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Procº nº 490/93-A.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Após ter sido notificado do Acórdão nº 595/99, tirado, aliás, na sequência de outros Acórdãos já proferidos nos presentes autos (os números
325/94, 459/94, 476/96, 765/96, 292/97, 395/97 e 519/97), veio o recorrente Licº C. S. requerer a concessão do apoio judiciário, pretensão que veio a ser indeferida por despacho do relator de 25 de Fevereiro de 2000 (fls. 218 a 220), despacho esse do seguinte teor:-
'O Licº C. S. veio, nos presentes autos, requerer a concessão do benefício do apoio judiciário na modalidade de ‘isenção de custas’, alegando, em síntese, que tem sido condenado neste Tribunal em custas cujo montante já ascende a milhares de contos e que a sua actual situação económica é deficiente, visto que tem como única fonte de receita mensal os proventos decorrentes de um contrato de prestação de serviços do qual aufere Esc. 80.000$00, sendo que a seu cargo tem uma filha, já maior, que não desfruta de quaisquer rendimentos.
Nos termos do nº 2 do artº 26º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, indefiro liminarmente o requerido benefício.
Na verdade, os presentes autos constituem «translado» de um processo que correu termos por este Tribunal, no qual foi já proferida, e há muito tempo, decisão final, sendo que esse «translado» tão somente foi determinado tendo em conta os inúmeros «incidentes» que, pelo ora requerente, têm sido deduzidos após a prolação daquela decisão final.
Anote-se, ainda, que, no processo de que o vertente «translado» foi extraído, o Licº C. S. formulara já pedido idêntico ao ora em apreço, pedido esse que veio a ser objecto de indeferimento por despacho do então Conselheiro Relator (despacho de 10 de Abril de 1996), o qual, tendo sido reclamado para a conferência, foi confirmado por intermédio do Acórdão nº 765/96, de 12 de Junho de 1996.
Nesse aresto foi dito, inter alia:-
‘............................................................................................................................................................................................................................................
2. Em 2 de Abril de 1996, veio C. S. requerer ao Tribunal Constitucional que lhe fosse concedido apoio judiciário sob a forma de isenção de custas, juntando para o efeito uma cópia da declaração de rendimentos respeitante ao ano de 1995, da qual consta um valor negativo. Por despacho do relator, de fls. 521 e 522, foi tal requerimento indeferido, com o fundamento de que o apoio judiciário tem o sentido de ‘evitar que alguém, por insuficiência de meios económicos, deixe de recorrer a juízo para fazer valer ou defender os seus direitos’, o que nunca será o caso quando o julgamento já teve lugar.
3. Notificado de tal despacho por carta registada expedida a 12 de Abril, apresentou o recorrente neste Tribunal, em 22 do mesmo mês, reclamação para a Conferência, nos termos do nº 3 do artigo 700º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 69º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. Nesta reclamação, suscita a questão de inconstitucionalidade da norma do artigo 17º, nº 2, do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, na ‘interpretação restritiva do segmento normativo 'em qualquer estado da causa’’, por violação do direito de acesso ao direito consagrado no artigo 20º, nº 1, da Constituição, e invoca dois argumentos, um de direito e outro de facto, para que a decisão da conferência lhe seja favorável:
- a possibilidade de o apoio judiciário ‘ser requerido em qualquer fase da causa' (prevista na parte inicial do nº 2 do artigo 17º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro) abrangeria, ‘literalmente, a fase processual desde o trânsito em julgado da decisão final até, inclusive, ao eventual processo de execução por custas (...), fase essa que compreende, taxativamente, os trâmites de cálculo e liquidação e de pagamento das custas’;
- a causa não estaria ainda definitivamente julgada, porquanto haveria ainda ‘recursos iminentes ou latentes, a ter lugar (...) logo que o processo baixe ao Supremo Tribunal de Justiça’.
Vejamos:
4. Quanto à alegada inconstitucionalidade da norma do artigo 17º, nº
2, do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, é manifesto não se verificar tal vício, como bem decorre do sentido do instituto do apoio judiciário, tal como foi sublinhado no despacho do relator, e que é o que corresponde ao conteúdo do direito de acesso aos tribunais, previsto no artigo 20º, nº 1, da Lei Fundamental.
5. Uma vez que a interpretação e a aplicação do direito vigente (em tudo quanto não implique apreciação da constitucionalidade e da legalidade, nos termos dos artigos 277º e seguintes da Constituição) fazem parte de reserva de jurisdição dos tribunais, não deve, em princípio, este Tribunal adoptar entendimento diferente do que já foi sufragado pelo Supremo Tribunal de Justiça, quanto ao apoio judiciário. Na sequência de jurisprudência, no mesmo sentido, dos Tribunais da Relação (v.g. Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 30 de Julho de 1981 e do Tribunal da Relação do Porto de 13 de Abril de 1989, publicados na Colectânea de Jurisprudência, Ano VI, Tomo IV, p. 70,71 e Ano XIV, Tomo II, p. 220,221), aquele Alto Tribunal estabeleceu, no Acórdão de 2 de Fevereiro de 1993 (publicado na Colectânea de Jurisprudência - Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Ano I, Tomo I, p. 107,108), que o ‘pedido de apoio judiciário só pode ser formulado na pendência de uma acção’ e que ‘não é admissível, depois de julgada definitivamente a causa, apenas para efeito de não pagamento das custas’. Improcede, pois, o primeiro argumento referido.
6. Se acaso o recorrente está na disposição - e em condições - de intentar outros recursos ‘logo que o processo baixe ao Supremo Tribunal de Justiça’, nada impede que, nesse momento, formule pedido de isenção de custas para tais recursos. Não pode é fazê-lo em relação aos recursos já decididos, nem junto do Tribunal Constitucional a propósito de recursos que irá interpor noutra instância. Assim, improcede também o segundo argumento aduzido.
............................................................................................................................................................................................................................................’
A corte argumentativa que levou ao indeferimento do pedido de apoio judiciário pelo aludido despacho do então Conselheiro Relator e que foi confirmado pelo acórdão de que parte se encontra transcrita é aplicável à presente situação e daí que, liminarmente, se rejeite a pretensão agora deduzida'.
Entretanto, como do referido Acórdão nº 595/99 o recorrente havia solicitado o respectivo esclarecimento, um tal pedido veio a ser indeferido por intermédio do Acórdão nº 101/2000 (fls. 214 e 215), prolatado em 22 de Fevereiro de 2000.
Notificado deste último aresto (o Acórdão nº 101/2000), veio o Licº C. S. fazer juntar aos autos requerimento, por meio do qual:-
- arguiu de nula essa decisão, visto que, na sua óptica, ela foi proferida antes de ter sido decidido o pedido de apoio judiciário;
- interpôs recurso de constitucionalidade do Acórdão nº 101/2000 'ao abrigo do disposto no art. 280.º, n.º 5, da Constituição', 'na medida em que o mesmo considera não inconstitucional o Decreto-Lei n.º 303/98 --, com fundamento no Acórdão n.º 654/99 (Proc. n.º 440/96, da 1.ª Secção) deste Alto Tribunal, que
-- implícita mas inequivocamente -- julga inconstitucional os pertinentes preceitos daquele decreto- -lei, expressamente aplicando à causa ali julgada, em
7-XII-1999, o ‘artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 149-A/83’';
- requerer a reforma do Acórdão nº 101/2000 no sentido de não ser ele, recorrente, condenado em custas, por isso que o Decreto-Lei nº 303/98 é inconstitucional, por consumar 'ofensa ao princípio da União de Estados de direito democrático consagrado n.º art. 6.,º n.º 2, do Tratado da União Europeia', sendo ilegal e inconstitucional as normas constantes dos números 2 a
5 do artº 84º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro - normas essas ao abrigo das quais foram editados os Decretos-Leis números 303/99 e 149-A/83 -, 'por ofensa aos preceitos -- de valor jurídico superior -- de ordem jus-eurocomunitária';
- requerer que, caso se oferecessem dúvidas a este Tribunal sobre a questão de saber se a vertente situação processual se insere no inciso «processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno», este mesmo órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa determinasse o reenvio de tal questão prejudicial ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.
