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Procº nº 921/98.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
I
1. O Licº J... solicitou ao Supremo Tribunal Administrativo, mediante petitório com 470 items, a suspensão da eficácia da deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais 'que, «em consequência da pena de aposentação compulsiva», decidida em 30 de Março de 1988 no âmbito do processo n.º 432, determinou executar essa pena «com efeitos desde 2 de Abril»'.
Na parte final do indicado petitório disse:-
'............................................................................................................................................................... Indica como testemunhas, ... desde já arguindo de inconstitucional, por violação dos artigos 20.º, n.º 1 e 4, e 268.º, n.º 4, da Lei Fundamental o artigo 77.º, n.º 2, da LPTA, interpretado no sentido de, nestes autos, não ser admissível prova testemunhal, nem outro meio de prova além da prova documental.
................................................................................................................................................................................................'
Por acórdão de 12 de Agosto de 1998, a 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo não conheceu do solicitado pedido de suspensão de eficácia.
Fê-lo com base na seguinte argumentação:-
'......................................................................................................................................................................................
4-B1 De harmonia com o disposto no art. 77º nº 2 da LPTA, quando a suspensão seja pedida ao Tribunal previamente à interposição do recurso, como é o caso, o requerente, além das demais exigências legais, tem de fazer prova do acto e da sua notificação ou publicação.
- A prova do acto faz-se nos termos dos artºs 36º nº 1 alínea f) da LPTA aprovada pelo DL 267/85 de 16-VII e 56º §§ 1º, 2º e 4º do Regulamento do STA (cf. anotação 3ª ao art. 77º da LPTA, in Contencioso Administrativo, 2ª edição, de Artur Maurício, Simões Redinha e Dimas de Lacerda)
- Ora, o requerente, como ele próprio afirma na sua petição, requereu a suspensão da eficácia da «decisão do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais que, em consequência da pena de aposentação compulsiva, decidida em 30 de Março de 1998, no âmbito do processo nº 432, determinou executar essa pena com efeitos desde 2 de Abril».
- Não requereu, ao contrário do entendido pela entidade requerida, «a suspensão de eficácia do despacho do Presidente do CSTAF que, na sequência da pena disciplinar de aposentação compulsiva, aplicada ao requerente, tornou pública a vacatura do respectivo lugar» (artº 15º da Resposta)
- O que ele afirma é só ter tomado conhecimento daquela decisão do Conselho, cuja suspensão de eficácia requereu, através da citada publicação do despacho que torna pública a vacatura do lugar (artº 291º e segs da petição)
- Acontece que nenhum dos documentos que juntou constitui, como claramente resulta da sua descrição em 4 A. b) da matéria de facto, «a comprovação da prática da invocada decisão do Conselho e a demonstração do seu conteúdo, tal como se exige no citado art. 56º do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo.
O docº nº 3, é sim, a comprovação do despacho do Presidente do Conselho Superior dos T. Administrativos e Fiscais, de 28 de Junho de 1988, publicitando a vacatura do lugar de juiz do 2º Juízo, 1ª Secção do Tribunal Tributário de 1ª instância de Lisboa em consequência da pena de aposentação compulsiva do seu titular, com efeitos desde 2 de Abril de 1988.
- E, mesmo na óptica, adoptada pelo Requerente, de que tal decisão inexistiu juridicamente, apesar de executada, necessário era comprovar essa alegada inexistência, instruindo a petição com a correspondente certidão, que a atestasse. Os factos negativos também se provam.
- O requerente, por outro lado, nada invocou quanto à dificuldade ou impossibilidade de obter esse documento, provando que usou dos meios previstos no art. 82º da LPTA para o obter (Ac de 4-4-89, rec 26926).
- Como bem se escreve no ac. deste S.T.A. de 7-7-96, rec. 40466 «é jurisprudência dominante deste Supremo Tribunal que a tramitação processual deste meio acessório não consente a aplicação do disposto no artº 40º da LPTA e
477º do C.P.C., para regularização da petição(...)
..................................................................................................................................................................................................
- Nenhuma razão se vê para divergir desta orientação jurisprudencial pelo que, não havendo lugar ao convite para apresentar o documento comprovativo do acto suspendendo e da sua notificação ou publicação, que obrigatoriamente deveria instruir a petição, nos termos dos preceitos legais citados (artº 77º nº
2 da LPTA, 36º nº 1 alínea f) do mesmo diploma e 56º §§ 1º, 2º e 4º do Reg. do STA), impossibilitado está o Tribunal de entrar na apreciação do pedido de suspensão, devendo, em consequência ser determinada a sua rejeição (...).
................................................................................................................................................................................................'
Deste aresto pretendeu o requerente do pedido de suspensão, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, recorrer para o Tribunal Constitucional, dizendo que o mesmo 'aplicou normas legais cuja inconstitucionalidade foi questionada durante o processo'.
Todavia, por despacho, datado de 3 de Setembro de 1998, não foi admitido o recurso, em virtude de se ter entendido que o acórdão desejado impugnar não aplicou qualquer norma cuja inconstitucionalidade houvesse sido suscitada durante o processo.
É desse despacho que o Licº J... apresenta a vertente reclamação para o Tribunal Constitucional, sustentando, em síntese, após transcrever a parte final do petitório do pedido de suspensão de eficácia (igualmente acima transcrita) que 'o tribunal aplicou manifestamente o artigo 77.º, n.º 2 da LPTA, com o sentido impugnado'.
Tendo tido «vista» dos autos, o Representante do Ministério Público junto deste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa pronunciou-se no sentido do improcedência da presente reclamação.
Cumpre decidir. II
2. Adianta-se, desde já, que a reclamação em espécie não deve lograr deferimento.
Há que assinalar que - muito embora o requerimento por intermédio do qual o ora reclamante manifestou a sua vontade de interpor recurso para este Tribunal não obedecesse minimamente aos requisitos previstos nos números 1 e 2 do artº 75º-A da Lei nº 28/82 (circunstância que seria ultrapassável por apelo ao estipulado no nº 5 do mesmo artigo) –, resulta inequivocamente da peça processual consubstanciadora desta reclamação que a intentada impugnação se dirigia à norma ínsita no nº 2 do artº 77º da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovada pelo Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho.
Sublinha-se também que o ora reclamante, antes da prolação do acórdão da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, questionou a conformidade constitucional daquela norma. Porém, a arguição de um tal vício incidiu, e tão somente, numa sua dimensão interpretativa segundo a qual, num procedimento acessório como o de suspensão de eficácia, não consente a dita norma a admissão de prova testemunhal ou de outro meio de prova para além da prova documental.
3. Ora, se é certo que o aresto querido impugnar aplicou a norma constante do nº 2 do artº 77º da LPTA, menos certo não é que essa aplicação não redundou de uma interpretação tal como aquela cuja enfermidade constitucional foi suscitada pelo então requerente.
Efectivamente, o que o aludido acórdão decidiu foi não conhecer do pedido de suspensão de eficácia da deliberação tomada pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, justamente com base na circunstância de o autor de tal pedido não ter demonstrado a prática dessa deliberação, o respectivo conteúdo e a sua notificação ou publicação, nem ter invocado a impossibilidade de obtenção dessa demonstração, nunca expressamente se tendo referido a que essa prova era impedida de ser levada a efeito por qualquer meio que o não documental.
Poder-se-á, assim, dizer que o que, na realidade das coisas, foi aplicado pelo acórdão pretendido recorrer para indeferir o pedido de suspensão que ora releva, foi a parte final do nº 2 do artº 77º da LPTA, que comanda que, no caso da alínea b) do nº 1 daquele artigo [suspensão pedida previamente à interposição do recurso], deverá o requerente fazer prova do acto e da sua notificação ou publicação.
Esta exigência, que deflui da norma do mencionado nº 2 do artº 77º e que constituiu o suporte normativo da decisão lavrada pelo acórdão querido colocar sob a censura do Tribunal Constitucional, nunca foi, ela mesma, directa ou indirectamente, posta em crise pelo ora reclamante antes do referido aresto, tomando por parâmetro qualquer norma ou princípio constantes do Diploma Básico.
Significa isto que a interpretação – acima explicitada - do preceito
ínsito no nº 2 do artº 77º da LPTA que o então requerente considerou conflituante com a Constituição, não baseou jurídico-normativa- mente o decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo.
4. Sendo que o recurso que se quis interpor era baseado na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82 e que o seu objecto se reportava a um dado sentido interpretativo conferido a uma norma jurídica, mister seria, de entre o mais, para que o mesmo pudesse vir a ser admitido, que o Alto Tribunal a quo tivesse, na decisão intentada impugnar, aplicado essa norma com o dito sentido.
Não o tendo feito, como no caso sub specie ocorreu, não poderia abrir-se a via do recurso que o ora reclamante desejava.
Pelos avançados motivos, não é passível de censura a decisão que se contém no despacho de não admissão do recurso.
III
Em face do exposto, indefere-se a presente reclamação, condenando-se o reclamante nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em 15 unidades de conta. Lisboa, 16 de Dezembro de 1998 Bravo Serra Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa