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Proc. nº 22/98 TC - 1ª Secção Rel.: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
1 - Nos autos de acção emergente de contrato individual de trabalho que lhe foi movida por M... no 5º Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa, T..., SA, com sede na Av. Frei Miguel Contreiras nº 54 ? 1º - 1700 Lisboa, interpôs recurso para este Tribunal da sentença que, recusando a aplicação do artigo 6º nº 1, al. nº e) do DL nº 519-C1/79, de Dezembro, por inconstitucionalidade material, a condenou a pagar ao A. a quantia de 122.206$00.
O requerimento de interposição do recurso foi assim formulado.
?(...) T..., SA., R. nos autos à margem referenciados, notificada da douta sentença de fls. ... que concluiu pela sua condenação, em consequência de recusa da aplicação do artº. 6º nº 1 alínea e) do D.L. 519-C1/79 de 29.12 por julgar inconstitucional o identificado preceito legal, pretende interpor recurso desta decisão, para o Tribunal Constitucional, pelo que requer a respectiva admissão?(...).
Sobre este requerimento foi lavrado o seguinte despacho de aperfeiçoamento:
?(...) Fls. 53. Ao requerimento de recurso faltam alguns dos elementos previstos no artº 75º-A do DL nº 519-C1/97 de 29.12.
Nestes termos e ao abrigo do disposto no nº 5 do citado artº. 75º-A convido a requerente a prestar tal indicação, em 10 (dez) dias?(...).
A recorrente pediu a aclaração deste despacho nos seguintes termos:
?(...) T..., SA, recorrente nos autos à margem referenciados, notificada do douto despacho de fls. ..., em que se refere faltarem no requerimento de recurso alguns elementos previstos no art. 75-A do DL nº 519-C1/79 de 19.12, vêm expor e requerer: Com o devido respeito a recorrente T..., SA, salvo alteração recente ao DL nº
519-C1/79, não vislumbra que neste diploma haja a norma referida. Por outro lado, tendo o Digníssimo Agente do Ministério Público interposto recurso, fica a dúvida sobre se o despacho se dirige à recorrente T..., SA, ou ao recorrente Ministério Público.
Assim, requer a V.Exa. se digne aclarar o referido despacho para que não restem dúvidas sobre o respectivo alcance?(...).
O pedido de aclaração veio a ser indeferido nos termos do despacho de fls. 58 que se transcrevem:
?(...) Fls. 57: Nada há a aclarar.
O despacho reporta-se ao requerimento da T... como se evidencia pelo reporte a fls. 53.
Se o recorrente não vislumbra a norma, não pode o Tribunal substituir-se a essa indicação.
Notifique para aperfeiçoar o requerimento , querendo.
Prazo: 10 (dez) dias?(...).
Nada tendo sido, entretanto, requerido pela recorrente, foi indeferido o requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional.
É deste despacho que vem deduzida a presente reclamação, onde o reclamante T... SA, depois de relatar a situação supra descrita, conclui:
?(...) Ora, parece à reclamante que, tendo o Tribunal ?a quo? feito errada indicação do diploma ao abrigo do qual deveria o requerimento de recurso ser aperfeiçoado, facto de que a reclamante não se apercebeu por aquela altura mas apenas muito mais tarde, foi também errado o despacho que negou a indicação correcta do diploma.
Com efeito, o principio da mútua colaboração entre o Tribunal e as partes exigia do meritíssimo juiz ?a quo? resposta no sentido de corrigir tal erro.
Termos em que deve a presente reclamação ser admitida e admitido o recurso interposto, cujo requerimento vai agora aperfeiçoado?(...).
Juntou com a reclamação requerimento em que diz interpor recurso ao abrigo do artigo 70º nº 1 alínea a) e 72º nº 1 alínea b) da LTC.
Remetidos os autos a este tribunal, o Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
?(...) A insólita situação processual, versada nos autos, e que originou a presente reclamação, deve-se, desde logo, a manifesto lapso de escrita no despacho de aperfeiçoamento proferido a fls. 56, aparecendo o mesmo reportado ao art. 75º-A do DL nº 519-C1/79, de 29/12, em vez de o ser à Lei do Tribunal Constitucional ? Lei nº 28/82.
Ora - e apesar de considerarmos duvidoso se não seria exigível ao Exmº. Mandatário da recorrente ter-se logo apercebido de tal lapso manifesto de escrita, que efectivamente viciara o despacho de aperfeiçoamento inicialmente proferido, considerando-o obviamente reportado à Lei nº 28/82 ? afigura-se, que tal lapso, não rectificado, será susceptível de afectar o despacho de aperfeiçoamento proferido, prejudicando ou dificultando eventualmente a sua plena inteligibilidade pelo destinatário. E tal situação implica que se não possa considerar válido o despacho de rejeição do recurso, por não haver sido precedido de um válido e regular convite ao aperfeiçoamento do deficiente requerimento de interposição.
Nestes termos, será de deferir a presente reclamação, procedendo-se, oportunamente, no âmbito do próprio recurso de constitucionalidade, ao convite para completar os elementos em falta, dirigido ao recorrente?(...).
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
2 - Por força do artigo 75-A nº 1 da LTC, no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional deve ser indicada a alínea do nº 1 do artigo 70º daquela Lei ao abrigo da qual o recurso é interposto e a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o tribunal aprecie.
Na falta de tais elementos, compete ao juiz convidar a requerente a aperfeiçoar o seu requerimento (nº 5 do cit. Artigo 75-A); suposta essa falta, o requerimento deve ser indeferido se o requerente não acede ao convite do tribunal (artigo 76º nº 2 da LTC).
No caso em apreço, como se deixou relatado, a tramitação processual obedeceu a estes comandos legais.
Com efeito, recusada na sentença recorrida, por inconstitucionalidade material, a aplicação do artigo 6º nº 1 alínea e) do DL nº
519-C1/79, a reclamante não cumpriu as exigências constantes do artigo 75-A nº 1 da LTC, o que motivou o convite de aperfeiçoamento de fls. 56.
Sucede que neste despacho não foram indicados directamente, os elementos em falta, optando-se por os reportar a um preceito de determinado diploma legal.
E nada haveria a apontar a um tal procedimento se correcta fosse a referência ao diploma legal em causa - no caso, a Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
Mas, por manifesto lapso, foi outro o diploma citado ? o DL nº
519-C1/79, que, para além de não conter qualquer artigo 75º - A, nada dispõe sobre os elementos que devem constar no requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional.
Cumpriria então rectificar o erro, quando a reclamante veio pedir a aclaração do dito despacho, alegando não vislumbrar que no DL nº 519-C1/79 houvesse a norma referida.
Porém, como se viu, foi indeferido o pedido, mantendo-se implicitamente o anterior convite de aperfeiçoamento que então se renova.
Indeferido depois o requerimento de interposição do recurso perante o silêncio da reclamante , a questão que se coloca é, pois, a de saber se a conduta omissiva da reclamante justificaria aquela decisão, considerando os termos em que o convite fora formulado.
A resposta é necessariamente negativa.
Cuidou, na verdade, o legislador de não inviabilizar a interposição de recurso para o Tribunal Constitucional por deficiências formais do respectivo requerimento.
A justificada imposição de nestes constarem determinados elementos não obstou a que, à sua falta, se não fizesse, de imediato, corresponder o malogro da pretensão impugnatória dos recorrentes, resultado que só deverá concretizar-se depois de prévio convite de aperfeiçoamento pelo juiz ou relator.
Mas se este é o espírito da lei, mal se compreenderia que o despacho de aperfeiçoamento fosse de teor tal que, alertados os recorrentes para uma deficiência, não fornecesse ele um mínimo de condições susceptíveis de apontar para o tipo de deficiência cometida; ou - pior ainda ? apontasse para um caminho de perplexidade ou enganos.
Ora, no caso, a referência legal à recorrente enfermava de erro manifesto, tendo, por esta razão, o mesmo, ou até mais grave, efeito do que resultaria se omitido fosse o despacho de aperfeiçoamento.
Não se exclui que, com maior zelo e diligência, a recorrente pudesse aperceber-se do erro ( o número do preceito estava correcto) e reportasse o preceito indicado à Lei nº 28/82; mas, igualmente, não é de afastar a hipótese de o despacho em causa, pelo lapso cometido e, principalmente, pela recusa em corrigi-lo, ter ?paralisado? a recorrente em termos de ela não saber verificar e suprir a deficiência do seu requerimento de interposição do recurso.
E perante estas hipóteses, de sinal contrário, sempre será de fazer apelo ao princípio do ?favor actionem?.
Acontece que a reclamante supriu já a deficiência do requerimento de interposição de recurso com indicação da alínea do nº 1 do artigo 75-A da LTC ao abrigo da qual recorre para o Tribunal Constitucional (alínea a) ), sendo certo que se não vislumbram outras razões para não admitir o recurso.
Impõe-se, assim, deferir a presente reclamação.
3 ? Decisão
Pelo exposto e em conclusão decide-se deferir a reclamação.
Lisboa, 19 de Maio de 1998 Artur Mauricio Alberto Tavares da Costa Vitor Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma Maria Helena Brito Paulo Mota Pinto Luis Nunes de Almeida