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Processo n.º 1150/2013
3.ª Secção
Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. A., notificado do Acórdão n.º 168/2014, que indeferiu a reclamação apresentada, vem apresentar requerimento do seguinte teor:
«(...)
Vem, por não concordar e não se conformar com esta decisão, ao abrigo do disposto no artigo 78º - B nº 2 da LTC,
RECLAMAR PARA A CONFERÊNCIA,
Nos termos do nº 3 do artº 78-A LTC (aplicando-se, igualmente o nº 4 da mesma disposição), Que proferiu o Acórdão nº 168/2014, pelo qual indeferiu a presente reclamação, remetendo- se para a fundamentação da decisão sumária nº 05/2014.
Acontece que, existindo o incumprimento do disposto no artigo 495º nº 2 do C.P.P., quanto á a falta de cumprimento das condições de suspensão, pelo Tribunal recorrido (ausência da necessária prova e ouvido o condenado) que fundamenta a alegada violação do artigo 13º nº 2 da C.R.P., acontece que nesta parte, a decisão sumária é omissa. E, por maioria da razão, o Acórdão proferido que remete para tal decisão.
Assim, R. a V. Exa. Se dignem, nos termos dos artigos 613 nº 2 e 615º nº 1 al. d) do C.P.C. aplicável por força do artigo 4º C.P.P., e artigo 79º C da L.T.C., ACLARAR E ESCLARECER se a decisão constante do Acórdão proferido, contemplou a falta de cumprimento pelo Tribunal Recorrido, do disposto no artigo 495º nº 2 do C.P.P. (quanto á falta de cumprimento das condenações de suspensão) que o recorrente, entende, como violação do artigo 13º nº2 da C.R.P.
Nos autos supra referenciados vem o recorrente pedir a aclaração e reforma do douto acórdão proferido, por entender que existem obscuridades e ambiguidades que a douta decisão contém.
O douto acórdão refere “não conhecimento do objeto do recurso por o recorrente não ter colocado ao tribunal qualquer questão de constitucionalidade normativa de que se possa conhecer”; “por não existir correspondência entre o objeto do recurso e a ratio decidendi da questão recorrida”. Com o devido respeito nestas expressões existe obscuridade e ambiguidade, sendo ininteligíveis e nos parecem apresentar uma interpretação contraditória com outras possíveis interpretações da norma constante no artigo 70º, nº 1 b) da Lei 28/82, de 15 de novembro.
Por outro lado a douta decisão não se encontra devidamente fundamentada, não explanou critérios lógicos que constituíssem um substrato racional de decisão e existem contradições insanáveis na argumentação apresentada. Não existe um elencar argumentos que estejam na base da decisão e que justifiquem a decisão tomada. E existe dever de fundamentação artigo 205º, nº 1 da Constituição.
Pelo facto das referidas expressões se revelarem obscuras e ininteligíveis e existir falta de fundamentação vem suscitar-se a nulidade da douta decisão (artigo 615º, nº 1, alínea c) e d) do Código Processo Civil.
Pelo exposto vem suscitar-se a nulidade da douta decisão proferidas suscitando-se a sua aclaração e reforma.»
2. Notificado deste requerimento, o Ministério Público respondeu nos seguintes termos:
«(….)
4.º (…) tendo o Acórdão n.º 168/2004 sido proferido em conferência, parece-nos evidente que dele não cabe reclamação para a conferência, encontrando-se esgotado, com a sua prolação, o poder jurisdicional, não se estando perante as circunstâncias previstas no artigo 79.º-D da Lei do Tribunal Constitucional (LTC).
5.º Porém, na parte final do requerimento o recorrente invocando os artigos 613.º, n.º 2 e 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil, pede a aclaração do acórdão.
6.º Não é facilmente percetível a pretensão do recorrente.
7.º Efetivamente, se ele pede a aclaração por vislumbrar qualquer obscuridade ou ambiguidade, teria de invocar a nulidade com esse fundamento e que se encontra prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil, preceito não referido no requerimento.
8.º O mencionado artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil diz respeito à nulidade da decisão por omissão (ou excesso) de pronúncia, não esclarecendo, porém, o recorrente, em que consistiria essa omissão de pronúncia.
9.º De qualquer forma, dir-se-á que o Acórdão é perfeitamente claro e insuscetível de dúvida objetiva, encontrando-se devidamente fundamentado.
10.º Pelo exposto, a conhecer-se do “pedido de aclaração” e da “arguição de nulidade”, devem os mesmos serem indeferidos.»
II. Fundamentação
4. Em primeiro lugar incumbe referir, seguindo o parecer do Ministério Público, que, tendo o Acórdão n.º 168/2004 sido proferido em conferência, dele não cabe nova reclamação para a conferência, já que não está prevista na lei «reclamação sobre reclamação». No entanto, na parte final do requerimento, o recorrente, invocando os artigos 613.º, n.º 2 e 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil, pede a aclaração do acórdão. Assim, deve entender-se que, não obstante o recorrente designar o presente requerimento como «reclamação para a conferência», o mesmo deverá ser tramitado como pedido de aclaração do Acórdão n.º 168/2004.
5. No Acórdão n.º 168/2014, o Tribunal Constitucional indeferiu reclamação da Decisão Sumária n.º 05/2014, que decidiu não tomar conhecimento do objeto de recurso de constitucionalidade interposto. Aí se esclareceu, de forma inequívoca, que o não conhecimento do objeto desse recurso se devia ao não preenchimento dos pressupostos processuais inferidos a partir da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC. Sustentou-se, com efeito, que o objeto do recurso não era idóneo por não possuir natureza normativa. Por outro lado, daí resulta de forma igualmente límpida, que o recorrente não logrou suscitar nenhuma questão de constitucionalidade durante o processo. Na reclamação apresentada, o reclamante não aduziu qualquer argumento que permitisse abalar os fundamentos que presidiram à decisão sumária. Assim, o Acórdão cuja aclaração ora se requer limitou-se de forma clara, a reiterar os dois fundamentos de não conhecimento que constavam da decisão sumária mencionada, remetendo para a fundamentação da mesma.
6. Não obstante, o recorrente invoca ambiguidade da expressão relativa ao «não conhecimento do objeto do recurso por o recorrente não ter colocado ao tribunal qualquer questão de constitucionalidade normativa de que se possa conhecer». Ora, não se compreende onde reside a obscuridade, ambiguidade, ou ininteligibilidade destas expressões. A Decisão Sumária n.º 05/2014 explicou de forma detalhada, recorrendo a transcrições quer do requerimento de recurso quer da resposta ao aperfeiçoamento do mesmo, que isso significava que o recorrente pretendia questionar a própria bondade da decisão recorrida, ou o juízo subsuntivo feito pelo tribunal a quo, que considerou não aplicável aos autos o referido artigo 49º nºs 2 e 3 do C.P. Ora, estando o recorrente devidamente representado por advogado, não se compreendem como podem estas expressões ser tidas como obscuras, ambíguas, ou ininteligíveis. Nem, por outro lado, podem ser tidas como contraditórias com outras possíveis interpretações da norma constante no artigo 70º, nº 1 b) da LTC. Muito pelo contrário, vão precisamente ao encontro da jurisprudência sedimentada deste Tribunal, que tem afirmado, em inúmeras ocasiões, que não decorre da norma invocada a competência do Tribunal Constitucional para a apreciação de alegadas inconstitucionalidades, diretamente imputadas pelo recorrente às decisões judiciais proferidas. Assim, o decidido pela Decisão Sumária n.º 05/2014 e confirmado pelo Acórdão n.º 168/2014 corresponde à jurisprudência pacífica do Tribunal sobre a inexistência da figura de recurso de apreciação da constitucionalidade de decisões judiciais (recurso de amparo) na nossa ordem jurídico-constitucional.
7. No que toca à invocada ambiguidade da expressão relativa a «não existir correspondência entre o objeto do recurso e a ratio decidendi da questão recorrida» não se compreende o alegado pelo recorrente, uma vez que essa expressão não foi usada nem pelo Acórdão n.º 168/2014, nem pela Decisão Sumária n.º 05/2014.
8. Por outro lado, não se verifica omissão de pronúncia no que toca à alegada «falta de cumprimento pelo Tribunal Recorrido, do disposto no artigo 495º nº 2 do C.P.P. (quanto à falta de cumprimento das condenações de suspensão) que o recorrente, entende, como violação do artigo 13º nº2 da C.R.P», uma vez que semelhante pronúncia respeitaria a uma análise do respeito, por parte do Tribunal recorrido, de uma norma de direito infraconstitucional. Ora, como se tem reiteradamente afirmado na jurisprudência do Tribunal Constitucional, não incumbe ao Tribunal Constitucional sindicar a boa ou má aplicação do direito infraconstitucional pelos tribunais comuns. Por outro lado, a questão aí indicada não constitui objeto do recurso, que foi fixado, após convite de aperfeiçoamento do Relator, como sendo constituído pela «não aplicação do artigo 49º nºs 2 e 3 do C.P. ao caso concreto da decisão recorrida». Assim, nos termos do artigo 71.º da LTC, a decisão do Tribunal Constitucional teria de se limitar a essa questão, não se podendo pronunciar sobre questões não enunciadas, como a alegada «falta de cumprimento, pelo tribunal recorrido, do disposto no artigo 495.º do C.P.P».
9. Invoca, por fim, o recorrente que «a douta decisão não se encontra devidamente fundamentada, não explanou critérios lógicos que constituíssem um substrato racional de decisão e existem contradições insanáveis na argumentação apresentada. Não existe um elencar argumentos que estejam na base da decisão e que justifiquem a decisão tomada. E existe dever de fundamentação artigo 205º, nº 1 da Constituição». No entanto, não esclarece quais os aspetos concretos da decisão que carecem de fundamentação ou que revelam contradição insanável. Assim, neste ponto resta concluir que, uma vez que na reclamação apresentada, o reclamante não aduziu quaisquer argumentos que permitissem abalar o decidido pela Decisão Sumária n.º 05/2014, restou ao Acórdão n.º 168/2014 remeter para os argumentos detalhadamente explanados na referida decisão, por nada mais haver a acrescentar aos mesmos.
Constata-se assim nada haver a aclarar, não se vislumbrando qualquer ambiguidade ou obscuridade que justifique esclarecimento, nem falta de fundamentação ou contradições insanáveis no Acórdão n.º 168/2014.
III. Decisão
Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir o pedido de aclaração do acórdão proferido.
Lisboa, 25 de março de 2014. – Lino Rodrigues Ribeiro – Catarina Sarmento e Castro – Maria Lúcia Amaral.