Imprimir acórdão
Processo nº 234/99
3ª Secção Relatora: Maria dos Prazeres Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. No processo acima identificado, veio E..., através do requerimento de fls.
211 , 'ao abrigo da alínea b) do nº 1 do Art. 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, com fundamento na violação dos Arts. 27º, nº 2 e 29º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa', interpor recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de fls. 204, que julgou improcedente o recurso por ele interposto do despacho de fls. 176. No mesmo requerimento afirma que 'suscitou a questão da violação das normas atrás referidas nas alegações de recurso' para o Tribunal da Relação de Coimbra. O recurso não foi, porém, admitido, pelo acórdão de fls. 215 do Tribunal da Relação de Coimbra, por não ter sido 'suscitada a inconstitucionalidade de qualquer norma', nem nas referidas alegações, nem no próprio requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, onde, 'mais uma vez [o recorrente] se limitou a referir a violação de normas constitucionais sem mencionar que norma ou normas foram inconstitucionalmente aplicadas'. Reclamou então E... para este Tribunal, 'ao abrigo do disposto no nº 4 Art. 76º' da Lei 28/82, sustentando que está em causa o 'sentido e alcance do nº 2 do Art.
2º do Código Penal', cuja interpretação que perfilha seria 'a única conforme ao princípio da legalidade e tipicidade consagrado no nº 1 do Art. 29º da Constituição da República Portuguesa' e acrescentando que 'estas normas foram expressamente referidas nas conclusões da alegação de recurso'. Colhido o respectivo visto, o Ministério Público pronunciou-se no sentido de que a reclamação é manifestamente improcedente, 'por faltar, de forma evidente, um pressuposto de admissibilidade do recurso de constitucionalidade interposto', uma vez 'que o reclamante não suscitou, durante o processo, isto é, antes da prolação da decisão que pretendia impugnar, podendo perfeitamente tê-lo feito, qualquer questão de inconstitucionalidade de normas ou interpretações normativas susceptível' de constituir o respectivo objecto.
2. Trata-se de uma questão simples, razão pela qual se procede à emissão da decisão sumária prevista no nº 3 do artigo 77º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. Com efeito, a reclamação é manifestamente improcedente, pois falta um pressuposto indispensável ao conhecimento do objecto do recurso: não foi suscitada durante o processo, nos termos exigidos pela al. b) do nº 1 do artigo
70º da Lei nº 28/82, a inconstitucionalidade da norma que o reclamante pretende seja apreciada pelo Tribunal Constitucional. Como este Tribunal tem reiteradamente afirmado, este requisito da invocação da inconstitucionalidade de uma norma ou de uma sua interpretação durante o processo traduz-se na necessidade de que tal questão seja colocada perante o tribunal recorrido de forma a proporcionar-lhe a oportunidade de a apreciar. Só nos casos excepcionais e anómalos, que aqui manifestamente não ocorrem, em que o recorrente não dispôs processualmente dessa possibilidade, é que será admissível a arguição em momento subsequente (cfr., a título de exemplo, os acórdãos deste Tribunal com os nºs 62/85, 90/85 e 160/94, publicados, respectivamente, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 5º vol., págs. 497 e 663 e no Diário da República, II, de 28 de Maio de 1994). Sustenta o reclamante que suscitou a questão da inconstitucionalidade nas conclusões das alegações do recurso que interpôs para o Tribunal da Relação de Coimbra. A análise atenta dessas conclusões revela, porém, que em parte alguma o reclamante sequer questionou a constitucionalidade da norma constante do nº 2 do artigo 2º do Código Penal. Com efeito, apenas refere este preceito inserido numa lista de disposições, umas da lei ordinária, outras da Constituição, que considera terem sido violadas pelo 'despacho recorrido'. Só na reclamação do despacho de não admissão de recurso para este Tribunal é que a questão é suscitada, o que é, manifestamente, extemporâneo.
Nestes termos, indefere-se a reclamação, confirmando-se a decisão de não admissão do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 ucs. Lisboa, 30 de Abril de 1999 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida