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Processo nº 259/99
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. C...,S.A., sociedade comercial com sede no Porto, veio, 'com fundamento no art. 70º, nº 1, al. b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro', interpor recurso para este Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (1ª Secção), de 15 de Dezembro de 1998, que negou o recurso de revista, interposto pela mesma recorrente, mantendo-se as decisões das instâncias a ela desfavoráveis quanto à transformação da sociedade 'C...,Ldª' em sociedade anónima sob a designação de 'C...,SA', constante de escritura pública outorgada no 17º Cartório Notarial de Lisboa, em 31 de Outubro de 1994. No requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade invoca a recorrente o seguinte:
'A norma cuja inconstitucionalidade se pretende submeter à apreciação do Tribunal Constitucional é a do art. 334º do C.Cv.. A C...,S.A. considera violados o direito de acesso à justiça, consagrado no artº
20º da Constituição, o princípio do Estado de direito democrático constante do artº 2º da CRP e a norma do artº 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, aplicável nos termos do art. 16º, nº 2, da CRP, bem como os preceitos contidos no art. 6º da Declaração Europeia dos Direitos do Homem e no art. 14º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, directamente aplicáveis por força do disposto no art. 17º da CRP, na medida em que, com base na referida norma, lhe foi oposta uma decisão proferida em processo em que não foi parte e em que, portanto, não lhe foi dada oportunidade de se defender e de produzir as suas razões de modo a poder influenciar a dita decisão. A recorrente suscitou a questão de inconstitucionalidade nas alegações do recurso interposto do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto'.
2. Nas suas alegações, concluiu assim a sociedade recorrente:
'1º Com base no art. 334º do Código Civil, foi oposta à Recorrente, no douto acórdão recorrido, uma decisão proferida nos autos da providência cautelar não especificada requerida pelos ora Recorridos contra o Dr. M. P. em que a Requerente não foi parte e em que, portanto, não lhe foi dada oportunidade de se defender e de produzir as suas razões de modo a poder influenciar a dita decisão.
2º Não tendo sido a Recorrente parte no processo da providência cautelar requerida contra o Dr. M. P., o decretamento desta medida não poderia impedi-la de executar um acto social perfeitamente válido e eficaz, tanto mais que a providência decretada, não é, sequer, a que a lei especificamente prevê para paralisar a eficácia de deliberações sociais (que é a constante dos arts. 396º e segs. do C.P.C.).
3º A limitação às partes do processo de eficácia do caso julgado é uma disposição de direito estrito incongraçável com extensões seja de que espécie for, ainda que na base de (putativas) razões de boa-fé (alias, manifestamente deslocadas). Se uma pessoa não foi parte no processo, se não lhe foi dada oportunidade de nele se defender e de produzir as suas razões, a decisão proferida não lhe poderá ser oposta, sob pena de ofender de forma intolerável o seu direito fundamental de defesa.
4º O douto acórdão recorrido, respaldando-se na interpretação que deu à proibição do exercício abusivo dos direitos constantes do art. 334º do Código Civil, incorreu em violação dos princípios do contraditório e da eficácia relativa a caso julgado, os quais estão incluídos no âmbito de protecção das normas do artº 20º da Constituição, do art. 2º do mesmo diploma e do art. 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, aplicável nos termos do art. 16º, nº
2, da Constituição, bem como dos preceitos contidos no artº 6º da Declaração Europeia dos Direitos do Homem e no art. 14º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, directamente aplicáveis por força do disposto no art. 17º da Constituição.
5º Consequentemente, o preceito do art. 334º do Código Civil, na interpretação e aplicação que dela foi feita no douto acórdão recorrido - ou seja, no sentido de estender a eficácia proibitiva de uma decisão proferida num processo judicial a alguém que nele não foi parte e não pôde, consequentemente, deduzir a sua defesa
-, viola o direito de acesso consagrado no art. 20º da Constituição, o princípio do Estado de Direito democrático constante do art. 2º do mesmo diploma e as supra referidas normas directamente aplicáveis constantes de convenções internacionais.'
3. Contra-alegaram os recorridos M. G. e mulher Ma. G. e H. G., todos com os sinais identificadores dos autos, começando por invocar uma 'questão prévia' - traduzida no facto de que 'não suscitou a Recorrente a respectiva inconstitucionalidade, antes se tendo quedado pela hipotética inconstitucionalidade do artº 334º do Cód. Civil', acrescendo ainda a circunstância de estar 'reservado à decisão a proferir por este Vndº Tribunal um alcance meramente académico' - e sustentando, depois, a 'inteira constitucionalidade do artº 334º do Cód. Civil' ('Não violou, em suma, o Acórdão impugnado os preceitos dos artºs 2º, 16º, nº 2, 17º e 20º da Constituição, o artº 6º da Declaração Europeia dos Direitos Homem, o artº 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e artº 14º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos' - é a afirmação final dos recorridos).
4. Ouvida a recorrente sobre a questão prévia suscitada pelos recorridos, no sentido de não conhecer-se do objecto do presente recurso, veio ela sustentar que deverá desatender-se tal questão e 'conhecer-se do objecto do presente recurso', na base das seguintes considerações essenciais:
- 'Ora, foi justamente a inconstitucionalidade do art. 334º do Código Civil tal como interpretado e aplicado pela Relação que a Recorrente suscitou nas alegações perante o Supremo Tribunal de Justiça - a Recorrente não invocou a inconstitucionalidade de tal preceito em si mesmo, mas sim na forma como ele foi interpretado e aplicado'.
- 'Consequentemente, a formulação verbal adoptada pela Recorrente é inequívoca e inatacável: dado que esta não alegou a inconstitucionalidade, tout court, da norma do art. 334º, não faria sentido que afirmasse que tal norma é inconstitucional, mas sim que seria inconstitucional se fosse a correcta a interpretação e aplicação que de tal preceito fez a Relação no acórdão recorrido
- interpretação e aplicação essas cuja efectiva desconformidade com a Constituição a Recorrente oportunamente arguiu perante o Supremo'.
- A circunstância de 'se ter formado caso julgado dos autos quanto à questão da insuficiência de poderes do outorgante da escritura de 31.10.94' não obsta a que o presente recurso 'mantenha a sua utilidade', pois um 'dos fundamentos do douto acórdão recorrido é o pretenso abuso de direito coenvolvido na outorga da escritura pública de transformação da Recorrente'.
5. Tudo visto, cumpre decidir. A situação retratada nos autos está perfeitamente sintetizada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de Março de 1999, que desatendeu uma arguição de nulidades do acórdão ora recorrido, nestes termos:
'No recurso em apreço estava em causa a transformação de uma sociedade por quotas em sociedade anónima, tendo comparecido perante o Notário a autorgar a respectiva escritura, M. R. que foi nomeado gerente da sociedade em Assembleia onde não estiveram presentes todos os gerentes, não se podendo considerar ter a decisão sido tomada pela administração. Foi decidido, no acórdão deste STJ, que o mandato conferido não permitia ao referido M. R. obrigar a sociedade nos termos em que o fez. Decidindo ainda que a transformação de uma sociedade (que foi o que ocorreu) é diferente da alteração do contrato da sociedade. Contrariamente ao que invoca a recorrente conheceu-se também da problemática do abuso de direito. Claramente se disse que 'mesmo que assim não fosse, sempre a transformação resultaria de uma escritura realizada com manifesto abuso de direito'. Tendo sido nomeado um representante da sociedade para outorgar a escritura de transformação, porque uma decisão judicial o inibiu de intervir, o mesmo indicou para o efeito outra pessoa. Justifica-se que se procurou contornar a proibição judicial e que se estava claramente perante uma situação de abuso de direito, mesmo sem ser necessário recorrer à doutrina do levantamento da personalidade colectiva. Expressamente se afirmou que não é possível concluir que a actuação dos autores integre um 'venire contra factum proprium'. E, no acórdão recorrido, depois de se considerar que se está perante 'a transformação de uma sociedade por quotas em sociedade anónima' e que, contrariamente ao defendido pela recorrente, 'a regra segundo a qual qualquer membro da administração pode, por si só, consignar em escritura pública, não é, pelas razões já expostas, extensível à transformação', avança-se com este discurso:
'A questão, contudo, não se esgota aqui. Mesmo que assim não fosse, sempre a transformação resultaria de uma escritura realizada com manifesto abuso de direito, como acertadamente decidiram as instâncias. O artigo 334º do C. Civil diz que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Aceita o legislador a concepção objectivista. Não é preciso que o agente tenha consciência da contrariedade do seu acto à boa fé, aos bons costumes ou ao fim social ou económico do direito exercido. Basta que o acto se mostre contrário, exigindo-se contudo, que o titular do direito tenha excedido manifestamente esses limites impostos ao seu exercício - Prof. Almeida Costa - 'Obrigações', pág. 52 e seguintes. A figura do abuso de direito surge como uma forma de adaptação do direito à evolução da vida. Por um lado, servindo como válvula de escape a situações que os limites apertados da lei não contemplam por forma considerada justa pela consciência social em determinado momento histórico, por outro evitando que observada a estrutura formal do poder que a lei confere, se exceda manifestamente os limites que se devem observar, tendo em conta a boa fé e o sentimento de justiça em si mesmo. A jurisprudência tem exigido que o exercício do direito tinha sido feito em termos clamorosamente ofensivos da justiça – Por todos o Ac. STJ de 08.11.84, BMJ nº 341, pág. 418. O abuso do direito equivalerá à falta de direito, obtendo-se os efeitos que se produziriam