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Proc. nº 343/99 ACÓRDÃO Nº 279/00
1ª Secção Relator: Consº. Vítor Nunes de Almeida
(Consº Artur Maurício)
ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
1. – V... e outro propuseram no Tribunal Marítimo de Lisboa uma acção declarativa sob a forma sumária contra a M... – Sociedade Mútua de Seguros, pedindo a sua condenação no pagamento de determinada quantia a título de danos emergentes, acrescida de juros, e ainda no pagamento de uma indemnização por prejuízos sofridos com as deslocações ao tribunal e também pelas despesas de patrocínio.
A Mútua, apesar de regularmente citada, não contestou a acção em tempo.
Assim, foi proferida uma decisão que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a M... no pagamento da quantia peticionada a título de danos emergentes, mas absolvendo-a do pedido relativo aos lucros cessantes e às despesas com o patrocínio judiciário.
Para fundamentar esta condenação, o tribunal invocou e utilizou o disposto no artigo 784º, n.º2, do Código de Processo Civil (CPC), na redacção anterior ao Decreto-Lei nº 180/96, de 25 de setembro.
2. – Não se conformando com o assim decidido, a M... interpôs dois recursos para o Tribunal da Relação de Lisboa: um recurso de agravo, contra o despacho que tinha mandado desentranhar a contestação, e outro, de apelação, em que suscitou nas respectivas alegações a questão da inconstitucionalidade da norma do n.º 3 do artigo 784º do CPC, por violação do princípio da igualdade.
Na Relação, por acórdão de 17 de Abril de 1997, julgou-se procedente o recurso de agravo, pelo que foi determinada a integração nos autos da contestação da ré, julgando-se prejudicada a apelação.
Desta decisão recorreram os autores da acção para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), tendo o recurso sido admitido como agravo. Entretanto, a Mútua veio arguir a nulidade do despacho que admitiu o recurso, mas o relator na Relação decidiu indeferir a nulidade, mantendo o despacho de admissão do recurso. Tendo havido reclamação para o Presidente do STJ, o recurso veio a ser definitivamente admitido.
No STJ, o recurso veio a ser julgado procedente, tendo-se revogado o acórdão recorrido para ficar a subsistir o despacho da 1ª instância (que tinha mandado desentranhar a contestação), determinando-se a baixa do processo à Relação para conhecer da apelação.
A Relação, por acórdão de 22 de Outubro de 1998, decidiu negar provimento ao recurso de apelação, confirmando a decisão recorrida proferida na 1ª instância.
Desta decisão recorreu a Mútua para o STJ, voltando a sustentar nas respectivas alegações que tem a natureza de uma pessoa colectiva sui generis, já que não é sociedade comercial e, porque constituída antes de
1985, não segue sequer o regime das cooperativas.
Nessas alegações de revista, a Mútua voltou a suscitar, em termos idênticos ao que já tinha feito nas alegações de recurso para a Relação, a inconstitucionalidade do artigo 784º do CPC por estabelecer um regime duplamente discriminatório: cria um regime discriminatório entre pessoas colectivas sociedades comerciais e pessoas colectivas não comerciais; e, por outro lado, por meras razões económicas, coloca um réu ‘revel’ numa acção sumária em situação qualitativamente diferente do réu revel numa acção ordinária.
O recurso para o STJ não foi admitido, pelo que a Mútua veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão da Relação, para apreciar a questão da inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 784º do CPC, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de Setembro, por violação do princípio da igualdade.
3. - Neste Tribunal a Mútua apresentou alegações, que concluiu pela forma seguinte:
'1º - O nº. 3 do art. 784º do C.P.C. viola o art. 13º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que estabelece um regime discriminatório com base exclusivamente no valor, é inconstitucional, e como tal não pode ser aplicado.
2º - Estabelece um regime diferente para a acção com valor superior ou inferior a Esc.: 2 000 000$00, portanto, com base apenas no valor económico é materialmente inconstitucional.
3º - O nº. 3 do art. 784º do C.P.C. cria uma excepção ao princípio da cominação plena, relativamente às pessoas colectivas.
4º - Pessoa colectiva é um ente (não pessoa física), com personalidade jurídica, que engloba entre outras associações, o Estado, as Fundações e as Sociedades com personalidade jurídica.
5º - O nº. 3 do art. 784º do C.P.C. não distingue quaisquer categorias ou tipos de pessoas colectivas.
6º - Aplicando o nº. 3 do art. 784º do C.P.C. no sentido de que o termo 'pessoa colectiva apenas comporta um sentido restritivo (não englobando as sociedades comerciais) estabelece-se uma distinção discriminatória, desigualdade de tratamento materialmente infundada, sem qualquer fundamento sério, sem qualquer justificação objectiva e racional entre os diferentes tipos de pessoas colectivas.
7º - A recorrente é uma pessoa colectiva que não reveste qualquer dos tipos de sociedade comercial.
8º - A recorrente é uma pessoa colectiva no sentido restrito do termo.
9º - A interpretação dada ao nº. 3 do art. 784º do C.P.C. pelo Acórdão da Relação é materialmente inconstitucional.'
Contra-alegaram os recorridos concluindo nos seguintes termos:
'A – O presente recurso não deve ser admitido, porquanto tendo a recorrente esgrimindo, em sede de recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, a inconstitucionalidade do n.º. 2 do art. 784º, do Código de Processo Civil, na versão anterior ao actual, 'desvia-a' para o n.º. 3, do mesmo preceito legal.
B – As pessoas colectivas não são todas iguais: há as que têm escopo lucrativo – as sociedades comerciais; as que visam distribuir excedentes – cooperativas, sociedades cooperativas, onde se encontra a recorrente; e as que não visam obter nem uma coisa nem outra: as associações de bairro, do ambiente, recreativas, etc;
C – Bem esteve o douto acórdão recorrido em não considerar a recorrente nestas últimas, antes considerando que é uma sociedade cooperativa, que exerce o comércio dos seguros e com a denominação de Sociedade Mútua de Seguros de Responsabilidade Limitada, muito mais perto ou identificada, até, com as sociedades comerciais.
D – A jurisprudência tem entendido, e bem, que o legislador não quis proteger quem, exercendo uma actividade profissional que lhe confere réditos económicos (chamem-se lucros ou excedentes), tem obrigação de proteger os seus interesses em tempo útil;
E – Inconstitucional seria, isso sim, através da capa da igualdade formal, estabelecer um regime de excepção para a recorrente, e não o fazer para inúmeras pessoas singulares que vivem no limiar da dignidade humana e para quem o acesso à justiça, sendo por vezes mera garantia formal, não as liberta dos efeitos cominatórios de acções desta estirpe.'
Notificada para responder à questão prévia suscitada, nada disse a recorrente.
Colhidos os vistos legais, foi o processo discutido, tendo havido mudança de relator, por vencimento.
II – FUNDAMENTOS:
4. – Importa, antes de mais, apreciar a questão prévia suscitada pelos recorridos.
Sustentam os recorridos que a recorrente nas alegações de recurso questiona a constitucionalidade do artigo 784º, nº3, do CPC, quando a inconstitucionalidade havia sido suscitada apenas em relação ao nº2 do mesmo artigo 784º, pelo que o recurso deveria ser rejeitado.
Vejamos:
Os ora recorridos intentaram acção sumária contra a recorrente, pedindo a condenação desta no pagamento das quantias acima referidas resultantes de um sinistro ocorrido com uma embarcação dos AA. e ainda a indemnizar os AA. pelos prejuízos que se viessem a apurar para efectivo recebimento da quantia peticionada.
Citada para contestar, a Ré ofereceu contestação que foi mandada desentranhar por extemporaneidade.
Na sentença final decidiu-se na parte que interessa:
'De acordo com o disposto no artigo 784º n.º. 2 do Código de Processo Civil, o pedido procede relativamente aos danos emergentes, mas já não quanto aos lucros cessantes, em face do que consta no art. 23º das condições gerais da apólice (que os autores juntaram aos autos), como também não procede no que respeita ao pagamento em quantia a apurar em liquidação posterior pelas despesas com o patrocínio forense, dado que tais despesas são englobadas na procuradoria.
Pelo exposto, julgando a acção parcialmente procedente, condeno a ré no pagamento da quantia de 1.762.449$00, acrescida de juros de mora à taxa anual de 15%, a partir da citação.'
No recurso de apelação interposto pela Ré, começou ela por sustentar que o pedido relativo aos danos emergentes deveria improceder por já não vigorar, à data do sinistro, o contrato de seguro outorgado entre as AA. e a Ré.
Acrescentou depois:
'E, nem se diga que assim não será por aplicação do art. 784º do C.P.C.
Dispõe o n.º. 3 do art. 784º do C.P.C. 'Nos casos a que se referem as alíneas a) e b) do artigo 485º a cominação é aplicada ao Réu que não tenha contestado, desde que não seja incapaz ou uma pessoa colectiva...'
Assim, não se verificará a aplicação e funcionamento do princípio da cominação plena – n.º. 2 do art. 784º - quando (nomeadamente) o Réu é uma pessoa colectiva, como, aliás, e bem considerou o Meritíssimo Juiz ao julgar a presente acção nos termos em que o fez.
A Ré – M... – Sociedade Mútua de Seguros – é uma pessoa colectiva.
Há, todavia, jurisprudência que entende que a expressão 'pessoa colectiva' do n.º. 3 do art. 784º é apenas e só aplicável às pessoas colectivas que não sejam sociedades comerciais.
Este entendimento representaria uma interpretação que não tem na letra da lei o mínimo de correspondência verbal e, (n.º. 2 do art. 9º do C.C.) não pode 'ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso'.'
Entende, assim, a recorrente não ser sociedade comercial, mas 'pessoa colectiva', para efeitos do disposto no artigo 784º, nº3, do CPC, pelo que não poderia verificar-se o pressuposto da aplicação da cominação plena.
E acrescentou ainda:
'Mas, se por absurdo se considerasse que a Ré não é pessoa colectiva, nos termos do art. 784º do CPC, e que, consequentemente, se aplicaria o princípio de cominação plena porque não verificada qualquer das excepções previstas no art. 485º do C.P.C. por remissão do art. 784º do C.P.C., este artigo não poderia ser aplicado porquanto violador do princípio da igualdade, princípio com dignidade constitucional (art. 13º da Constituição da República Portuguesa).
O art. 784º do C.P.C. viola o princípio da igualdade porquanto estabelece um regime discriminatório a dois níveis:
Por um lado, criando um regime discriminatório entre pessoas colectivas, sociedades comerciais e pessoas colectivas não sociedades comerciais e, por outro, porque apenas por razões inerentes à situação económica, coloca o Réu 'revel' numa acção sumária em situação qualitativamente diferente do Réu revel numa acção ordinária.
O art. 13º da CRP estabelece a igualdade dos cidadãos perante a lei impondo ao legislador e ao intérprete/aplicador da lei que pratique tratamento igual em situação igual e proíbe-lhe a desigualdade.
O entendimento de que pessoa colectiva se aplica apenas a algum dos tipos de pessoa colectiva cria uma discriminação geradora de um posicionamento qualitativo diferente sem razão séria ou fundamento profundo.
Assim, o art. 784º do CPC viola o princípio da igualdade porque ignorando a proibição de tratamento desigual:
- Estabelece um regime jurídico diferente para a parte quando ao seu interesse é atribuído um valor superior ou inferior a Esc.: 2 000 000$00.
- Estabelece uma distinção discriminatória, desigualdade de tratamento materialmente infundada, sem qualquer fundamento sério, sem qualquer justificação objectiva e racional entre os diferentes tipos de pessoas colectivas.
O princípio da igualdade, numa perspectiva negativa, como proibição de privilégios ou de discriminar impõe-se ao legislador e ao intérprete, obrigando-os a tratar de igual modo situações iguais (dimensão positiva), pelo que sendo o art. 784º do CPC inconstitucional não pode ser aplicado, verificando-se, então a aplicação do art. 485º (princípio subsidiário para o processo sumário na ausência de disposição especial).
De acordo com o disposto no art. 484º considerar-se-iam confessados os factos articulados pelo A a não ser que se verificasse qualquer das excepções do art. 485º.
E, então tinha de resultar assente o contrato outorgado em todos os seus elementos caracterizadores, nomeadamente, o período de vigência (doc. N.º.
1 da P.I.)
No caso dos autos está em apreciação a responsabilidade adveniente de um contrato de seguro.
Ora, o contrato de seguro é um contrato formal constituindo a respectiva apólice... 'documento ad substantiam, insubstituível por qualquer outro meio de prova' – Acórdão da Relação do Porto de 24/05/94 in CJ – 1994 Tomo III, pág. 219.
Estamos, assim, perante a situação prevista na alínea d) do art.
485º.
Assente este facto continha o processo todos os elementos para 'uma decisão conscenciosa' art. 510º, n.º. 1, alínea c) do CPC, decisão que, consequentemente, seria a improcedência total do pedido, porquanto à data do sinistro referido nos autos não estava em vigor o contrato de seguro que fundamenta o pedido.'
Formulou, depois, as seguintes conclusões:
'6º) – O Meritíssimo Juiz a acção julgou parcialmente improcedente quando a devia ter julgado totalmente improcedente já que a apelante é pessoa colectiva e os autos continham todos os elementos para assim decidir.
7º) – O contrato de seguro de que emerge a pretendida responsabilidade contratual da apelante não estava em vigor à data do sinistro dos autos.
8º) – O n.º. 3 do art. 784º do CPC cria uma excepção ao princípio da cominação plena relativamente às pessoas colectivas.
9º) – Pessoa colectiva é um ente (não pessoa física), com personalidade jurídica, que engloba entre outras associações, o Estado, as fundações e as sociedades com personalidade jurídica.
10º) – O art. 784º, n.º. 3 do CPC não distingue quaisquer categorias ou tipos de pessoas colectivas.
11º) – Não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei o mínimo de correspondência verbal
(art. 9º do Código Civil).
12º) – A apelante é uma pessoa colectiva que não reveste qualquer dos tipos de sociedade comercial, nem os seguros mutualistas têm natureza comercial
(art. 425º do Código Comercial).
13º) – Como mutualista não tem o escopo de gerar lucros para distribuir entre os sócios visando tal como o das cooperativas a entreajuda entre os membros.
14º) – A apelante não sendo sociedade comercial nem tendo fins lucrativos é pessoa colectiva no sentido restrito do termo.
15º) – O n.º. 2 do art. 784º do CPC violaria o art. 13º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que estabelece um regime discriminatório, pelo que,
16º) – É inconstitucional e, como tal não pode ser aplicado.
17º) – O contrato de seguro é um contrato formal, formalidade ad substantiam.
18º) – Está documentalmente provado o contrato de seguro com todos os seus elementos caracterizadores nomeadamente o período de validade.
19º) – A apreciação dos elementos de facto e a aplicação do direito a esses factos leva obrigatoriamente à improcedência da acção porquanto à data do sinistro não estava em vigor o contrato de seguro que fundamenta o pedido.'
O acórdão da Relação, ora recorrido, negou provimento ao recurso, considerando que:
a. a apelante é uma sociedade que faz do comércio o escopo da sua actividade. b. é-lhe aplicável o disposto no artigo 784º, nº2, do CPC, só ficando impedida a condenação no pedido nos casos da alínea c) do artigo 485º do CPC. c. cai, assim, por terra toda a estratégia da Ré, nomeadamente quanto à hipotética inconstitucionalidade. d. o contrato de seguro vigorava à data do sinistro.
5. – Para resolver a questão prévia em apreço, importa definir com clareza qual a questão de inconstitucionalidade que a recorrente suscitou.
O artigo 784º do CPC, na redacção agora questionada, regulava os efeitos da falta de contestação em processo sumário. A regra constava do nº2: a falta de contestação do réu, citado ou devendo considerar-se citado na sua própria pessoa, determina a condenação no pedido, com ressalva dos casos em que a vontade das partes for ineficaz para produzir o efeito jurídico que pela acção se pretende obter (artigo 485º, alínea c), do CPC, para que remete o artigo 784º, nº2). O nº3 abre ainda outra excepção àquela regra com referência ao disposto nas alíneas a) e b) do artigo 485º, interessando ao caso a que se reporta à não contestação de ré 'pessoa colectiva': – neste caso, não há condenação no pedido.
Em suma, se a acção é intentada contra uma 'pessoa colectiva' e esta não contesta, não se verifica a chamada condenação de preceito.
Como se viu, a sentença de 1ª instância julgou a acção parcialmente procedente, condenando a Ré no montante pedido relativo a danos emergentes, e improcedente quanto ao pedido de indemnização por lucros cessantes.
No que concerne ao primeiro pedido, a fundamentação assenta expressamente no disposto no artigo 784º, nº2, do CPC: – a sentença fez, pois, funcionar a cominação da condenação de preceito, recusando, implicitamente, a qualificação de Ré como 'pessoa colectiva' para os efeitos do disposto no n.º. 3 do mesmo artigo 784º em conjugação com o artigo 485º, alínea b).
Já no que concerne ao segundo pedido, a sentença não faz aplicação do artigo 784º, nº2, pois, para julgar o pedido improcedente, assenta na cláusula 23º do contrato de seguro, onde se afastaria a responsabilidade da Ré seguradora por lucros cessantes.
Não estando em causa matéria de relações indisponíveis
(artigo 485º, alínea c), do CPC), parece que a sentença faz implícito apelo ao disposto na alínea d) do mesmo artigo 485º ('Quando se trata de factos para cuja prova se exija documento escrito'), muito embora resulte do disposto no artigo
784º, nº2, que a cominação de condenação no pedido só não opera (suposto que a Ré não seja pessoa colectiva) no caso previsto na alínea c) do artigo 485º.
Não compete, porém, ao Tribunal Constitucional sindicar a aplicação do direito infraconstitucional, a menos que tal sindicabilidade seja indispensável para a resolução da questão de constitucionalidade suscitada nos autos.
No caso dos autos, para a condenação da Ré no pedido de indemnização de danos emergentes – e só esta a Ré impugnou como parte vencida –, a sentença de 1ª instância, confirmada pelo acórdão recorrido, fez funcionar a norma que determina a condenação de preceito, o que – como se deixou dito – significa que não considerou a Ré como pessoa colectiva (artigos 784º, nº3, e
485º, alínea b), do CPC).
A impugnação da Ré dirigiu-se, claramente, quanto a este
último fundamento, alegando primeiro que deveria ser qualificada como 'pessoa colectiva' e não como 'sociedade'; e, depois, subsidiariamente, a inconstitucionalidade da norma que distingue as consequências da não contestação, consoante o Réu seja pessoa colectiva ou sociedade e ainda em função de se tratar de acção em processo ordinário ou em processo sumário.
É certo que nas alegações para a Relação, na parte respeitante à arguição de inconstitucionalidade, a recorrente se reporta quer singelamente ao artigo 784º (fls. 69, 70 e 71) quer ao artigo 784º, nº2,
(conclusão 15ª).
Por outro lado, como se referiu, no requerimento de interposição de recurso a recorrente indica a norma do artigo 784º, nº2, do CPC, como sendo aquela cuja inconstitucionalidade pretende que o Tribunal aprecie.
Só nas alegações a recorrente se reporta (e exclusivamente nas conclusões) ao nº3 do artigo 784º, sempre, porém, mantendo a tese que defendera nas alegações para a Relação e com os mesmos fundamentos.
Neste contexto, não se vêem razões para não conhecer do objecto do recurso, por a recorrente ter 'desviado', nas alegações, a arguição de inconstitucionalidade do nº2 para o nº3 do artigo 784º do CPC, como sustentam os recorridos.
Na verdade, pode afirmar-se que os nºs 2 e 3 do artigo
784º do CPC e as alíneas a), b) e c) [aqui interessa-nos a b)] do artigo 485º têm ínsito um complexo normativo, onde a aplicação do princípio contido no nº 2 do primeiro artigo (condenação no pedido por falta de contestação) supõe o afastamento das ressalvas ao mesmo princípio previstas no nº3 [este ainda com referência ao artigo 485º a) e b)].
Tendo sido aplicado esse princípio, não é forçado entender-se que a recorrente, ao suscitar a inconstitucionalidade da norma que prevê a ressalva, embora tenha apontado para o nº2 do artigo 784º, teve em vista o que, com melhor rigor, se dispõe no nº3 do mesmo artigo.
Considera, assim, o Tribunal que a recorrente, nas alegações, não altera substancialmente o que disse no requerimento de interposição de recurso, pelo que se desatende a questão prévia suscitada pelos recorridos.
6. – Como se referiu atrás, em regra, não se integra nos poderes do Tribunal Constitucional a interpretação do direito ordinário. Porém, se, para a resolução da questão de constitucionalidade equacionada nos autos, for indispensável proceder à interpretação do direito infraconstitucional, então, não o fazer equivaleria a deixar na competência do tribunal recorrido algo que a Constituição especificamente comete ao Tribunal Constitucional: administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional.
Portanto, quando é essencial à resolução da questão de constitucionalidade, o Tribunal não pode deixar de conhecer de certos aspectos de direito infraconstitucional; designadamente, não pode deixar de verificar a justeza das qualificações feitas pelo tribunal recorrido, quando tal for indispensável para resolução da questão de constitucionalidade, ou, talvez melhor dizendo, quando a questão de constitucionalidade coincidir, em maior ou menor dimensão, com a questão da qualificação feita à luz do direito ordinário.
É o que se passa no caso dos presentes autos, em que a recorrente suscitou uma questão de constitucionalidade em duas vertentes: por um lado, entende que uma interpretação do artigo 784º, do CPC, que qualifique a ré como sociedade ou como não sendo
uma pessoa colectiva, é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade; por outro lado, entende que aquele princípio constitucional também é violado quando se estabelece um regime jurídico diferente para a parte, consoante o valor da causa é superior ou inferior a 2.000.000$00.
É que a qualificação da ré (M...) como sociedade importa a sua condenação no pedido, mas outro tanto não sucede se ela for qualificada como pessoa colectiva. E é para essa diversidade de tratamento que a ré não encontra fundamento capaz.
De facto, a M... nas suas alegações para a Relação, ao suscitar a questão de constitucionalidade refere expressamente o seguinte: 'O entendimento de que pessoa colectiva se aplica apenas a alguns dos tipos de pessoa colectiva cria uma discriminação geradora de um posicionamento qualitativo diferente sem razão séria ou fundamento profundo'.
É certo que o entendimento acolhido na decisão de 1ª instância e da Relação corresponde ao entendimento doutrinário comum.
Com efeito, Antunes Varela, e Sampaio e Nora, (in 'Manual de Processo Civil' 2ª ed., p. 349/350) referem a este respeito o seguinte, mencionando ainda que a mesma doutrina era geralmente aceite em relação à expressão pessoa moral, usada nas disposições que antecederam o actual artigo 485º:
'Na expressão pessoa colectiva cabem apenas, de acordo com a terminologia do Código Civil (artigo 157º) as associações que não tenham por fim o lucro económico dos seus membros e as fundações de interesse social, ficando assim excluídas as sociedades, designadamente as sociedades comerciais (...)'
No mesmo sentido, escreve Luso Soares in 'Processo Civil de Declaração', p. 634:
'Sendo também as sociedades, pessoas colectivas, numa interpretação do actual texto da alínea b) levar-nos-ia directamente à aplicação desta excepção aos casos em que algum dos réus fosse uma daquelas sociedades. Verdade, contudo, é que não foi isto que o legislador de 1967 pretendeu e, por conseguinte, deverá entender-se esta alínea como respeitando apenas às pessoas colectivas de utilidade pública, às associações que não tenham por fim o lucro dos associados e às fundações de interesse social. Isto é, em resumo: a alínea b) contém uma excepção somente relativa às pessoas colectivas, exceptuadas as sociedades.' Ainda com o mesmo entendimento escreve Castro Mendes in 'Direito Processual Civil', Lições de 1978/79, III vol., sobre a alínea b) do artigo 485º do CPC:
'Nesta disposição há a observar: Antes de mais, que a «pessoa colectiva» se emprega aqui no sentido de «pessoa moral», portanto excluindo as sociedades.'
Este entendimento comum dos efeitos da revelia em processo civil apenas veio a sofrer alteração através do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, que ao dar nova redacção à alínea b) do artigo 485º do Código de Processo Civil, permitiu que os efeitos da revelia passassem a operar em relação às pessoas colectivas em geral, e não apenas em relação a algumas entidades dentro deste tipo.
Começando por considerar a segunda vertente atrás enunciada da questão de constitucionalidade, desde já se adianta que não se vê qualquer violação do princípio da igualdade no facto de, em processo ordinário
(em que o valor da causa é superior a dois mil contos), a revelia operar, em termos de importar confissão dos factos, enquanto que, em processo sumário, de valor inferior àquele montante, ela implicar, não já apenas a confissão dos factos, mas a própria condenação de preceito.
Na verdade, o que dita as diferentes formas de processo e as consequentes diferenças de regulamentação adjectiva é o valor da causa
(artigo 462º nº1, do CPC). E esse valor nada tem a ver com a situação económica dos litigantes. Da diferente situação económica destes não decorre, por isso, qualquer diferença de tratamento.
Não se configura, pois, qualquer desigualdade em razão da situação económica, sendo certo que se trata por igual as partes nos processos com igual valor (cfr. Acórdão nº 163/90 in ATC, 16º vol., pp. 301 e segs.).
7. - Porém, no que diz respeito à outra vertente em que vem questionada a constitucionalidade do artigo 784º do CPC, importa proceder a uma análise com mais detença.
A M... começa por discordar do facto de a decisão recorrida a ter qualificado, com base no Decreto-Lei n.º 188/84, de 5 de Junho, como sociedade comercial, ainda que com a forma de cooperativa de responsabilidade limitada, não a tendo qualificado como 'pessoa colectiva', no sentido de pessoa colectiva sem carácter lucrativo.
A M..., cuja constituição definitiva foi autorizada por Portaria da Inspecção de Seguros de 4 de Julho de 1942 (in 'Diário do Governo', IIª Série, de 11 de Julho de 1942), foi constituída por escritura de 27 de Julho de 1942, com publicação no diário oficial, para 'segurar pelos meios apropriados as pessoas singulares ou colectivas que exerçam a actividade de pesca profissional ou se dediquem à aquicultura e actividades conexas e, bem assim, a própria Mútua e os seus trabalhadores contra os riscos de acidentes e doença ou outros que derivem dos respectivos contratos colectivos de trabalho ou de disposições legais [alínea a) do artigo 5º dos Estatutos], e as embarcações de pesca e outros bens de investimento e consumo, bem como outros riscos a que estejam sujeitas as entidades referidas na alínea anterior, com exclusão dos do Ramo Vida [alínea b)]'.
A actividade das sociedades mútuas de seguros começou por ser regulada através do Decreto de 21 de Outubro de 1907, em cujo preâmbulo se referia a ausência de outra regulamentação e a 'situação preponderante em todos os países (...)' deste tipo de sociedades e que 'entre nós, desde o século XIV pela conhecida lei de D. Fernando, se acha intimamente ligada à tradição e à história do direito nacional'. No diploma de 1907, o artigo 12º autoriza a constituição de sociedades mútuas de seguros e refere que 'para todos os efeitos serão havidas como sociedades comerciais'. Por outro lado, a Lei n.º2/71, de 12 de Abril, que estabelece o regime da actividade de seguros e resseguros, determina na Base X que 'as sociedades mútuas de seguros cujos sócios (...) são os próprios segurados (...) são havidas para todos os efeitos como sociedades comerciais (...)'. Em 1984, a lei voltou a ser alterada: o Decreto-Lei n.º
188/84, de 5 de Junho, estabelece no artigo 20º que 'as mútuas de seguros revestem a forma de cooperativa de responsabilidade limitada (...) e regem-se pelo disposto no presente diploma e pelo Código Cooperativo (...)'.
Constata-se, assim, que as mútuas de seguros, embora com finalidades de auxílio entre os respectivos associados, têm sido consideradas quer como sociedades comerciais quer como sociedades cooperativas.
A M... entende que é uma pessoa colectiva, com finalidades exclusivamente mutualistas: de facto, os seus sócios, ao constituírem a mútua, não visam directamente realizar o lucro, desde logo porque o artigo 425º do Código Comercial retira a natureza comercial aos seguros mútuos. E, depois e essencialmente, porque a Mútua não pode explorar livremente a actividade dos seguros, só podendo segurar os seus associados e os trabalhadores próprios nos apertados limites que a lei lhe impõe.
Pessoa colectiva é a 'organização constituída por um conjunto de indivíduos ou por um complexo patrimonial tendo em vista a prossecução de um interesse comum determinado e às quais a ordem jurídica atribui a qualidade de sujeito de direitos, isto é, reconhece como centros autónomos de relações jurídicas' (Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, 1964, 1º v., p.45). Esta definição doutrinal corresponde a uma realidade bem conhecida: os interesses das pessoas nem sempre são exclusivamente individuais, podendo, por vezes, tomar um carácter social e aparecendo referidos a certas classes ou grupos mais restritos de indivíduos, sendo por vezes necessário agrupar vários indivíduos e congregar um conjunto de meios materiais e bens para os colocar ao serviço dum serviço colectivo de uma generalidade de pessoas, ressaltando assim um interesse social como fim a atingir. A pessoa colectiva é a entidade que se destina a realizar esse fim: se este consistir na realização de um fim ou interesse público, a pessoa colectiva diz-se de direito público; se tal fim tiver natureza privada, a pessoa colectiva diz-se de direito privado.
A M..., enquanto tem por finalidade segurar, pelos meios apropriados, as pessoas singulares ou colectivas que exerçam a pesca profissional ou se dediquem á aquicultura e actividades anexas e as embarcações ou os bens de investimento e consumo, procura realizar um fim colectivo de carácter privado, pelo que se pode considerar uma pessoa colectiva de direito privado e de fim interessado, na medida em que a realização daqueles fins se circunscrevem a uma classe restrita de pessoas – os associados da Mútua. Mas como a Mútua não pode efectuar seguros a outras entidades que não sejam os seus associados, realiza um interesse social de natureza mutualística, na medida em que visa o auxílio mútuo em situação de acidente, procurando também o melhoramento das condições de vida dos associados como forma voluntária de realização do ideal de solidariedade.
Assim, mesmo que não existissem razões de outra valia a apontar nesse sentido, logo por aí, a M..., à luz do direito infraconstitucional, bem poderia ser considerada como pessoa colectiva no sentido de «pessoa moral». Sucede, no entanto, que existem razões de outra ordem a reforçar e impor este entendimento.
Com efeito, a Lei de Revisão Constitucional de 20 de Setembro de 1997 alterou o artigo 82º da Constituição que regula 'os sectores de propriedade dos meios de produção'. As alterações introduzidas consistiram em dar nova redacção à alínea a) do nº 4, sobre o sector cooperativo e social, e no acrescentamento de uma nova alínea, a alínea d), que tem para o caso um extremo relevo.
De facto, a norma constitucional referida estabelece a existência de três sectores de propriedade de meios de produção: o público, o privado e o cooperativo e social. Por sua vez, este último sector abrange os seguintes sub-sectores: um, em que os meios de produção são possuídos e geridos por cooperativas; outro, em que os meios de produção comunitários são possuídos e geridos por comunidades locais; ainda um outro, em que os meios de produção são objecto de exploração colectiva por trabalhadores e, finalmente, após a Revisão de 1997, 'os meios de produção possuídos e geridos por pessoas colectivas, sem carácter lucrativo, que tenham como principal objecto a solidariedade social, designadamente entidades de natureza mutualista'.
Com a introdução desta alínea d), apesar de alguma polémica suscitada na discussão da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional (cf. Acta Provisória n.º98, Reunião de 27 de Maio de 1997, in José Magalhães, CDROM), teve-se em vista, dentro do sector cooperativo e social, reforçar e precisar o regime das entidades mutualistas, autonomizando o tratamento jurídico-constitucional que se deve dar às entidades que realizam fins mutualísticos e que dificilmente se podiam enquadrar em qualquer outra das alíneas do n.º4 do artigo 82º da Constituição. O legislador constitucional quis, pois, claramente abranger os meios de produção geridos por instituições de natureza vária, sem carácter lucrativo, designadamente por entidades mutualistas, pretendendo, assim, fazer corresponder à realidade o texto constitucional, pois estas formas de exploração de meios de produção criam riqueza e resolvem problemas socialmente relevantes.
Do texto, que é hoje a alínea d) do nº4 do artigo 82º da Constituição, resulta, assim, com irrefragável clareza, que as entidades sem carácter lucrativo, que tenham como principal objectivo a solidariedade social, designadamente as entidades de natureza mutualista, não podem, à face da Constituição, deixar de ser consideradas como pessoas colectivas. Ou, pelo menos, de beneficiar do tratamento que a estas últimas é dado.
Esta conclusão, que decorre da análise da alínea d) do nº4 do artigo 82º da Constituição, só se impõe, é certo, ao legislador ordinário após a entrada em vigor da Revisão Constitucional de 1997. No entanto, ela conforta a conclusão a que antes se chegou pela análise do direito ordinário vigente, a qual – recorde-se – vai no sentido de que a M..., enquanto entidade de natureza mutualista, constitui uma pessoa colectiva.
