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Proc. nº 210/98
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. O Magistrado do Ministério Público do Departamento de Investigação e Acção Penal junto do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa interpôs, ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, recurso do despacho do Juiz do Tribunal de Turno do Círculo de Lisboa de fls. 2 a 13, em que este magistrado se declarou materialmente incompetente para determinar a ulterior tramitação do processo, com fundamento na ilegalidade e inconstitucionalidade da interpretação dada ao nº 1 do art. 22º B do DL nº
214/88 na decisão do Presidente da Relação de Lisboa que estabeleceu a escala dos juizes a exercer funções no Tribunal de Turno do círculo judicial de Lisboa, e na inconstitucionalidade do nº 3 do art. 90º da Lei nº 38/87, na redacção dada pela Lei nº 44/96, de 3 de Setembro.
2. Já neste Tribunal foi o Ministério Público (recorrente) notificado para alegar, o que fez, tendo concluído que 'não tendo funcionado a recusa de aplicação das normas por ilegalidade e inconstitucionalidade como ratio decidendi, não deverá tomar-se conhecimento do recurso'. Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação.
3. Questão prévia: da possibilidade de conhecer do objecto do recurso. Como este Tribunal decidiu recentemente no seu Acórdão nº 331/98 (Diário da República, II Série, de 27 de Novembro de 1998), numa questão em tudo idêntica à dos autos, não pode o Tribunal Constitucional conhecer do objecto do presente recurso, interposto pelo Magistrado do Ministério Público do Departamento de Investigação e Acção Penal junto do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, por não estarem preenchidos os respectivos pressupostos de admissibilidade. Como então se ponderou, necessário para que se verifiquem os pressupostos de admissibilidade do recurso previsto na alínea a) nº 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional, é que a alegada recusa de aplicação de norma tenha determinado o sentido da decisão recorrida, ou, dito de outra forma, tenha funcionado como razão de decidir. Não é, porém, essa a situação factual que se encontra retratada nos autos – como não o era a que esteve na base do referido Acórdão nº 331/98. Nesse sentido, ponderou então o Tribunal Constitucional:
'Na verdade, se a recusa de aplicação das normas citadas implicaria a incompetência do magistrado e a declaração de incompetência foi «expressis verbis» proferida, certo é que aquele magistrado veio a intervir nos actos processuais cuja prática supunha a competência conferida pelas mesmas normas. De facto, escalado o magistrado para prestar serviço no tribunal de turno do círculo judicial de Lisboa por força do aludido despacho do Presidente da Relação de Lisboa, ao abrigo das referidas normas, a ele competiria, no caso em apreço, interrogar o detido, proferir despacho sobre a validade da detenção e determinar as medidas coactivas apropriadas (artº 141º do Código de Processo Penal). Pois, apesar da declaração de incompetência, o Juiz que proferiu o despacho impugnado veio, logo de seguida, a intervir em todos esses actos, ouvindo o detido, julgando válida a detenção e restituindo o arguido à liberdade sujeita a prestação de termo de identidade. Isto significa, como bem assinala o próprio magistrado recorrente, que a recusa de aplicação das normas por ilegalidade e inconstitucionalidade não funcionou como razão de decidir. E não funcionou, como não poderia funcionar, se cumprido fosse - como terá sido, embora sem referência expressa ao preceito - o artigo 33º nº 2 do CPP que obriga o tribunal, a despeito da declaração de incompetência, à prática dos actos urgentes. A situação descrita obsta a que o Tribunal Constitucional tome conhecimento do recurso. Não por ocorrer causa que torne o recurso supervenientemente inútil, o que suporia a ocorrência de uma circunstância posterior à interposição do recurso que lhe fizesse perder utilidade - e não foi o caso, pois à data da interposição já o juiz «a quo» procedera às mencionadas diligências - mas por não se verificar um dos pressupostos de admissibilidade do recurso previsto no artº 70º nº 1 al. a) da Lei nº 28/82, ou seja - repete-se - que a recusa de aplicação de norma opere com directa incidência no sentido da decisão'.
É esta jurisprudência que, por manter inteira validade, agora mais uma vez há que reiterar. III – Decisão Por tudo o exposto, decide-se não tomar conhecimento do recurso. Lisboa, 26 de Maio de 1999 José de Sousa e Brito Messias Bento Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa José Manuel Cardoso da Costa