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Processo nº 648/99
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Central Administrativo, proferiu o Relator a seguinte Decisão Sumária:
'1. C. M., com os sinais identificadores dos autos, veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional, 'ao abrigo do disposto nas alíneas a), b) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional', dos acórdãos do Tribunal Central Administrativo, de 22 de Julho de 1999 e de 30 de Setembro de 1999, invocando que o 'recurso fundamenta-se no facto de a interpretação e aplicação das normas constantes nos n 5 e nº 6 do artigo 145º do Código de Processo Civil, no nº 1 do artigo 76º e no nº 1 do artigo 113º, ambos da L.P.T.A., feita nos Acórdãos recorridos, se traduzir na violação do Princípio da Igualdade, previsto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, do Princípio do Processo Devido e Princípio do Direito à Tutela Jurisdicional Efectiva, previstos nos nºs
4 e nº 5 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, e dos Direitos Fundamentais da dignidade da pessoa humana e do desenvolvimento da sua personalidade, nos termos do artigo 26º da Constituição da República Portuguesa, e também dos Direitos Fundamentais ao trabalho e à habitação, previstos respectivamente nos artigos 58º e 65º da Constituição da República Portuguesa'. No primeiro acórdão foi decidido:
'1º Rejeitar o recurso interposto, em 17-3-1999, da sentença de fls. 36 a 53, dos autos, por intempestividade, e não cumprimento do artº 145º, nº 6, do CPC.
2º Não admitir o recurso de 22-4-1999, em relação ao despacho de 12-4-1999, por o mesmo ter sido interposto mediante alegações intempestivas'. O segundo acórdão, rectificando, em parte, aquele primeiro, de 22 de Julho de
1999, desatendeu 'as nulidades arguidas, pelo requerente'.
2. Prima facie, tem de afastar-se a invocação das alíneas b) e f), do nº 1, do artigo 70º, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, por não caber no caso a recusa de aplicação de qualquer norma, com fundamento em inconstitucionalidade, ou a aplicação de norma ao redor de uma qualquer questão de ilegalidade (derivada de
'violação de lei com valor reforçado' ou de contradição entre diplomas legais de região autónoma e da República). Todo o recurso, pois, é concebido pelo recorrente na base de se ter aplicado nos acórdãos recorridos 'inconstitucionalmente ...' as normas atrás identificadas, portanto, o fundamento adequado é o da alínea b), nº 1, do artigo 70º. Só que não se verifica aqui um dos seus requisitos processuais específicos, o da suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa durante o processo, ou seja, uma arguição de inconstitucionalidade reportada àquelas indicadas normas dos artigos 133º, nº 1, da LPTA e do artigo 145º, nºs 5 e 6, do Código de Processo Civil. Com efeito, e ponderando as peças processuais apresentadas pelo recorrente e que tem a ver com aquelas normas, ele reporta-se sempre à decisão jurisdicional, dizendo: 'o Juiz 'a quo', para além de violar o disposto no número 6 do artigo
145º do Código de Processo Civil, violou também o Direito Fundamental à Tutela Jurisdicional Efectiva, previsto no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa'; 'o Tribunal 'a quo' não mais faz do que denegar ao ora Recorrente o seu legítimo direito de recorrer de uma decisão que lhe era desfavorável'; deve o despacho recorrido ser revogado 'por violação das normas constantes do número
6 do artigo 145º do Código de Processo Civil e do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa' (texto das alegações do recurso e conclusões E), F)) e H), em que o recorrente impugnou o 'douto despacho de 12 de Abril de 1999, proferido no decurso do processo nº 113/99, da 1ª secção do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que declarou extinto o seu direito de recorrer da decisão desse douto Tribunal que indeferiu a sua pretensão de suspender o acto administrativo proferido pelo Exmº Senhor Director Regional de Faro do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras)'. Depois, na arguição de nulidade do acórdão recorrido de 22 de Julho de 1999, o recorrente repete as mesmas posições, voltando a reportar as violações do artigo 20º da Constituição à decisão do
'Juiz 'a quo', acrescentando ainda - 'mesmo que se entendesse que seria de aplicar aqui o disposto no número 1 do artigo 113º da L.P.T.A.', tal como se expressa - a violação do 'princípio constitucionalmente consagrado da Igualdade, ao permitir que, no mesmo tipo de processo, as exigências formais fossem diferentes, negando igualmente o direito a um processo justo e devido' (mas continua o recorrente a referir-se à aplicação pelas instâncias do nº 1 do artigo 113º da LPTA, sendo ela a violar aquele princípio). Quando o recorrente invoca que 'interpôs um recurso de agravo, que como tal foi aceite em 22-4-1999 pelo Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa' e que 'negar ao ora Requerente a interposição de um recurso de agravo em processo administrativo, nas circunstâncias referidas, é negar-lhe o direito a um processo justo e devido, e constitui uma violação ao número 4 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, e é uma decisão que lhe nega igualmente o seu direito à tutela jurisdicional efectiva, da previsão do número 5 do mesmo artigo', está uma vez mais a pôr em causa a própria decisão. Por consequência, em parte alguma se detecta o levantamento de uma questão de inconstitucionalidade por as identificadas normas serem portadoras de um vício de inconstitucionalidade ou por serem interpretadas nos acórdãos recorridos com um determinado sentido que preencheria tal vício. Sempre o recorrente posiciona a censura jurídico-constitucional em direcção à própria decisão jurisdicional, por esta envolver directamente a violação de normas ou princípios constitucionais. Ora, é sabido que a questão de inconstitucionalidade tem de adequadamente atingir a norma ou uma sua interpretação e não o acto jurisdicional ou o acto administrativo que a teria aplicado com violação da Constituição. Por fim, diga-se ainda que também não se verifica um dos requisitos processuais do tipo de recurso de constitucionalidade em causa - a aplicação de norma arguida de inconstitucionalidade durante o processo -, quanto à norma do artigo
76º da LPTA, pela simples razão de que ela não foi efectivamente aplicada nos acórdãos recorridos. Estes decidiram a causa numa base puramente processual e não chegaram ao fundo, quanto ao pedido de suspensão da eficácia do acto administrativo impugnado pelo recorrente (saber se o acto poderia ou não ver suspensa a sua eficácia, nunca foi decidido, expressa ou implicitamente, nos acórdãos recorridos). Com o que, por falta dos apontados requisitos processuais, não se pode tomar conhecimento do presente recurso.
3. Termos em que, ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, aditado pelo artigo 2º da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, e na redacção do artigo 1º da Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro, não tomo conhecimento do presente recurso e condeno o recorrente nas custas, com a taxa de justiça fixada em cinco unidades de conta.' B. Veio então o recorrente apresentar 'RECLAMAÇÃO, nos termos dos nº 3 e nº 4 da Lei do Tribunal Constitucional e da Fiscalização da Constitucionalidade, contra a decisão sumária proferida a 17 de Novembro de 1999', pedindo que este Tribunal aprecie 'as questões de inconstitucionalidade apresentadas, com todos os efeitos legais'. Para o efeito o reclamante limitou-se a invocar que 'interpôs este recurso para o Tribunal Constitucional porque, em seu entende, nas decisões recorridas os Meritíssimos Juízes 'a quo' aplicaram inconstitucionalmente, em função do caso concreto, as normas por si extraídas dos preceitos do nº 5 e nº 6 do artigo 145º do Código de Processo Civil, do nº 1 do artigo 76º e do nº 1 do artigo 113º, ambos da L.P.T.A.', pois tais normas, 'quando aplicadas ao caso concreto, são violadoras do Princípio da Igualdade, previsto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, do Princípio do Processo Devido e Princípio do Direito à Tutela Jurisdicional Efectiva, previstos nos nº 4 e nº 5 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, e dos Direitos Fundamentais da dignidade da pessoa humana e do desenvolvimento da sua personalidade, nos termos do artigo
26º da Constituição da República Portuguesa, e também dos Direitos Fundamentais ao trabalho e à habitação, previstos respectivamente nos artigos 58º e 65º da Constituição da República Portuguesa'. C. O recorrido Director Regional de Faro do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras não respondeu à reclamação. D. Tudo visto, cumpre decidir. Aquela Decisão Sumária não sai minimamente beliscada da reclamação apresentada pelo recorrente, no que toca às normas questionadas dos nºs 5 e 6 do artigo 145º do Código de Processo Civil e 'quanto à norma do artigo 76º da LPTA', nem este demonstra que tenha dado satisfação aos requisitos processuais em falta no tipo de recurso de constitucionalidade de que se serviu - o da alínea b), nº 1, do artigo 70º já que, relativamente às alíneas a) e f) do mesmo nº 1, teria sempre que afastar-se liminarmente a sua invocação. Com efeito, o reclamante não diz onde e como teria suscitado uma questão de inconstitucionalidade normativa durante o processo - em que peça processual e de que modo o teria feito -, nem contraria a afirmação de que, 'quanto à norma do artigo 76º da LPTA', ela não foi efectivamente aplicada nos acórdãos recorridos. Admitindo, no tocante à norma do nº 1 do artigo 113º daquela mesma Lei, que houvesse da parte do recorrente uma arguição de inconstitucionalidade normativa
- o que se admite por mera hipótese -, o certo é que tal norma não foi aplicada, a propósito do recurso interposto da sentença de fls. 36 a 53 dos autos, pois que o tribunal recorrido reconheceu que 'só por lapso manifesto se invocou o artº 113, nº 1, da LPTA, para se considerar intempestivo o recurso' (acórdão de
30 de Setembro de 1999, que acabou por rectificar mesmo o acórdão anterior de 22 de Julho do mesmo ano), e, por outro lado, quanto ao recurso relativo ao despacho de 12 de Abril de 1999, é inútil tratar da questão respeitante a esse artigo, pois, qualquer que fosse a decisão dada à questão, sempre subsistiria a rejeição daquele outro recurso (por incumprimento do artigo 145º, nºs 5 e 6, citado). Tanto basta para concluir que é infundada a reclamação, não havendo que alterar a Decisão Sumária reclamada. E. Termos em que, DECIDINDO, indefere-se a reclamação e não se toma conhecimento do recurso, condenando-se o reclamante nas custas, com a taxa de justiça fixada em quinze unidades de conta. Lisboa, 3 de Fevereiro de 2000 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa