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Processo n.º 1284/13
2.ª Secção
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
Relatório
No processo n.º 14217/02.0TDLSB, da 2.ª Vara Criminal de Lisboa, em que é arguida A., em 16 de abril de 2012 foi proferido despacho, em obediência ao ordenado em acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, que determinou a emissão de mandados de detenção contra a arguida para cumprimento da pena em que havia sido condenada naqueles autos.
A arguida recorreu desse despacho para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão proferido em 12 de julho de 2012, negou provimento ao recurso.
A arguida invocou a existência de uma irregularidade processual, interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e interpôs ainda recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC, prevenindo a hipótese do primeiro não ser admitido.
Em 6 de novembro de 2012 foi proferido acórdão que desatendeu a arguição de irregularidade processual.
A arguida veio entretanto reclamar para a conferência do despacho do Desembargador Relator que havia fixado efeito ao recurso e que não lhe tinha sido notificado e arguir a nulidade da intervenção da conferência na fixação do efeito do recurso.
Por acórdão proferido em 29 de janeiro de 2013 a reclamação e a arguição de nulidade foram indeferidas.
A arguida veio arguir a existência de irregularidade processual e a nulidade deste último acórdão.
Por acórdão proferido em 26 de fevereiro de 2013 foi reconhecida a irregularidade arguida e ordenada a notificação à arguida da resposta apresentada pelo Ministério Público e indeferida a arguição da nulidade do acórdão proferido em 29 de janeiro de 2013.
A arguida recorreu dos acórdãos proferidos em 29 de janeiro de 2013 e em 26 de fevereiro de 2013 para o Supremo Tribunal de Justiça e, subsidiariamente, para a hipótese de não serem admitidos estes recursos, recorreu desde logo para o Tribunal Constitucional, nos termos da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC.
Em 22 de abril de 2013 foi proferido despacho pelo Desembargador Relator de não admissão dos recursos interpostos para o Supremo Tribunal de Justiça.
A arguida reclamou para a conferência deste despacho, não tendo a reclamação sido conhecida por acórdão proferido em 2 de julho de 2013.
A arguida reclamou do mesmo despacho para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, tendo o Vice-Presidente deste Tribunal por decisão proferida em 23 de outubro de 2013 indeferido a reclamação.
No Tribunal da Relação de Lisboa foram admitidos os três recursos que haviam sido interpostos para o Tribunal Constitucional.
Neste Tribunal foi a recorrente convidada a enunciar os critérios normativos aplicados pelas decisões recorridas cuja constitucionalidade pretendia ver apreciada nos três recursos interpostos.
A arguida respondeu, apresentando dois requerimentos com o seguinte conteúdo:
“A., Recorrente nos Autos à margem supra referenciados, notificada do Douto Despacho de 9 de dezembro de 2013, vem, em cumprimento do mesmo, enunciar o critério normativo aplicado pela Decisão recorrida constante do Douto Acórdão de 12 de julho de 2012 (TRL 5ª Sec.) - ato jurisdicional de suporte do primeiro dos três Recursos interpostos para esse Colendo Tribunal, aos quais se refere aquele Douto Despacho e objeto do presente Processo - cuja constitucionalidade ali pretende ver apreciada.
I Na Decisão recorrida, constante do Douto Acórdão supra referenciado, foi adotado critério normativo cuja desconformidade constitucional a Recorrente pretende ver apreciada, que aqui enuncia seguidamente em cumprimento do Douto Despacho de 9 de dezembro de 2013, e imputada à interpretação da dimensão normativa da norma legal do art.º 720º do Código de Processo Civil (CPC), composta pelos seus únicos nºs 1 e 2, e integrada pela respetiva versão anterior à introduzida pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de agosto, aplicada in casu por força do art.º 11º deste diploma legal e do determinado no Douto Acórdão de 29 de março de 2012 do STJ que, a fls. 11888 do Processo em apreço, e ao abrigo daquela norma legal, ordenou a respetiva baixa ao Tribunal recorrido - cfr. Doc. 1 sob o qual, para mais fácil elucidação, aqui se junta fotocópia das referidas fls.
II A referida norma legal foi aplicada na Decisão recorrida como sua ratio decidendi e em fundamento da legalidade da emissão in casu de mandados de detenção até ao presente não revogados - de forma aliás surpreendente por ter postergado em absoluto a aplicação das normas legais de obrigatória aplicação reguladoras da matéria relativa à emissão de mandados de detenção e à prévia verificação da exequibilidade da condenação que constitui o pressuposto legal de tal emissão - por adoção de critério normativo que é causador de prejuízo grave e irreversível para o arguido e redunda inequivocamente em seu desfavor.
III Critério normativo que é discernível na Decisão recorrida, orientador da interpretação da dimensão normativa da referida norma legal do art.º 720º do CPC, feita com caráter de generalidade ao qual subsumiu o caso concreto, e que com autonomia em relação ao texto é passível de aplicação a casos semelhantes, o qual a conduziu no sentido de que:
da aplicação em Processo Judicial da norma do art.º 720º do CPC para ordenar a respetiva baixa ao Tribunal recorrido na sequência de apresentação de requerimentos em suscitação de ilegalidades processuais, decorre que 'estamos no domínio dos não direitos', sendo por isso legal a emissão de mandados de detenção sem que se verifique a definitividade de decisões ainda pendentes e das quais depende a modificação e/ou subsistência da condenação em que tal emissão se deve sustentar.
IV O critério normativo aplicado na Decisão recorrida contende e colide com os conceitos normativos subjacentes à norma legal em causa e igualmente ínsitos às normas constitucionais dos art.ºs 32.º, n.ºs 1 e 2, 29.º, n.º 1 - por lapso referido no Requerimento de Recurso com o nº 6 cuja retificação aqui se requer - 9.º, alínea b), 283.º, n.º 3, 18.º, n.º 2, 20.º, n.ºs 4 e 5, da CRP, porquanto:
a) posterga a consideração da exequibilidade da condenação como pressuposto prévio e imprescindível à verificação da legalidade da emissão de mandados de detenção para cumprimento de pena;
b) conduz ao entendimento de que pode haver lugar à emissão de mandados de detenção para cumprimento de pena, mesmo que a exequibilidade da condenação não tenha tido ainda verificação - in casu porque pendente ainda de decisões definitivas que a podem modificar e/ou pôr em causa a respetiva subsistência, por força da 'anulação do Processo em caso de modificação, no traslado, da decisão exequenda e/ou de eventual decisão favorável' relativa à questão da prescrição do procedimento criminal, nos precisos termos aqui citados e concretamente decididos por Douto Acórdão do STJ no Processo-crime em apreço e constantes de respetivas fls. 11889;
c)- conduz a entendimento que faz sobrepor a norma legal do art.º 720º do CPC em causa nos Autos, às normas legais que regulam a exequibilidade da condenação, a qual constitui o pressuposto legal imprescindível à emissão de mandados de detenção - v.g. as normas dos art.ºs 497.º, 498.º,677.º, 668.º, 669.º,671.º a 676.º do CPC, aplicáveis ex vi art.º 4º do CPP;
d)- conduz em sentido de integrar de forma ilegal o sentido literal e conceptual da norma do art.' 720º do CPC, porquanto esta não estabelece qualquer relação entre o conteúdo das decisões que no Processo devam ser tomadas pelo Tribunal recorrido - que está obrigado a apreciar todas as questões concernentes ao prosseguimento dos Autos e consequente marcha do Processo após a respetiva baixa - e a invocação feita daquela norma legal pelo Tribunal de Recurso para determinar esta baixa;
e) - conduz em sentido - em absoluto não sufragado nem pela determinação literal nem pela determinação conceptual daquela norma que nada dispõe sobre trânsito em julgado - do abusivo entendimento de que da mesma se pode retirar que, com a baixa do Processo e por força desta, quando determinada ao abrigo desta norma legal do art.º 720º do CPC - nos termos supra já em I referidos e também constantes do aqui Doc. 1 - se verifica o trânsito em julgado e a exequibilidade da decisão condenatória;
f)- viola as garantias de defesa, do direito ao recurso e da presunção de inocência consagrados e assegurados ao arguido em processo criminal como DIREITOS FUNDAMENTAIS pela norma do art. 32º nºs 1 e 2 da CRP, porquanto:
i. impõe ao arguido o sacrifício da sua liberdade, em concreta violação da presunção de inocência, por não permitir que o exercício do seu direito de defesa, incluindo o direito ao recurso, que envolve a possibilidade de o arguido provocar a reapreciação da exequibilidade da condenação, nomeadamente quanto aos efeitos decorrentes da extinção dos crimes que constituíram o respetivo objeto, tenha cabal e efetiva realização em momento prévio e anterior à emissão de mandados de detenção, só concretizável se tal emissão não puder ter lugar antes de decididas, com caráter de definitividade, as questões fundamentais das quais dependem a própria condenação e a pena a aplicar e, consequentemente,
ii. antes de se mostrarem esgotados, através de prolação de decisão definitiva a recair sobre os mesmos, todos os meios processuais que lhe são conferidos com a plenitude da respetiva garantia, pertinentes a provar a inexistência de interesse punitivo do Estado relativamente aos factos que lhe foram imputados, enquanto efeito do exercício do seu direito de punir ao qual se opõe o DIREITO FUNDAMENTAL do arguido a que, por força da extinção de crimes, aquele se abstenha de intervir ou de efetivar a sua reação decorrente da sua titularidade originária do jus puniendi e da qual o poderá vir ainda a isentar;
iii. impede especialmente o arguido de ver realizado, com a plenitude da respetiva garantia, o seu direito ao recurso, só concretizável se em tempo útil e adequado à defesa dos seus DIREITOS FUNDAMENTAIS, direitos, liberdades e garantias - nos quais se insere o seu direito à liberdade - necessariamente anterior à privação de tais direitos, puder o arguido conhecer já as decisões definitivas que virão a recair sobre os Recursos que devida e oportunamente interpôs de decisões relativas a questões fundamentais das quais dependem a própria condenação e a pena a aplicar;
g)- acarreta restrição total dos direitos do arguido, salvaguardada com garantia de proibição pela norma do art.º 18º, nºs 1 e 2 da CRP, no entendimento declarado de forma expressa na Decisão recorrida de que, por força da aplicação no Processo da norma legal do art.º 720º do CPC para efeito de no mesmo ser ordenada a respetiva baixa, 'estamos no domínio dos não direitos', não havendo lugar, por consequência de tal aplicação, à revogação do Despacho que determinou a emissão de mandados detenção na sequência daquela baixa do Processo ao Tribunal de 1ª Instância;
h)- é desconforme ao princípio da legalidade penal postulado pela norma do art.º 29º, nº 1 da CRP - por lapso referido no Requerimento de Recurso com nº 6 cuja retificação aqui se requer - por redundar na integração de lacunas in malam partem;
i)- obstaculiza, impede e restringe a plenitude da garantia de concretização efetiva da realização do núcleo essencial do direito do arguido à tutela jurisdicional efetiva, postulado pela norma do art.º 20º, nº's 4 e 5 da CRP, que lhe assegura com garantia de plenitude o direito a obter decisões definitivas sobre as questões que submeteu a Juízo, em tempo adequado à efetiva salvaguarda dos seus DIREITOS FUNDAMENTAIS, direitos, liberdades e garantias, as quais se tornam em decisões irreversivelmente inúteis se antes de proferidas forem emitidos mandados de detenção do arguido que aguarda que tais decisões definitivas tomem insubsistente a condenação e/ou modifiquem a pena;
V O critério normativo adotado foi, aliás, ponderado pela própria Decisão recorrida como passível de violar a constitucionalidade que a Recorrente pretende ver apreciada através do presente Recurso, porquanto, como daquela Decisão se transcreve, ali desde logo se declarou que:
“III - 3.4) Questiona-se, finalmente, se este entendimento, algo drástico, reconhecemo-lo, não será inconstitucional por violar direitos fundamentais, mormente afetando os princípios da segurança jurídica. da presunção da inocência, tutela das expectativas jurídicas. e outros. salvaguardados pela Constituição?' (sublinhado nosso)
VI O critério normativo adotado na Decisão recorrida é desconforme aos princípios, constitucionalmente postulados, da adequação, da exigibilidade, da proporcionalidade e da proibição do excesso, dos direitos à decisão da causa, ao processo equitativo, da plenitude das garantias de defesa, pilares do processo penal consagrados nas normas dos art.ºs 32.º, n.ºs 1 e 2, 29.º, n.º 1, 9.º, alínea b), 18.º, n.º 2, 20.º, n.ºs 4 e 5 da CRP em causa no presente Recurso de constitucionalidade.
Termos em que, em cumprimento do Douto Despacho proferido nos Autos em 9 de dezembro de 2013, se enuncia o critério normativo aplicado na Decisão recorrida face à constitucionalidade que a Recorrente pretende ver apreciada através do presente Recurso que tem como ato jurisdicional de suporte o Douto Acórdão do TRL de 12 de julho de 2012.”
“A., Recorrente nos Autos à margem supra referenciados, notificada do Douto Despacho de 9 de dezembro de 2013, vem, em cumprimento do mesmo, enunciar o critério normativo aplicado pela Decisão recorrida constante do Douto Acórdão de 26 de fevereiro de 2013 (TRL 5ª Sec.) - ato jurisdicional de suporte do terceiro dos três Recursos interpostos para esse Colendo Tribunal, aos quais se refere aquele Douto Despacho e objeto do presente Processo - cuja constitucionalidade ali pretende ver apreciada.
I Na Decisão recorrida, constante do Douto Acórdão supra referenciado, foi adotado critério normativo cuja desconformidade constitucional a Recorrente pretende ver apreciada, que aqui enuncia seguidamente em cumprimento do Douto Despacho de 9 de dezembro de 2013, e imputada à interpretação da dimensão normativa da norma legal do art.º 417.º, nº 2 do Código de Processo Penal (CPP).
II Critério normativo que é discernível na Decisão recorrida, orientador da interpretação da dimensão normativa da referida norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP, feita com caráter de generalidade ao qual subsumiu o caso concreto, e que com autonomia em relação ao texto é passível de aplicação a casos semelhantes, o qual a conduziu no sentido de que:
o regime imposto pela norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP quanto à imperativa notificação ao arguido, enquanto sujeito processual afetado pela Resposta do Ministério Público pronunciada sobre Recurso em processo penal na qual não se limita a apôr o seu visto, não tem aplicação por analogia à Resposta do Ministério Público pronunciada sobre Reclamação de Despacho do Relator apresentada à Conferência pelo arguido naquela sede, não sendo consequentemente obrigatória a sua notificação para efeito do exercício do direito ao contraditório.
III O critério normativo aplicado na Decisão recorrida contende e colide com os conceitos normativos subjacentes à norma legal em causa e igualmente ínsitos às normas constitucionais dos art.ºs 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, 2.º e art.º 18.º, nº 1 da CRP, porquanto:
a)- posterga o direito de defesa do arguido em processo criminal, concretizado através do seu direito ao contraditório, por o impedir de se pronunciar sobre as questões de direito e de facto suscitadas nas intervenções levadas a efeito pelo Ministério Público através de Resposta sobre Reclamação apresentada pelo arguido em sede de Recurso, pela qual aquele não se limita a apôr o seu visto, mas antes emite pronúncia com influxo na decisão da causa por invocação de argumentos ali suscitados ex novo contra a argumentação antes expendida pelo arguido;
b)- posterga a obrigatoriedade da notificação ao arguido da Resposta do Ministério Público emitindo Parecer sobre Reclamação apresentada pelo arguido em sede de Recurso, e que constitui o meio processual indispensável e adequado a possibilitar a concretização do direito ao contraditório, cujo prazo de exercício se inicia precisamente com tal notificação, e sem a qual, consequentemente, este direito não tem plenitude de garantia efetiva;
c)- conduz a entendimento que não acolhe a determinação literal e conceptual da norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP, através da qual o legislador consagrou de forma inequívoca a imposição de ser sempre dada a possibilidade de pronúncia a todos os sujeitos processuais afetados por intervenção do Ministério Público pela qual se não limite a apôr o seu visto mas antes emite Parecer sobre Recurso no qual se insere e está inserida Reclamação pela qual é suscitada à Conferência revisão ou reapreciação de qualquer decisão judicial proferida naquele Recurso pelo respetivo Relator;
d)- conduz em sentido que posterga a imperativa aplicação da norma legal do art.º 4.º do CPP - imprescindível à legalidade do processo penal - que impõe que nos casos omissos ou não especialmente previstos pelo Código de Processo Penal sejam aplicadas por analogia as normas deste Código, e com recurso à qual deve ser aplicada a norma do art.º 417.º, nº 2 do CPP às Reclamações apresentadas na mesma sede de Recurso para que foi prevista, e nas quais se verificam as mesmas razões justificativas que levaram o legislador a impôr o procedimento previsto naquela norma legal para conferir aos sujeitos processuais o direito a contraditar as Respostas do Ministério Público pelas quais emite Parecer sobre Recursos interpostos por qualquer sujeito processual - in casu o arguido;
e) -viola as garantias de defesa, do direito ao contraditório e da equidade consagrados e assegurados ao arguido em processo criminal como DIREITOS FUNDAMENTAIS pela norma do art. 32º nºs 1, 2 e 5 da CRP, porquanto:
i. impede o arguido de exercer cabalmente o seu direito de defesa, cuja efetiva realização só será concretizável se lhe não for vedada a possibilidade de contraditar, pronunciando-se consequentemente, todas as intervenções que ofereçam argumentação suscetível de comprometer as posições por si processualmente perfilhadas e que pretende fazer valer em sede de revisão e reapreciação de decisões judiciais que tais intervenções possam influenciar;
ii. nega necessariamente a equidade que deve constituir apanágio das decisões judiciais que venham a ser proferidas na sequência daquelas intervenções, só alcançada quando todos os sujeitos processuais tiverem tido a possibilidade de se pronunciar sobre todas as questões de direito e de facto que constituem o respetivo objeto;
iii. impede o cabal exercício do direito ao contraditório do arguido sem o qual se não mostra realizada a sua defesa, assegurada constitucionalmente com garantia de plenitude através do exercício do seu direito de audiência, e cuja efetivação só se concretiza com a sua notificação dos atos praticados pelos sujeitos processuais, nomeadamente o Ministério Público, em obrigatório esgotamento de todos os meios processuais que lhe são conferidos, como necessários, pertinentes e adequados a tal efeito de salvaguarda dos seus DIREITOS FUNDAMENTAIS, direitos, liberdades e garantias - nos quais se inserem os seus direitos de defesa, do contraditório e a um processo equitativo;
f)- acarreta restrição dos direitos do arguido, salvaguardada com garantia pela respetiva proibição imposta pela norma do art.º 18º, nºs 1 e 2 da CRP, por não conduzir à aplicação por analogia da norma do art.º 417.º, nº 2 do CPP quando o Ministério Público se pronuncia através de Resposta sobre Reclamação, apresentada por aquele, de Despacho do Relator proferido na sede de Recurso na qual se impõe o procedimento previsto por aquela norma legal;
IV O critério normativo adotado na Decisão recorrida é desconforme aos princípios e direitos, constitucionalmente postulados aos arguidos, da audiência, do contraditório, da proibição de restrição de direitos, do direito à tutela das expectativas legítimas, à segurança jurídica, a um processo equitativo, da plenitude das garantias de defesa, pilares do processo penal consagrados nas normas dos art.ºs 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, 18.º, n.ºs 1 e 2 da CRP, em causa no presente Recurso de constitucionalidade.
Termos em que, em cumprimento do Douto Despacho proferido nos Autos em 9 de dezembro de 2013, se enuncia o critério normativo aplicado na Decisão recorrida face à constitucionalidade que a Recorrente pretende ver apreciada através do presente Recurso que tem como ato jurisdicional de suporte o Douto Acórdão do TRL de 26 de fevereiro de 2013.”
Foi proferida decisão sumária que decidiu:
a) julgar deserto o recurso interposto do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido nestes autos em 29 de janeiro de 2013;
b) não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 720.º, do Código de Processo Civil, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95 de 12 de dezembro, quando aplicado em processo penal, de forma a permitir a emissão de mandados de detenção para cumprimento de pena de prisão, quando ainda não se encontram definitivamente decididas questões, das quais depende a subsistência da pena;
e, em consequência,
c) julgar improcedente o recurso interposto do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido nestes autos em 12 de julho de 2012,
d) não julgar inconstitucional a interpretação segundo a qual o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não se aplica à resposta do Ministério Público à reclamação para a conferência de despacho do relator proferido em recurso penal;
e, em consequência,
e) julgar improcedente o recurso interposto do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido nestes autos em 26 de fevereiro de 2013.
Esta decisão apoiou-se na seguinte fundamentação:
“A arguida interpôs três recursos para o Tribunal Constitucional.
Os recursos foram interpostos dos acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa, nos presentes autos, em 12 de julho de 2012, 29 de janeiro de 2013 e 26 de fevereiro de 2013.
Recurso do acórdão proferido em 29 de janeiro de 2013
Relativamente ao recurso interposto do acórdão proferido em 29 de janeiro de 2013 a arguida não correspondeu ao convite que lhe foi endereçado, nos termos do artigo 75.º-A, n.º 5, da LTC, no sentido de enunciar os critérios normativos aplicados pela decisão recorrida, cuja constitucionalidade pretendia ver apreciada, pelo que, nos termos do n.º 7 do mesmo artigo, deve este recurso ser julgado deserto.
Recurso do acórdão proferido em 12 de julho de 2012
A arguida invoca neste recurso a inconstitucionalidade do artigo 720.º, do Código de Processo Civil, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95 de 12 de dezembro, quando aplicado em processo penal, de forma a permitir a emissão de mandados de detenção para cumprimento de pena de prisão, quando ainda não se encontram definitivamente decididas questões, das quais depende a subsistência da pena.
Esta questão já foi objeto de apreciação pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 547/2004 (acessível em www.tribunalconstitucional.pt), não tendo sido julgado inconstitucional o critério normativo acima enunciado. Este juízo foi posteriormente subscrito pelos Acórdãos n.º 376/12 e 312/13 (acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
Sendo os fundamentos aduzidos naquele primeiro aresto transponíveis para a questão agora colocada, deve ser proferida decisão sumária no mesmo sentido, aderindo-se a esses fundamentos, nos termos permitidos pelo artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.
Recurso do acórdão proferido em 26 de fevereiro de 2013
A arguida invoca neste recurso a inconstitucionalidade da interpretação normativa, segundo a qual o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não se aplica à resposta do Ministério Público à reclamação para a conferência de despacho do relator proferido em recurso penal.
Esta questão também já foi objeto de múltiplas pronúncias anteriores do Tribunal Constitucional, a propósito da reclamação para a conferência de decisões do relator proferidas neste tribunal, designadamente nos acórdãos n.º 568/01, 68/11, 180/12, 364/13 e 805/13 (acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt) que entenderam que o referido critério normativo não violava qualquer parâmetro constitucional.
Sendo os fundamentos destes arestos transponíveis para a questão agora colocada, deve ser proferida decisão sumária no mesmo sentido, aderindo-se a esses fundamentos, nos termos permitidos pelo artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.”
A Recorrente reclamou desta decisão com os seguintes argumentos:
I - A Douta Decisão sumária aqui reclamada, proferida no Recurso à margem supra referenciado e interposto pela ora Reclamante para esse Colendo Tribunal Constitucional em sede de fiscalização concreta de interpretação normativa, para apreciação de questões de inconstitucionalidade suscitadas e verificadas, entre outros, no Douto Acórdão de 26 de fevereiro de 2013 do Tribunal da Relação de Lisboa - ato jurisdicional de suporte daquele Recurso - decidiu a respetivas fls. 12 e 13:
'd) não julgar inconstitucional a interpretação segundo a qual o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não se aplica à resposta do Ministério Público à reclamação para a conferência de despacho do relator proferido em recurso penal; '
II A Douta Decisão sumária em causa na presente Reclamação fundamentou-se, exclusivamente, em Jurisprudência desse Colendo Tribunal Constitucional, que refere como constante dos Doutos Acórdãos nºs 568/01, 68/11, 180/12, 364/13 e 805/13, por julgar que os mesmos 'entenderam que o critério normativo [em causa] não violava qualquer parâmetro constitucional'.
III Aqui se realçando desde já que, salvo o muito devido respeito, os Acórdãos nºs 68/11 e 180/12 supra em II referidos, em absoluto se não referem a qualquer segmento da norma legal do art. º 417.º do CPP em causa no presente Recurso de constitucionalidade, suscitado pela interpretação da respetiva dimensão normativa pela qual o Julgador lhe tenha subsumido um caso concreto, não se vislumbrando mesmo qualquer razão para a invocação do referido Acórdão nº 180/12.
IV Acresce que, qualquer que tivessem sido os fundamentos - embora não referentes à interpretação de dimensão normativa da referida norma legal do art.º 417.º do CPP - que pudessem ter sido julgados como 'transponíveis' dos Acórdãos supra em II identificados, para efeito de, com recurso à analogia fundamentar a Douta Decisão sumária em causa, certo é que tal método interpretativo não constitui meio adequado em sede de interpretação da Constituição, sendo consequentemente não admitido na hermenêutica jurídica em causa, como meio de extrincar e captar o sentido das inconstitucionalidades provocadas por concreta aplicação de uma determinada norma legal.
V E no Acórdão nº 568/01 - primeiro daqueles Arestos supra em II identificados - não estava em causa Resposta do Ministério Público a 'reclamação para a conferência de despacho do relator proferido em recurso penal', nos termos expressos na Douta Decisão sumária reclamada (cfr. transcrição supra em I), mas antes Resposta do Ministério Público sobre Requerimento apresentado pelo arguido e relativamente à qual não tem aplicação a norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP, especialmente prevista pelo legislador para as Respostas do Ministério Público apresentadas, como no caso subjacente aos presentes Autos, naquela sede de impugnação (Recurso/Reclamação) de decisões judiciais proferidas em processo penal.
VI Extraindo-se, aliás, sintetizadamente daquele Acórdão nº 568/01 - e, salvo o muito devido respeito, contrariando o sentido do mesmo extraído pela Douta Decisão sumária aqui reclamada - no que ali se refere a questões de constitucionalidade relacionadas com as que estão em causa no presente Recurso, que se impõe o exercício do direito ao contraditório do arguido em processo penal quanto às intervenções proferidas em 'visto inicial do Ministério Público no recurso'.
VII Sendo exatamente um 'visto inicial do Ministério Público' em sede de impugnação/Reclamação, e enquanto razão de ser do exercício do direito ao contraditório, que constitui questão especialmente suscitada no presente Recurso, como inconstitucionalidade gerada pela interpretação de dimensão normativa da referida norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP.
VIII Pois, no presente Recurso, está concretamente em causa a questão de inconstitucionalidade provocada pela interpretação de dimensão normativa da norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP que, orientada por critério normativo que colide com o conceito normativo subjacente àquela norma legal e ínsito às normas dos artigos da Constituição da República devidamente identificadas no Requerimento de Recurso pela ora Reclamante - e que impõe o exercício do contraditório do arguido nos casos ali previstos - foi conduzida em sentido de não julgar a Reclamação para a Conferência incluída no conceito literal de 'recurso' expressado naquela norma legal (cfr. fls. 2 - 5º parágrafo do Acórdão de 26/02/12, ato jurisdicional de suporte do presente Recurso).
IX Questão de constitucionalidade que, devidamente suscitada, foi aliás concretamente evidenciada pela Douta Decisão sumária ora reclamada, no ponto II de respetivas fls. 8, onde, nomeadamente, se lê:
'II Critério normativo que é discernível na Decisão recorrida, orientador da interpretação da dimensão normativa da referida norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP, feita com caráter de generalidade ao qual subsumiu o caso concreto, e que com autonomia em relação ao texto é passível de aplicação a casos semelhantes, o qual a conduziu no sentido de que: o regime imposto pela norma legal do art.º 417.º, n.º 2 do CPP quanto à imperativa notificação ao arguido, enquanto sujeito processual afetado pela Resposta do Ministério Público pronunciada sobre Recurso em processo penal na qual não se limita a apôr o seu visto, não tem aplicação por analogia à Resposta do Ministério Público pronunciada sobre Reclamação de Despacho do Relator apresentada à Conferência pelo arguido naquela sede, não sendo consequentemente obrigatória a sua notificação para efeito do exercício do direito ao contraditório.'
X Questão concreta de inconstitucionalidade consequentemente não resolvida através da simples remissão para os Acórdãos invocados em respetiva fundamentação pela Douta Decisão sumária aqui reclamada, enquanto questão que havia sido assim especialmente suscitada no presente Recurso, e pelo qual a ora Reclamante pretendeu ver devidamente apreciada a questão de saber se o legislador, fortemente preocupado com a realização do princípio do contraditório - em absoluta conformação com o conceito normativo Ínsito às normas constitucionais em causa no Recurso e subjacente à referida norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP e como meio adequado a impor a necessária máxima efetividade do núcleo essencial do conteúdo do direito fundamental que o consagra - entendeu que, em conformação com os conceitos ínsitos às normas constitucionais de que emana aquela norma legal, constitui sempre razão do seu obrigatório exercício a intervenção feita 'em visto inicial pelo Ministério Público' através da qual se pronuncia, usando argumentação contrária à do arguido, pela primeira vez sobre um ato processual pelo qual este impugna - pelos meios processuais de que dispõe para recorrer (in casu Reclamação) - ato processual que decidiu questão processual nova, em seu desfavor e afetando os seus direitos.
XI Pois, tendo assim o legislador imposto aquele contraditório na norma do art.º 417.º, nº 2 do CPP, em concretização daquele princípio e do conceito normativo que constitucionalmente o determinam e consagram, para realização efetiva do direito de defesa assegurado ao arguido durante todo o processo criminal, não podem as decisões de constitucionalidade ser tomadas como se tal consagração inexistisse na ordem jurídico-constitucional, na qual se enquadrou, aliás, a atuação jurisdicional constante do Acórdão ato jurisdicional de suporte do presente Recurso e em causa na presente Reclamação (cfr. supra referidas fls. 2 - 5º parágrafo do Acórdão do TRL de 26/02/12).
XII Suscitação da concreta questão de constitucionalidade provocada pela interpretação normativa do mesmo segmento da referida norma legal do art.º 417.º do CPP, que foi também feita nos termos expressos e constantes outrossim da Douta Decisão sumária em causa, nomeadamente evidenciados no ponto III, alínea c) de respetivas fls. 8 e 9, onde se lê:
'III O critério normativo aplicado na Decisão recorrida contende e colide com os conceitos normativos subjacentes à norma legal em causa e igualmente ínsitos às normas constitucionais dos art.ºs 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, 2.º e art.º 18.º, n.º 1da CRP, porquanto:
c)- conduz a entendimento que não acolhe a determinação literal e conceptual da norma legal do art.º 417.º, n.º 2 do CPP, através da qual o legislador consagrou de forma inequívoca a imposição de ser sempre dada a possibilidade de pronúncia a todos os sujeitos processuais afetados por intervenção do Ministério Público pela qual se não limite a apôr o seu visto mas antes emite Parecer sobre Recurso no qual se insere e está inserida
Reclamação pela qual é suscitada à Conferência revisão ou reapreciação de qualquer decisão judicial proferida naquele Recurso pelo respetivo Relator;'
Por outro lado,
XIII Extrai-se do Acórdão nº 364/13, referido entre os Arestos supra em II identificados - muito embora também sem que no mesmo seja feita qualquer apreciação ou sequer referência à norma legal do art.º 417.º do CPP, mas cujos fundamentos foram igualmente transpostos para a Douta Decisão sumária em causa para ali se constituírem em respetiva fundamentação - que se impõe o exercício do direito ao contraditório do arguido em processo penal quanto a intervenção do Ministério Público enquanto 'ato prescrito por lei capaz de influir no exame ou decisão da causa', na qual algo 'de novo foi invocado que pudesse surpreender o reclamante ou prejudicar a defesa do arguido', como 'questão nova relativamente à qual o reclamante tivesse ficado impossibilitado de controlar e responder'.
XIV Ora, foi especialmente suscitada no presente Recurso a questão da inconstitucionalidade gerada pela interpretação de dimensão normativa da referida norma legal do art.º 417.º, nº 2 do CPP que, orientada pelo critério normativo no mesmo em causa, foi conduzida em sentido de não julgar ser obrigatório conferir o direito ao contraditório sempre que o Ministério Público se pronuncia contra a argumentação expendida pelo arguido em Reclamação para a Conferência, para o efeito invocando e aduzindo o Ministério Público na sua Resposta argumentos novos e antes nunca referidos.
XV Circunstância de invocação e de adução de argumentos novos e antes nunca referidos que teve concreta verificação na Resposta do Ministério Público apresentada no caso subjacente ao presente Recurso - cuja não notificação para efeito do contraditório provocou a inconstitucionalidade ali suscitada - e da qual constam elementos de facto e de direito que integraram 'questão nova' que cabia conhecer para aquele efeito (do contraditório), porquanto tais elementos foram trazidos ao Processo naquela Resposta, em argumentação usada pelo Ministério Público para contrariar os argumentos expendidos em Reclamação pela arguida enquanto Recorrente.
XVI Concreta questão expressamente referida em suscitação da constitucionalidade da interpretação normativa do mesmo segmento da referida norma legal do art.º 417.º do CPP, que foi também feita no presente Recurso, nos termos aliás constantes outrossim da Douta Decisão sumária em causa, nomeadamente evidenciados no ponto III, alínea a) de respetivas fls. 8, onde se lê:
'III O critério normativo aplicado na Decisão recorrida contende e colide com os conceitos normativos subjacentes à norma legal em causa e igualmente ínsitos às normas constitucionais dos art.ºs 32.º, n.ºs 1, 2, e 5 e art.º 18.º, n.º 1 da CRP, porquanto:
a)- posterga o direito de defesa do arguido em processo criminal, concretizado através do seu direito ao contraditório, por o impedir de se pronunciar sobre as questões de direito e de facto suscitadas nas intervenções levadas a efeito pelo Ministério Público através de Resposta sobre Reclamação apresentada pelo arguido em sede de Recurso, pela qual aquele não se limita a apôr o seu visto, mas antes emite pronúncia com influxo na decisão da causa por invocação de argumentos ali suscitados ex novo contra a argumentação antes expendida pelo arguido; '
XVII Questões de constitucionalidade sobre as quais, tendo sido assim devidamente suscitadas, se não pronunciou afinal a Douta Decisão sumária aqui reclamada, através da simples invocação dos Acórdãos referidos em respetivo suporte.
XVIII Pois, com a introdução da norma legal do nº 2 do art.º 417.º do CPP, o legislador consagrou o direito ao contraditório do arguido, sempre que o Ministério Público se pronuncia sobre os atos de impugnação que aquele interpõe (Recurso/Reclamação) - em inovação legislativa pela qual, com a entrada em vigor da Lei nº 59/98, de 25 de agosto, 'tomou posição expressa e inequívoca, solvendo-a no sentido' ... 'de conceder o direito de resposta sempre que o MP se não limitasse a apôr o seu visto no Processo e levantasse qualquer questão ou usasse nova argumentação que pudesse prejudicar a outra parte' (cfr. MAIA GONÇALVES, in Código de Processo Penal, 15a Ed., Almedina, Coimbra 2005) - pondo assim fim à formulação da norma legal do art.º 664.º do CPP de 1929, à qual se refere, aliás, o caso do Acórdão nº 568/01 invocado em respetiva fundamentação pela Douta Decisão sumária aqui reclamada.
XIX Acórdão nº 568/01 no qual é referida aquela norma legal do art.º 664.º do CPP/29 - e cujos argumentos foram transpostos pela Douta Decisão sumária ora reclamada - mas que o legislador de 1998 alterou com aquela introdução do nº 2 da norma legal do art.º 417.º do CPP operada pela Lei nº 59/98, de 25 de agosto, precisamente por aquela norma do CPP/29 ser incompatível com os conceitos normativos Ínsitos às normas da Constituição da República emergida no Estado de Direito após 1974 e, por isso, passível de censura constitucional por violação dos princípios do contraditório e da igualdade de armas, os quais constituem os fundamentos essenciais daquela alteração.
XX O que o legislador fez em realização efetiva do direito ao contraditório do arguido, enquanto DIREITO FUNDAMENTAL que lhe é assegurado como garantia durante todo o processo criminal pela norma constitucional do art.º 32.º da CRP, e tendo inserido, para tal efeito, no novo nº 2 do norma legal do art.º 417.º do CPP em causa, o termo 'recurso', em sentido necessariamente lato para nele fazer incluir qualquer dos meios processuais de impugnação de que o arguido dispõe para recorrer de ato judicial que decide, pela primeira vez, sobre questão nova suscitada no Processo-crime em que aquele arguido é Parte, e nos quais, para além do Recurso, se inclui necessariamente, a Reclamação.
XXI Pelo que a formulação encontrada pelo legislador para a nova norma introduzida na Lei nº 59/98, de 25 de agosto, como nº 2 do art.º 417.º do CPP, ao invés de se centrar na atuação do Ministério Público e nos seus poderes para ali determinar a imposição do contraditório, considerou como única solução alternativa para a efetiva realização deste direito sempre que o MP se não limite a apôr o seu visto e especialmente quando levante qualquer nova questão ou faça uso de argumentação nova, conceder sempre à outra Parte o efetivo direito de contraditar Resposta do Ministério Público apresentada sobre ato processual de impugnação, enquanto direito que o ordenamento jurídico do Estado ao tempo do CPP de 1929 não previa, tal como não previa/permitia o exercício de outros DIREITOS FUNDAMENTAIS igualmente ao tempo não consagrados, quer nacional, quer internacionalmente - v.g. Declaração Universal dos Direitos do Homem (10-12-1948).
XXII Sendo, pois, a constitucionalidade suscitada concretamente pela interpretação de dimensão normativa daquela norma legal do art.º 417.º do CPP, no respetivo segmento integrado pela norma prevista no seu nº 2, que se pretende ver apreciada pelo presente Recurso em sede de fiscalização concreta daquela constitucionalidade.
XXIII Questões de constitucionalidade efetivamente não apreciadas de forma concreta nos Acórdãos invocados pela Douta Decisão sumária aqui reclamada, os quais, consequentemente, não podiam ter sido transpostos em respetiva fundamentação, por, como ao longo da presente Reclamação se vem objetivamente demonstrando, não poderem preencher os requisitos previstos pela norma do art.º 78-A, nº 1, da LTC - cfr. Douta Decisão reclamada fls. 12, 2º e 3º parágrafos - exigidos como suporte de decisão sumária feita por 'simples remissão para anterior jurisprudência do Tribunal'.
XXIV Tendo assim a Douta Decisão em causa omitido pronúncia sobre questões fundamentais e essenciais que lhe cabia conhecer, estando consequentemente ferida de vício que a torna nula e de nenhum efeito, previsto pela norma do art.º 615.º, nº 1, al. d) do Código de Processo Civil (CPC) - Lei nº 41/2013, de 26 de junho, aplicável ex vi art.º 69.º da LTC.
XXV NULIDADE da Douta Decisão sumária que aqui se argui consequentemente nos termos da norma legal supra em XXIV citada, para que seja declarada com todos efeitos legais inerentes.
XXVI De igual modo padece a Douta Decisão sumária de vício provocado pela falta de adequada fundamentação, decorrente da invocação de Acórdãos desse Colendo Tribunal cujos fundamentos não se constituem em fundamentação bastante, quer por não conduzirem à efetiva apreciação das inconstitucionalidades suscitadas no presente Recurso - por dos mesmos não ser possível extrincar ou captar decisão concreta sobre as questões devidamente submetidas a esse Colendo Tribunal em sede de fiscalização concreta de interpretação normativa em causa nos Autos - quer por dos mesmos dever antes ser extraída decisão em sentido contrário ao captado relativamente às questões de inconstitucionalidade suscitadas, verificando-se assim contradição entre aqueles fundamentos e a Douta Decisão tomada.
XXVII Vícios que tornam a Decisão sumária consequentemente nula e de nenhum efeito nos termos previstos pela norma do art.º 615.º, nº 1, al. c) do Código de Processo Civil (CPC) - Lei nº 41/2013, de 26 de junho, aplicável ex vi art.º 69.º da LTC.
XXVIII NULIDADE da Douta Decisão sumária que aqui se argui consequentemente nos termos da norma legal supra em XXVII citada, para que seja declarada com todos efeitos legais inerentes.
XXIX NULIDADES que ferem a Douta Decisão sumária e foram causa da sua condução em sentido de:
' d) não julgar inconstitucional a interpretação segundo a qual o disposto no artigo 417.º, nº 2, do Código de Processo Penal, não se aplica à resposta do Ministério Público à reclamação para a conferência de despacho do relator proferido em recurso penal
e, em consequência,
e) julgar improcedente o recurso interposto do Acórdão da Relação de Lisboa proferido nestes autos em
26 de fevereiro de 2013'
XXX NULIDADES que inquinam a Douta Decisão sumária aqui reclamada, que não podia ter julgado por 'simples remissão para anterior jurisprudência do Tribunal' as questões objeto do presente Recurso, ao qual pretendeu pôr fim considerando como 'transponíveis' 'fundamentos de arestas' afinal não bastantes nem adequados a se constituírem em respetiva fundamentação.
XXXI Pelo que se impõe assim que, com todos os devidos e legais efeitos, seja consequentemente revogada a Douta Decisão sumária aqui reclamada.
Termos em que deve a presente RECLAMAÇÃO ser julgada procedente, com a consequente revogação da Douta Decisão sumária de 15 de janeiro de 2014 proferida nos presentes Autos de Recurso interposto pela ora Reclamante para esse Colendo Tribunal Constitucional em sede de fiscalização concreta de interpretação normativa para apreciação de questões de inconstitucionalidade suscitadas no Douto Acórdão de 26 de fevereiro de 2013, devendo especialmente:
a) Ser declarada, com todos os efeitos legais, a NULIDADE invocada e arguida na presente Reclamação nos termos da alínea d) do nº 1 do art.º 615.º do CPC (Lei nº 41/2013, de 26 de junho), aplicável ex vi art.º 69.º da LTC de que está ferida a Douta Decisão sumária de 15 de janeiro de 2014 proferida nos presentes Autos de Recurso em apreciação de questões de inconstitucionalidade suscitadas no Douto Acórdão de 26 de fevereiro de 2013;
b) Ser declarada, com todos os efeitos legais, a NULIDADE invocada e arguida na presente Reclamação nos termos da alínea c) do nº 1 do art.º 615.º do CPC (Lei nº 41/2013, de 26 de junho), aplicável ex vi art.º 69.0 da LTC, de que está ferida a Douta Decisão sumária de 15 de janeiro de 2014 proferida nos presentes Autos de Recurso para apreciação de questões de inconstitucionalidade suscitadas no Douto Acórdão de 26 de fevereiro de 2013;
c) Ser devidamente julgadas as questões submetidas a juízo através do presente Recurso de constitucionalidade em causa na presente Reclamação”.
O Ministério Público respondeu, pronunciando-se pelo indeferimento da reclamação apresentada.
*
Fundamentação
A Recorrente apenas reclama da parte da decisão sumária que não julgou inconstitucional a interpretação segundo a qual o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não se aplica à resposta do Ministério Público à reclamação para a conferência de despacho do relator proferido em recurso penal, tendo, em consequência, julgado improcedente o recurso interposto do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido nestes autos em 26 de fevereiro de 2013.
A decisão reclamada considerou que a questão de constitucionalidade colocada pela Recorrente era de fácil solução, uma vez que existiam anteriores decisões proferidas pelo Tribunal Constitucional cuja fundamentação era transponível para a resolução da presente questão pelo que, por remissão para essa fundamentação, julgou não inconstitucional a interpretação normativa impugnada.
A Recorrente, defendendo que a fundamentação dos acórdãos citados na decisão sumária não só não é aplicável à presente questão, como a de alguns arestos é contraditória, argui a nulidade daquela decisão por omissão de pronúncia, fundamentação desadequada e contradição entre a fundamentação e a decisão.
Vejamos.
A questão de constitucionalidade colocada pelo Recorrente no recurso que interpôs do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 26 de fevereiro de 2013, incidiu sobre a interpretação normativa sustentada por este aresto, segundo a qual o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não se aplica à resposta do Ministério Público à reclamação para a conferência de despacho do relator proferido em recurso penal.
A decisão reclamada remeteu para a fundamentação dos acórdãos n.º 568/01, 68/11, 180/12, 364/13 e 805/13 deste Tribunal as razões pelas quais considerava que aquela interpretação normativa não era inconstitucional.
O Acórdão n.º 180/12 não tem qualquer conexão com a matéria em causa, devendo-se a sua indicação a um lapso de processamento de texto, visando-se referir o Acórdão n.º 188/13.
No acórdão 568/01 indeferiu-se reclamação de decisão sumária que havia julgado não serem inconstitucionais as normas contidas nos artigos 138.º, n.º 4, 140.º, § 3 e 664.º do Código de Processo Penal (CPP)/29, na interpretação de que quando, em conjugação, aplicadas “de molde a não conceder ou consentir ao arguido a possibilidade de exercer o contraditório em relação ao parecer emitido pelo Ministério Público, suscetível de agravar a sua posição”.
Na fundamentação da decisão sumária escreveu-se o seguinte:
“5. Havendo que apreciar tal questão, por ter sido adequadamente suscitada a arguição de inconstitucionalidade, dir-se-á, para já, que diferente é a situação que ocorreu no caso dos acórdãos deste Tribunal (e que o recorrente invoca para servir de apoio à sua pretensão) e o presente caso.
Com efeito, nos casos daqueles acórdãos, estávamos perante o visto inicial do Ministério Público no recurso.
No caso dos presentes autos estamos perante um requerimento apresentado pelo recorrente a pedir que seja declarado extinto o procedimento criminal, tendo o Ministério Público, no exercício do seu direito ao contraditório, manifestado a sua discordância.
