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Procº nº 769/97.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
Nos presentes autos vindos do Tribunal da Relação de Lisboa e em que figuram, como recorrente, M... e, como recorrido, o Ministério Público, concordando-se, no essencial, com a exposição lavrada pelo relator de fls. 89 a 94, que aqui se dá por integralmente reproduzida, decide-se não tomar conhecimento do recurso, condenando-se a recorrente nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em 8 unidades de conta.
Lisboa, 4 de Fevereiro de 1998 Bravo Serra Fernando Alves Correia Guilherme da Fonseca Messias Bento José de Sousa e Brito Luis Nunes de Almeida EXPOSIÇÃO PRÉVIA Procº nº 769/97.
2ª Secção.
1. M... suscitou a nulidade do despacho que, em processo pendente pela 10ª Vara do Tribunal Criminal do Círculo de Lisboa - e em que figura como arguida, sendo-lhe imputada a prática de factos subsumidos ao cometimento de um ilícito de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo nº 1 do artº 21º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro - designou data para a realização de julgamento, fundando-se, em síntese, na circunstância de não ter sido pessoalmente notificada da decisão instrutória e despacho de pronúncia, notificação essa que teria ocorrido tão só na pessoa da sua defensora, por isso que a mesma arguida, a dado passo, teria, por decisão judicial, sido afastada da sala onde ocorreu o debate instrutório e veio a ser proferido o citado despacho de pronúncia.
Por despacho de 29 de Julho de 1997, foi indeferida a invocada nulidade, o que motivou que do mesmo recorresse a arguida para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Na motivação adrede apresentada pela falada arguida, nunca esta, em passo algum, directa ou indirectamente, explícita ou implicitamente, suscitou qualquer questão de desconformidade com a Lei Fundamental referentemente a normas jurídicas constantes do ordenamento jurídico infraconstitucional.
Por acórdão de 30 de Setembro de 1997, negou a Relação de Lisboa provimento ao recurso.
Disse-se, nesse aresto, sob o epíteto de 'Em conclusão':-
'- O arguido afastado da sala durante o debate instrutório, por razões de disciplina, deve considerar-se presente (arts. 301º, 325º, nºs 4 e 5 C.P.P.);
- Ocorrendo a leitura do despacho de pronúncia na mesma sessão (art.
325º, nº 6 C.P.P.), deve considerar-se presente à leitura;
A leitura do despacho de pronúncia equivale à sua notificação à arguida, na sua própria pessoa, por esta dever considerar-se presente'.
Deste acórdão recorreu a arguida para o Tribunal Constitucional ao abrigo das alíneas b) e f) do nº 1 do artº 70º da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, invocando que o mesmo 'fez interpretação inconstitucional do disposto pelos Artigos 113º nº 5 do Código de Processo Penal' e dizendo que pretendia que este órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa «declarasse» a incompatibilidade com o Diploma Básico dos 'Artigo 325º nº 4 e 5 do e 301º do C.P.P., na medida em que contendem com o disposto pelo Artigo 32º nº 1 e 5 da C.R.P. e 13º e 113º, ambos do C.P.P., além de colidirem, igualmente, com a jurisprudência anterior e dominante daquele Tribunal'.
O recurso veio a ser admitido por despacho prolatado em
11 de Novembro de 1997 pela Desembargora Relatora do Tribunal da Relação de Lisboa.
2. Não obstante tal despacho, porque o mesmo não vincula este órgão de administração de justiça (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82), e dado que se entende que a vertente impugnação não deveria ter sido admitida, efectua-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da mesma Lei, esta exposição, na qual se propugna por se não dever tomar conhecimento do recurso.
Na verdade, como deflui do que se veio de dizer, intentou a arguida impugnar a decisão lavrada no Tribunal da Relação de Lisboa estribada nas alíneas b) e f) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82.
2.1. Ora, tocantemente à segunda daquelas alíneas, é por demais claro que, in casu, não se posta nenhuma situação de suscitação pela recorrente, antes da prolação do acórdão de 30 de Setembro de 1977, da
«ilegalidade» normativa baseada em violação de lei com valor reforçado, da
«ilegalidade» de norma constante de diploma regional aplicada em violação de estatuto de região autónoma ou de lei geral da República, ou da «ilegalidade» de norma emanada de um órgão de soberania com fundamento em violação de estatuto de região autónoma.
Daí que nunca tal alínea - a f) do nº 1 do artº 70º - pudesse servir de suporte ao pretendido recurso.
Mas, ainda que porventura se viesse a entender que a menção daquela alínea se deveu a mero lapso de escrita [por isso que a arguida, ao invocar uma eventual 'jurisprudência anterior e dominante' do Tribunal Constitucional, poderia querer reportar-se à alínea g) dos mesmos número e artigo], o que é certo é que, concernentemente às normas indicadas no requerimento consubstanciador da interposição de recurso, não se conhecem quaisquer anteriores decisões deste Tribunal por intermédio das quais tivessem sido levados a cabo juízos de enfermidade com a Lei Fundamental por banda desses normativos. Consequentemente, o decidido pela Relação de Lisboa, ao se basear em tais normativos, nunca poderia ser entendido como uma aplicação de norma já anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, motivo pelo qual, nem por via da aludida alínea g), seria possível a presente forma de impugnação.
2.2. Respeitantemente à alínea c) do indicado nº 1 do artº 70º, viu-se já que a ora recorrente nunca, antes da decisão desejada pôr sob censura, suscitou a incompatibilidade com a Constituição de qualquer norma
ínsita no ordenamento jurídico infraconstitucional.
E nem se diga que ao escrever, na «conclusão» 11 da motivação de recurso que 'A falta de notificação da Arguida, quer da Decisão Instrutória quer do Despacho de Pronúncia, efectuada nos termos do disposto no Artigo 113º do C.P.P., faz diminuir a garantia dos seus direitos de defesa', isso equivaleu à suscitação pela recorrente da uma questão de inconstitucionalidade normativa.
Efectivamente, o que ali se contém é a afirmação de que deve o arguido ser notificado nos termos daquele artº 113, e que, se o não for, os seus «direitos de defesa» ficam diminuídos.
Pois bem:
Ainda que se admitisse que a invocação daqueles
«direitos de defesa» se reportava às garantias de defesa prescritas pela Lei Fundamental (o que, minimamente, se não pode, sem mais e liquidamente, concluir, pois que da leitura da motivação é de extrair que os «direitos de defesa» com que a arguida aí esgrime são os congrados no diploma adjectivo criminal), então haverá que convir que o que a impugnante com aquela «conclusão» põe em crise é a própria decisão judicial, no ponto em que, ao não mandar efectuar a sua notificação nos termos do artº 113º do Código de Processo Penal, seria conflituante com a Constituição.
Ora, mesmo numa tal postura, não seria cabido o recurso fundado na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, visto que o seu objecto são normas jurídicas e não outros actos do poder público, como, verbi gratia, as decisões judiciais qua tale, como tem sido dito e redito por este Tribunal.
Em face do exposto, não deverá conhecer-se do recurso.
Cumpra-se a parte final do nº 1 do artº 78º-A da Lei nº
28/82. Lisboa, 8 de Janeiro de 1988.