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Proc. nº 71/98
1ª Secção Cons. Rel: Artur Mauricio
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. A..., arguido nos autos de instrução pendentes nos autos com o nº
94/97 do 1º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal do Porto e aí pronunciado pelos crimes de difamação e injuria p. e p. pelos arts. 180º a 184º do Código Penal e 25º, 26º nº 2 al. a) e 27º da Lei da Imprensa, interpôs recurso do pertinente despacho de pronúncia para o Tribunal da Relação do Porto.
O recurso não foi admitido, o que determinou a reclamação do recorrente para o Presidente do Tribunal da Relação do Porto, reclamação essa onde o reclamante arguiu a inconstitucionalidade material do Artº 310º do Código de Processo Penal por violação do Artº 32º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.
Indeferida a reclamação por despacho de fls. 45 é deste que vem interposto o presente recurso para o Tribunal Constitucional.
Nas alegações, o recorrente formula as seguintes conclusões:
(...)' 1ª. 'O nº 1 do artº. 32º da C.R.P. dispõe que 'O processo Criminal assegurará todas as garantias de defesa'.
2ª A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
3ª A quarta revisão constitucional acrescentou a este artigo o inciso 'incluíndo o recurso' consagrando assim, com uma amplitude maior do que a que lhe era reconhecida pela jurisprudência dominante, o princípio do 'duplo grau de jurisdição'.
4ª Devem por isso considerar-se compreendidas nas garantidas de defesa que a Constituição reserva ao arguido o direito ao recurso judicial das decisões que determinam a sua sujeição a julgamento.
5ª A sujeição de uma pessoa a julgamento representa sempre um vexame para esta.
6ª O nº 1 do artº. 310º. do C.P.P. nega o direito ao recurso pelo que viola, porque em flagrante oposição material, o nº 1. do artº 32º da C.R.P.(...)'
Fundado em jurisprudência firmada deste tribunal sobre a questão
(entre outros, acórdãos nºs 265/94, 610/96 e 468/97) o Exmº Magistrado do Ministério Público pugna pela improcedência do recurso.
2. Como bem se evidencia nas contra-alegações do Ministério Público, a questão controvertida - inconstitucionalidade do Artº 310º do Código de Processo Penal por violação do Artº 32º nº 1 da CRP - foi já o objecto de apreciação por este tribunal em diversos recursos com idêntica pronúncia: o artº 310º do CPP não ofende o artº
32º nº 1 da CRP.
A argumentação do recorrente nada inova e não compromete a decisão e respectiva fundamentação dos acórdãos do Tribunal Constitucional que emitiram aquela pronuncia e aqui se dão por reproduzidos - entre outros, os acórdãos nºs
265/94 (DR, II Série, nº 165, de 19/7/94), 610/96 (DR, II Série, nº 155, de
617/96) e 468/97, de 2/7/97, proferido no P. 367/96.
Nem se diga, em contrário, que a matéria constante da conclusão 4ª das alegações do recorrente sintetiza argumento ainda não ponderado e apreciado por este Tribunal.
Não o foi, decerto, enquanto pretensamente apoiado no inciso aditado ao artigo 32º nº 1 da CRP pela revisão de 97 - 'incluindo o recurso' - já que os acórdãos citados são anteriores a tal revisão.
Sempre, porém, se entendeu nos mesmos acórdãos que 'a faculdade de recorrer em processo penal (constitui) uma tradução da expressão do direito de defesa', correspondendo mesmo a uma imposição constitucional a consagração do recurso de sentenças condenatórias ou 'de actos judiciais que durante o processo tenham como efeito a privação ou a restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais' (citado Acórdão nº 265/94 e Acórdão nº 31/87 in 'Acórdãos do Tribunal Constitucional', 9º vol., pág. 463).
Simplesmente, o que sempre se recusou foi que a CRP impusessse a recorribilidade de todos os despachos proferidos em processo penal.
Não o impunha antes, nem o impõe depois da revisão de 97 onde o segmento aditado ao artigo 32º nº 1 apenas explicita o que a jurisprudência do Tribunal Constitucional já entendia compreendido nas 'garantias de defesa em processo penal, sem o absurdo a que conduziria a interpretação maximalista que subjaz à argumentação do recorrente.
Em suma, o 'direito de recurso', como imperativo constitucional, hoje expressamente consagrado no artigo 32º nº 1 da CRP, deve continuar a entender-se no quadro das 'garantias de defesa' - só e quando estas garantias o exijam - o que, pelas razões repetidamente apontadas nos anteriores acórdãos deste Tribunal, não compreende a impugnação do despacho de pronúncia.
3. Decisão
Pelo exposto e em conclusão, decide-se negar provimento ao recurso.
Lisboa, 28 de Abril de 1998 Artur Mauricio Maria Helena Brito Alberto Tavares da Costa Paulo Mota Pinto Vitor Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa