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Processo nº 683/99 Conselheiro Messias Bento
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
Recorrente(s): F. C. e M. P. Recorrido(s): C...–Actividades Hoteleiras, Ldª
I. Relatório:
1. Os recorrentes interpuseram o presente recurso, ao abrigo das alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28 de Setembro de 1999. Pretendem, conforme esclareceram na resposta ao convite que neste Tribunal lhes foi feito, que se aprecie a constitucionalidade das normas constantes dos seguintes artigos: a). dos artigos 33º e 35º do Regime do Arrendamento Urbano, 'não aplicadas com o fundamento de que a sua aplicabilidade reconduziria à aplicabilidade do regime do artigo 36º, nº 1, do mesmo Regime do Arrendamento Urbano (nº 4.2.4.1 de fls.
270/1 dos autos a que aderiram os acórdãos da Relação e do Supremo), isto é, a sua aplicação seria inconstitucional ex vi da inconstitucionalidade da norma do nº 1 do artigo 36º do Regime do Arrendamento Urbano'; b). do nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 330/81, de 4 de Dezembro, cuja inconstitucionalidade foi por eles 'suscitada nas alegações do recurso para a Relação de Lisboa e sintetizada na respectiva conclusão X, a fls. 314, e mantida nas alegações para o Supremo Tribunal de Justiça e sintetizada na conclusão
21ª'.
2. O relator, por entender não poder conhecer-se do recurso, proferiu decisão sumária.
3. Reclamam, agora, os recorrentes para a conferência, sustentando, em síntese, que, contrariamente ao que se concluiu na decisão sumária, a inconstitucionalidade da norma constante do nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº
330/81, de 4 de Dezembro, foi por eles suscitada, nas alegações para o Supremo Tribunal de Justiça, que conheceu dessa questão. Acrescentam que 'àquela norma foi dada interpretação e aplicação que infringe o artigo 205º da Constituição da República por impedir a aplicação das decisões judiciais que fixaram o montante das rendas resultantes da avaliação fiscal extraordinária'.
Decorre do teor da reclamação apresentada que os reclamantes se conformaram com a decisão sumária, no ponto em que nela se concluiu que não se verificam os pressupostos do recurso da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, ou seja, enquanto tal recurso tem por objecto as normas dos artigos 33º e 35º do Regime do Arrendamento Urbano. Por isso, na subsequente exposição, apenas se tomará em consideração o recurso enquanto fundado na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, ou seja, na parte em que ele tem por objecto a norma do mencionado nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 330/81, de 4 de Dezembro.
A recorrida pronunciou-se no sentido de que deve indeferir-se a reclamação.
4. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
5. Na decisão sumária, escreveu-se o seguinte no que concerne ao recurso fundado na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional: O recurso de constitucionalidade, quando fundado na alínea b) do nº 1 do artigo
70º da Lei do Tribunal Constitucional, só tem lugar, quando a decisão recorrida tenha aplicado uma norma jurídica, cuja inconstitucionalidade o recorrente haja suscitado, durante o processo, ou seja, antes de proferida decisão sobre a matéria a que a questão de constitucionalidade respeita. Ora, no caso, os recorrentes, durante o processo – recte, nas alegações para o Supremo Tribunal de Justiça – não suscitaram a inconstitucionalidade do nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 330/81, de 4 de Dezembro. Designadamente, na conclusão 21ª onde dizem tê-lo feito, o que os recorrentes disseram foi o seguinte: O acórdão recorrido impede o cumprimento e a execução das referidas sentenças judiciais que fixaram as rendas mensais em causa, pelo que não são obrigatórias para a recorrida, o que viola o disposto no artigo 208º da Constituição da República Portuguesa, actual artigo 205º, e por isso aquele acórdão enferma de inconstitucionalidade material. Os recorrentes imputaram a violação do mencionado preceito constitucional ao acórdão da Relação, então sob recurso, e não a qualquer norma jurídica, maxime à que consta do nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 330/81. Ora, o controlo de constitucionalidade que a Constituição e a lei cometem a este Tribunal é um controlo normativo, e não um controlo de actos de outra natureza, como são as decisões judiciais.
É certo que o acórdão recorrido, a dado passo, referiu ter 'de concluir que a norma do artigo 4º, nº 4, aplicada nas instâncias, não viola o artigo 208º da Constituição da República'. Simplesmente, os recorrentes não colocaram esta questão de constitucionalidade, pois que imputaram a violação da Constituição à decisão da Relação de que então recorriam. Não tendo sido suscitada, durante o processo, pelos recorrentes, a inconstitucionalidade da norma constante do nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº
330/81, de 4 de Dezembro, não se verifica esse pressuposto do recurso da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, essencial ao seu conhecimento. Ex abundanti, sempre se dirá que, se houvesse de conhecer-se do recurso na parte em que este tem por objecto a norma constante do nº 4 do citado artigo 4º - que rege para o caso de a renda resultante da avaliação fiscal extraordinária exceder o dobro da renda praticada à data do pedido -, sempre haveria de concluir-se que a questão da sua constitucionalidade era manifestamente infundada.
Ao que então se escreveu apenas se acrescentarão, agora, duas notas: a primeira, para dizer que, contrariamente ao que os reclamantes afirmam, na decisão sumária, não se reconhece que o referido nº 4 do citado artigo 4º reja para o caso dos autos. Essa é uma questão que este Tribunal não tem que decidir, uma vez que os recursos de constitucionalidade são restritos às questões de inconstitucionalidade que constituem o seu objecto. A segunda nota é para sublinhar que a manifesta falta de fundamento da questão de inconstitucionalidade da norma constante do nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº
330/81, de 4 de Dezembro, resulta, desde logo, do facto de os recorrentes, para sustentarem tal inconstitucionalidade, dizerem que essa norma, como foi interpretada, viola o artigo 205º da Constituição, por 'impedir a aplicação das decisões judiciais que fixaram o montante das rendas resultantes da avaliação fiscal extraordinária': de facto, não se vê como é que a norma em causa – que prevê um modo excepcional de execução progressiva da decisão que, em resultado de avaliação fiscal extraordinária, fixe renda que exceda o dobro da renda praticada à data do pedido, - possa afrontar a norma constitucional que dispõe que 'as decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre quaisquer outras decisões'.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, decide-se:
(a). indeferir a reclamação, confirmando a decisão sumária de não conhecimento do recurso;
(b). condenar os recorrentes nas custas, com quinze unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 9 de Fevereiro de 2000 Messias Bento José de Sousa e Brito Luís Nunes de Almeida