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Proc. nº 371/97
3ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional I
1.1.- S..., Lda., foi condenada, em processo contra-ordenacional, por decisão do Conselho Directivo do Instituto do Trabalho Portuário, de 24 de Outubro de 1991, na coima de três milhões e quinhentos mil escudos (posteriormente reduzida, por perdão, a três milhões de escudos), por violação do disposto, em conjugação, nos artigos 1º, nº 1, 2º, 4º, 6º e 42º, alínea a), do Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio. Considerou-se, então, que, em 19 de Junho de 1990, em terminal situado na zona portuária sob jurisdição da Administração do Porto de Lisboa, a arguida, no
âmbito da operação de descarga de melaço de um navio tanque, prestara assistência integrada no conceito de operações portuárias de conferência e superintendência a que se refere o nº 1 do artigo 1º daquele diploma (bem como a cláusula 3ª, nº 5, do anexo ao CCT de 1990, dos Trabalhadores Portuários de Lisboa), sem para o efeito se encontrar licenciada como operador portuário no porto de Lisboa, ou qualquer outro, de acordo com o preceituado nos referidos artigos 2º, 4º e 6º do mesmo texto legal. Interposto recurso pela interessada para o Tribunal Judicial da comarca de Almada, por decisão de 15 de Maio de 1992, foi o recurso julgado procedente e, consequentemente, absolvida a arguida. Entendeu-se, com base no mesmo suporte fáctico, que a situação em apreço consubstancia a excepção prevista na alínea f) do nº 1 do artigo 5º do citado Decreto-Lei nº 151/90, dada a natureza do melaço, considerado substância nociva, razão pela qual não se tornava obrigatória a intervenção de um operador portuário. A sentença veio, no entanto, a ser revogada por acórdão de 4 de Novembro de
1992, do Tribunal da Relação de Lisboa, na sequência de recurso interposto pelo Ministério Público, o qual manteve a decisão inicial: para a Relação, o melaço não é um produto químico e, assim, independentemente de ser qualificado como nocivo do ponto de vista da protecção das águas marinhas e do litoral ou, até, de exigir medidas especiais de segurança e de actuação nas suas cargas e descargas, a operação portuária executada pela recorrida não cabe na previsão da alínea f) do nº 1 do artigo 5º do Decreto-Lei nº 151/90 - que, por ser excepção, não contempla interpretação analógica - nem em qualquer das excepções à regra do artigo 4º, pelo que a operação em si não estava isenta de obrigatoriedade de intervenção de operadores portuários.
1.2. - Posteriormente - em 10 de Outubro de 1995, subentendendo uma situação subsumível à parte final do nº 2 do artigo 2º do Código Penal e do nº 2 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro - requereu a arguida a extinção da instância e a consequente libertação da garantia bancária prestada a favor do Instituto do Trabalho Portuário, para o efeito invocando aqueles preceitos legais e o disposto no artigo 29º, nº 4, da Constituição da República
(CR), por um lado, e, por outro, a nova legislação entrada em vigor sobre o regime jurídico do trabalho portuário - aprovado pelo Decreto-Lei nº 280/93, de
13 de Agosto que, nomeadamente, revogou o Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio
[alínea b) do seu artigo 24º] – e sobre o regime da operação portuária - Decreto-Lei nº 298/93, de 28 de Agosto, que, ao definir as respectivas condições de acesso e de exercício, excluíu do seu âmbito de aplicação o exercício da actividade de superintendência de cargas, bem como de exames periciais que tenham por objecto cargas a embarcar ou desembarcadas, ainda que sejam realizados na zona portuária (nº 2 do artigo 1º). A pretensão da arguida foi, no entanto, por decisão de 6 de Março de 1996, aclarada em 30 de Abril seguinte, do Juiz do Tribunal de Pequena Instância Criminal de Almada, ,desatendida, dado se considerar que a conduta da arguida não deixou de constituir ilícito contra-ordenacional, atento o disposto na alínea b) do artigo 2º do Decreto-Lei nº 298/93.
1.3.- Inconformada, recorreu a arguida para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 11 de Junho de 1997, lhe negou provimento, após concluir que nenhum dos actos em si praticados, e pelos quais foi punida, se encontra
'despenalizado'.
É deste último aresto que a interessada recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, pretendendo ver apreciada a constitucionalidade da norma constante da alínea e) do nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 298/93, de 28 de Agosto, na interpretação dada na decisão recorrida, a qual, violando os parâmetros fixados nas alíneas b), d) e g) do artigo 1º da Lei nº 1/93, de 6 de Janeiro (lei de autorização legislativa daquele decreto-lei), criou norma que, restringindo a sua amplitude, infringe directamente 'o princípio da conformidade dos decretos–leis autorizados com as respectivas leis de autorização, vertido no nº
2 do artigo 168º da Constituição da República' (hoje, nº 2, do artigo 165º).
2.- Recebido o recurso, alegou oportunamente a recorrente que assim concluíu:
'1º A recorrente foi condenada, no âmbito do DL. 151/90 de 15 de Maio, por ter exercido a actividade portuária de conferência/superintendência sem estar licenciada para tal efeito.
2º A Lei de Autorização nº 1/93 de 6 de Janeiro, delimita os âmbitos de matéria a regular pelos Decretos Leis Autorizados, prescrevendo a liberalização da actividade portuária mormente em operações incompatíveis com a intervenção de empresas de estiva.
3º O Decreto-Lei nº 298/93 de 28 de Agosto, elaborado mediante a autorização legislativa constante do artº 1 da mesma Lei de Autorização, destina-se a regular a matéria respeitante à operação portuária dentro dos parâmetros definidos pela Lei habilitante.
4º Da interpretação da alínea a) do artº 2º do DL. 298/93 resulta que o âmbito do conceito de operação portuária é mais abrangente englobando outras operações portuárias para além da mera movimentação de cargas.
5º Apenas o exercício da operação de movimentação de cargas sem estar licenciado
é objecto de sanção contra-ordenacional pelo artº 31 nº 1 a) do mesmo diploma legal.
6º As actividades complementares das operações portuárias excepcionadas pelo nº
2 do artº 7 do Decreto-Lei nº 298/93 de 28 de Agosto, estão afastadas do Regime do Trabalho Portuário nos termos do nº 3 do artº 7º do mesmo Decreto.
7º O nº 2 do artº 1 do Decreto-Lei 298/93 de 28 de Agosto exclui, expressamente, do âmbito de aplicação do diploma as actividades de conferência/superintendência.
8º A realização de operação de descarga de produtos líquidos a granel através de condutas instaladas no navio encontra-se abrangida pela alínea e) do nº 2 do artº 7º DL.
9º A actividade de conferência/superintendência é complementar desta operação portuária e como tal isenta do Regime do Trabalho Portuário nos termos do nº 3 do artº 7º do mesmo Decreto.
10º A interpretação que considera não despenalizada a operação portuária de conferência/superintendência realizada como complementar da operação de descarga de produtos líquidos a granel através de condutas viola o princípio da conformidade dos Decretos-Leis autorizados face à Lei de Autorização, violando designadamente o disposto no artº 168º nº 2 da Constituição da República.
11º Ao negar a Aplicação no presente caso do Princípio da aplicação no tempo da Lei mais favorável, viola o disposto no artº 3º nº 2 do Dec.Lei 433/82 de 17 de Outubro.
12º Sendo que a norma criada com a interpretação impugnada viola designadamente o disposto no artº 4º do artº 29º e artº 18º da Constituição da República.
