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Processo n.º 168/14
3.ª Secção
Relator: Conselheira Catarina Sarmento e Castro
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, A. veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC), mediante requerimento de interposição dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, com o seguinte teor:
“A., recorrente nos autos supra melhor identificados, notificado que foi do despacho que enforma a decisão de indeferimento do requerimento de fls. 106 e 107, considerando-se assim violado o disposto nos artigos 20.º e 202.º ambos da Constituição da República Portuguesa, que enformam em si o Princípio do Acesso ao Direito e à Tutela Jurisdicional Efectiva bem como o Princípio do Contraditório, o que é suscitado no recurso interposto, vem ao abrigo do art. 70.º da LTC interpor RECURSO para o douto Tribunal Constitucional, que ao abrigo do art. 692.º CPC ex vi art. 69.º LTC, deverá ser processado com efeito suspensivo.”
2. Perante tal requerimento de interposição de recurso, o Senhor Conselheiro Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça proferiu o seguinte despacho:
“ Fls. 119:
Convido o Recorrente a, em novo requerimento, aperfeiçoado, de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, apresentar no prazo de 10 dias (artº 75º-A, nº 5, da LTC), indicar o referido no nº 1 do predito artigo da Lei, sob pena de o requerimento de interposição de recurso para o T.C. ser indeferido (artº 76º, nºs. 1 e 2 da LTC).
Notifique.”
3. Na sequência da notificação de tal despacho, o recorrente apresentou a peça processual constante de fls. 37, com o seguinte teor:
“A., recorrente nos autos supra melhor identificados, notificado que foi do douto despacho que enforma a decisão de indeferimento do requerimento de fls. 106 e 107, fundamentada que foi na aplicação do art. 689.º/2 CPC (redação entretanto revogada), não podendo com a mesma concordar porquanto é manifesto que a aplicação do art. 689.º/2 CPC como o foi feito pelo douto Supremo Tribunal de Justiça é inconstitucional, pois que obsta e coarta o direito constitucionalmente previsto de acesso ao Tribunal para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
Assim, a aplicação do art. 689.º/2 cPc da forma como o foi feito pelo douto Supremo Tribunal de Justiça viola o disposto nos artigos 20.º e 202.º ambos da Constituição da República Portuguesa, que enformam em si o Princípio do Acesso ao Direito e à Tutela Jurisdicional Efetiva bem como o Princípio do Contraditório.
Ademais, a aplicação do art. 689.º/2 Cpc da forma como o foi feito pelo douto Supremo Tribunal de Justiça viola a aplicação da Lei no Tempo, negando o douto Supremo Tribunal de Justiça o acesso à Justiça do ora recorrente com base num artigo revogado, o que é suscitado no recurso interposto, pelo que ao abrigo do art. 70.º da LTC se interpõe RECURSO para o douto Tribunal Constitucional, que ao abrigo do art. 692.º CPC ex vi art. 69.º LTC, deverá ser processado com efeito suspensivo.”
4. O Senhor Conselheiro Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça proferiu, então, o seguinte despacho:
“ Notificado, nos termos e para os efeitos plasmados no despacho de fls. 122, de 01-10-2013, o recorrente agiu pela forma que o requerimento de 14-10-2013 evidencia, não indicando a alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, ao abrigo da qual o recurso é interposto.
Assim, visto o exarado no artigo 76.º n.º 2 da LTC, indefiro o requerimento de interposição de recurso para o T.C.
Custas pelo recorrente.
Notifique.”
É desta decisão, datada de 4 de novembro de 2013, que o recorrente presentemente reclama.
5. Para fundamentar a reclamação apresentada, manifesta o recorrente a sua discordância relativamente à decisão reclamada.
Refere, em síntese, que a não indicação da alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, ao abrigo da qual o recurso é interposto, determinou, no caso, o indeferimento do respetivo requerimento de interposição.
Porém, o princípio da cooperação, plasmado na letra do artigo 75.º-A, n.º 5, da LTC, acarreta a obrigatoriedade de notificação do recorrente para suprir a apontada deficiência. Assim, a sanção para a omissão de indicação de tal elemento não pode ser o imediato indeferimento do requerimento de interposição de recurso.
Nestes termos, procede o reclamante à indicação em falta, referindo que o recurso é interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC e junta requerimento de interposição de recurso aperfeiçoado, em conformidade.
6. O Ministério Público, no Tribunal Constitucional, referiu, em síntese, que foi justamente por aplicação do disposto no artigo 75.º-A, n.º 5, da LTC, que o Senhor Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça dirigiu ao recorrente despacho de convite ao aperfeiçoamento do requerimento de interposição de recurso. Porém, o recorrente não deu seguimento a tal aperfeiçoamento, no tocante à indicação da alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual o recurso é interposto, apenas tendo procedido a tal indicação na presente reclamação.
Nestes termos, não lhe assiste razão.
Acresce que o recurso de constitucionalidade apresentado não detém os necessários requisitos de normatividade, que permitam a sua apreciação por este Tribunal Constitucional.
Conclui o Ministério Público, pelo exposto, pela improcedência da reclamação.
O reclamado Paulo Manuel Carvalho de Sousa optou por não responder à reclamação apresentada.
Cumpre apreciar e decidir.
II - Fundamentos
7. Nos termos do artigo 75.º-A, n.º 1, da LTC, o recurso para o Tribunal Constitucional deve ser interposto por meio de requerimento, no qual se indique, desde logo, a alínea do n.º 1 do artigo 70.º ao abrigo da qual o recurso é interposto.
Ora, no presente caso, apesar de o recorrente ter sido convidado a apresentar requerimento de interposição de recurso aperfeiçoado, com indicação dos elementos referidos no n.º 1 do artigo 75.º-A, da LTC, sob pena de indeferimento, não aproveitou tal convite, de forma satisfatória.
De facto, no requerimento de interposição de recurso aperfeiçoado, que oportunamente apresentou, não indicou a alínea do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, ao abrigo da qual o recurso era interposto, o que compromete irremediavelmente a possibilidade de apreciação dos pressupostos substanciais do conhecimento do objeto do recurso.
Pelo exposto, não tendo o reclamante cumprido, de forma suficiente, os requisitos formais do requerimento de interposição de recurso - nem no inicial requerimento, nem no subsequente, aperfeiçoado, - apesar de convidado a fazê-lo, o seu recurso não poderia ser admitido.
A este propósito, a jurisprudência consolidada do Tribunal Constitucional vem entendendo que a indicação dos elementos referidos nos n.os 1 a 4 do artigo 75.º-A da LTC constitui um verdadeiro requisito formal de apreciação do recurso, pelo que o seu incumprimento – esgotada que se encontra a possibilidade de aperfeiçoamento – tem como consequência o indeferimento do recurso.
Na verdade, refere o Acórdão n.º 121/98 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt) o seguinte:
“(…) como o Tribunal Constitucional vem entendendo, a norma do artigo 75º-A não se limita a decretar um dever de colaboração do recorrente com o tribunal. Antes estabelece um requisito formal de apreciação do recurso de constitucionalidade que apenas pode ser apreciado em face das indicações fornecidas por aquele, por esse motivo sendo-lhe dada uma oportunidade de suprir essa falta, por parte do juiz, não admitindo que o tribunal possa, oficiosamente, substituir-se-lhe (cfr., inter alia, os acórdãos nºs. 402/93 e 636/93, publicados no Diário da República, II Série, de 18 de Janeiro e 31 de Março de 1994, respectivamente).
Não observado esse requisito pelos autores do requerimento, não obstante para o efeito terem sido expressamente notificados, não podia ser outro o despacho que não fosse o de não recebimento do recurso, atendendo ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 76º da Lei nº 28/82.”
Nestes termos, conclui-se que é correta a decisão de indeferimento do requerimento de interposição de recurso, proferida nos termos do artigo 76.º, n.º 2, da LTC.
Pelo exposto, mantendo-se o indeferimento do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, julga-se improcedente a presente reclamação.
III – Decisão
8. Assim, decide-se indeferir o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade e, em consequência, julgar improcedente a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (artigo 7.º, do mesmo diploma).
Lisboa, 9 de abril de 2014. – Catarina Sarmento e Castro – Lino Rodrigues Ribeiro – Maria Lúcia Amaral.