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Proc.Nº 556/97 Sec. 1ª Rel. Cons. Vitor Nunes de Almeida
Acordam no Tribunal Constitucional:
Nos presentes autos de recurso, em que é recorrente o ALMIRANTE CHEFE DO ESTADO MAIOR DA ARMADA e recorrido H..., pelos fundamentos constantes da exposição do relator de fls.250 a 256, à qual o recorrente não respondeu, tendo o recorrido concordado com a mesma, decide-se não tomar conhecimento do presente recurso.
Lisboa, 28 de Abril de 1998 Vitor Nunes de Almeida Maria Helena Brito Alberto Tavares da Costa Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa ACÓRDÃO Nº 292/98 Proc.Nº 556/97 Sec. 1ª Rel. Cons. Vitor Nunes de Almeida
Exposição Preliminar do Relator a que se refere o Artº 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional
1 - J... veio requerer a execução de acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, de 26 de Maio de 1994, tendo a entidade requerida, o Almirante Chefe do Estado Maior da Armada aduzido na sua resposta que tal acórdão foi integralmente executado pelo despacho de 25 de Janeiro de 1995.
Requerida a declaração de inexistência de causa legítima de inexecução do acórdão, o Supremo Tribunal Administrativo (adiante, STA), por acórdão de 28 de Março de 1995, veio declarar que se não verificava causa legítima de inexecução. Notificado desta decisão, o Almirante Chefe do Estado Maior da Armada interpôs recurso para o Pleno da Secção.
Entretanto, quer o requerente quer a autoridade requerida foram ouvidos sobre os actos e operações em que a execução devia consistir e sobre o prazo para a prática de tais actos, tendo a Secção, por acórdão de 21 de Fevereiro de 1996, decidido quais os actos a executar e as operações que esta necessário desenvolver para cumprir o acórdão e, quanto ao ressarcimento dos danos sofridos remeteu o requerente para a acção de indemnização.
O Almirante Chefe do Estado Maior da Armada, notificado desta decisão e não se conformando com ela interpôs recurso para o Pleno da Secção. Também o Ministério Público interpôs recurso da decisão, na parte em que se decidiu que a reintegração do requerente se devia fazer com efeitos a partir de
21 de Agosto de 1977.
Produzidas as respectivas alegações e contra-alegações, o Pleno do STA proferiu o acórdão de 20 de Março de 1997, pelo qual se decidiu negar provimento ao recurso interposto do acórdão de 28 de Março de 1995, que declarou não se verificar causa legítima de inexecução do acórdão de 26 de Maio de 1994 e conceder parcial provimento aos recursos do acórdão de 21 de Fevereiro de 1996,
'ordenando que em quinze dias a Administração profira acto que reintegre no seu cargo e categoria o interessado, com efeitos desde 21/8/78, e avalie se estão ou não reunidas as condições para a sua promoção. A concluir pela afirmativa, deverá a autoridade recorrida efectuar a promoção e decidir das promoções subsequentes. No mais, confirmam o decidido'.
Entretanto, o mandatário do requerente veio comunicar aos autos o falecimento do seu ex-constituinte, prosseguindo o processo com a herdeira habilitada, Nélia de Fátima Branco Tirapicos Dias.
2. - O Almirante Chefe do Estado Maior da Armada, notificado do acórdão de 20 de Março de 1997 veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, indicando no respectivo requerimento de interposição que o fazia ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº1, alínea a), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, 'por recusa de aplicação do princípio constitucional da intangibilidade do caso julgado'.
Notificado para completar os elementos exigidos pelo artigo 75º-A, da Lei do Tribunal Constitucional (adiante, LTC), foi do seguinte teor a resposta da entidade recorrente:
'I - Tendo sido notificado do douto despacho proferido por V.Excia no processo à margem identificado, no qual é Recorrente, sendo Recorrida Nelia de Fátima Branco Tirapicos Dias, diz o Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada:
1º - O fundamento da interposição do presente recurso para esse Venerando Tribunal tem a ver com a recusa da aplicação do princípio constitucional da intangibilidade do caso julgado.
2º - Como já se referiu, nomeadamente nas alegações de recurso para o Pleno da
1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, em que foi impugnado o douto Acórdão de 28/3/95, o princípio constitucional da intangibilidade do caso julgado emana, por um lado do princípio do Estado de direito democrático e, por outro, é claramente aflorado no nº 3 do artigo 282º da Constituição, ao ressalvar os casos julgados dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, salvo situações excepcionais.
3º - Os princípios constitucionais, como os princípios gerais de direito, tem valor de normas, consubstanciando a sua violação o vício de violação de lei, como esclarece, entre outros, o douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26/6/90, in 'Acórdãos Doutrinais', nº 366, pág. 735 e seguintes.
4º - Mais ainda, o princípio da intangibilidade do caso julgado é pré-constitucional e mesmo supra-constitucional, sendo um dos garantes da independência do poder judicial inerente ao Estado de Direito e garantia concreta da certeza da vida jurídica, cuja ofensa ou recusa de aplicação, atenta contra o Estado de Direito e os seus pilares.
5º - Em tal contexto, a norma que fundamenta o presente recurso, por recusa da sua aplicação no douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20/3/97, é o princípio constitucional da intangibilidade do caso julgado.'
Após a resolução de uma questão relativa à exigência de uma multa, importa apreciar se o recurso de constitucionalidade, tal como vem interposto, pode ser admitido.
3. - O presente recurso vem interposto ao abrigo do que se preceitua no artigo 70º, nº 1, alínea a) da Lei do Tribunal Constitucional, que determina que 'cabe recurso para o Tribunal Constitucional, em secção, das decisões dos tribunais que: (a) recusem a aplicação de qualquer norma, com fundamento em inconstitucionalidade'.
Ora, tal como decorre da disposição transcrita - que mais não faz do que reproduzir o texto do artigo 280º, nº1, alínea a) da Constituição - é pressuposto de admissibilidade de um tal tipo de recurso que a decisão recorrida tenha recusado a aplicação de uma qualquer norma com fundamento em inconstitucionalidade.
Porém, a autoridade recorrente não indica qual seja a norma legal que a decisão do Pleno do STA desaplicou com fundamento em inconstitucionalidade. Com efeito, no requerimento de interposição do recurso apenas refere que houve 'recusa de aplicação do princípio constitucional da intangibilidade do caso julgado' e na resposta ao convite para indicar os elementos exigidos pelo artigo 75º-A, não só voltou a repetir tal afirmação como as considerações que ali se explanam pretendem justificar as raízes constitucionais do princípio da intangibilidade do caso julgado, bem como a natureza normativa de tal princípio, concluindo o requerimento em causa afirmando que 'Em tal contexto, a norma que fundamenta o presente recurso, por recusa da sua aplicação no douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de
20/3/97, é o princípio constitucional da intangibilidade do caso julgado'.
Ora, colocar as coisas deste modo não só não é forma adequada de suscitar uma questão de constitucionalidade - uma vez que, o que se censura à decisão recorrida é o não ter feito aplicação do princípio da intangibilidade do caso julgado, e não ter recusado aplicação de uma norma ordinária com fundamento na sua inconstitucionalidade -, como também a admitir-se que, nos autos, tenha sido suscitada uma questão de constitucionalidade então ela é dirigida ao próprio acórdão recorrido. Na verdade, não pode entender-se de outro modo o facto de se imputar directamente ao próprio acórdão do Pleno do STA a recusa de aplicação do princípio da intangibilidade de caso julgado, uma vez que, percorrendo o texto do referido acórdão, não se descortina em lugar algum que nele exista uma explícita ou, ao menos, implícita, recusa de aplicação de qualquer norma ordinária com fundamento na sua inconstitucionalidade.
Por último, dir-se-á que a recusa de aplicação de uma norma ou princípio constitucional - a admitir-se que o princípio da intangibilidade do caso julgado tem integral consagração constitucional - não coloca, em princípio, uma questão de constitucionalidade, uma vez que no recurso da alínea a) do nº1 do artigo 70º da LTC uma tal questão apenas pode surgir da recusa de aplicação de uma norma infraconstitucional por se verificar contradição com uma norma ou princípio constitucional, o que, como se referiu, não acontece no caso dos autos.
Não está, assim, verificado o requisito de admissibilidade do presente recurso de constitucionalidade, pelo que se propõe que o Tribunal não tome conhecimento do recurso. XXXXXXXX
Notifiquem-se as partes para, querendo, responder no prazo legal.
Lisboa, 11 de Fevereiro de 1998 Vitor Nunes de Almeida