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Proc. n.º 154/95 ACÓRDÃO Nº
270/00 Plenário Cons. Vítor Nunes de Almeida
ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
1. – O Pedido
O Provedor de Justiça requereu ao Tribunal Constitucional, ao abrigo do preceituado no artigo 281º, n.º1, alínea a), e nº2, alínea d), da Constituição, a apreciação e declaração da inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 309º e 318º, alínea o), do Código de Justiça Militar, bem como do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82, de 24 de Setembro (diploma que define o regime jurídico da atribuição das 'pensões de preço de sangue' e das 'pensões por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País').
2. - Fundamentos do pedido.
O Provedor de Justiça impugna a constitucionalidade das normas constantes dos preceitos transcritos, na parte ou dimensão acabada de precisar, considerando que tais normas violam os artigos 113º, n.º 2, e 215º e ainda – mas agora no que respeita apenas ao artigo 28º do DL 404/82 – o artigo
168º, n.º 1, alínea q), da Constituição [ hoje, respectivamente, artigos 110º, n.º 2, 213º (com profundas alterações) e 165º, n.º 1, alínea p)] .
A fundamentar o pedido, afirma-se, em síntese, o seguinte:
- A Constituição (art. 215º) consagrou o princípio da competência limitada dos tribunais militares, atribuindo-lhes exclusivamente competência na esfera do direito penal militar e eventualmente na disciplinar. Assim, em correspondência com o princípio da definição constitucional da competência dos órgãos de soberania (art. 113º, n.º 2), só as correspondentes funções, e não 'quaisquer outras', nomeadamente 'consultivas', eles poderão, pois, desempenhar.
- Logo, a atribuição aos Tribunais Militares da competência para exercerem quaisquer outras funções determinadas na lei [ art.
309º e art. 318º, alínea o), CJM] 'vai para além da permissão normativa da lei constitucional, porquanto expande a competência consagrada na Constituição a matérias - atribuições - que aí não são tuteladas, resultando assim que tais normas do CJM são praeter constitutionem'.
- De igual modo, também a competência atribuída ao STM pelo Decreto-Lei n.º 404/82 não encontra acolhimento na Constituição: a Lei Fundamental não consagra um tal poder consultivo-administrativo dos Tribunais Militares, pelo que essa competência a retira o STM exclusivamente da lei. Também aí, pois, há desrespeito dos princípios da competência limitada dos tribunais militares e da definição constitucional da competência dos órgãos de soberania.
- Por outro lado, e no que diz respeito ao Decreto-Lei n.º 404/82, acresce que este 'não foi precedido de autorização legislativa, embora legislasse sobre competências de um Tribunal - o STM', indo, assim, 'ao arrepio do disposto no (então) artigo 168º, n.º1, alínea q), da Constituição'. É que 'a matéria relativa à organização e competência dos Tribunais abrange, necessariamente, toda a competência dos Tribunais, incluindo as competências não jurisdicionais'.
3. - Resposta do autor da norma.
Notificados nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 54º e 55º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, o Presidente da Assembleia da República ofereceu o merecimento dos autos e o Primeiro-Ministro defendeu a plena conformidade constitucional das normas impugnadas, rematando a sua resposta com as seguintes conclusões:
A) 'Os artigos 309º e 318º, al. o), do CJM, ao remeterem para lei ordinária a complementação de competências reconhecidas constitucionalmente aos tribunais militares pelo art. 215º da CRP, revelam plena conformidade com o princípio constitucional da 'competência fechada' que vincularia a esfera de poderes das jurisdições castrenses'.
B) 'O artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82 regula um procedimento de aprovação, por parte da Administração pública, de um acto complexo, que reveste, a título final, nos termos do Capítulo II do Título II do Regulamento de Disciplina Militar, a natureza jurídica de uma medida disciplinar de recompensa, traduzida em uma pensão por serviços excepcionais ou relevantes praticados em teatro de guerra'.
C) 'O carácter obrigatório do parecer do STM previsto no art. 28º do Decreto-Lei n.º 404/82, e a sua natureza vinculativa, no caso de o seu sentido ser desfavorável à concessão da pensão referida na alínea precedente, permitem integrar a intervenção consultiva do STM na génese do referido acto procedimento complexo de aplicação de uma medida disciplinar, para a qual o mesmo tribunal é competente, nos termos do artigo 215º, n.º 3, da CRP'.
D) 'O mesmo art. 28º do Decreto-Lei n.º 404/82, ao ter virtualmente repetido, sem sentido inovatório, a disciplina jurídica do art. 37º do Decreto-Lei n.º 47084, de 9 de Julho de 1966, relativa à competência consultiva do STM em matéria de atribuição de pensões por serviços relevantes ou excepcionais, não procede, nos termos da linha interpretativa vertida pela jurisprudência constitucional sobre esta matéria, a qualquer intromissão no
âmbito da reserva relativa da Assembleia da República.'.
4. - Objecto do pedido Os dois preceitos do Código de Justiça Militar têm o seguinte teor: Artigo 309º Aos tribunais militares compete, além de quaisquer outras funções determinadas na lei, o conhecimento dos crimes essencialmente militares e dos crimes dolosos que, por lei, vierem a ser equiparados àqueles. Artigo 318º Em matéria criminal, compete ao Supremo Tribunal Militar:
[...] o)exercer quaisquer outras atribuições determinadas na lei.
Quanto, por sua vez, ao preceito impugnado do Decreto-Lei n.º 404/82, de 24 de Setembro, ele já não tinha, à data da apresentação do pedido, a redacção original, mas a que lhe fora dada pelo Decreto-Lei n.º 140/87, de 20 de Março. Ora, a verdade é que o requerente, nem especifica tal circunstância, nem sequer menciona esse último diploma, quando, no artigo 48º do requerimento inicial, refere as sucessivas alterações de que foi sendo objecto aquele primeiro Decreto-Lei. Não obstante, tais omissões não devem impedir que se entenda o pedido – já que esse será o seu entendimento normal – como reportado ao artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82 tal como vigorava na data em que o mesmo pedido foi apresentado, ou seja, na redacção do Decreto-Lei n.º 140/87, a qual era a seguinte: Artigo 28º Compete ao Conselho de Ministros proferir resolução sobre o direito à pensão a que se refere o artigo anterior, mediante proposta do Ministro das Finanças, precedendo parecer favorável do Supremo Tribunal Militar, quando o facto justificativo do mesmo seja a prática de actos realizados em teatro de guerra, e da Procuradoria-Geral da República, nos demais casos.
Cumpre esclarecer que 'a pensão a que se refere o artigo anterior', a que o preceito ora transcrito se reporta, é a 'pensão por serviços excepcionais ou relevantes prestados ao país' – sendo, pois, só quanto a essa pensão, e já não também quanto à 'pensão por preço de sangue' que a lei prevê a emissão de parecer favorável prévio pelas entidades que menciona.
Consoante decorre da respectiva fundamentação, o objecto do pedido não abrange a integralidade das normas identificadas, sendo mais restrito. Assim, se a alínea o) do artigo 318º do Código de Justiça Militar é por ele plenamente abrangida, já o artigo 309º do mesmo Código só o é no inciso em que inclui na competência dos tribunais militares quaisquer outras funções determinadas na lei, para além das aí especificadas; e o artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82, de 24 de Setembro, na redacção do Decreto-Lei n.º
140/87, na parte em que atribui ao Supremo Tribunal Militar a competência consultiva que aí lhe é deferida, ponto em que a redacção dele aqui em apreço em nada se modificou, relativamente à original.
Isto é, no presente pedido de declaração de inconstitucionalidade, pretende-se que o Tribunal aprecie a conformidade à Lei Fundamental de um complexo normativo constituído pelo artigo 309º e pela alínea o) do artigo 318º, ambos do Código de Justiça Militar e do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82, de 24 de Setembro, enquanto atribuem ao Supremo Tribunal Militar competência para emitir o parecer sobre o cabimento, ou não, do direito
à pensão por serviços excepcionais ou relevantes, quando o facto justificativo dele seja a prática de actos realizados no teatro de guerra.
Ora, atento o teor das normas em causa (designadamente, do artigo 309º, no segmentoo) e, essencialmente, face à argumentação expendida pelo requerente, pode e deve inferir-se que a apreciação abstracta da sua constitucionalidade só foi, afinal, suscitada, na medida em que as normas do Código de Justiça Militar constituem a 'base legal' do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82, ou seja, na medida em que este, de alguma forma, representa uma mera
'aplicação' do princípio que delas decorre. Dito de outro modo: entende-se que os dois pedidos se encontram, afinal, dada a forma como foram apresentados, incindivelmente ligados.
Assim sendo – e o contexto do requerimento inicial torna inarredável semelhante leitura – adiante-se, desde já, que a eventual falta de interesse no conhecimento do pedido relativo ao artigo 28º do Decreto-lei nº
404/82 arrastará idêntica falta de interesse quanto ao pedido respeitante aos preceitos do Código de Justiça Militar.
5. - O estabelecimento da jurisprudência do Tribunal sobre a competência dos tribunais militares.
A propósito das normas que estabeleciam a competência do STM para o contencioso administrativo relativo aos actos praticados no âmbito da instituição militar, firmou o Tribunal uma abundante e uniforme jurisprudência sobre a solução constitucional consagrada em matéria da competência dos tribunais militares. Segundo tal jurisprudência, decorre dos princípios da competência limitada dos tribunais especiais e da definição constitucional da competência dos órgãos de soberania, que tal solução foi a de restringir a competência dos tribunais militares às matérias constantes do artigo 215º da Constituição, estendendo-a a essas e só a essas.
Consequentemente, vieram aquelas normas a ser declaradas inconstitucionais, com força obrigatória geral, pelos Acórdãos n.ºs 81/86
(Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 7º- I, p. 103), 204/86 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 7º-I, p. 253) e 38/87 (Acórdãos do Tribunal Constitucional - AcTC, vol. 9º, p. 265).
6. Precedentes directamente respeitantes às normas ora em apreço.
Entretanto, o Tribunal também teve oportunidade de apreciar a constitucionalidade da própria norma constante do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82 (e justamente na redacção já do Decreto-Lei n.º 140/87). Fê-lo nos Acórdãos n.ºs 21/96 (em AcTC, 33º vol., p. 127) e 632/96, tirados em fiscalização concreta, sendo que – em 'aplicação', naturalmente, da orientação geral da sua jurisprudência, já antes firmada, como se viu – veio a julgar inconstitucional esse preceito, por violação dos artigos 113º, nº 2, e 215º da Constituição, 'na parte em que atribui ao Supremo Tribunal Militar competência para emitir o parecer aí previsto' (sobre o cabimento, ou não, do direito à pensão por serviços excepcionais ou relevantes, quando o facto justificativo dele seja a prática de actos realizados em teatro de guerra).
7. – A questão prévia da falta de interesse ou da inutilidade do conhecimento do pedido.
Posto isto, importa começar a análise da questão da eventual falta de interesse no conhecimento do pedido formulado.
A norma do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82, de 24 de Setembro, foi alterada – na parte em que atribuía ao Supremo Tribunal Militar a competência para emitir o parecer nela previsto – pelo Decreto-Lei n.º 97/96, de 18 de Julho. Como fundamento dessa alteração, invocou-se expressamente, no
'Preâmbulo' deste diploma, a jurisprudência do Tribunal Constitucional, acima referida: aí se diz, com efeito, que o legislador intervém em ordem a 'corrigir a situação', para isso (em tal consistiu a alteração) 'cometendo à Procuradoria-Geral da República a competência para a emissão de parecer relativamente a todos os casos'.
O referido artigo 28º, na redacção introduzida pelo artigo 2º do Decreto-Lei n.º 97/96, de 18 de Julho, dispõe agora, na verdade, o seguinte: Artigo 28º A concessão de pensões prevista no artigo anterior é efectuada por despacho conjunto do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças, precedendo parecer favorável da Procuradoria-Geral da República.
Nestes termos, encontra-se pura e simplesmente revogado o segmento da norma do dito artigo 28º que era parte do objecto do presente pedido de fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade.
Note-se ainda que, entretanto, veio o recente Decreto-Lei n.º 466/99, de 6 de Novembro, regular de novo a matéria das pensões de preço de sangue e por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, revogando, na íntegra, o Decreto-Lei n.º 404/82 (cfr. art. 34º). E também nele – no dito Decreto-Lei n.º 466/99 – se encontra agora um preceito com uma redacção e um sentido em tudo idênticos aos que o Decreto-Lei n.º 97/96 viera dar ao artigo 28º do diploma de 1982. Trata-se do artigo 25º, que dispõe assim: 'a concessão da pensão prevista no número anterior é efectuada por despacho conjunto do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças, precedido de parecer favorável da Procuradoria-Geral da República'. (O diploma agora referido entrou em vigor, nos termos do seu artigo 35º, no dia 1 de Janeiro do ano corrente).
Como é jurisprudência reiterada do Tribunal, a inequívoca revogação duma norma não implica necessariamente que deva deixar de conhecer-se do pedido de fiscalização abstracta da sua constitucionalidade. Mas, de acordo com essa mesma reiterada jurisprudência, também nesse caso (de revogação) tal conhecimento só se justifica se houver um interesse jurídico relevante na apreciação do pedido (cf. por exemplo, o acórdão n.º 639/98) – o que desde logo não acontecerá se não se detectar qualquer alcance prático na emissão de uma eventual declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma em causa.
Como se escreveu, a este propósito, no Acórdão n.º
238/88 (in Acórdão do Tribunal Constitucional, 12.º Vol., p.273 e Diário da República, II Série, de 21-12-1988): 'há-de (...) tratar-se de um interesse com
‘conteúdo prático apreciável’, pois, sendo razoável que se observe aqui um princípio de adequação e proporcionalidade, ‘seria inadequado e desproporcionado accionar um mecanismo de índole genérica e abstracta, como é a declaração de inconstitucionalidade’ (...) para eliminar efeitos eventualmente produzidos que sejam constitucionalmente pouco relevantes ou que possam facilmente ser removidos de outro modo'. 'Por conseguinte, estando em causa normas revogadas, a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, só deverá ter lugar - ao menos em princípio - quando for evidente a sua indispensabilidade' - afirmou-se ainda nesse Acórdão (no mesmo sentido, cf., por exemplo, o Acórdão n.º 465/91, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 20º Vol., p.279 e Diário da República, IIª Série, de 2 de Abril de 1992).
Ora, por um lado, tem o Tribunal entendido não existir um interesse jurídico relevante - um interesse prático apreciável - no conhecimento do pedido quando os meios individuais e concretos de defesa postos
à disposição dos interessados são suficientes para acautelar os seus direitos ou interesses, impedindo a aplicação da norma inconstitucional (ou ilegal): assim, nos casos versados nos Acórdãos n.ºs 308/93, 397/93, 188/94, 580/95 e 117/97
(DR, II Série, de 22-7-1993, 14-9-1993, 19-5-1994, 30-12-1995, e 26-3-1997, respectivamente).
Por outro lado, e de todo o modo, é ainda jurisprudência conhecida do Tribunal que não existe um interesse jurídico relevante - um interesse prático apreciável - no conhecimento do pedido quando a situação for tal que, no caso de uma eventual declaração de inconstitucionalidade, os efeitos desta sempre viriam a ser limitados, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo
282º da CR (vejam-se por exemplo, os Acórdãos n.ºs 238/88, 319/89, 415/89,
73/90, 135/90, 465/91, 308/93, 398/93, 804/93, 186/94, 57/95, 121/95, 497/97 e
625/97 (DR, II Série, de 21-12-1988, 28-6-1989, 15-9-1989, 19-7-1990, 7-9-1990,
2-4-1992, 22-7-1993, 20-12-1993, 31-3-1994, 14-5-1994, 12-4-1995, 13-4-1995, e
10-10-1997, respectivamente).
Pois bem: à luz desta jurisprudência, afigura-se que no caso em apreço não existe interesse no conhecimento do pedido de declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, no tocante, desde logo, ao segmento revogado da norma do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82.
Na verdade, enquanto vigorou tal norma, no seguimento da aplicação dela, nessa sua parte, chegou-se, necessariamente a uma de duas situações: ou à atribuição da pensão (após parecer favorável do Supremo Tribunal Militar) ou à denegação da pensão. A menos que – e será uma terceira hipótese, embora pouco provável – a situação ainda esteja 'pendente', seja de decisão administrativa, seja da decisão de uma impugnação contenciosa.
Ora, quanto a este último tipo de situações – as eventuais situações 'pendentes' – uma declaração de inconstitucionalidade é desnecessária, e seria desproporcionada, para a sua resolução: na verdade, tratando-se de casos que ainda estejam na fase administrativa, poderá logo entender-se que, alterado, nos termos vistos, o regime legal em apreço, o respectivo procedimento haveria de ser oficiosamente reordenado, à luz da nova competência da Procuradoria-Geral da República, para serem reanalisados por esta entidade; mas para além disso, de todo o modo, e estejam essas situações pendentes ainda na fase 'administrativa' ou já em fase 'contenciosa', sempre os interessados terão ao seu dispor o instrumento processual da fiscalização concreta da constitucionalidade, como meio suficiente para impedir ou obviar à aplicação, no caso, do preceito questionado. (E que é assim, de resto, aí estão a confirmá-lo os exemplos, supra referidos, em que o Tribunal já conheceu da questão em sede de fiscalização concreta).
Por sua vez, quanto às situações da primeira espécie
(aqueles em que a pensão foi concedida), não se duvidará, seguramente, de que uma eventual declaração de inconstitucionalidade nunca as iria pôr em causa (o que se traduziria na reabertura do respectivo procedimento administrativo, por forma a ser obtido, agora, um parecer favorável da Procuradoria-Geral da República, sobre a atribuição da pensão). Tais situações, na verdade, ou estariam logo abrangidas pela ressalva dos 'casos julgados', entendida como abrangendo os 'casos decididos', constante do n.º 3 do art. 282º, CR; ou, então, o Tribunal sempre cautelarmente as ressalvaria, utilizando – com fundamento numa
óbvia razão de segurança jurídica – os poderes de restrição de efeitos que lhe são conferidos pelo n.º 4 desse mesmo preceito constitucional.
Restarão, pois, as situações em que foi denegado o direito a pensão (em resultado de parecer desfavorável do Supremo Tribunal Militar). Mas, quanto a estas, também uma de duas: ou se entende que a alteração do preceito do artigo 28º, operada pelo Decreto-Lei n.º 97/96, teve a virtualidade de reabri-las (isto, independentemente de saber se o pedido de pensão já podia sempre ser renovado a todo o tempo), justamente para que seja possível a sua reapreciação, com a intervenção, agora, da Procuradoria-Geral da República – o que significa que uma declaração da inconstitucionalidade daquela norma será, para esse efeito, desnecessária; ou se entende, ao contrário, que a mencionada alteração não teve semelhante virtualidade, e que o acto de denegação da pensão, esgotado o prazo da sua impugnação contenciosa (cfr. artigo 26º do Decreto-Lei n.º 404/82, e, agora, o artigo 23º do Decreto-Lei n.º 466/99), se firmou 'definitivamente' na ordem jurídica, assumindo a natureza de 'caso resolvido' – o que significará, então, que a mesma declaração de inconstitucionalidade nenhum efeito poderá ter sobre essas situações, por força do princípio do n.º 3 do artigo 282º da Constituição (ressalva dos 'casos julgados', entendida como envolvendo situações substancialmente equiparáveis). Em qualquer das alternativas, por consequência, teremos, ainda aqui, uma declaração de inconstitucionalidade 'inútil'.
Eis como – por tudo quanto fica dito – não existe interesse no conhecimento do pedido de declaração da inconstitucionalidade da norma do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 404/82, de 24 de Setembro, na redacção do Decreto-Lei n.º 140/87, de 20 de Março.
Dado o já acima afirmado laço de incindibilidade que liga os pedidos formulados pelo requerente, é manifesto que a falta de interesse do conhecimento do pedido relativo ao artigo 28º do Decreto-Lei n.º 402/82 implica idêntica falta de interesse no conhecimento do pedido relativo aos preceitos do Código de Justiça Militar identificados e na dimensão que foi equacionada nos autos.
8. - Decisão
Nos termos do que fica exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do pedido.
Lisboa, 10 de Maio de 2000 Vítor Nunes de Almeida Artur Maurício Paulo Mota Pinto Bravo Serra Messias Bento Guilherme da Fonseca Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida Maria Fernanda Palma Maria dos Prazeres Pizarro Beleza José de Sousa e Brito Maria Helena Brito José Manuel Cardoso da Costa