13º Deve, assim, ser revogada a decisão ora impugnada e substituída por outra que, interpretando a Lei nos termos pugnados pela recorrente, considere extinto o presente procedimento, ordenando-se a devolução da coima entretanto paga pela recorrente.' Por sua vez, contra-alegando, o Ministério Público formulou uma conclusão única, propugnando a negação de provimento ao recurso:
'A norma constante do artigo 7º, nº 2, alínea e), do Decreto-Lei nº 298/93, de
28 de Agosto, na interpretação acolhida na decisão recorrida, não viola os parâmetros fixados na respectiva lei de autorização (Lei nº 1/93, de 6 de Janeiro).' Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II
1.1.- O Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio - na vigência do qual ocorreram os factos que originaram o procedimento contra-ordenacional - emitido ao abrigo da competência legislativa própria do Governo [alínea a) do nº 1 do artigo 201º da CR, na redacção então em vigor], veio estabelecer o regime jurídico da operação portuária, definindo no nº 1 do seu artigo 1º, o que, para efeitos do diploma, se deve considerar como operações portuárias: 'todas as que requeiram as mercadorias desembarcadas ou para embarque directamente destinadas ou provenientes de transporte marítimo relativas à estiva, desestiva, conferência, carga, descarga, transbordo, movimentação e arrumação em cais, terraplanos ou armazéns, formação e decomposição de unidades de carga, recepção, armazenagem e entrega, bem como as operações complementares, designadamente as de superintendência de cargas, dentro da zona portuária'. O artigo 2º, subordinado à epígrafe 'Operador e trabalhador portuário', dispunha, no seu nº 1, serem operadores portuários 'as sociedades exclusivamente licenciadas para o exercício das operações portuárias referidas no artigo anterior'. O artigo 4º estabelecia o princípio de que só os operadores portuários podem executar as operações portuárias, salvo, embora, as excepções contempladas na sua segunda parte, e o artigo 6ºcuidava do licenciamento, dispondo no nº 1, depender o exercício da actividade portuária nos portos do continente de licenciamento nas condições do diploma em causa e dos respectivos regulamentos. No elenco das operações isentas de licenciamento figuravam as 'de carga, descarga e trasfega de produtos químicos cujas características imponham especiais regras de actuação e segurança' - cfr., a alínea f) do nº 1 do artigo
5º, que a decisão da 1ª instância entendeu ser aplicável ao caso vertente. De acordo com a alínea a) do artigo 42º do diploma, constitui contra-ordenação punida com coima até 500 contos, no caso de pessoas singulares, ou até 6000 contos, no caso de pessoas colectivas, a realização de operações portuárias, como tal definidas no artigo 1º, por quem não seja operador nem trabalhador portuário, devidamente licenciado, admitido e inscrito nos termos do diploma, fora das excepções dos artigos 5º, 13º, nº 3 e 23º. O diploma veio revogar (cfr. artigo 51º) o texto que anteriormente estabelecia as condições de acesso à actividade de operador portuário (o Decreto-Lei nº
282-B/84, de 20 de Agosto), com a confessada preocupação de, além do mais, manter a existência de empresas especialmente constituídas para a execução de operações portuárias (do respectivo preâmbulo) se bem que, como revela o transcrito no nº 1 do artigo 2º, impondo o licenciamento para o exercício da actividade portuária, com cariz exclusivo, desse modo vedando o estatuto a empresas titulares de cais privativos, com terminais especializados. Relativamente ao anterior regime, surpreende-se um grau de exigência maior no que ao licenciamento respeita, dado que, quer o Decreto-Lei nº 282-B/84, quer o que lhe antecedeu e por ele foi revogado - o Decreto-Lei nº 46/83, de 27 de Janeiro - permitiam a intervenção de operadores portuários em determinadas operações, numa assumida excepção ao regime geral, ditada pelo tipo de operações, a exigir elevado grau de especialização técnica e o recurso a pessoal dotado de correspondentes aptidões, conjunto de circunstâncias dificilmente congregável para a generalidade dos operadores (cfr., ainda, com interesse, o artigo 1º, nº 2, do Decreto-Lei nº 145-A/78, de 17 de Junho; ver, sobre a evolução legislativa sofrida, os pontos 3 e 4 do parecer da Procuradoria-Geral da República nº 39/95, publicado no Diário da República, II Série, de 26 de Agosto de 1998).
1.2.- Significativa alteração foi, no entanto, a que viria a ser autorizada pela Lei nº 1/93, que credenciou o Governo, a rever o regime jurídico do trabalho e das operações portuárias. Assim, ao abrigo dos artigos 164º, alínea e), 168º, nº 1, alíneas b), i), j) e z), e 169º, nº 3, da CR - na redacção então vigente - foi o Governo autorizado a rever o regime jurídico da operação portuária no sentido, nomeadamente, de:
'[...] b) Reconhecer às pessoas singulares ou colectivas, titulares de direitos de uso privativo de parcelas do domínio público, de concessões de exploração do domínio público, de concessões de serviço público ou de obras públicas na área portuária, a liberdade de exercício das operações de movimentação de cargas e de actividades conexas;
(...) d) Eliminar parcialmente as limitações ao exercício da operação portuária;
(...) g) Excepcionar da obrigatoriedade de realização por empresa de estiva as operações de movimentação de cargas cuja natureza se mostra incompatível com tal regime ..............................................' Ao abrigo desta autorização foram editados diplomas como o Decreto-Lei nº
280/93, de 13 de Agosto, sobre o regime jurídico do trabalho portuário, e o Decreto-Lei nº 298/93, de 28 de Agosto, que estabelece o regime da operação portuária (parcialmente alterado pelo Decreto-Lei nº 65/95, de 7 de Abril). Neste segundo texto, após o capítulo I cuidar do 'objecto e definições' e o seguinte do 'Regime geral da operação portuária', o capítulo III trata das
'Empresas de estiva' - por sua vez definidas, na alínea g) do artigo 2º, como
'as pessoas colectivas licenciadas para o exercício da actividade de movimentação de cargas na zona portuária'. Ora, o artigo 7º - que abre esse capítulo III - preceitua no seu nº 1, sob a epígrafe 'Âmbito de actividade', que a prestação de serviços de movimentação de cargas manifestadas nas áreas portuárias de prestação de serviço público é realizada por empresas de estiva, acrescentando-se no nº 2 um determinado elenco de operações não abrangidas por esse disposição, aí figurando - alínea e) - 'as operações de carga, descarga e trasfega de combustíveis e produtos petrolíferos e de outros produtos líquidos a granel, quando, neste último caso, se processe em terminais especializados'. Na intenção do legislador, como se retira do exórdio do segundo destes decretos-leis, terá estado a preocupação de, além do mais, pautar a intervenção das empresas de estiva em obediência às 'necessidades reais do bom funcionamento dos portos' permitindo-se, na prossecução desse intento, a dispensa de licenciamento como no caso da transcrita alínea e) do nº 2 do artigo 7º. Como já se ponderou a este respeito, é 'toda uma realidade de mundo do trabalho portuário e da gestão da mão-de-obra portuária que em bloco termina e é substituída por uma realidade nova [...]' (cfr. o acórdão deste Tribunal nº
119/95, publicado no Diário da República, II Série, de 7 de Abril de 1995).
2. - No dia 19 de Junho de 1990, a recorrente procedeu, no terminal da Shell Portuguesa, no sítio da Banática, área sob jurisdição da Administração-Geral do Porto de Lisboa, a diversas operações no âmbito da descarga de seis mil toneladas de melaço de um navio tanque: acompanhou detalhadamente toda a operação de descarga, a fim de anotar possíveis paragens , rupturas de condutas, derrames e tonelagem desembarcada; procedeu à mediação dos tanques receptores antes e após a descarga do produto; conferiu níveis dos tanques receptores, periodicamente, para verificação das quantidades de melaço recebidas; supervisionou os calados do navio antes e após o desembarque da mercadoria; verificou, de uma maneira geral, a forma como decorreu a descarga do produto. A recorrente não estava, como nunca esteve, licenciada como operador portuário no porto de Lisboa ou em qualquer outro. O Tribunal da Relação, por acórdão de 4 de Novembro de 1992, transitado em julgado, qualificou a actividade desenvolvida pela interessada como sendo de superintendência ['Não vem impugnada e está efectivamente correcta a qualificação da actividade desenvolvida pela arguida, no caso dos autos, como sendo de superintendência e, consequentemente, como operação portuária (cfr., artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 151/90, e cláusula 3ª, nº 5, do Anexo ao CTT
1990 dos Trabalhadores Portuários de Lisboa)]. E, igualmente, decidiu que a operação efectuada não integrava a previsão da alínea f) do nº 1 do artigo 5º do Decreto-Lei nº 151/90 - ou seja, não consistiu a mesma em carga, descarga ou trasfega de produtos químicos cujas características imponham especiais regras de actuação e segurança, o que vale dizer, à luz do quadro legal então vigente, não ser permitida a efectivação da operação pela ora recorrente. Não obstante, pretende esta que a alteração legislativa de 1993, ao eliminar a exigência de licenciamento para a actividade por si executada, significa a eliminação da correspondente contra-ordenação, aproveitando-lhe, nessa medida, considerando o disposto no nº 2 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 443/82, de 27 de Outubro, e no nº 2 do artigo 2º do Código Penal, subsidiariamente aplicável
(artigo 32º daquele diploma legal), sob a tutela constitucional do nº 4 do artigo 29º da Lei Fundamental. Com efeito, se, de acordo com o diploma de 1990, à data dos factos incluiam-se no elenco das operações portuárias as operações complementares, entre elas figurando as de superintendência de cargas que, em princípio, só podiam ser efectivadas por operadores portuários devidamente licenciados - o que não era o caso - pelo texto de 1993 manteve-se a necessidade do licenciamento para prestação ao público da actividade do movimento de cargas (como se exprime o artigo 4º), sem prejuízo das excepções enunciadas nas várias alíneas do nº 2 do artigo 7º, mas excluíu-se, expressamente, do âmbito do diploma, o exercício da actividade de superintendência de cargas, como se lê do nº 2 do artigo 1º.
3. – Observa o Ministério Público, a certo passo das suas alegações neste Tribunal que, no fundo, o que a recorrente pretende é que seja sindicada a interpretação feita pelo acórdão recorrido, uma vez que termina as suas alegações pedindo a revogação da decisão que impugna e a sua substituição por outra que, interpretando a lei nos termos por si pugnados, considere extinto o procedimento, ordenando-se a devolução da coima entretanto paga. Ora, como é manifesto, ao Tribunal Constitucional falece competência para apreciar a correcção normativa de uma interpretação feita a nível infraconstitucional pelo tribunal recorrido. O caso sub judice constitui, a esta luz, mais um exemplo da dificuldade tão amiudadamente sentida de estabelecer, de modo inequívoco e resposta fácil, a linha de demarcação entre uma questão de interpretação normativa constitucionalmente sindicável e um mero reexame da matéria fáctica apurada e do enquadramento jurídico que lhe foi dado nas instâncias, mormente no tribunal a quo. O que é tanto mais assim quanto é certo que, entre nós, não existem outros sistemas de reacção com características semelhantes aos recursos de queixa constitucional ou de amparo. Ora, na verdade, a tese da recorrente, ao sustentar a despenalização da sua conduta por força da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 298/93, de 28 de Agosto, e na medida em que intenta 'jogar' com dois regimes legais diferentes que se sucederam no tempo, não obstante ter transitado em julgado, oportunamente, a decisão proferida à luz do regime anterior, não é mais do que, mediante o artifício do recurso de constitucionalidade, obter uma reapreciação da situação que já fora objecto de julgado. Ou seja, uma vez que, na realidade, não se suscita questão de constitucionalidade normativa - ou de sua interpretação - não pode conhecer-se do objecto do presente recurso. III Em face do exposto, decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em _oito unidades de conta. Lisboa, 28 de Setembro de 1999- Alberto Tavares da Costa Vítor Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma Artur Maurício Maria Helena Brito José Manuel Cardoso da Costa