Adquirida a conclusão de que a M... tem a natureza de pessoa colectiva, ou pelo menos deve ter o tratamento que às pessoas colectivas
é concedido, importa regressar ao caso dos autos e analisar a vertente da questão de constitucionalidade, que vem suscitada pela Mútua e que falta resolver.
8. – Esta questão de constitucionalidade vinha equacionada pela Mútua como constituindo violação do princípio da igualdade o facto de a norma em causa, o artigo 784º do Código de Processo Civil, ser interpretada como estabelecendo uma distinção discriminatória, sem justificação material bastante, entre as sociedades comerciais – categoria em que a sentença arrumou a recorrente - e as pessoas colectivas.
Mas, tendo-se concluído que hoje, por imposição constitucional, à Mútua tem de ser atribuído o tratamento dado às pessoas colectivas, então, a questão de constitucionalidade suscitada nos autos há-de ser assim equacionada: a norma do artigo 784º do CPC será inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, se tratar desigualmente e sem um fundamento material bastante, as pessoas colectivas de natureza mutualista, relativamente
às pessoas colectivas de outra natureza. Deixa, de facto, de fazer sentido utilizar como termo de comparação as sociedades comerciais.
Vejamos.
O princípio da igualdade, segundo a jurisprudência uniforme e constante do Tribunal Constitucional, reconduz-se a uma proibição de arbítrio, sendo inadmissível quer a diferenciação de tratamento sem qualquer justificação razoável quer a identidade de tratamento para situações manifestamente diferentes: a inconstitucionalidade, na perspectiva da ausência de fundamento material bastante, traduz-se, assim, numa falta de razoabilidade e de coerência da norma com o sistema jurídico; por outro lado, as medidas de diferenciação devem ser positivamente fundamentadas segundo critérios constitucionalmente relevantes.
No caso em apreço, a decisão recorrida entendeu que a Mútua era uma cooperativa de responsabilidade limitada e, verificada a sua falta de contestação da acção, aplicou-lhe o artigo 784º do CPC, interpretando-o no sentido de ser operante a revelia da ré que, no caso, era a M...
Ora, para além de, hoje, a Constituição impor que as entidades de natureza mutualista sem carácter lucrativo sejam consideradas pessoas colectivas, a M... já assim devia ser qualificada à luz do direito ordinário. Por isso, o tratamento processual da Mútua não pode ser diferente do das outras pessoas colectivas, sob pena de inconstitucionalidade, uma vez que não existe qualquer fundamento material suficiente para justificar a diferença de tratamento.
Assim, a norma do artigo 784º do Código de Processo de Civil, interpretada no sentido de que, não tendo a entidade mutualista, no caso, a M..., contestado a acção sumária contra si proposta, se impunha logo a sua condenação no pedido, é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, pois está a tratar de modo diferenciado duas situações idênticas, sem que para tal se descubra um fundamento material bastante: - a situação das mútuas, em que a falta de contestação importa condenação no pedido e a situação das outras pessoas colectivas sem carácter lucrativo, em que tal falta de contestação não tem essa consequência.
III – DECISÃO:
Nestes termos, o Tribunal Constitucional decide: A. julgar inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição, a norma do artigo 784º do Código de Processo Civil, na redacção anterior ao Decreto-Lei nº 180/96, de 25 de Setembro, interpretada no sentido de que a falta de contestação de uma acção, por parte de uma entidade mutualista importa a sua condenação no pedido; B. em consequência, conceder provimento ao recurso, devendo reformular-se o acórdão recorrido em consonância com o presente juízo de inconstitucionalidade.
Lisboa, 16 de Maio de 2000 Vítor Nunes de Almeida Luís Nunes de Almeida Maria Helena Brito Artur Maurício (vencido, nos termos da declaração junta) José Manuel Cardoso da Costa (vencido, por haver entendido o objecto do recurso em termos diversos dos que fizeram maioria na secção. Ou seja, e muito precisamente: por havê-lo entendido nos mesmos termos que o primitivo relator, Exmº Conselheiro Artur Maurício, e tal como este os enuncia na sua declaração de voto)
Declaração de voto
Voto vencido por entender que a questão de constitucionalidade sujeita a apreciação do Tribunal Constitucional, para além da que se julga como
'primeira vertente da questão de constitucionalidade', não é a que veio a ser resolvida nos pontos 7 e segs. do acórdão, mas a que claramente resulta da conclusão 6ª das alegações da recorrente, ou seja a de saber se a norma do nº. 3 do artigo 784º do CPC estabelece uma distinção, constitucionalmente censurável, entre 'pessoas colectivas', não compreendendo neste conceito as sociedades comerciais.
Com esta delimitação do objecto do recurso entendi, como primitivo relator - e mantenho - que a norma em causa não viola o artigo 13º da CRP ou qualquer outra norma ou princípio constitucional. Artur Maurício