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Proc. nº 246/99 TC – 1ª Secção Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam em conferência na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 - No Proc. 35/C/15/O/98 do Supremo Tribunal Militar (STM), o Procurador--Geral Adjunto nesse Tribunal requereu que fosse declarado o impedimento do Juiz Conselheiro A... para intervir no julgamento, em sede de recurso.
Por despacho proferido a fls. 191 v. daquele processo, não se tomou conhecimento do requerido.
O mesmo Procurador-Geral Adjunto reclamou para a conferência do referido despacho.
Com fundamento em ilegitimidade do Ministério Público, o STM, por acórdão, não tomou conhecimento da reclamação.
O Ministério Público interpôs, então, recurso para o Tribunal Constitucional, dizendo, no respectivo requerimento de interposição:
'7º. (...) e tal como já havíamos referido no nosso requerimento, ao Ministério Público compete, nos termos do art. 219º, nº. 1 da Constituição e art. 1º da Lei nº. 60/98 (E.M.P.) defender a legalidade democrática.
8º. Legalidade essa que julgamos ter sido violada quando o Exmo. Sr. Conselheiro Gonçalves Pereira se pronunciou sobre uma questão em relação à qual havia tomado posição na 1ª instância,
9º. Contra o que dispõem os arts. 216º do Código de Justiça Militar e 40º do Código de Processo Penal,
10º. e fundamentalmente, o art. 32º, nº. 1 da Constituição.'
Nos termos do artigo 75º-A nº. 5 da Lei nº. 28/82, o recorrente foi notificado para indicar a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade pretendia ver apreciada pelo Tribunal Constitucional, qual a alínea do nº. 1 do artigo 70º da citada Lei nº. 28/82 ao abrigo da qual pretendia recorrer e, finalmente, qual a peça processual em que a inconstitucionalidade ou ilegalidade fora suscitada.
Respondeu o Ministério Público indicando que o recurso era interposto ao abrigo da alínea b) do nº. 1 do artigo 70º da Lei nº. 28/82, que as normas arguidas de inconstitucionalidade eram as dos artigos 40º do Código de Processo Penal e 216º nº. 1 al. d) do Código de Justiça Militar as quais, interpretadas no sentido de que é permitido ao juiz do recurso pronunciar-se sobre a questão em relação à qual já se havia pronunciado em 1ª instância, violavam os artigos 32º nºs. 1 e 5 da Constituição e que a inconstitucionalidade fora suscitada no requerimento em que pedira a declaração de impedimento do Juiz Conselheiro Gonçalves Pereira.
O recurso não foi admitido por despacho de fls. 255/256 com fundamento em que a questão de inconstitucionalidade não fora suscitada quer quanto ao artigo 40º do CPP, quer no que concerne ao artigo 216º nº. 1 alínea d) do CJM; mesmo admitindo que a inconstitucionalidade da norma contida no primeiro artigo citado tivesse sido suscitada, a decisão recorrida não aplicara essa norma, pois o fundamento do não conhecimento da reclamação residira na falta de legitimidade do Ministério Público.
É deste despacho que vem deduzida a presente reclamação que se transcreve na
íntegra:
'O representante do Ministério Público junto do Supremo Tribunal Militar vem, ao abrigo do disposto no art. 76º, nº. 4 da Lei 28/82, de 15/11, reclamar do despacho proferido a fls. 256 e 257 do processo acima referenciado, que indeferiu o requerimento da interposição do recurso para esse Alto Tribunal (v. fls. 242 a 249). Requer-se, assim, que os autos vão à conferência, nos termos do nº. 1 do art.
77º da citada Lei e aí se decida que é admissível o recurso.'
Indo os autos com vista ao Ministério Público neste Tribunal pronunciou-se ele no sentido do indeferimento da reclamação por entender que, suscitada embora a questão da inconstitucionalidade da norma do artigo 40º do CPP, esta não fora aplicada na decisão recorrida.
Cumpre decidir.
2 - Nos termos do artigo 76º nº. 4 da Lei nº. 28/82, do despacho que indefira o requerimento de interposição do recurso cabe reclamação para o Tribunal Constitucional.
Não regula a Lei nº. 28/82 os termos em que a reclamação deve ser deduzida, estabelecendo apenas, no artigo 77º, os trâmites processuais relativos ao julgamento da reclamação.
Há, pois, que aplicar as normas do Código de Processo Civil, como legislação subsidiária, nos termos do artigo 69º da Lei nº. 28/82, para aferir da regularidade da reclamação apresentada.
Ora, de acordo com o disposto no artigo 688º nº. 2 do CPC, na reclamação, 'o recorrente exporá as razões que justificam a admissão do recurso'.
Impõe-se, assim, que o reclamante substancie a sua discordância relativamente ao despacho de não admissão do recurso, não prevendo a lei qualquer despacho judicial de aperfeiçoamento que vise proporcionar ao reclamante o suprimento da omissão, diferentemente do que acontece nos casos previstos no artigo 690º nº. 3 do CPC.
Uma reclamação sem a exposição de quaisquer fundamentos representa afinal a mera inconformação do reclamante em relação ao despacho reclamado, o que, de certo modo, equivale à interposição de recurso sem alegações, situação que a lei fulmina com a deserção do recurso (artigo 690º nº. 2 do CPC).
No caso, como se patenteia na reclamação integralmente transcrita, o Magistrado reclamante não expôs uma única razão que justificasse a admissão do recurso, sendo certo que a lei não isenta o Ministério Público do ónus de apresentar os fundamentos da impugnação deduzida.
Mas, sendo assim, faltando um requisito essencial da reclamação, deste se não pode conhecer.
Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, decide-se não tomar conhecimento da reclamação. Lisboa, 26 de Maio de 1999 Artur Maurício Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa