Imprimir acórdão
Proc. nº 65/98 Acórdão nº 287/00
3ª Secção Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. E... propôs no Tribunal de Trabalho de Almada uma acção de impugnação do despedimento contra o BANCO C..., SA, indicando como principal fundamento a circunstância de se encontrar prescrita a infracção disciplinar em que o despedimento se baseou, por ter decorrido mais de um ano entre a prática dos factos e a instauração do processo disciplinar correspondente. Na contestação, o BANCO C..., SA veio defender, por entre o mais, a não aplicabilidade do prazo prescricional previsto no nº 3 do artigo 27º da L.C.T.
às infracções disciplinares que consubstanciam também um ilícito criminal, infracções essas a que deveriam ser aplicados os prazos de prescrição estabelecidos pela Lei Penal. Em seu entender, considerá-las 'abrangidos naquele preceito' torná-lo-ia inconstitucional 'por violação do artº 13º da Constituição da República Portuguesa', por conter um regime 'diferente daquele que vigora no ordenamento jurídico, designadamente o que se aplica a outras entidades, como por exemplo aos Agentes da Administração Pública', já que 'estão em causa os mesmos valores que se pretendem tutelar, designadamente o de confiança nas relações de trabalho'. O Tribunal do Trabalho de Almada considerou procedente a acção, determinou a reintegração do Autor no seu posto de trabalho e condenou a Ré no pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que o Autor deixou de receber, acrescido dos respectivos juros.
Quanto ao aspecto que ora mais releva, o Juiz do Tribunal de Trabalho de Almada afirmou o seguinte na respectiva sentença:
'Tendo ficado provado que os factos ocorreram entre 10 e 12/11/92 e o processo disciplinar apenas movido em 1995 é claro que o prazo previsto no artº 27 nº 3 da LCT já havia decorrido, tendo-se consumado a prescrição.
Nem se diga como a R. que tratando-se de uma infracção disciplinar que consubstancia igualmente um ilícito criminal, em matéria de prescrição, deverão aplicar-se ao procedimento disciplinar os prazos estabelecidos pela lei penal.
Na verdade, como refere o Ac. Do S.T.J. de 16/2/90 – Rec nº 2250, a diferença entre os interesses teleologicamente subjacentes à infracção criminal e à infracção disciplinar justificam a estatuição de prazos diversos para as respectivas prescrições. Com efeito, a infracção criminal consiste na ofensa de valores jurídico-criminais, tutelados pelo direito criminal através dos tipos legais de crimes, que se prendem de maneira essencial com a vida comunitária do homem e com a livre expansão da sua personalidade moral, enquanto na infracção disciplinar laboral está em causa o interesse juslaboral da entidade patronal que ela intenta proteger, com o escopo de se sancionarem os comportamentos do trabalhador que ponham em causa o justo e equilibrado desenvolvimento da relação laboral'. E concluiu dizendo não vislumbrar 'qualquer violação do princípio da igualdade, tanto mais como já se referiu estamos perante interesses teleologicamente diversos que merecem em virtude disso tratamento diverso'.
2. Inconformada, a Ré recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, desenvolvendo nas suas alegações a argumentação já apresentada na contestação e mantendo a invocação da inconstitucionalidade do nº 3 do artigo 27º da L.C.T., por violação do princípio da igualdade.
O Tribunal da Relação de Lisboa, porém, negou provimento ao recurso e confirmou a sentença recorrida.
Sobre o prazo de prescrição de 'um ano a contar do momento em que teve lugar' a infracção disciplinar, fixado no nº 3 do artigo 27º da L.C.T., o Tribunal da Relação de Lisboa, citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9/12/88, proferido no processo nº 1971, considerou fundamentar-se nos seguintes interesses:
'- A necessidade de tutelar o valor da segurança como certeza jurídica, que predominantemente inspira o instituto da prescrição em geral e, em particular, no âmbito do direito do trabalho;
· A necessidade de evitar que a perspectiva de punição de uma eventual infracção disciplinar seja mantida como uma ameaça suspensa indefinidamente sobre o trabalhador, a fim de lhe condicionar o comportamento;
· A necessidade de salvaguardar os fins que são próprios da sanção discliplinar laboral e que são sobretudo preventivos – evitando, para esse efeito, o excessivo distanciamento entre a infracção e a sanção, o que é conseguido mediante a estipulação de um prazo prescricional de um ano a contar do momento em que teve lugar a infracção disciplinar'. Relativamente à questão da constitucionalidade da norma impugnada, disse o seguinte:
'E também não assiste razão à recorrente quando refere que não devia ser aplicado no caso em apreço o disposto no artº 27º, nº 3 da L.C.T., por este se mostrar ferido de inconstitucionalidade material (conclusões nºs 9 a 12).
É que, nos casos referidos, e como se diz na sentença recorrida, estamos perante interesses ‘teleologicamente diversos’ que merecem, em virtude disso, tratamento diverso. Não se verifica, pois, qualquer violação do princípio da igualdade consignado no artº 13º da C.R.P.'.
3. É do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que vem interposto o presente recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos da alínea b) do nº
1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. Pretende a recorrente a apreciação da constitucionalidade da norma contida no nº
3 do artigo 27º do Decreto-Lei nº 49.408, de 24 de Novembro de 1969 (L.C.T), por violação do disposto nos artigos 13º, 207º e nº 2 do 208º da Constituição. Notificada para o efeito, a recorrente veio apresentar as suas alegações, defendendo a inconstitucionalidade invocada, mas limitando o respectivo fundamento à violação do princípio da igualdade. Em síntese, sustentou que abranger na norma impugnada as infracções disciplinares que consubstanciam igualmente infracções criminais conduziria à impunidade de ilícitos disciplinares de grande gravidade apenas porque não foram descobertos no prazo de um ano. Em seu entender, 'o instituto da prescrição, quer no âmbito do Direito do Trabalho, quer no âmbito do Direito Penal, justifica-se pela necessidade de tutelar o valor da segurança, como certeza jurídica, de forma a evitar que a perspectiva de punição de uma eventual infracção seja mantida indefinidamente. Todavia, se os factos praticados ofendem não só os valores que devem presidir às relações entre trabalhador e empregador, como também, os valores jurídico-criminais, nenhuma razão existe para que o prazo de prescrição não seja o previsto na Lei Penal'. O recorrente invoca ainda a existência de um 'princípio geral de direito', revelado no nº 3 do artigo 498º do Código Civil e presente no artigo 4º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos, de acordo com o qual o prazo de prescrição de infracções que constituam simultaneamente ilícitos criminais é o que corresponde ao previsto na lei criminal, se este for superior. Ora, a aplicação desse princípio às relações privadas de trabalho seria imposta pelo princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição. E isto porque 'os princípios que enformam o poder disciplinar são semelhantes, quer no domínio do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos da Administração Central, Regional e Local, quer da Lei do Contrato de Trabalho'.
'(...) Caso contrário, estamos perante uma flagrante e patente desigualdade de tratamento, sem qualquer fundamento, uma vez que estão em causa os mesmos valores que se pretendem tutelar; a confiança nas relações entre empregador e trabalhador, entre o Estado como entidade empregadora e os seus funcionários'.
4. Constitui assim objecto deste processo a norma do nº 3 do artigo
27º da Lei do Contrato de Trabalho, o Decreto-Lei nº 49.408, de 24 de Novembro de 1969, 'na parte em que se considere aplicável às infracções disciplinares que configuram simultaneamente infracções criminais' (conclusão 6. da alegação da recorrente).
É o seguinte o texto do citado nº 3:
'A infracção disciplinar prescreve ao fim de um ano a contar do momento em que teve lugar, ou logo que cesse o contrato de trabalho'.
Não cabe naturalmente ao Tribunal Constitucional pronunciar-se sobre a interpretação – aliás, questionada por parte da doutrina – que foi adoptada para este preceito pela decisão recorrida mas, tão somente, apreciar a sua alegada inconstitucionalidade.
5. Em breves traços, convém ter presente a matéria de facto que esteve na base da acção proposta.
Entre 10 e 12 de Novembro de 1992 desapareceram de uma das dependências da Ré, que apresentou queixa crime contra incertos em 2 de Fevereiro de 1993, 'dois maços de cautelas premiadas com o valor total de
714.750$00'. Em 10 de Março de 1994, o Autor foi acusado pelo Ministério Público, tendo a Ré formulado então um pedido de indemnização cível. O Autor foi condenado, por acórdão de 10 de Novembro de 1995 entretanto transitado, pela prática de um crime de furto e pela prática, em co-autoria, de dois crimes de burla. A condenação baseia-se 'no facto de o Autor entre 10 e 12 de Novembro de 1992, no exercício das suas funções de segurança, na dependência do Banco na Rua Augusta, se ter apoderado de oito fracções de Lotaria, as quais haviam sido depositadas nas contas às ordens dos respectivos clientes do Banco, no total de 4.500$00, após o que entregou à sua mulher, com vista à reclamação dos respectivos prémios ou troca por outras fracções, o que esta veio efectivamente a fazer, rebatendo-as e trocando-as por outras de idêntico valor'. Em 7 de Dezembro de 1995, foi mandado instaurar processo disciplinar com intenção de despedimento por despacho do Conselho de Administração da Ré; e a instauração do processo foi comunicada ao Autor, por carta registada com aviso de recepção, em 9 de Janeiro de 1996. A ré decidiu em 10 de Maio aplicar ao Autor a sanção de despedimento com justa causa, decisão recebida pelo Autor em 3 de Junho de 1996, também por carta registada com aviso de recepção. O Autor encontrava-se em situação de 'baixa médica desde 01 de Julho de 1993'.
6. De acordo com a norma impugnada, vale para as infracções disciplinares laborais que se traduzam na prática de factos simultaneamente qualificados como infracções criminais o prazo de prescrição de um ano a contar da prática do facto (nº 3 do artigo 27º, atrás transcrito). Sustenta a recorrente que esta norma infringe o princípio constitucional da igualdade, por, injustificadamente, importar um regime diverso daquele que é consagrado pelo 'Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos (artº 4º). (...) Aliás, o mesmo se passa por exemplo no domínio do Estatuto da Ordem dos Advogados (vd. artº 99º), bem como no Estatuto do Pessoal dos C.T.T. (vd. artº
4º, Portaria nº 348/87, de 28 de Abril'. E chama a atenção para o facto de o Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos ser 'aplicável igualmente, em matéria disciplinar, aos Oficiais de Justiça e aos Magistrados Judiciais'.
7. Não se afigura procedente, todavia, a alegada de violação do princípio da igualdade. O Tribunal Constitucional já por diversas vezes se debruçou sobre este princípio, tendo tido a oportunidade de, reiteradamente, fixar uma orientação firme, quer quanto às suas exigências, quer quanto à metodologia a aplicar para reconhecer as correspondentes infracções. Assim, e em primeiro lugar, utilizando agora como referência o acórdão nº 683/99
(publicado no Diário da República, II Série, de 3 de Fevereiro de 2000), o Tribunal Constitucional, como em vários outros acórdãos anteriores, afirmou
'Como se escreveu no Acórdão nº 425/87 deste Tribunal (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 10º vol., pp 451 e segs.):
‘O âmbito de protecção do princípio da igualdade abrange diversas dimensões: proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer a diferenciação de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais; proibição de discriminação, não sendo legítimas quaisquer diferenças de tratamento entre os cidadãos baseadas em categorias meramente subjectivas ou em razão dessas categorias; obrigação de diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que pressupõe a eliminação pelos poderes públicos de desigualdades fácticas de natureza social, económica e cultural (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1º vol., 2ª ed., Coimbra, próprio. 149 e segs.). A proibição do arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controlo.
Todavia, a vinculação jurídico-material do legislador a este princípio não elimina a liberdade de conformação legislativa, pois lhe pertence, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão-de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente. Só existe violação do princípio da igualdade enquanto proibição de arbítrio quando os limites externos da discricionaridade legislativa são afrontados por carência de adequado suporte material para a medida legislativa adoptada. Por outro lado, as medidas de diferenciação devem ser materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da praticabilidade, da justiça e da solidariedade, não se baseando em qualquer razão constitucionalmente imprópria’
'. Em segundo lugar, e para hipóteses em que, como agora sucede, estava em causa o confronto entre aspectos particulares de estatutos mais amplos – neste caso, dos funcionários públicos e dos trabalhadores sujeitos ao regime do contrato de trabalho –, o Tribunal Constitucional observou repetidamente que não é aceitável, precisamente, isolar um ponto do regime global para fazer a comparação. Assim, no citado acórdão nº 683/99: '(...) Como se salientou recentemente no Acórdão nº 555/99 (e, em sentido semelhante, ainda mais recentemente, no Acórdão nº 663/99, ambos inéditos), em relação à comparação de pontos parciais do estatuto ou do regime jurídico da relação de emprego público (no caso, de funcionários civis e militares), ‘o carácter tendencialmente fechado e totalizante do quadro normativo que definiu o estatuto [...] levanta um decisivo obstáculo a que se considere exigível e decorrente da observância do princípio da igualdade a ‘extensão’ de um determinado direito [...].' Note-se que os acórdãos nºs 555/99 e 663/99 foram, entretanto, publicados no Diário da República, II Série, de 15 de Março de 2000 e de 24 de Fevereiro de 2000, respectivamente. A mesma advertência se pode encontrar, nomeadamente, no acórdão nº 367/99
(publicado no Diário da República, II Série, de 9 de Março de 2000): '(...) a igualdade é sempre um conceito de relação (cf. o parecer da Comissão Constitucional nº 5/81, Pareceres da Comissão Constitucional, 14º vol., pp. 309 e segs., e o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 44/84, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 3º vol., pp. 133 e segs.) e o de que a igualdade é um conceito predominantemente valorativo. Por outras palavras, aferir da igualdade/desigualdade entre duas situações não passa penas pela sua consideração isolada, antes é, sobretudo, um trabalho de ponderação dos valores que estão subjacentes à disciplina legal de cada uma delas e da sua harmonização.' E, no acórdão nº 663/99, atrás citado, tirado a propósito da constitucionalidade da diferença de tratamento estabelecida entre trabalhadoras da função pública e trabalhadoras vinculadas por contrato individual de trabalho no que toca à licença de maternidade, disse-se: 'Pretender fazer valer uma igualdade formal em matéria de uma regalia específica ou norma específica, desconsiderando todo o universo de diferenças que a justifica, bem como o sentido da própria regulamentação globalmente considerada que a impõe (diverso, como se disse, perante relações de direito privado e no domínio público), seria desconsiderar o próprio sentido do princípio da igualdade, que exige o tratamento diferenciado do que é diferenciado tanto quanto exige o tratamento igual do que é igual. Sendo certo, aliás, que a igualação de uma circunstância pode, no conjunto, agravar a desigualdade – basta que tal igualização se faça a favor da parte mais favorecida em todas as outras circunstâncias, menos naquela.'
Finalmente, o Tribunal Constitucional frisou, repetidamente, que há que admitir que existem diferenças significativas entre a relação jurídica de emprego público e a correspondente relação privada, justificativas de regimes diversos; essas diferenças, diga-se agora, traduzem-se em particularidades suficientes para fundar materialmente, quanto ao ponto de que nos ocupamos, a beneficiação do empregador público relativamente ao empregador privado.
Assim, no já citado acórdão 683/99: 'Não podem, em primeiro lugar, negar-se as diferenças de regime jurídico entre a relação jurídica de emprego público e privado, mesmo quando aquela não se funda num acto administrativo de nomeação de funcionário, ou num contrato de provimento, mas antes num verdadeiro contrato de trabalho celebrado com o Estado. A especificidade da relação jurídica de emprego público (...) resulta, antes de mais, do facto de ela se estabelecer entre um particular e o Estado, estando tal relação colimada à satisfação das necessidades de pessoal da Administração para prossecução do interesse público (...). Como resultado da sua orientação para a satisfação do interesse público e da sua integração num corpo ao serviço do Estado, os trabalhadores da função pública estão sujeitos a um regime jurídico próprio, substancialmente diferente do regime jurídico que disciplina os trabalhadores do sector privado.’ E indicam-se, seguidamente, várias diferenças de regime, a propósito da acumulação de funções, da responsabilidade dos funcionários, do recrutamento e selecção dos funcionários, da publicidade conferida a alguns actos relativos à sua situação profissional, da extinção da relação jurídica de emprego público, da competência dos tribunais para julgar os litígios emergentes de conflitos de trabalho, dos regimes salariais.
8. É claro que a diferença global dos dois regimes não impediu o Tribunal Constitucional de, em casos em que se encontravam em causa eventuais distinções que afectavam direitos fundamentais dos trabalhadores, estender a um dos grupos normas definidas para o outro, justamente por considerar não materialmente fundada a diferenciação. Assim, nomeadamente, no que respeita à participação das respectivas organizações no processo de elaboração da legislação do trabalho
(cfr., por exemplo, os acórdãos 451/87, 93/92 e 362/94, publicados em Acórdãos do Tribunal Constitucional, respectivamente, vol. 10º, pág. 161 e segs., 21º, pág. 91 e segs. e 28º, pág. 81 e segs.). A verdade, porém, é que não nos encontramos perante uma hipótese, sequer, semelhante ou análoga. Note-se, aliás, restringindo agora a nossa atenção aos diversos prazos de prescrição estabelecidos em matéria disciplinar, seja pela Lei do Contrato de Trabalho, seja pelo Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos, que encontramos sempre diferenças, todas elas demonstrando a maior gravidade das infracções cometidas no âmbito da relação de emprego público. Assim, onde este
último Estatuto estabelece prazos de 3 anos a contar da prática da infracção (nº
1 do artigo 4º), 3 meses sobre o conhecimento do dirigente máximo do serviço (nº
2) e 6 meses, 3 anos ou 5 anos para a prescrição da pena, a Lei do Contrato de Trabalho prevê, respectivamente, 1 ano (nº 3 do artigo 27º) e 60 dias (nº 2 do artigo 31º) e 60 dias (nº 3).
É inegável que, em ambos os casos, é o funcionamento da organização em que se inserem os trabalhadores que é imediatamente protegido pelo regime disciplinar, e que esse funcionamento é tão mais afectado quanto mais graves forem as infracções praticadas; a verdade, porém, é que, na relação de emprego público, é o bom desempenho das tarefas obrigatoriamente levadas a cabo pela Administração no interesse geral que está em causa, ao passo que, numa relação de emprego privada, é o interesse particular do empregador e da sua empresa que é prosseguido. No confronto entre esses interesses – cuja prossecução exclusiva levaria à inexistência de prazos de prescrição –, por um lado, e a garantia da segurança dos trabalhadores – que justifica a definição de prazos de prescrição, e que é tanto mais protegida quanto menores eles forem –, por outro, o legislador está constitucionalmente autorizado a dar um relevo desigual, tendo em conta a prossecução do interesse público do bom funcionamento da Administração, à estabilidade e segurança do emprego.
Assim, pelos fundamentos exposto, nega-se provimento ao recurso. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 ucs. Lisboa, 17 de Maio de 2000 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza José de Sousa e Brito Messias Bento Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida