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Proc.Nº 589/95 Sec. 1ª Rel. Cons. Vitor Nunes de Almeida Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional: I - RELATÓRIO:
1 - Nos presentes autos em que C... propôs contra o B..., SA, uma acção declarativa de condenação em processo comum na forma sumaríssima, foi elaborada pelo relator, a fls.94 e segs., uma exposição no sentido do não conhecimento do recurso de constitucionalidade interposto pelo autor e recorrente. O recorrente veio responder à exposição para além do prazo legal de 5 dias, mas invocou para justificar o incumprimento do prazo a existência de justo impedimento. Pelo Acórdão nº 878/96, de 9 de Julho de 1996, decidiu-se confirmar o despacho do relator que considerou não se verificar o justo impedimento, acórdão este que transitou em julgado, pelo que ficou definitivamente assente que a resposta do recorrente à exposição prévia foi extemporânea.
2 - A fls. 184 e 185, o recorrente veio pedir o apoio judiciário, pedido este que, por despacho do relator foi indeferido. O Tribunal, por acórdão de 14 de Janeiro de 1997, nº 12/97, decidiu revogar aquele despacho e admitir liminarmente o pedido de apoio judiciário. Na sequência deste acórdão, o recorrente veio atravessar um requerimento (a fls.221) a pedir a revogação do Acórdão nº878/96 ou, em alternativa, a reforma desse acórdão com fixação da taxa de justiça no mínimo legal e a baixa dos autos ao tribunal da procedência - requerimento que ainda não obteve decisão.
3 - A fls. 234, vº, foi levantada a questão de falta do duplicado para arquivo, tendo o Ministério Público promovido que o duplicado fosse extraído pela secção
à custa do recorrente, nos termos do nº5 do artigo 152º do CPC.
4 - A fls.235, o relator determinou que se solicitasse à Ordem dos Advogados informação sobre a situação profissional do recorrente. A Ordem respondeu (fls. 237), informando que o recorrente Dr. C... está suspenso desde 10 de Novembro de 1995. Na sequência desta informação foi o recorrente notificado para constituir mandatário judicial, nos termos dos artigos 32º a 35º da CPC. Notificado desde despacho, o recorrente reclamou dele (fls. 239) para a conferência, juntando um «parecer» de sua própria autoria sobre a matéria. Também aqui a secção de processos informou da falta de duplicado para arquivo, tendo o Ministério Público promovido no mesmo sentido do que promovera ao constatar-se a anterior falta do duplicado. Seguidamente (fls. 259), C... veio apresentar um pedido de correcção do seu requerimento de 30 de Janeiro (fls.221) e com tal pedido juntar um oficio da Assembleia da República, o que ficou nos autos. Por despacho de 15 de Julho de 1997 foram pedidas informações sobre a situação económica do requerente e, quanto à questão dos duplicados foi proferido um despacho que consta de fls. 264 a 267, dos autos, no sentido de mandar extrair cópia dos duplicados em falta, pagando o responsável o triplo das despesas a que isso der lugar.
5. - C..., notificado deste último despacho veio a fls.269 dizer que:
'1 - A locução 'se a parte não juntar o duplicado', no nº 5 do art. 152º do Cód. Proc.Civil, deverá, se bem se julga, ser entendida no sentido de 'se não o juntar, depois de notificada oficiosamente pela secretaria', nos termos do nº 3 do mesmo artigo, sob pena de interpretação inconstitucional da norma daquele nº
5, por violação da garantia da proibição do excesso (C.R.P., arts. 18º et al.). Na verdade, seria notória a desproporção entre a sanção aplicável, nos termos do nº 3, a uma falta maior: todos os duplicados e cópias ante-exigidos, e a sanção
- a não aceitar-se o entendimento acima exposto - visando uma falta menor: o simples duplicado para arquivo.
2 - Além disso, e principalmente, acontece que do 'parecer' em causa se encontra uma cópia em arquivo no Gabinete do Exmo. Presidente desse Alto Tribunal desde Abril último, conforme se alcança do ofício do Exmo. Chefe do Gabinete datado de
8 desse mês dirigido ao aqui Recorrente (que, se assim solicitado, poderá apresentar cópia do mesmo), cópia aquela que, se bem se julga, preencherá para todos os efeitos os requisitos do 'duplicado para arquivo do Tribunal' preceituado. Termos em que REQUER se digne V. Excelência:
1º - Dispensar o Recorrente da apresentação de nova cópia do seu 'parecer' de que se trata - visto encontrar-se já uma em arquivo nesse Alto Tribunal -, por identidade de razão (princípio da igualdade) com o preceituado no nº 4 do art.
152º do Cód.Proc.Civil; ou,
2º - caso assim não se entenda, ordenar à Secretaria para notificar o Recorrente para apresentar a cópia do documento considerada em falta, por maioria de razão
(princípio da proporcionalidade, proibição do excesso) relativamente ao preceituado no nº 3 do mesmo artigo.'
6. - Entretanto, foram juntos dois ofícios da PSP de Viana do Castelo e da GNR do Porto, que informam sobre a situação económica do requerente de apoio judiciário. O Ministério Público teve vista dos autos e sobre estas questões exarou o seguinte parecer:
'Através do requerimento de fls. 269, limita-se o recorrente a reiterar o seu entendimento e a manifestar discordância com o já decidido pelo Exmo.Conselheiro Relator - o que obviamente é totalmente desprovido de efeitos processuais e não obsta a que se forme caso julgado formal sobre o decidido nos autos. A situação económica e profissional do requerente do benefício do apoio judiciário e do seu agregado familiar não justificam, a nosso ver, que lhe deva ser concedido para acção sumaríssima com o valor de 19.076$50, em que aparece inserido o presente recurso de constitucionalidade, pelo que desde já se deduz oposição à concessão do pretendido benefício.
7. - Estando ainda pendente a decisão sobre a questão do mandato judicial, o recorrente veio aos autos juntar os duplicados em falta, pelo que, em 5 de Novembro de 1997, abrangendo a questão dos duplicados e do pedido de apoio judiciário, foi proferido pelo relator um despacho, que transitou em julgado e pelo qual se deu como findo o incidente relativo aos duplicados e se decidiu não conceder ao recorrente o apoio judiciário que tinha pedido.
8. - Sendo este o estado actual dos presentes autos, verifica-se que estão prontos para ser decididas as seguintes questões:
- o pedido de revogação ou, em alternativa, de reforma do Acórdão nº 878/96;
- a reclamação para a conferência do despacho que notificou o recorrente para constituir mandatário, ou seja, a obrigatoriedade do mandato ser exercido por advogado, quando a parte, sendo licenciado em direito, não está inscrita na Ordem dos Advogados ou tem a sua inscrição suspensa. Cumpre, portanto, apreciar e decidir as questões acima equacionadas. II - FUNDAMENTOS:
9 - A primeira das questões referidas tem manifestamente de improceder. O Acórdão nº 878/96 não pode ser revogado nem reformado, uma vez que o mesmo transitou em julgado, pelo que se indefere o requerimento de fls. 221 a 228.
10. - Importa agora considerar a segunda questão a decidir: a reclamação para a conferência do despacho do relator que determinou a notificação do recorrente para constituir mandatário, face à informação da Ordem dos Advogados de que a sua inscrição estava suspensa desde 10 de Novembro de 1995. A Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção actual) impõe o patrocínio judiciário obrigatório nos recursos interpostos de decisões de outros tribunais para o Tribunal Constitucional - artigo 83º. É a questão da constitucionalidade desta norma que o recorrente suscita na sua reclamação. Ora, esta matéria foi já apreciada e decidida por vários acórdãos deste Tribunal
(vejam-se os acórdãos nº 252/97, in Diário da República, 2ª Série, de 20 de Maio de 1997; acórdãos nºs 294/97, e 332/97, ainda inéditos). No acórdão nº 332/97, processo em que é parte o ora reclamante, escreveu-se:
'Se é certo que existem ordenamentos jurídicos que não consagram soluções de patrocínio judiciário obrigatório, em Portugal é tradicional a solução oposta, consagrada nas leis de processo pré-constitucionais e que a Constituição da República Portuguesa de 1976 não imfirmou. Tão-pouco sofrem de inconstitucionalidade o art.83º, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional e outras normas das leis processuais que impõem a constituição de advogado (por exemplo, arts. 32º, nº1, e 60º do Código de Processo Civil; cfr. ac. nº 245/97, inédito). A circunstância de o litigante ser licenciado em Direito não lhe dá automaticamente o direito de pleitear por si, desacompanhado de advogado, como se julgou nos recentes acórdãos nºs 252/97 e 294/97, ainda inéditos.' Não estão, assim, afectadas de inconstitucionalidade quer as normas do artigo
83º, nº1, da Lei do Tribunal Constitucional quer as normas processuais que impõem a constituição de advogado (v.g., os artigos 32º, nº1 e 60º do Código de Processo Civil -cfr. o Acórdão nº 245/97, in 'Diário da República', IIª Série, de 16 de Maio de 1997). Neste sentido, vai a própria revisão constitucional levada a cabo através da Lei nº 1/97, de 20 de Setembro, ao aditar à Constituição o artigo 208º, sob a epígrafe 'Patrocínio forense' e o seguinte teor: 'a lei assegura aos advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato e regula o patrocínio forense como elemento essencial à administração da justiça' (sublinhado agora). Parece claro que a Constituição reconhece expressamente que a necessidade de recurso aos advogados devidamente inscritos na respectiva Ordem, em condições de exercerem o mandato profissional, assenta em razões ponderosas que têm como finalidade a salvaguarda de interesses de ordem pública, como sejam, os da realização da justiça e do direito e a protecção dos interesses dos patrocinados. Inexiste assim, violação do artigo 20º da Constituição, pois o acesso aos tribunais continua possível através da nomeação de um patrono, assim como inexiste qualquer violação do princípio da igualdade uma vez que não há qualquer privilegiamento da classe dos advogados inscritos na Ordem, mas sim apenas se pretende com tal exigência a defesa dos interesses na realização da justiça e do direito que só poderão efectuar-se através de profissionais devidamente habilitados e qualificados. Tem assim de se indeferir a presente reclamação para a conferência, confirmando-se o despacho reclamado e renovando o prazo de 15 dias para constituição de mandatário nos presentes autos, sob a cominação legal - artigos
32º e 33º do Código de Processo Civil. III - DECISÃO: Nos termos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir o requerimento de fls. 221, pedindo a revogação ou a reforma do Acórdão nº 878/96 e desatender a reclamação para a conferência relativa ao despacho que determinou ao reclamante, Dr. C... a constituição de mandatário judicial. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 10 (dez UC's.). Lisboa, 13 de outubro de 1999 Vítor Nunes de Almeida Alberto Tavares da Costa Maria Helena Brito Artur Maurício Paulo Mota Pinto (com a declaração de que não tomaria conhecimento da reclamação, por o reclamante não Ter constituído advogado) José Manuel Cardoso da Costa