Escreveu-se no acórdão nº 533/99:
“O princípio da igualdade de armas que o Tribunal Europeu faz derivar da noção mais lata de processo equitativo (fair trial, procès equitable), deriva-se do princípio de assegurar todas as garantias de defesa, tal como o princípio do contraditório. Contraditório sem igualdade de armas não assegura todas as garantias de defesa. Igualdade de armas exige contraditório sempre que possível. Não se garante uma defesa efectiva se não houver 'possibilidade real de serem contrariadas e contestadas todas as afirmações ou elementos trazidos aos autos pela acusação', nas palavras do Acórdão nº 150/87”.
No caso dos acórdãos referidos, o Ministério Público interveio em nome da acusação, como titular da ação penal, tendo ele tomado inicialmente uma posição.
Na lógica da contraposição dialética entre acusação e a defesa, compreende-se que o réu possa contestar (contradizer) os argumentos utilizados por aquela entidade pública.
Porém, no caso dos presentes autos, quem tomou inicialmente uma posição (posição sobre a extinção do procedimento criminal) foi o próprio réu.
E se o contraditório há de ser assegurado, nessa lógica de equilíbrio entre as partes, então, aqui, esse princípio há de ser assegurado, dando vista ao Ministério Público, como aconteceu, sob pena de, dando de novo ao réu idêntica possibilidade (partindo do princípio de que haveria dispositivo legal a permiti-lo), o equilíbrio se revelar acentuada e desproporcionadamente desigual relativamente ao Ministério Público.
Por outro lado, e se a defesa é um posterius no que se refere à acusação que pressupõe (cfr. o referido acórdão nº 533/99), nem, nos presentes autos, a pretensa defesa do réu tem como pressuposto uma acusação, nem o princípio do contraditório o exige, sob pena de, exigindo-o, se favorecesse o réu assimetricamente (cfr. ainda o referido acórdão nº 533/99).
Admitindo, por hipótese, que o réu, face a determinada posição assumida pelo Ministério Público, viria a alterar substancialmente o seu requerimento, com a introdução de novos argumentos, deveria ser de novo dada a possibilidade ao Ministério Público de contradizer, também de novo, como bem acentua o STJ no seu acórdão.
Não se vê preceito legal que o permita, mas ainda admitindo que a última palavra pertença à defesa, não se pode aceitar que essa faculdade vá ao ponto de poder desvirtuar também o papel do Ministério Público (já que mais não seja como defensor do princípio da legalidade democrática).
Assim sendo, não assiste qualquer razão ao recorrente, sendo simples a questão presente, por ser manifestamente infundada.
É que não se vê que a questionada interpretação e aplicação das normas em causa do Código de Processo Penal seja colidente com quaisquer normas ou princípios constitucionais, contrariamente ao que sustenta o recorrente.
Tanto basta para, nesta parte, ter de se negar provimento ao recurso.”
E na decisão da reclamação desta decisão acrescentou-se:
“Relativamente à segunda questão suscitada – quanto ao ‘visto’ subsequente do Ministério Público – é evidente o artificialismo da tese do recorrente que – bem vistas as coisas – impediria que o Ministério Público exercesse o estrito contraditório sobre os requerimentos apresentados pelo arguido – pronunciando-se sobre as questões neles suscitadas – obrigando sempre a uma inútil e absurda ‘réplica’ do arguido sobre a posição que se assumiu sobre a questão por ele suscitada!”.
No Acórdão n.º 68/11 indeferiu-se a arguição de nulidade, com fundamento na não audição do reclamante sobre o conteúdo da resposta apresentada pelo Ministério Público no incidente de reclamação de decisão sumária em recurso constitucional, com a seguinte fundamentação:
“ No âmbito do processo penal, o Ministério Público é sujeito processual em qualquer das instâncias jurisdicionais, e, em ordem ao princípio da parificação do posicionamento jurídico da acusação e da defesa (e sem prejuízo dos seus deveres de objetividade), tem o direito processual de responder aos requerimentos do arguido-recorrente, designadamente quando esteja em causa a reclamação da decisão sumária do relator.
E não é o simples exercício desse direito processual, mesmo quando o Ministério Público pugne pela manutenção do julgado, contraditando a argumentação do reclamante, que pode conferir à contraparte o direito de resposta, quando é certo que aquela intervenção processual é precisamente justificada pela necessidade de incrementar o princípio material da igualdade das armas.
O direito de audição, nesse conspecto, apenas se justificaria, para evitar que o recorrente viesse a ser confrontado com uma decisão surpresa, se fosse previsível que o tribunal viesse a adotar, na apreciação da reclamação, um fundamento diverso daquele que serviu de base à decisão de não conhecimento do recurso, e relativamente ao qual o recorrente não tivesse tido oportunidade de pronunciar.
No caso em análise, embora seja certo que o Ministério Público, no exercício do seu direito de resposta, invocou, a título subsidiário, um novo argumento para a manutenção da decisão reclamada – o não cumprimento do ónus de suscitação, de modo processualmente adequado, em relação a duas das questões de constitucionalidade que constituíam objeto do recurso (pontos III e V) -, o certo é que o acórdão n.º 463/2010 limitou-se a confirmar a decisão anterior pelos mesmos fundamentos, e não decidiu, portanto, com base em qualquer aspeto inovatório sobre o qual o recorrente não tivesse tido oportunidade de aduzir as suas razões.
Seria, por isso, inteiramente inútil, face à decisão que veio a ser adotada, abrir uma nova fase de discussão a partir da resposta apresentada pelo Ministério Público, quando o tribunal, para fundamentar a sua decisão, não utilizou quaisquer novos argumentos que o respondente tivesse invocado.
4. É patente, por outro lado, que a interpretação efetuada pelo tribunal não ofende o princípio do contraditório ou o princípio da igualdade das armas.
Em primeiro lugar, a norma aplicável ao caso não é a do artigo 77.º, n.º 2, da LTC, que apenas se reporta à reclamação do despacho que indefira o requerimento do recurso, mas a do artigo 78.º-A, n.º 3, dessa Lei, que se refere à reclamação para a conferência da decisão sumária do relator que não conheça do objeto do recurso. Por outro lado, embora aí não se encontre especialmente prevista a vista ao Ministério Público, a observância dessa formalidade mostra-se justificada, à luz dos princípios gerais, para assegurar o direito processual de resposta ao requerimento do recorrente.
Como corolário do princípio do processo equitativo e do princípio da igualdade, o direito à igualdade de armas ou igualdade de posição no processo visa essencialmente assegurar a proibição de todas as diferenças de tratamento arbitrárias; ao passo que a proibição da indefesa e o direito ao contraditório se traduz fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e direito, oferecer provas, controlar a admissibilidade e a produção das provas da outra parte e pronunciar-se sobre o valor e resultado de umas e outras.
Ora, o reclamante teve oportunidade de contraditar a decisão sumária através da reclamação para a conferência, e não foi objeto de qualquer discriminação pelo facto de se ter concedido direito de resposta a um outro sujeito processual que tem plena legitimidade para intervir no processo.
O recorrente apenas poderia invocar a violação do princípio da decisão surpresa, como decorrência do princípio do contraditório, caso o tribunal viesse a adotar novos fundamentos decisórios relativamente aos quais o reclamante não tivesse podido pronunciar-se. Mas, como vimos, o tribunal não se afastou dos termos em que a discussão vinha colocada na decisão reclamada, pelo que o recorrente não pode agora dizer que o desfecho do processo poderia ter sido diferente se tivesse tido oportunidade de contraditar os argumentos do Ministério Público, quando é certo que esses argumentos não foram valorados ex novo na decisão reclamada.”
