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Processo nº 186/99
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, exarou o Relator a seguinte DECISÃO SUMÁRIA:
'1. H..., S.A., actualmente HR..., Ldª, sociedade comercial com sede em Mem Martins - Sintra, veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional, 'ao abrigo da al. b), do nº 1, do artº 70º da Lei 28/82 de 15.11', das decisões da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça, de que resulta a manutenção do regime de subida e do efeito de recurso agravo em que é interessada, e com ele
'pretende-se ver declarada a inconstitucionalidade do artº 515º do Código de Processo Civil, se interpretado no sentido de que devem ser consideradas pelo Tribunal todas as provas, mesmo as obtidas por meio ilícito ou até criminoso e os artºs 80º, nº 3 do Código Processo de Trabalho e 734º do Código de Processo Civil se interpretados no sentido que acima se deixa referido e que aqui a Ré
'brevitatis causa' se abstém de repetir', ou seja, 'interpretados no sentido de que os agravos apenas sobem imediatamente quando a sua retenção os torne absolutamente inúteis e entendendo-se que se não verifica a excepção, isto é, entendendo-se que a retenção não os torna absolutamente inúteis, mesmo que, o efeito diferido implique a produção de prova ilícita, e mesmo leve ao cometimento de um crime, são também constitucionais, por violarem, também elas, as citadas disposições da Constituição da República'.
2. Nas citadas decisões o Supremo Tribunal de Justiça entendeu que a 'única questão a decidir é a de saber qual é o regime da subida do recurso de agravo e o efeito a atribuir-lhe do despacho que admitiu como meio de prova as cassetes de gravação apresentadas pelo Autor', acrescentando, que não interessa
'averiguar, se esse meio de prova é lícito ou ilícito pois esta é uma questão a decidir no momento em que se conheça do agravo, é o seu objecto'. E considerando o regime legal decorrente dos artigos 80º, nºs 1 e 3, do Código de Processo do Trabalho, e 734º, nº 2, do Código de Processo Civil, entendeu o mesmo Supremo Tribunal não merecer censura o decidido pelo tribunal de relação quando se atribuiu aos agravos interpostos pela recorrente 'subida diferida e efeito meramente devolutivo'. Daqui resulta o seguinte: a) não foi aplicada nessas decisões a norma do artigo 515º do Código de Processo Civil, nem ela própria, nem com o sentido que a recorrente pretende que tenha sido aplicada em tais decisões, sendo esclarecedor o que o Supremo Tribunal de Justiça afirma, a certo passo:
'É evidente que a Recorrente pretende evitar a audição das gravações, mas isso não determina a subida imediata do recurso, pela simples razão de que a decisão a proferir sobre o objecto do agravo, aproveita ao Recorrente se a mesma lhe for favorável. Prosseguindo o processo com a audição das cassetes e caso estas venham a ser decisivas para uma sentença de mérito em sentido contrário aos interesses da agravante, o eventual provimento do recurso anulará a matéria de facto alicerçada nessas cassetes e os actos subsequentes a essa decisão, incluindo a sentença de mérito. A Recorrente confunde a eficácia do despacho que admitiu a audição das cassetes, com a eficácia da decisão do recurso que sobre aquele venha a recair e só em relação a esta se levanta a questão da absoluta inutilidade do recurso.' E volta-se a repetir o mesmo neste passo:
'A única questão que era objecto do recurso era a de saber qual o regime de subida e o efeito do agravo interposto pela Ré não estando em apreciação o mérito do mesmo, ou seja, se o meio de prova em causa devia ou não ter sido admitido. Ora, tal questão foi apreciada pelo que não existe qualquer nulidade no que tange à omissão de pronúncia'. b) as únicas normas aplicadas nas decisões recorridas são as dos artigos 80º, nº
3, e 734º, já citadas e a que a recorrente se refere no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade. Só que, reportando-se esses artigos ao regime de subida e aos efeitos dos recurvos de agravo, e localizando-se aí a controvérsia levantada pela recorrente, ela não suscitou nenhuma questão de inconstitucionalidade nas alegações apresentadas perante o Supremo Tribunal de Justiça, sendo esse processualmente o momento adequado e próprio para tal (artigo 72º, nº 2, da Lei nº 28/82). Nessa peça processual a recorrente limitou-se, identificando aquele artigo 80º, nº 3, a sustentar que se impõe a subida imediata do recurso de agravo, sem nada acrescentar quanto à matéria de (in)constitucionalidade desse preceito (em si mesmo ou com o sentido com que foi aplicado). E daí que da parte do Supremo Tribunal de Justiça não haja nenhuma pronúncia relativamente a essa matéria. Sendo isto assim, faltam os pressupostos específicos do presente recurso de constitucionalidade fundado no artigo 70º, nº 1, b): o de aplicação de norma jurídica - quanto ao artigo 515º - e o de arguição de inconstitucionalidade de norma jurídica durante o processo - quanto aos artigos 80º, nº 3, e 734º -, o que determina que não se possa conhecer de tal recurso.
3. Termos em que, DECIDINDO, e ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo
78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, aditado pelo artigo 2º, da Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, e na redacção do artigo 1º, da Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro, não tomo conhecimento do recurso e condeno a recorrente nas custas, com a taxa de justiça fixada em dez unidades de conta' B. Dessa decisão sumária veio a recorrente 'reclamar para a Conferência, o que faz nos termos do disposto no nº 3 do artº 78º-A da Lei 28/82 na redacção que lhe deu a Lei nº 13-A/98', confirmando que, 'o que, de facto, se pretende com o recurso para o Tribunal Constitucional é que se declare a inconstitucionalidade do artº 80º, nº 3 do Código do Processo do Trabalho e do artº 734º nº 2 do Código do Processo Civil, na medida em que estas disposições legais impõem a subida diferida do recurso de agravo mesmo quando este regime de subida permite
- ou até impõe - a produção de prova cujo acto de produção constitui, ele próprio, a prática de um crime - no caso o do artº 119º do Código Penal'. Na reclamação a recorrente reconhece que 'suscitou a questão da
(in)constitucionalidade de tais preceitos se interpretados, com tal amplitude - isto é, se não harmonizados com o nº 3 do artº 80º do Código Processo Trabalho e com o nº 2 do artº 734º do Código Processo Civil, ou seja, se se não entender que se verifica a inutilidade da retenção mesmo quando tal retenção implica a produção de prova que consubstancia, ela própria (produção) a prática de um crime - na reclamação que fez do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça' e que
'o Supremo Tribunal de Justiça ainda estava em tempo de se pronunciar sobre tal inconstitucionalidade'. C. Não foi apresentada nenhuma resposta a tal reclamação. D. Tudo visto cumpre decidir.
É a própria reclamante que reconhece que suscitou a questão de inconstitucionalidade das normas legais em causa 'na reclamação que fez do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça' e não em momento anterior à prolação desse aresto, não sendo aquela reclamação, todavia, momento relevante e
'processualmente adequado' para o fazer (artigo 72º, nº 2, da Lei nº 28/82). Com efeito, vindo controvertido pela reclamante no recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça o regime de subida e os efeitos dos recursos de agravo, à luz das normas legais em causa, não foi por ela levantada nenhuma questão de inconstitucionalidade nas alegações desse recurso, não podendo aproveitar-lhe a suscitação posterior à prolação do acórdão recorrido, a propósito de uma arguição de nulidade. Tanto assim que no acórdão que conheceu dessa arguição e a desatendeu, diz-se acertadamente que a 'questão colocada pela Ré (a ora reclamante) não integra o conceito de nulidades mas antes um erro de julgamento por o acórdão ter feito uso de normas que a seu ver, enfermam de inconstitucionalidade'. Tanto basta para concluir que a fundamentação da DECISÃO SUMÁRIA não é abalada pela presente reclamação, e, por isso, deve ser confirmada. E. Termos em que, DECIDINDO, indefere-se a reclamação, não se tomando conhecimento do recurso, e condena-se a reclamante nas custas, com a taxa de justiça fixada em 15 unidades de conta. Lisboa, 18 de Maio de 1999 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto Luís Nunes de Almeida