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Procº nº 523/97.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
I
1. Em autos de processo comum com intervenção de juiz singular, que correram termos pelo Tribunal de comarca de Portimão e nos quais figura como arguido A..., sendo partes civis, como demandantes, F..., M..., AC..., J..., Centro Regional de Segurança Social do Algarve e Sociedade P..., S.A. e, como demandados, R..., Companhia de Seguros, e E..., Ldª, foi, em 14 de Dezembro de 1994, proferida sentença que, por entre o mais, condenou a demandada R... a pagar:
aos demandantes F..., M... e AC..., a quantia global de Esc. 14.189.700$00, além de determinados juros;
ao demandante J..., o quantitativo total de Esc.
10.590.000$00, além de determinados juros;
ao demandante Centro Regional de Segurança Social do Algarve, o montante de Esc. 24.420$00 e juros e
à demandante Sociedade P..., S.A., a quantia de Esc.
2.999.165$00.
Dessa sentença pretendeu recorrer a R... mas, por despacho proferido em 19 de Janeiro de 1995 pelo Juiz daquele Tribunal de comarca, foi o recurso dado sem efeito atendendo à circunstância de não ter pago a taxa de justiça a que se reporta a alínea b) do artº 190º do Código das Custas Judiciais então em vigor.
De tal despacho reclamou a R... para o o Presidente do Tribunal da Relação de Évora tendo esta entidade, por despacho de 25 de Fevereiro de 1995, decidido não tomar conhecimento da reclamação, uma vez que, argumentou-se, a impugnação do despacho que dá sem efeito um recurso interposto por falta de pagamento da taxa de justiça - e já que se não tratava de uma situação em que em causa estava um despacho de não admissão ou retenção de um recurso - devia ser levada a cabo, não por intermédio de reclamação, mas sim por intermédio de recurso.
Do despacho prolatado pelo Presidente do Tribunal da Relação de Évora agravou a R... para o Supremo Tribunal de Justiça.
Aquele Presidente, por despacho de 11 de Maio de 1995, por considerar 'anómala e imprópria' a impugnação desejada efectuar, porquanto
'nem sequer a lei consente recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões singulares', desantendeu a pretensão da R...
Deste despacho novamente intentou recorrer de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça a R..., o que fez já no Tribunal de comarca de Portimão, motivo pelo qual o respectivo Juiz, considerando 'descabida e destituída de fundamento legal' tal pretensão, determinou, por despacho de 7 de Julho de 1995, o desentranhamento do requerimento consubstanciador do agravo, considerando que nem sequer era porpositado ser o processo remetido ao Presidente do Tribunal da Relação de Évora, a fim de este se pronunciar sobre aquele recurso.
Desse despacho recorreu a R... para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão de 29 de Outubro de 1996, negou provimento ao recurso, o que levou a então recorrente a interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Por despacho proferido em 18 de Fevereiro de 1997 pelo Desembargador Relator daquele Tribunal de 2ª Instância, não foi o recurso admitido em face do preceituado na alínea d) do nº 1 do artº 400º do Código de Processo Penal.
Do assim decidido interpos a R... recurso para o Tribunal Constitucional, o qual não foi admitido por despacho lavrado pelo citado Desembargador Relator em 11 de Março de 1997.
2. É desse despacho que versa a vertente reclamação para este órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa.
Na peça processual que tal reclamação corporiza, a R... diz, inter alia, que os despachos proferidos pelo Presidente do Tribunal da Relação de Évora e o acórdão lavrado pelo mesmo Tribunal se abstiveram de conhecer da questão de inconstitucionalidade levantada pela ora reclamante
àcerca da norma constante do artº 192º do Código das Custas Judiciais.
O representante do Ministério Público em funções junto deste Tribunal exarou parecer no sentido de a presente reclamação ser indeferida.
Cumpre decidir.
II
1. A reclamação ora em apreço só poderia lograr deferimento se porventura no vertente caso se reunissem todos os pressupostos a que os pertinentes preceitos legais condicionam a admissão do recurso para este Tribunal, devendo sublinhar-se que tal intentado recurso se reporta ao despacho proferido pelo Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Évora em 18 de Fevereiro de 1997 que não admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão daquela Relação de 29 de Outubro de 1996.
Ora, como sabido é, o recurso fundado na alínea b) do nº
1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, exige, além do mais, por um lado, que o recorrente tenha suscitado uma questão de inconstitucionalidade normativa, por outro, que a decisão que se deseja impugnar no tocante a tal questão se tenha, como razão do decidido, suportado na norma cujo vício de desconformidade com a lei Fundamental foi sustentado pelo recorrente e, ainda por outro, que tenha havido exaustão dos recursos ordinários que no caso cabem.
O despacho de 18 de Fevereiro de 1997, que foi querido colocar sob censura do Tribunal Constitucional, baseou-se, normativamente e tão só, no preceito ínsito na alinea d) do nº 1 do artº 400º do Código de Processo Penal.
A norma nele contida nunca foi, minimamente, questionada do ponto de vista da sua compatibilidade com o Diploma Básico pela ora reclamante, a qual, ao longo do processado, unicamente tem esgrimido com a inconstitucionalidade do normativo a que se refere a alínea b) do artº 192º do pretérito Código das Custas Judiciais, sendo ainda de assinalar que tão pouco a reclamante, do despacho exarado pelo Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Évora, reclamou para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, razão pela qual nem sequer estariam, na presente situação, esgotados os recursos ordinários (cfr., sobre este ponto, por entre muitos outros, o Acórdão deste Tribunal nº 65/85, publicado na 2ª Série do Diário da República de 31 de Maio de
1985).
2. De igual sorte, quer os despachos proferidos pelo Presidente do Tribunal da Relação de Évora, quer o acórdão dessa mesma Relação prolatado em 29 de Outubro de 1996 (e suposto, de uma banda, que seria dos mesmos que a reclamante intentava recorrer para o Tribunal Constitucional e, de outra, que eles seriam, ao menos atempadamente, impugnáveis perante este órgão de administração de justiça, asserção de que se pode desde logo legitimamente duvidar), nunca se estribaram, em sede de ratio decidendi e mesmo que de modo implícito, na norma cuja inconstitucionalidade foi, pela R..., colocada em causa em face da Constituição.
E daí a inequívoca conclusão segundo a qual se não verifica, in casu, a existência de, pelo menos, dois dos pressupostos do recurso a que alude a dita alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, a saber, o não ter a decisão querida impugnar aplicado a norma cuja desconformidade constitucional foi questionada pela ora reclamante, e não se verificar a exaustão dos recursos ordinários.
III
Em face do exposto, indefere-se a presente reclamação, condenando-se a reclamante nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em oito unidades de conta. Lisboa, 4 de Fevereiro de 1998 Bravo Serra José de Sousa e Brito Messias Bento Guilherme da Fonseca Fernando Alves Correia Luis Nunes de Almeida