se alguém praticasse um acto que não pode realizar. Existirá tal situação no caso em apreço? Tendo o Dr. M. P. sido nomeado, como representante da sociedade, foi o mesmo inibido de intervir na mesma, por decisão judicial proferida em providência cautelar. Por vontade do referido Dr. M. P. foi então nomeado gerente da sociedade, M. R. e incumbido de outorgar na escritura em questão. Parece-nos evidente que se procurou contornar a proibição imposta, através do uso abusivo da personalidade jurídica da sociedade. Sendo a atribuição de personalidade jurídica às pessoas colectivas um dos princípios basilares do nosso direito, destina-se essa criação técnico-jurídica a facilitar a vida social e económica e não a conseguir objectivos proibidos por lei ou decisão judicial. Mesmo sem se tornar necessário recorrer à doutrina do levantamento da personalidade colectiva (defendida entre outros, pelo Prof. Menezes Cordeiro), parece certo que a ré, ou quem em nome dela actuou, excedeu manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico do direito. Face a esta actuação da aqui recorrente, que 'não respeitou a deliberação de ser o Dr. M. P. e só ele quem tinha poderes bastantes para outorgar a escritura, não
é possível concluir que a actuação dos autores integra o ‘venire contra factum proprium’, assumindo comportamentos contraditórios. Acrescenta-se uma nota final. Surge, em sede de alegações para este Tribunal, a tese de que a interpretação dada pelo Tribunal da Relação ao artigo 334º do C. Civil seria inconstitucional por comportar uma restrição do direito de acesso à justiça. Não se vê qualquer inconstitucionalidade. O mecanismo de abuso de direito não contém uma limitação do acesso ao direito, antes procura dar ao Juiz um instrumento que, ao serviço da justiça do caso concreto, procure evitar a desigualdade de tratamento que os conceitos indeterminados adoptados pela nossa lei civil tantas vezes permitem'.
6. Há que decidir primariamente a 'questão prévia' suscitada pelos recorridos, pois, a proceder, não se chegaria ao conhecimento do mérito do recurso de constitucionalidade. E tal questão, nos termos em que vem posta, quer significar, no fundo, que a pretensa questão de inconstitucionalidade levantada pela recorrente não assume os contornos de uma verdadeira questão de inconstitucionalidade normativa. Pois que, quando os recorridos dizem que a recorrente se quedou 'pela hipotética inconstitucionalidade do artº 334º do Cód. Civil', querem com isto dizer que a verdadeira censura vem dirigida ao acto de julgamento, escapando a discussão à
óptica jurídico-constitucional, com referência àquela norma do artigo 334º. Vejamos, pois, se é assim mesmo. O acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 2 de Abril de 1998, de que a recorrente veio a interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, tratou especificamente da 'questão sobre o abuso de direito' e, colocando-se no plano do 'relacionamento entre uma pessoa colectiva e a sua realidade intrínseca', concluiu que, 'ao ser autorgada a escritura de 94.10.31, produziu-se um resultado proibido, utilizando-se a personalidade colectiva da sociedade ‘C....,Ldª’ para iludir a situação proibitiva acima referida'
('Trata-se de uma situação que violou os limites impostos pela boa fé e, portanto, abusiva, nos termos do disposto no art. 334º do Código Civil' – acrescenta-se a seguir). Confrontada com essa perspectiva, a recorrente, naquele recurso de revista, e nas respectivas alegações, abordou tal questão, relativamente ao artigo 334º do Código Civil, nos seguintes termos:
'Alega-se que o que os requerentes da providência realmente quiseram foi o impedimento à transformação da sociedade, pois o afastamento da gestão da sociedade (o prejuízo fundamento da providência) ocorreria quem quer que fosse a pessoa do outorgante da escritura. Conceda-se que sim. Mas não é menos verdadeiro que, buscando embora aquele objectivo, enveredaram por um caminho que não os levaria ali...Pretendendo que a C....,LDª (ou qualquer pessoa por ela), fosse intimada a não executar a deliberação de transformação, pediram simplesmente ao tribunal que condenasse o Dr. M. P., e apenas o Dr. M. P., a não o fazer. Ora esta lide foi e continua a ser, para a C....,S.A., pura res inter alia, pois o Dr M. P. não tinha poderes para a representar em processos tendentes a obstar à transformação, nem foi demandado nessa qualidade. Como é que – repise-se – o mero conhecimento de que a providência foi decretada a torna extensível à apelante? Onde está a má-fé de esta não se reconhecer vinculada por uma decisão judicial que lhe não diz respeito e executar uma deliberação social que é válida e está ‘em vigor’? Note-se que a apelante não estaria impedida de executar a deliberação mesmo que, no processo intentado contra o Dr. M. P., os apelados tivessem peticionado a sua própria condenação (dela apelante) a abster-se de o fazer e que o tribunal deferisse efectivamente ao requerido e a notificasse para o efeito. A regra de mera eficácia relativa das decisões judiciais assim o determinaria – pelo que o mesmo não pode deixar de valer, por maioria de razão, no tocante a uma providência que a não teve especificamente como destinatária. O art. 334º do Código Civil, na interpretação que lhe é dada pela Relação, seria inconstitucional, por comportar uma inadmissível restrição do direito de acesso
á justiça, consagrado no art. 20º da Constituição. Na verdade, é hoje pacificamente aceite que estão contidos naquela norma quer o princípio do contraditório, fundamental no processo civil, quer a consequente eficácia relativa do caso julgado, nos termos da qual ninguém ser afectado por uma decisão proferida num processo judicial no qual não teve a possibilidade de intervir em defesa dos seus direitos e interesses. Aliás, a essencialidade do princípio em causa leva mesmo a que a doutrina mais conceituada o considere incluído no próprio âmbito de protecção do princípio do estado de direito democrático, pelo que a interpretação aventada ofenderia, também o preceito constante do art. 2º da CRP. Violada seria igualmente, nessa hipóteses, a norma do art. 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, aplicável nos termos do art. 16º, nº 2 da CRP, bem como os preceitos contidos no art. 6º da Declaração Europeia dos Direitos do Homem e no art. 14º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, directamente aplicáveis por força do disposto no art. 17º da CRP, na medida em que os direitos fundamentais neles previstos têm natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias consagrados no texto constitucional'. Daqui resulta que, sendo inquestionável ter sido aplicada a norma do art. 334º, do Código Civil, com um determinado sentido, naquele acórdão do Tribunal da Relação do Porto, a recorrente pretendeu questionar, em sede de constitucionalidade, o julgado, em termos de obrigar o Supremo Tribunal de Justiça a pronunciar-se, e não o fez como uma 'mera hipótese'. Tal arguição relevou para o decidido no acórdão recorrido, que conheceu da problemática do abuso de direito, como acima se dá nota nas transcrições feitas, não havendo só 'um alcance meramente académico' nessa decisão. Antes é o tronco do decidido, na medida em que no acórdão recorrido se assentou ser 'evidente que se procurou contornar a proibição imposta, através do uso abusivo da personalidade jurídica da sociedade' e parecer 'certo que a ré, ou quem em nome dela actuou, excedeu manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico do direito'. Só que tal juízo apresenta-se destituído de sentido normativo, não podendo falar-se aqui em julgamento de (in)constitucionalidade de uma norma jurídica. Com efeito, e como em hipótese similar à destes autos decidiu o acórdão do Tribunal Constitucional nº 655/99, publicado no Diário da República, II Série, nº 64, de 16 de Março de 2000, a propósito da mesma norma do artigo 334º do Código Civil, o que a recorrente veio questionar foi 'realmente a forma como as instâncias aplicaram o direito infraconstitucional', o que tem a ver, como se assentou nesse acórdão 'com a própria estrutura de tal cláusula geral na sua relação com a decisão judicial que a ela recorre'. A própria recorrente reconhece que 'não invocou a inconstitucionalidade de tal preceito em si mesmo, mas sim na forma como ele foi interpretado e aplicado', dirigindo essencialmente a censura ao acto de julgamento, no segmento em que o Supremo Tribunal de Justiça, depois de reafirmar a posição de que o ' abuso do direito equivalerá à falta de direito, obtendo-se os efeitos que se produziriam se alguém praticasse um acto que não pode realizar', aprecia a 'situação no caso em apreço', para concluir que 'a ré (ora recorrente), ou quem em nome dela actuou, excedeu manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico do direito' ('O mecanismo de abuso de direito não contém uma limitação do acesso ao direito, antes procura dar ao Juiz um instrumento que, ao serviço da justiça do caso concreto, procure evitar a desigualdade de tratamento que os conceitos indeterminados adoptados pela nossa lei civil tantas vezes permitem' - é o entendimento perfilhado no acórdão recorrido). Tanto basta para concluir que procede a dita 'questão prévia' suscitada pelos recorridos, com o significado que se lhe atribui, não podendo, assim, tomar-se conhecimento do objecto do presente recurso.
7. Termos em que, DECIDINDO, não se toma conhecimento do recurso e condena-se a recorrente nas custas, com a taxa de justiça fixada em 15 unidades de conta. Lisboa, 12 de Abril de 2000 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto Bravo Serra Maria Fernanda Palma (voto a decisão por considerar que, no presente caso, a questão não tem a mesma natureza da questão decidida no Acórdão nº 655/99, em que votei vencida. Aqui, diferentemente desse outro caso, considero que se trata de um puro problema de decisão) José Manuel Cardoso da Costa