No Acórdão n.º 364/13 também se indeferiu a arguição de nulidade, com fundamento na não audição do reclamante sobre o conteúdo da resposta apresentada pelo Ministério Público no incidente de reclamação de decisão sumária em recurso constitucional, com a seguinte fundamentação:
“6. O recorrente vem arguir a nulidade do Acórdão n.º 191/2013, decorrente, em seu entender, da nulidade processual cometida nos autos ao omitir-se, em momento prévio à prolação daquele acórdão, a notificação ao recorrente da resposta apresentada pelo Ministério Público à reclamação por aquele apresentada da decisão sumária que negou conhecimento ao recurso.
7. Como fundamento da nulidade invoca, em síntese, a preterição do processo equitativo em recurso, por privação do direito ao contraditório e conhecimento prévio do articulado apresentado pelo Ministério Público. Tal fundamento não integra, porém, as causas de nulidade da sentença previstas no artigo 668.º do Código de Processo Civil.
8. Sustenta, todavia, o reclamante que a decisão proferida, bem como todo o processado prévio conducente à mesma, padece de nulidade, por preterição de garantias de defesa e direitos constitucionalmente tutelados ao arguido, consagrados no artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 69.º da LTC, e ainda o artigo 20.º, n.os 1 e 4 da Constituição, bem como o artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Do teor do requerimento resulta que o reclamante se insurge contra o facto de não lhe ter sido dada oportunidade de conhecer e se pronunciar sobre a resposta, junta pelo Ministério Público, à reclamação para a conferência apresentada pelo reclamante, omissão que colide com o processo justo e equitativo.
A pronúncia do Ministério Público em referência surgiu, todavia, na sequência da reclamação apresentada pelo reclamante, apresentando-se, assim, em resposta à mesma, e sendo delimitada pelo respetivo objeto. Nada de novo foi invocado que pudesse surpreender o reclamante ou prejudicar a defesa do arguido. E sendo assim, nenhuma omissão ocorreu de um ato prescrito por lei capaz de influir no exame ou decisão da causa.
Tão-pouco se pode afirmar a ocorrência de qualquer violação do princípio do contraditório, ou do processo justo e equitativo, uma vez que da intervenção do Ministério Público não decorreu qualquer questão nova relativamente à qual o reclamante tivesse ficado impossibilitado de controlar e responder.
Improcede, portanto, a nulidade invocada.”
E no Acórdão n.º 805/13 que igualmente indeferiu a arguição de nulidade, com fundamento na não audição do reclamante sobre o conteúdo da resposta apresentada pelo Ministério Público no incidente de reclamação de decisão sumária em recurso constitucional, com a seguinte fundamentação:
“5. Invoca o requerente, como fundamento da sua arguição de nulidade, a violação do princípio do contraditório e do direito de acesso aos tribunais, decorrente da circunstância de não ter sido notificado da resposta do Ministério Público à sua reclamação, antes de proferida a decisão.
Em tal resposta, porém, não foi suscitada qualquer questão nova, relativamente à qual o requerente não tivesse tido oportunidade de se pronunciar.
Pelo contrário, o Ministério Público limitou-se a responder aos argumentos aduzidos na reclamação, desta forma exercendo o seu direito ao contraditório relativamente a tal peça processual.
Não foi, por isso, cometida qualquer nulidade processual, como bem decidiu o Acórdão n.º 188/2013 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt, onde poderão ser encontrados todos os acórdãos doravante indicados), a propósito de questão idêntica.
Na verdade, a resposta do Ministério Público corresponde ao “fecho da dialética” - utilizando a expressão do Acórdão n.º 255/2003 - sobre as questões apresentadas na reclamação.
Tal como refere o Acórdão n.º 568/01 - a propósito de questão com algum paralelismo com a presente - o exercício do direito ao contraditório, numa lógica de equilíbrio entre as partes, encontrar-se-ia desvirtuado se, após a resposta do Ministério Público, se concedesse ao requerente nova possibilidade de se pronunciar sobre a questão que ele próprio suscitara. É que tal resposta consubstancia o elo final da contraposição dialética de argumentos entre a parte que veio arguir o vício (o ora requerente) e a parte contrária, cuja posição é atingida por aquela arguição.
Pelo exposto, não existe qualquer violação do princípio do contraditório, como corolário do direito de acesso aos tribunais, na vertente do direito a um processo equitativo, razão que motiva o indeferimento da presente arguição de nulidade.”
Em todas estas decisões o Tribunal Constitucional sustentou, fundamentada mente, que não é violado o princípio do contraditório quando não é dada oportunidade ao arguido para se pronunciar sobre a resposta apresentada pelo Ministério Público a pretensão da iniciativa do arguido, salvo se nessa resposta se suscitarem questões novas sobre as quais o arguido não teve oportunidade de se pronunciar.
Essas decisões foram tomadas perante situações paralelas com aquela a que se reporta a norma cuja fiscalização de constitucionalidade foi requerida no presente recurso – reclamação para a conferência deduzida pelo arguido de despacho do relator em recurso penal – sendo a fundamentação apresentada perfeitamente transponível para a decisão de constitucionalidade daquela norma.
Também relativamente à questão de constitucionalidade colocada neste recurso se pode dizer que, no caso dos presentes autos, quem tomou inicialmente uma posição foi o próprio réu. E se o contraditório há de ser assegurado, nessa lógica de equilíbrio entre as partes, então, aqui, esse princípio há de ser assegurado, dando vista ao Ministério Público, como aconteceu, sob pena de, dando de novo ao réu idêntica possibilidade (partindo do princípio de que haveria dispositivo legal a permiti-lo), o equilíbrio se revelar acentuada e desproporcionadamente desigual relativamente ao Ministério Público (Acórdão n.º 568/01). E que no âmbito do processo penal, o Ministério Público é sujeito processual em qualquer das instâncias jurisdicionais, e, em ordem ao princípio da parificação do posicionamento jurídico da acusação e da defesa (e sem prejuízo dos seus deveres de objetividade), tem o direito processual de responder aos requerimentos do arguido-recorrente, designadamente quando esteja em causa a reclamação da decisão sumária do relator. E não é o simples exercício desse direito processual, mesmo quando o Ministério Público pugne pela manutenção do julgado, contraditando a argumentação do reclamante, que pode conferir à contraparte o direito de resposta, quando é certo que aquela intervenção processual é precisamente justificada pela necessidade de incrementar o princípio material da igualdade das armas (Acórdão n.º 68/11). E ainda que o exercício do direito ao contraditório, numa lógica de equilíbrio entre as partes, encontrar-se-ia desvirtuado se, após a resposta do Ministério Público, se concedesse ao requerente nova possibilidade de se pronunciar sobre a questão que ele próprio suscitara. É que tal resposta consubstancia o elo final da contraposição dialética de argumentos entre a parte que veio arguir o vício e a parte contrária, cuja posição é atingida por aquela arguição (Acórdão n.º 805/13).
Não incluindo a norma cuja inconstitucionalidade foi invocada neste recurso perante o Tribunal Constitucional qualquer dado no sentido de que a resposta apresentada pelo Ministério Público incluía a suscitação de uma questão nova sobre a qual o arguido não teve oportunidade de se pronunciar, a fundamentação contida nos citados Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 568/01, 68/11, 364/13 e 805/13 revela-se perfeitamente suficiente para justificar a utilização da faculdade prevista no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, no sentido de, sumariamente, ser proferida decisão sumária que não julgue inconstitucional a interpretação normativa, segundo a qual o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não se aplica à resposta do Ministério Público à reclamação para a conferência de despacho do relator proferido em recurso penal, remetendo-se para a fundamentação constante daqueles arestos.
Assim, não se verifica que a decisão reclamada sofra de omissão de pronúncia, fundamentação inadequada ou contraditória, devendo a reclamação apresentada ser indeferida.
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Decisão
Pelo exposto, indefere-se a reclamação apresentada por A..
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Custas da reclamação pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (artigo 7.º, do mesmo diploma).
Lisboa, 6 de Março de 2014.- João Cura Mariano – Ana Guerra Martins – Joaquim de Sousa Ribeiro.