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Processo n.º 587/99 Conselheiro Messias Bento
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório:
1. O Juiz de Direito R. R. interpõe o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Pleno da 1ª Secção), de 27 de Maio de 1999, que negou provimento ao recurso contencioso de anulação por si interposto da deliberação do CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS (CSTAF), de 9 de Maio de 1994, que lhe atribuiu a classificação de Suficiente pelo serviço que prestou no 6º Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, de 15 de Julho de 1989 a 30 de Março de 1993.
Pretende se aprecie a constitucionalidade da norma do artigo 77º, conjugada com a do artigo 100º, ambas do Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril (ETAF), 'no entendimento dado de não ser necessária a criação de um corpo de inspectores no
âmbito dos tribunais administrativos e fiscais, podendo e sendo as inspecções realizadas por inspectores nomeados ad hoc': tal entendimento - diz - viola o direito à igualdade, como sustentou perante o Supremo Tribunal Administrativo.
Neste Tribunal, o recorrente concluiu a sua alegação como segue:
1. A interpretação dada pelo Supremo Tribunal Administrativo ao artigo 100º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais conjugado com o artigo 77º do mesmo diploma, no sentido de dispensar a criação de um serviço de inspecções judiciais, com um quadro próprio e permanente de inspectores judiciais, a funcionar junto do Conselho dos Tribunais Administrativos e Fiscais, à semelhança do que acontece no Conselho Superior da Magistratura, viola o princípio da igualdade, estabelecido no artigo 13º da Constituição.
2. O regime de nomeação de inspectores judiciais praticado pelo Conselho dos Tribunais Administrativos e Fiscais – nomeação de inspectores, caso a caso, para cada inspecção – põe em causa a integridade do processo de inspecções judiciais, ao introduzir um elemento de arbitrariedade no processo e afasta as garantias de imparcialidade e objectividade que a existência de um corpo de inspectores próprio e permanente garante.
3. Sendo certo que a existência de um quadro permanente de inspectores judiciais, especialmente preparado e vocacionado para a realização das inspecções judiciais, conduz a inspecções mais profissionais, mais rigorosas e sistemáticas, em termos de metodologia aplicada e dos critérios de avaliação do mérito dos juízes.
4. A existência de dois regimes diferentes de inspecções judiciais nos tribunais judiciais e nos tribunais administrativos e fiscais, não justificável em termos das suas eventuais especificidades, cria uma diferenciação de tratamento dos juízes destes tribunais, sem qualquer justificação razoável e, como tal, inaceitável do ponto de vista constitucional.
5. O princípio da igualdade obriga a que o artigo 100º, conjugado com o artigo
77º, ambos do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais seja interpretado no sentido de as inspecções judiciais ordenadas pelo Conselho dos Tribunais Administrativos e Fiscais sejam executadas por inspectores judiciais que integrem um quadro de inspectores judiciais próprio e permanente, à semelhança do que acontece com as inspecções ordenadas pelo Conselho Superior da Magistratura e executadas nos termos do Estatuto dos Magistrados Judiciais. Termos em que se requer seja declarada inconstitucional a interpretação dada ao artigo 77º, conjugado com o artigo 100º, ambos do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, no sentido de dispensar a criação de um serviço de inspecções com um quadro de inspectores a funcionar no Conselho dos Tribunais Administrativos e Fiscais, por violação do princípio da igualdade, estabelecido no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.
O Conselho dos Tribunais Administrativos e Fiscais concluiu como segue a sua alegação: I. Por falta do pressuposto de admissibilidade a que se refere a alínea b) do nº
1 do artigo 70º da LTC, quer quanto à norma do artigo 100º do ETAF, porque não foi suscitada a sua inconstitucionalidade durante o processo, quer quanto à norma do artigo 77º do ETAF, por não ter sido aplicada pelo acórdão recorrido, não se deve tomar conhecimento do presente recurso. II. A Constituição distingue e autonomiza a magistratura dos tribunais administrativos e fiscais da dos tribunais judiciais. III. E, por isso, em comandos separados, remete para a lei ordinária, por um lado, a nomeação, a colocação, a transferência e a promoção dos juízes dos tribunais judiciais, que compete ao Conselho Superior de Magistratura [nº 1 do artigo 217º da CRP], e, por outro, a nomeação, a colocação, a transferência e a promoção relativamente aos juízes dos tribunais administrativos e fiscais, que compete ao respectivo conselho superior (CSTAF) [nº 2 do referido artigo 217º da CRP]. IV. O mérito profissional dos juízes nos tribunais judiciais é apreciado pelo CSM (nº 1 do artigo 149º do EMJ). V. O mérito profissional dos juízes dos tribunais administrativos e fiscais é apreciado pelo CSTAF [artigo 98º, nºs 1 e 2, alínea a), do ETAF]. VI. Todos os juízes da jurisdição administrativa e fiscal se encontram sujeitos ao regime do disposto nos artigos 98º, nº 1 e 2, alínea a) e 100º do ETAF. VII. O artigo 77º apenas permite a aplicação subsidiária das normas do EMJ, 'com as necessárias adaptações', aliás, com total respeito pela distinção de magistraturas constitucionalmente consagrada. VIII. Não se vislumbra, assim, qualquer inconstitucionalidade das normas do artigo 77º e do artigo 100º, ambos do ETAF, no entendimento expresso pelo recorrente. Face ao exposto, não deve tomar-se conhecimento do presente recurso, por inadmissibilidade deste, nos termos do preceituado na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC ou, caso assim se não entenda, porque as normas aplicadas no acórdão recorrido, ou a interpretação que delas se fez, não consubstanciam qualquer atropelo à invocada norma constitucional, forçoso é concluir pelo improvimento do recurso. Termos em que deve ser mantido o acórdão recorrido.
2. Cumpre decidir.
II. Fundamentos:
3. A questão prévia do não conhecimento do recurso. O recorrente, no recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, extraiu a norma, que questionou ratione constitutionis, do artigo 77º do Decreto-Lei n.º
129/84, de 27 de Abril. Quando recorreu para este Tribunal, fez derivar tal norma daquele normativo, sim, mas agora conjugado com o artigo 100º do mesmo diploma legal.
Como o recorrente apenas se reportou ao artigo 77º e - disse o Supremo Tribunal Administrativo - 'a inspecção realizada ao serviço por ele prestado como Juiz do
6º Juízo do Tribunal Tributário de Lisboa [...] ocorreu por aplicação da norma constante do artigo 100º do ETAF, e não em aplicação do entendimento que o recorrente sustenta ser dado pelo CSTAF ao artigo 77º deste Diploma', o acórdão recorrido não se pronunciou sobre a questão de constitucionalidade por ele suscitada.
Em consonância com isto, veio, na sua alegação, o CONSELHO recorrido suscitar a questão prévia do não conhecimento do recurso: 'quanto à norma do artigo 100º do ETAF, porque não foi suscitada a sua inconstitucionalidade durante o processo';
'quanto à norma do artigo 77º do ETAF, por não ter sido aplicada pelo acórdão recorrido'.
Ouvido o recorrente sobre tal questão prévia, veio ele dizer, para o que aqui importa, que se deve conhecer do recurso, uma vez que o acórdão recorrido aplicou a norma do referido artigo 77º, pois, 'para aplicar as normas dos artigos 98º e 100º do ETAF', tinha ele que 'aplicar a norma do artigo 77º do mesmo Estatuto'.
Nada há que obste a que este Tribunal se pronuncie sobre a questão de constitucionalidade. Na verdade, como atrás se viu, o que, em direitas contas, o recorrente questiona perante este Tribunal é a constitucionalidade de um sistema de inspecções em que estas são feitas por inspectores nomeados ad hoc pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Ora, a constitucionalidade desse sistema questionou-a o recorrente perante o Supremo Tribunal Administrativo, quando, na conclusão 1ª da petição de recurso, escreveu que 'as inspecções judiciais para avaliação do mérito dos magistrados
[...] não se compadecem com o funcionamento de inspectores ad hoc sendo inconstitucional, por violação do artigo [?] o entendimento dado pelo CSTAF ao artigo 77º do ETAF no sentido de dispensar a criação de um corpo de inspectores'; e, bem assim, quando, na conclusão 1ª da alegação que então apresentou, insistiu em que 'o funcionamento de inspectores ad hoc é inconstitucional, por violação do artigo 13º da CRP, já que não existe qualquer fundamento fáctico para o entendimento dado pelo CSTAF ao artigo 77º do ETAF no sentido de dispensar a criação de um corpo de inspectores'. A isto acresce que foi este sistema de inspecções, cuja constitucionalidade vem questionada, que o acórdão recorrido 'aprovou', ao negar provimento ao recurso para si interposto da deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que classificou o recorrente de Suficiente na sequência de uma inspecção feita por um Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo nomeado para o efeito pelo respectivo Conselho.
4. A norma sub iudicio: A norma aqui em apreciação, tal como o recorrente a identificou no requerimento de interposição de recurso – e é essa identificação que define o respectivo objecto (cf. artigo 75º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, conjugada com o 684º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Civil) - , é a do artigo 77º, conjugada com a do artigo 100º, ambas do Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril,
'no entendimento dado de não ser necessária a criação de um corpo de inspectores no âmbito dos tribunais administrativos e fiscais, podendo e sendo as inspecções realizadas por inspectores nomeados ad hoc'.
Dispõe o artigo 77º: Os juízes dos tribunais administrativos e fiscais formam um corpo único e regem-se pelo disposto na Constituição da República Portuguesa sobre a independência, a inamovibilidade, a irresponsabilidade e as incompatibilidades dos juízes, por este Estatuto e, com as necessárias adaptações, pelo Estatuto dos Magistrados Judiciais.
Prescreve o artigo 100º: As inspecções aos juízes dos tribunais administrativos de círculo, dos tribunais tributários de 1ª instância e dos tribunais fiscais aduaneiros são efectuadas por juízes do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Central Administrativo designados pelo Conselho.
O texto do artigo 100º, acabado de transcrever, corresponde à redacção da Lei n.º 49/96, de 4 de Setembro. Como os tribunais fiscais aduaneiros foram, entretanto, extintos pelo Decreto-Lei n.º 301-A/99, de 5 de Agosto(cf. artigo
3º, n.º 1), desapareceu deste artigo 100º a referência a esses tribunais.
Os juízes dos tribunais administrativos e fiscais – que, nos termos do artigo
77º, formam um corpo único e se regem pelo disposto na Constituição sobre a independência, a inamovibilidade, a irresponsabilidade e as incompatibilidades dos juízes, pelo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e, com as necessárias adaptações, pelo Estatuto dos Magistrados Judiciais -, enquanto juízes de 1ª instância, são inspeccionados por juízes do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Central Administrativo designados pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (cf. artigo 100º).
O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais - que, nos termos do artigo 98º, n.º 1 - é o órgão de gestão e disciplina dos juízes da jurisdição administrativa e fiscal, tem a composição indicada no n.º 1 do artigo 99º, dele fazendo parte juízes, eleitos pelos seus pares, do Supremo Tribunal Administrativo, do Tribunal Administrativo Central, dos tribunais administrativos de círculo e dos tribunais tributários de 1ª instância. Compete-lhe, entre o mais, apreciar o mérito profissional dos juízes dos tribunais administrativos e fiscais [cf. artigo 98º, n.º 2, alínea a)] e ordenar inspecções aos serviços desses tribunais [cf. artigo 98º, n.º 2, alínea e)].
O mérito profissional dos juízes dos tribunais administrativos e fiscais de 1ª instância é, assim, apreciado pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais com base em inspecções realizadas, com essa específica finalidade, por juízes do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Central Administrativo designados pelo mesmo Conselho. Ou seja: o Conselho não conta com um corpo permanente de inspectores para proceder a inspecções destinadas a averiguar o mérito profissional dos juízes; antes designa juízes do Supremo Tribunal Administrativo ou do Tribunal Central Administrativo para proceder a essas inspecções.
Com os magistrados judiciais, as coisas passam-se de modo algo diferente. De facto, o Conselho Superior da Magistratura, a quem cabe apreciar o mérito profissional de tais magistrados [cf. artigo 149º, alínea a), do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei n.º 21/85, de 30 de Julho)], conta com Serviços de Inspecção (cf. artigo 160º, n.º 1, do Estatuto, na redacção da Lei n.º 10/94, de
5 de Maio). Estes Serviços - para além deverem facultar ao Conselho 'o perfeito conhecimento do estado, necessidades e deficiências dos serviços, a fim de o habilitar a tomar as providências convenientes ou a propor ao Ministro da Justiça as medidas que dependam da intervenção do Governo' (cf. artigo 161º, n.º
1, do mencionado Estatuto, na redacção da Lei n.º 10/94, de 5 de Maio) – devem também, embora tão-só 'complementarmente', 'colher informações sobre o serviço e o mérito dos magistrados' (cf. o citado artigo 161º, n.º 2). A inspecção que se destine 'a colher informações sobre o serviço e o mérito dos magistrados' 'não pode ser feita por inspectores de categoria ou antiguidade inferiores às dos magistrados inspeccionados' (cf. o referido artigo 161º, n.º 4). E, quando o inspeccionado for um juiz da Relação, quer seja o Conselho a tomar a iniciativa de ordenar a inspecção, quer esta seja requerida pelo interessado [cf. o artigo
37º-A, nºs 1 2, do Estatuto (redacção da Lei n.º 143/99, de 31 de Agosto) e o artigo 149º, alínea e), do mesmo Estatuto], o Conselho nomeará um juiz do Supremo Tribunal de Justiça para, como inspector extraordinário, proceder à inspecção (cf. artigo 162º, n.º 3, do Estatuto, na redacção da Lei n.º 143/99). Os inspectores judiciais são nomeados, em comissão de serviço, de entre juízes da Relação ou, excepcionalmente, de entre juízes de Direito com antiguidade não inferior a 15 anos e classificação de serviço de Muito Bom (cf. artigo 162º, n.º
1, na redacção da citada Lei n.º 10/94).
5. A questão de constitucionalidade. O recorrente defende que a existência de dois regimes diferentes de inspecções judiciais nos tribunais judiciais e nos tribunais administrativos e fiscais viola o princípio da igualdade, já que – diz - não encontra justificação nas
'suas eventuais especificidades'. Diz mais que 'o regime de nomeação de inspectores judiciais praticado pelo Conselho dos Tribunais Administrativos e Fiscais – nomeação de inspectores, caso a caso, para cada inspecção – põe em causa a integridade do processo de inspecções judiciais, ao introduzir um elemento de arbitrariedade no processo e afasta as garantias de imparcialidade e objectividade que a existência de um corpo de inspectores próprio e permanente garante'; e que 'a existência de um quadro permanente de inspectores judiciais, especialmente preparado e vocacionado para a realização das inspecções judiciais, conduz a inspecções mais profissionais, mais rigorosas e sistemáticas, em termos de metodologia aplicada e dos critérios de avaliação do mérito dos juízes'.
Não há aqui, obviamente, que decidir qual dos dois sistemas de inspecção é o melhor: se o que a lei prevê para apuramento do mérito profissional dos juízes dos tribunais administrativos e fiscais, realizadas por juízes do Supremo Tribunal Administrativo ou do Tribunal Administrativo Central, nomeados para o efeito pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais; se o que se destina a colher informações sobre o serviço e o mérito dos magistrados judiciais, realizadas pelos Serviços de Inspecção do Conselho Superior da Magistratura - ou seja: por um inspector judicial do corpo de inspectores, formado, em regra, por juízes desembargadores. De facto, não estando em causa apurar se a norma sub iudicio constitui bom ou mau direito, mas tão-só decidir se ela é ou não inconstitucional, o que importa
é saber se o regime por ela consagrado constitui uma solução arbitrária, carecida de fundamento racional ou material bastante: é que, só tal acontecendo, sai violado o princípio da igualdade.
O princípio da igualdade, enquanto cânone reitor das várias funções do Estado, maxime da função legislativa, reclama que o legislador trate por igual o que for essencialmente igual e que dê tratamento diferente ao que na sua essência for dissemelhante. Como dizer igualdade não é o mesmo que dizer igualitarismo, a ideia de igualdade não se opõe à existência de regimes jurídicos diferenciados; o que ela recusa é o arbítrio legislativo, ou seja, as soluções legais carecidas de fundamento racional ou material bastante. Pois bem: não se vê que o sistema de inspecções em vigor para avaliação do mérito profissional dos juízes de 1ª instância dos tribunais administrativos e fiscais constitua uma solução arbitrária, carecida de fundamento racional ou material. Com efeito - e desde logo -, contrariamente ao que sustenta o recorrente, a circunstância de o inspector ser nomeado pelo respectivo Conselho não é, de per si, susceptível de fazer perigar a imparcialidade e a objectividade com que a inspecção deve ser feita; e, assim, não introduz essa circunstância qualquer
'elemento de arbitrariedade', nem, por conseguinte, põe 'em causa a integridade do processo de inspecções judiciais': é que, antes de mais, só podem ser nomeados inspectores os juízes do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Administrativo Central (cf. o citado artigo 100º); depois, o inspeccionado é obrigatoriamente ouvido sobre o relatório da inspecção (cf. o citado artigo 77º, conjugado com o artigo 37º, nºs 2 e 3, do Estatuto dos Magistrados Judiciais); além disso, quem classifica é o Conselho, e não o inspector, que apenas propõe uma classificação [cf. o citado artigo 98º, n.º 2, alínea a), e o artigo 15º, n.º 5, do Regulamento das Inspecções Judiciais (publicado no Diário da República, II série, de 10 de Novembro de 1999), aqui aplicável ex vi do disposto no artigo 37º do Regulamento do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (publicado no Diário da República, II série, de 7 de Maio de 1987)]; por último, o juiz pode impugnar contenciosamente a classificação que lhe for atribuída (cf. os artigos 168º a 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais aqui aplicável subsidiariamente). Acresce que as diferenças que existem entre os tribunais judiciais e os tribunais administrativos e fiscais têm relevo suficiente para ser a própria Constituição a determinar a existência de duas ordens jurisdicionais distintas, cujas principais características quanto aos respectivos juízes e conselhos são as seguintes: os juízes dos tribunais judiciais – conforme preceitua o artigo 215º, n.º 1, da Constituição - constituem um corpo único e regem-se por um só estatuto, distintos do corpo de juízes dos tribunais administrativos e fiscais e do respectivo estatuto; o critério e o âmbito pessoal de recrutamento dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça e dos das Relações está fixado na própria Constituição (cf. artigo 215º, nºs 3 e 4), mas outro tanto não acontece com os juízes do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Administrativo Central; o Conselho Superior da Magistratura tem a sua composição fixada pela própria Constituição (cf. artigo 218º), mas isso não sucede com o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Finalmente, não é despiciendo ponderar que, enquanto o reduzido número de juízes de 1ª instância, que compõem o corpo de juízes dos tribunais administrativos e fiscais, poderá não justificar a criação de um corpo permanente de inspectores, o elevado número de juízes de círculo e de juízes de direito tornaria completamente inoperativo um sistema de inspecções do tipo do que vigora para os tribunais administrativos e fiscais. São tudo razões e especificidades capazes de justificar que o legislador, no uso da liberdade de conformação que a Constituição, expressamente, lhe reconhece quanto a esta matéria (cf. o artigo 217º, nºs 1 e 2), preveja sistemas de inspecção diferentes para habilitar cada um dos conselhos a classificar os juízes sujeitos à sua jurisdição, de acordo com o respectivo mérito profissional.
A norma sub iudicio não viola, pois, o princípio da igualdade: é que, como se viu, existem razões e especificidades capazes de justificar o tratamento legislativo diferenciado que se observa no sistema de inspecções dos juízes dos tribunais administrativos e fiscais quando posto em confronto com o que vigora para as inspecções dos juízes dos tribunais judiciais.
Há, por isso, que negar provimento ao recurso.
III. Decisão: Pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide:
(a). negar provimento ao recurso;
(b). condenar o recorrente nas custas, com quinze unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 23 de Fevereiro de 2000 Messias Bento Alberto Tavares da Costa José de Sousa e Brito Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (com dúvidas quanto à verificação dos pressupostos de credibilidade do recurso) Luís Nunes de Almeida