Além disso, o Licº C. S. ainda fez juntar aos autos um outro requerimento em que pediu que se decretasse a 'suspensão de eficácia' (sic) do despacho que indeferiu o pedido de concessão do benefício de apoio judiciário.
2. Estão agora em causa, e somente, as questões relacionadas com os pedidos de arguição de nulidade e reforma do Acórdão nº 101/2000 e, bem assim, com a determinação de reenvio ao Tribunal de Justiça das Comunidades, e isso, justamente, porque as decisões a tomar sobre a solicitação conexionada com a interposição de recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade desse mesmo aresto e aqueloutra referente ao «pedido de suspensão de eficácia» do despacho que indeferiu o pedido de apoio judiciário, competem, num primeiro momento, ao relator, que, aliás, já proferiu em 28 de Março de 2000 (fls. 245 e
246) despacho sobre essa específica pretensão.
2.1. Em primeiro lugar, de assinalar é que o acórdão arguido de nulo não enferma de um tal vício.
Na verdade, a questão que se colocava e veio a ser decidida em tal aresto era a de saber se o antecedente acórdão (o Acórdão nº 595/99) enfermava de alguma obscuridade, tendo-se concluído pela negativa.
Assim, o solicitado pedido de apoio judiciário entretanto formulado não apresentava qualquer conexão com a mencionada questão, pelo que nada obstava processualmente à prolação do Acórdão que veio a tomar o nº 101/2000, consequentemente se não antevendo, de todo em todo, a existência de qualquer situação que, directa ou indirectamente, actuasse como prejudicial ao proferimento desse aresto ou acarretasse a sua invalidade.
2.2. No tocante ao pedido de reforma desse acórdão, com base na inconstitucionalidade das normas vertidas no Decreto-Lei nº 303/98 e na inconstitucionalidade ou ilegalidade das normas dos números 2 a 5 do artº 84º da Lei nº 28/82, reitera-se aqui o que tem sido abundantemente decidido por este Tribunal a propósito daquele primeiro diploma no sentido de se concluir não padecer ele do vício de desconformidade com o Diploma Básico, decisões essas, aliás, já tomadas nos presentes autos e em relações às quais nada há a acrescentar.
2.3. De outro lado, e tocantemente às normas constantes dos números
2 a 5 do aludido artº 84º, e independentemente da questão de saber se uma eventual contraditoriedade de legislação nacional com preceitos ínsitos em convenções internacionais regulamente ratificadas ou aprovadas por Portugal ou com normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte, gera desde logo e em face dessa contraditoriedade, o vício de inconstitucionalidade, o que é certo é que se não lobriga que aqueles preceitos briguem com qualquer normativo regente do Tratado da União Europeia, sendo que, como se depara claro, é destituído de sentido esgrimir-se com a gratuitidade do recurso para o Tribunal de Justiça das Comunidades como modo de
«preferência processual» para que, nas situações em que porventura esteja em causa uma eventual contraditoriedade de legislação interna de um país pertencente às Comunidades com o ordenamento europeu relacionado com a protecção de direitos fundamentais e, ao mesmo tempo, com a constituição desse mesmo país, também no particular dos direitos fundamentais, se lance mão desse recurso.
2.4. Por último, assinala-se que, não se suscitando dúvidas a este Tribunal no sentido de que haja desconformidade ou invalidade da tributação regida pelo Decreto-Lei nº 303/98 tendo por referência quaisquer normas constantes do ordenamento comunitário, designadamente com as que se inserem no Tratado da União Europeia, não se vêm quaisquer motivos que conduzam à sugerida suscitação de «reenvio» para dilucidação das questões prejudiciais.
Termos em que se desatende a arguição de nulidades e pedido de reforma do Acórdão nº 101/2000 e se indefere o sugerido «reenvio».
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta. Lisboa, 11 de Abril de 2000 Bravo Serra José de Sousa e Brito Guilherme da Fonseca Messias Bento Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Luís Nunes de Almeida