 218º, n.º3 não se regula a eventual competência do CSM quanto a funcionários de justiça [o que] resulta não só do texto do n.º1 do artigo 217º da CRP (...) mas também do facto de o legislador ordinário da Lei 10/94, de 5 de Maio, ter revogado o n.º2 do artº
136º da Lei n.º 21/85, que previa que 'O Conselho exerce também jurisdição sobre os funcionários de justiça'.
Refere também o COJ no seu pedido de reforma do acórdão que a fundamentação utilizada não teria tido em atenção as alterações legislativas que a Lei n.º 10/94, de 5 de Maio introduziu na Lei n.º 21/85, de
30 de Julho, de acordo com as quais o CSM não teria competência para apreciar o mérito e punir disciplinarmente os funcionários de justiça.
Termina o pedido formulando as seguintes conclusões:
'1. O Douto Acórdão ao declarar inconstitucionais as normas dos artigos 95º e
107º, al. a) do D.L. n.º376/87, de 11/12, incorreu em manifesto lapso na determinação da norma constitucional face à qual se decidiu pela citada inconstitucionalidade, ou seja, o artº 218º, n.º 3 da CRP;
2. Este comando constitucional não atribui competência ao CSM para apreciar o mérito e exercer a função disciplinar sobre os funcionários de justiça, muito menos impõe que este órgão tenha competência exclusiva sobre esta matéria.
3. O art. 218º, n.º 3 permite, apenas, que os funcionários de justiça possam compartilhar o regime de autonomia dos juizes, atribuindo ao legislador ordinário a faculdade de alargamento, da composição imperativa do CSM definida no n.º1 do artigo e limitando o âmbito dos poderes funcionais dos membros do CSM eleitos pelos funcionários de justiça. Isto é,
4. Este preceito constitucional apenas previne a hipótese de a lei ordinária atribuir jurisdição ao CSM sobre os funcionários de justiça, o que actualmente não sucede. E, nessa hipótese, tal norma - que regula a composição do CSM e não a sua competência – 'constitucionaliza' antecipadamente a nova composição daquele Conselho.
5. Que o CSM não tem competência disciplinar ou outra sobre os funcionários de justiça desde 1994 decorre, não só do texto do n.º1 do artº 217º da CRP – aqui, sim, trata-se da competência do CSM – mas também do facto de o legislador ordinário da Lei n.º10/94, para além de alterar o artº 136º da Lei n.º 21/85, revogando o seu n.º2, revoga, também, o n.º2 do artº 137º desta Lei. E o douto Acórdão esqueceu tais revogações.
6. Em conclusão, os artºs 95º e 107º, al. a) do D.L. n.º 376/87, de 11 de Dezembro, não violam o disposto no n.º3 do artº 218º da CRP, nem qualquer outro preceito constitucional, pois da Lei Fundamental não decorre que o CSM tenha competência para exercer jurisdição sobre os funcionários de justiça.
7. E para que o CSM tivesse competência sobre esta matéria, esta teria que estar prevista no n.º1 do artº 217º da CRP, pois é aqui que se encontram definidas as competência deste órgão superior. Entende-se, assim, que o douto Acórdão que se pretende ver reformado, incorreu em manifesto lapso ao aplicar quer a Lei n.º 21/85 sem a alteração introduzida pela Lei n.º 10/94, de 5 de Maio, quer o artº 218º, n.º3 da CRP.'
Notificado o pedido de reforma ao recorrente FERNANDO DE ALMEIDA PEREIRA veio este responder no sentido do indeferimento do pedido de reforma formulado.
Corridos que foram os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
2. – Funda-se o pedido formulado em 'manifesto lapso' na determinação da norma constitucional utilizada como parâmetro da inconstitucionalidade das normas questionadas.
Do texto do acórdão resulta com total clareza que a norma do n.º3 do artigo 218º da Constituição foi a norma utilizada como parâmetro da inconstitucionalidade normativa determinada: neste aspecto não existe qualquer ‘lapso’ no acórdão.
Por outro lado, também resulta claro da decisão em reclamação que o Tribunal entendeu que a norma do n.º3 do artigo 218º da Constituição continha, de forma explícita ou ao menos implicitamente, a imposição constitucional no sentido de caber ao Conselho Superior da Magistratura a apreciação do mérito e do poder disciplinar sobre os funcionários de justiça. Tal posição está devidamente fundamentada no acórdão e tal fundamentação não foi minimamente afectada, do ponto de vista do direito constitucional pela reclamação apresentada.
Com efeito, toda a argumentação em que se baseia a reclamação é do domínio do direito ordinário: trata-se da alteração que a Lei n.º 10/94 introduziu na Lei n.º 21/85. Ora, qualquer argumento tirado do direito ordinário é inócuo para efeitos de condicionar a Constituição. A inversa é que é verdadeira: há que partir do entendimento da Constituição para interpretar e aplicar o direito ordinário, portanto, qualquer argumento de direito ordinário não afecta o entendimento constitucional feito e devidamente estruturado.
Por todo o exposto, não tendo havido qualquer lapso e muito menos um ‘manifesto lapso’ no acórdão reclamado e não se aduzindo quaisquer argumentos do foro constitucional, tem de se indeferir a reclamação apresentada pelo Conselho dos Oficiais de Justiça.
Neste termos, vai indeferido o pedido de reforma do Acórdão n.º 145/2000, de 21 de Março de 2000.
Lisboa, 30 de Maio de 2000 Vítor Nunes de Almeida Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa