Imprimir acórdão
Proc.nº 617/97 Plenário Rel.: Cons.Sousa e Brito
Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
1. A Coligação Eleitoral 'MAIS LISBOA', com sede na Av............, nº ........º, em Lisboa, concorrente à eleição de 14 de Dezembro de 1997 das assembleias das freguesias do 3º Bairro (Alvalade, Ameixoeira, Benfica, Campo Grande, Campolide, Carnide, Charneca, Lumiar, Nossa Senhora de Fátima, São Domingos de Benfica, São João de Brito e São Sebastião da Pedreira), veio reclamar para o Juiz do 14º Juízo Cível de Lisboa, 3ª Secção, das provas tipográficas dos boletins de voto destinados àquelas eleições, nos termos do nº
1 do art. 83º do Decreto-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro, com os seguintes fundamentos:
- Das provas tipográficas desses boletins expostas no edifício da Câmara Municipal de Lisboa, destinados às eleições para a Câmara e Assembleia Municipal alcança-se que o símbolo de coligação reclamante, composto pelos símbolos dos partidos coligados (Partido Socialista, Partido Comunista Português, Partido Ecologista 'Os Verdes' e União Democrática Popular) se apresenta mais pequeno do que os das demais coligações concorrentes, conforme resulta dos documentos 1 a
12 juntos;
- Assim o símbolo da coligação 'MAIS LISBOA' aparece nos boletins com as dimensões de 18,5 x 18,5 mm (área de 342 mm), o da coligação LISBOA CIDADE com
25,5 mm X 15,5 mm (área de 387 mm);
- Conforme referiu o acórdão nº 544/89 do Tribunal Constitucional, a intenção do legislador, ao aprovar a Lei nº 5/89, foi a de permitir que os eleitores, ao exercerem o direito de voto, o fizessem conhecendo exactamente quais os partidos que integravam cada coligação, e não a de penalizar as coligações pelo facto de o serem;
- É possível representar graficamente os símbolos nos boletins de voto com áreas iguais, ou sensivelmente iguais, não havendo, assim, óbice a que se respeitem dois princípios fundamentais quanto à dimensão dos símbolos naqueles boletins: o da perceptibilidade dos símbolos identificativos das diversas candidaturas e o da igualdade do tratamento delas;
- A necessidade de manter bem visíveis os símbolos na impressão de boletins torna-se premente dada a qualidade de papel fornecido pelo STAPE para o efeito - papel reciclado e bastante poroso - e ao inevitável desgaste das matrizes.
A coligação reclamante pediu, em conclusão, que fosse judicialmente determinada 'a ampliação do símbolo' da mesma, 'procedendo-se à substituição da prova dos boletins de voto, de modo que o mesmo fique com uma
área igual ao da Coligação LISBOA CIDADE'.
Com a reclamação juntou doze documentos (provas tipográficas dos boletins às assembleias de freguesia identificadas).
Pronunciando-se sobre esta reclamação, afirmou o Senhor Juiz da
3ª Secção do 14º Juízo Cível em despacho proferido em 17 de Novembro do corrente ano :
'De acordo com o disposto no nº 2 do art. 82º do Dec.-Lei nº 701-B/76, de 29/9, cada boletim de voto terá impresso o símbolo da coligação concorrente.
E de acordo com o disposto nos arts. 1º e 2º da Lei nº 5/89, de 17/3, para fins eleitorais os símbolos das coligações devem corresponder integralmente aos constantes do registo do Tribunal Constitucional.
Estas disposições esclarecem suficientemente o preceito a observar na impressão do símbolo no boletim de voto.
Assim, o símbolo a imprimir deve corresponder ao constante do registo do Tribunal Constitucional.
Deste modo, tendo em consideração o caso em apreço, motivo atendível de reclamação é a inobservância daquela regra, designadamente a inobservância na impressão das dimensões dos símbolos tal como constam do aludido registo.
Mas sendo assim a reclamação não invoca motivo atendível, isto é, não invoca que a impressão do seu símbolo no boletim de voto não obedece às dimensões do mesmo como consta do registo, nem invoca que a impressão do símbolo da outra coligação não obedece às dimensões do mesmo como consta do registo.
Com efeito, tendo em consideração o caso em apreço, não basta como motivo atendível de reclamação a diferença de dimensões dos símbolos, é ainda necessário que essa diferença resulte da inobservância das dimensões como consta do registo.'
Com base nesta argumentação, foi indeferida a reclamação. Foi notificado o mandatário da coligação reclamante e o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, através de carta registada e de telecópia expedidas em 18 de Novembro.
2. Em 20 de Novembro deu entrada na secretaria do mesmo Tribunal recurso interposto pela coligação reclamante.
Com o requerimento de interposição do recurso, a coligação recorrente apresentou alegações onde reeditou a sua anterior argumentação constante da reclamação, invocando que o despacho recorrido enfermava 'de um erro na apreciação da situação, porquanto a reclamação da recorrente [incidira] sobre as provas tipográficas dos boletins de voto, [um] dado de facto, e aos seus boletins se apresentarem com uma área inferior aos da outra coligação'. Invocou igualmente a doutrina do acórdão nº 258/85 do Tribunal Constitucional, pedindo a revogação da decisão recorrida.
Formulou as seguintes conclusões :
'A decisão recorrida ao não determinar a ampliação do símbolo da coligação MAIS LISBOA, mandando proceder à substituição da prova dos boletins de voto violou o princípio de igualdade das candidaturas e isenção que subjazem ao espírito da Lei eleitora[l].
A decisão nesse sentido, aliás de acordo com as decisões proferidas nos restantes juízos eleitorais - 11º, 12º. 13º e 15º, em sede de reclamação sobre o mesmo objecto, é essencial para que os [símbolos] apareçam com as mesmas áreas nos boletins de voto'.
3. Através do despacho de fls. 40, proferido no mesmo dia, o Senhor Juiz recorrido admitiu o recurso interposto, mandando subir os processos referentes às identificadas freguesias ao Tribunal Constitucional e notificar os mandatários das demais listas candidatas e o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Não foi produzida qualquer resposta pelos notificados.
II
4. O presente recurso, subscrito por advogado em representação da Coligação Eleitoral 'MAIS LISBOA' - dispondo de substabelecimento a seu favor passado pelo mandatário da Coligação A., junto a fls. 10 dos autos principais - foi interposto em 20 de Novembro de 1997, não constando do registo de entrada a hora de entrega do respectivo requerimento, nem tendo sido possível apurá-la
(cfr. cota de fls.47). Nessa medida tem de presumir-se que entrou dentro do prazo de 48 horas previsto no art. 83º, nº 2, do Decreto-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro (Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais) visto o despacho que incidiu sobre a reclamação ter sido objecto de notificação por telecópia expedida em 18 do mesmo mês (a partir das 10 horas e 54 minutos - cfr. fls. 32 dos autos de reclamação).
Sendo indubitável que qualquer candidatura tem a qualidade de interessado para discutir a legalidade da reprodução dos símbolos identificadores da sua e de outras candidaturas, nos termos do nº 1 do art. 83º da referida Lei Eleitoral, dispõe, assim, a recorrente de legitimidade para interpor o recurso previsto no nº 2 do mesmo artigo, visto ter sido indeferida a reclamação oportunamente deduzida.
Estão, assim, verificados os pressupostos de admissibilidade do presente recurso.
5. Das provas tipográficas juntas a fls. 4 a 15 (docs. 1 a 12 juntos com a reclamação) resulta que :
a) Coligação 'MAIS LISBOA' - o símbolo dos quatro partidos coligados insere-se num quadrado com as dimensões de 18,5 mm por 18,5 mm (área de 342,25 mm quadrados);
b) Coligação 'LISBOA CIDADE' - o símbolo dos dois partidos coligados insere-se num rectângulo com as dimensões de 25 mm, de comprimento, por 15,5 mm de altura
(área de 387,5 mm quadrados).
6. Em matéria de dimensões dos símbolos das candidaturas concorrentes, o Tribunal Constitucional dispõe de uma jurisprudência firmada que o Senhor Juiz recorrido não tomou em consideração.
De facto, e como alega a coligação recorrente, no seu acórdão nº 258/85, o Tribunal Constitucional considerou que :
'... a possibilidade de reclamação não pode ter por objecto apenas a fidelidade dos símbolos impressos no boletim de voto em relação aos enviados pelo MAI
[Ministério de Administração Interna], sendo possível pôr em questão a regularidade dos símbolos quanto a todos os demais aspectos legalmente relevantes. Por outro lado, tendo em conta a natureza do contencioso eleitoral, as decisões das reclamações ou recursos nesta área não podem limitar-se a revogar, se for caso disso, as decisões em causa, devendo proceder igualmente à definição da solução que haja de caber ao caso.' (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 6º volume, p.953).'
E, dentro deste entendimento, afirmou-se no mesmo aresto que
'os símbolos não só hão-de estar claramente impressos, como também devem desempenhar o seu papel identificador em condições sensivelmente iguais em relação a todas as forças políticas concorrentes. Hão-de considerar-se ilegítimas as situações de significativa desigualdade, em que, por exemplo, um símbolo se mete «pelos olhos dentro» do eleitor enquanto outro mal se divisa'
(in Acórdãos cit., p. 954).
Mantendo-se o Tribunal Constitucional fiel a esta jurisprudência - que veio a ser confirmada pelo Acórdão nº 544/85 - facilmente se conclui que não pode confirmar o despacho recorrido quando este sustenta que os tribunais apenas devem verificar se os símbolos correspondem aos constantes do registo existente no próprio Tribunal Constitucional, nomeadamente no que toca à dimensão de cada símbolo considerado de per si, não tendo que se preocupar com eventuais diferenças de dimensões entre os símbolos das candidaturas concorrentes.
De facto, no Acórdão nº 544/85 - em situação idêntica à dos presentes autos, uma vez que se tratava de símbolos de coligações sujeitas ao disposto nos arts. 1º e 2º da Lei nº 5/89, de 17 de Março, diploma entretanto
entrado em vigor - escreveu-se :
'Com efeito, no momento em que foi proferido o Acórdão nº 258/85, quer os partidos políticos quer as coligações eleitorais podiam escolher livremente os respectivos símbolos, encontrando-se apenas sujeitos às limitações estabelecidas no nº 6 do artigo 5º do Decreto-Lei nº 595/74, de 7 de Novembro, pelo que a maior ou menor perceptibilidade de cada símbolo utilizado dependia única e exclusivamente da escolha efectuada pelos próprios concorrentes.
Todavia, com a entrada em vigor da Lei nº 5/89, de 17 de Março, alteraram-se os dados da questão, pelo que se deve, forçosamente, rever aquela decisão, enquanto, embora implicitamente, julgou suficiente uma área de 120 mm2 para garantir a recognoscibilidade dos símbolos.
Vejamos porquê.
De acordo com o preceituado no nº 1 do artigo 1º deste último diploma,
«os símbolos e siglas das coligações ou frentes para fins eleitorais, devem reproduzir rigorosamente o conjunto dos símbolos e siglas de cada um dos partidos que as integram». E, para além disso, «os símbolos e siglas dos respectivos partidos devem corresponder integralmente aos constantes do registo do Tribunal Constitucional» (artigo 2º).
Quer isto dizer que os partidos políticos que integram uma coligação para fins eleitorais deixaram de poder escolher livremente o símbolo dessa coligação, porquanto os seus elementos constitutivos se encontram expressamente pré-determinados na lei. Aos partidos coligados apenas sobra a faculdade de fixar o modo de combinação desses mesmos elementos.
Daqui resulta que os concorrentes às eleições, quando em coligação, não podem escolher o respectivo símbolo, designadamente em função do seu grau de perceptibilidade pelos eleitores. E que, embora os símbolos dos partidos coligados fossem perceptíveis com uma certa dimensão, já esses símbolos, reduzidos tantas vezes quantas o número de partidos coligados, podem, obviamente, deixar de o ser.
Assim sendo, e porque a intenção que terá presidido à aprovação da Lei nº
5/89 foi a de permitir que os eleitores, ao exercerem o direito de voto, o fizessem conhecendo exactamente quais os partidos que integravam cada coligação, e não a de penalizar as coligações, pelo simples facto de o serem, forçoso é concluir que as dimensões dos símbolos das coligações, nos boletins de voto, tem de permitir uma correcta identificação dos partidos que compõem cada uma delas.'
Neste acórdão nº 544/89 apreciou-se uma situação em que além de outras candidaturas partidárias, concorriam duas coligações às eleições dos
órgãos autárquicos no concelho de Lisboa, uma composta por quatro partidos (a Coligação 'Por Lisboa' - veja-se o acórdão nº 501/89, em Acórdãos, 14º vol., pp.
279-283) e outra por três partidos (a Coligação 'Viver Melhor em Lisboa' - veja-se o acórdão nº 513/89, in Diário da República, II Série, nº 240, de 18 de Outubro de 1989). Reafirmou-se então que era indispensável que os símbolos de cada uma das candidaturas ocupassem uma área sensivelmente idêntica para que se respeitasse o princípio de igualdade, do mesmo modo que se exigia que - tal como se decidira no Acórdão nº 258/85 - 'na reprodução dos símbolos' se devessem respeitar 'rigorosamente as suas proporções originárias', de modo a que não se alterassem a sua composição e configuração.
E nesse acórdão, face ao caso concreto, decidiu-se 'conceder provimento ao recurso, determinando-se, em conferência, que os boletins de voto em causa sejam substituídos por outros em que todos os símbolos (e, desde logo, o da coligação recorrente) tenham tal dimensão que o rectângulo ou quadrado em que eles se inscrevam (real ou imaginariamente) tenha cerca de 260 mm2, sem que, no entanto, no caso de um rectângulo, o lado correspondente à base possa exceder
27,5 mm e o lado correspondente à altura possa ultrapassar 19 mm.' (Acórdãos cit.,p.447).
7. O Tribunal Constitucional entende que a aplicação dos princípios constantes dos Acórdãos nºs 258/85 e 544/85 deve levar no caso concreto a concluir que é excessiva a diferença de áreas entre o desenho dos símbolos das duas coligações concorrentes, tal como constam das provas tipográficas juntas aos autos, uma vez que a diferença de áreas entre ambas
(45,25 mm2) representa mais de 13% da área do símbolo de menores dimensões.
Remontando ao critério acolhido no Acórdão nº 544/89, verifica-se que o símbolo da coligação LISBOA CIDADE tem uma área de mais de
127,5 mm2 do que a área então considerada adequada (260 mm2), embora as dimensões da base e da altura do quadrilátero onde se inscreve o respectivo símbolo se contenham dentro dos valores máximos então fixados (25 e 15,5 mm, respectivamente).
Assim sendo e face ao pedido formulado pela coligação recorrente há-de determinar-se a ampliação do quadrado onde se inscrevem os quatro partidos coligados até a uma área sensivelmente idêntica, embora menor por defeito, à ocupada pelo símbolo de outra coligação, ou seja, um quadrado com um lado de 1,96 mm (área de 384,16 mm2), ainda que tal implique um alargamento das linhas separadoras das diferentes candidaturas nos boletins de voto.
III DECISÃO
8. Nestes termos e pelas razões expostas decide o Tribunal Constitucional julgar procedente o recurso, devendo ser alteradas as provas tipográficas dos boletins em causa, ampliando-se a dimensão do símbolo da Coligação 'MAIS LISBOA' de modo a que o quadrado em que ele se inscreve tenha cerca de 384,16 mm2 ou seja, cada lado tenha 19,6 mm de extensão, e mantendo-se a dimensão do símbolo da outra coligação concorrente, ainda que tal implique um alargamento das linhas separadoras das diferentes candidaturas dos boletins de voto.
Lisboa, 26 de Novembro de 1997 José de Sousa e Brito Alberto Tavares da Costa Messias Bento Armindo Ribeiro Mendes Maria da Assunção Esteves Guilherme da Fonseca Vítor Nunes de Almeida Fernando Alves Correia Maria Fernanda Palma Bravo Serra Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa