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Processo nº 66/00
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, proferiu o Relator a seguinte Decisão Sumária:
'1. R..., Ldª, sociedade comercial com sede na Torralta-Alvor, veio, 'ao abrigo do disposto no artigo 70º nº 1, alínea b) e f) da Lei do Tribunal Constitucional', interpor recurso para este Tribunal Constitucional do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 25 de Novembro de 1999, 'e dos despachos de fls. 162 e de fls. 153 e seguintes', dizendo no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade que este 'fundamenta-se no facto da interpretação das normas dos artigos 735º, 700º nº 1 al. f), 287º al. e), 660º nº 2 e 668º nº
1 al. d), feitos nos despachos e no Acórdão recorridos se traduzir na violação do Princípio do Processo Devido e Princípio do Direito à Tutela Jurisdicional Efectiva previstos no artigo 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa e ainda na violação do disposto no artigo 263º nº 3 do C. P. Civil' ('A questão da inconstitucionalidade e ilegalidade foi suscita pelo ora recorrente nos requerimentos de 7 de Junho de 1999 e de 13 de Julho de 1999' - acrescenta ainda a sociedade recorrente).
2. A sequência processual dos autos, revelada pelas referências da sociedade recorrente, mostra que, estando pendente o processo no tribunal de relação, foi proferido um despacho com a data de 20 de Maio de 1999 pelo Mmº Juiz-Desembargador-Relator, no sentido do não conhecimento do recurso por ela interposto. Ouvida a sociedade recorrente sobre esse despacho, veio dizer que deve 'admitir-se o recurso, seguindo-se as posteriores termos até final', sustentando que 'se o Mmº Juiz considerasse que a sentença havia transitado não admitiria o recurso e não mandaria o mesmo subir ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa' ('Aliás, o entendimento contrário ao supra exposto violaria além do mais o princípio da busca da verdade material e os princípios constitucionais de acesso à justiça e à Tutela Jurisdicional efectiva e o direito ao processo devido, consagrados nos artigos 265º nº 3 do C. P.C. e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa'- acrescenta-se ainda na resposta). O mesmo Relator proferiu então despacho, em 24 de Junho de 1999, a fls. 153 e seguintes, em que 'nos termos do artº 700º, 1, al. f) e 287º, al. e), do C.P.Civil', julgou 'extinta a instância do recurso, por inutilidade superveniente da lide, não se tomando, em consequência, conhecimento do seu objecto'. A sociedade recorrente veio 'do mesmo arguir nulidades', invocando que se
'deveria conhecer o objecto do recurso e ao decidir por não conhecer do objecto do recurso cometeu a nulidade prevista no artigo 668º, nº 1 do C.P.C.' e citando-se apenas o artigo 20º da Constituição, mas sem servir de parâmetro aferidor da (in)constitucionalidade de qualquer preceito legal, nomeadamente do Código de Processo Civil. Indeferida a arguição de nulidades, por despacho do Relator, com a data de 21 de Outubro de 1999, a fls. 162 e 163 dos autos, a sociedade recorrente limitou-se a
'requerer que sobre a matéria recaia um Acórdão para o que deverá ser submetido
à conferência, nos termos do disposto no artigo 700 nº 3 do C.P.C', o que foi indeferido no acórdão recorrido, de 25 de Novembro de 1999, acolhendo-se aí 'na integra as razões em que se suportou o despacho reclamado, que aqui se dão por integralmente reproduzidas'
3. Daqui decorrem duas coisas:
- os invocados 'despachos de fls. 162 e de fls. 153 e seguintes', preenchendo o objecto do presente recurso, não são decisões jurisdicionais definitivas, porque sujeitas, como, in casu, efectivamente foram, a censura, por via da reclamação para a conferência, 'nos termos do disposto no artigo 700 nº 3 do C.P.C.'
- em nenhuma das peças processuais indicadas pela sociedade recorrente - os
'requerimentos de 7 de Junho de 1999 e de 13 de Julho de 1999' e a reclamação para a conferência - foram suscitadas questões de inconstitucionalidade normativa, não vindo imputado vício de inconstitucionalidade a qualquer das normas processuais referenciadas pela sociedade recorrente (quando muito, naquele requerimento de 7 de Junho de 1999, argui-se que 'o entendimento contrário violaria (...)', o que não é um modo processualmente adequado de suscitar uma questão de inconstitucionalidade normativa, antes é um modo de censurar o comportamento do julgador). Sendo isto assim, faltam os pressupostos processuais específicos do tipo de recurso fundado na invocada alínea b), do nº 1, do artigo 70º: o esgotamento das vias de impugnação das decisões de que se pretende recorrer para o Tribunal Constitucional, sendo que são equiparadas a recursos ordinários 'as reclamações dos despachos dos juízes relatores para a conferência'(nºs 2 e 3 do mesmo artigo
70º, na redacção do artigo 1º, da Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro), o que vale para os invocados 'despachos de fls. 162 e 153 e seguintes'; a suscitação de questão de inconstitucionalidade normativa durante o processo, que tem que ser feita 'de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigada a dela conhecer' (nº 2 do artigo 72º, na redacção do artigo 1º, da mesma Lei nº 13-A/98), o que vale para o acórdão recorrido, pois na reclamação para a conferência limitou-se a sociedade recorrente a requerer que 'sobre a matéria recaia um Acórdão'. Uma última palavra para registar que não tem cabimento no caso a invocação pela sociedade recorrente da alínea f), do nº 1, do mesmo artigo 70º, pois não se trata patentemente de hipóteses de aplicação de norma 'cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo', por referência às alíneas c), d) e e), bastando fazer uma leitura destas alíneas. Com o que não se pode tomar conhecimento do presente recurso, por faltarem os aludidos pressupostos processuais.
4. Termos em que, DECIDINDO, ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, aditado pelo artigo 2º, da Lei nº
85/89, de 7 de Setembro, e na redacção do artigo 1º, da Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro, não tomo conhecimento do recurso e condeno a sociedade recorrente nas custas, com a taxa de justiça fixada em oito unidades de conta'. B. Com essa Decisão Sumária não concordou a recorrente que da mesma veio
'reclamar para a conferência nos termos e com os fundamentos seguintes:
1 - Salvo melhor opinião e contrariamente ao decidido a recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade no decurso do processo, de modo processualmente adequado e em tempo do Tribunal recorrido poder tomar posição sobre a questão.
2 - Na verdade em especial no requerimento de 7 de Junho de 1999 e antes por isso da decisão proferida pelo Relator a questão da inconstitucionalidade foi expressamente levantada no artigo 12 do referido articulado.
3 - Proferido o despacho do relator em desacordo com a interpretação correcta e constitucionalmente adequada dos preceitos legais em questão resulta a violação dos preceitos constitucionais invocados.
4 - Posteriormente o despacho que indeferiu as nulidades e o Acórdão proferido não consideraram as inconstitucionalidades invocadas e, como é óbvio, podiam tê-lo feito.
5 - Assim não pode deixar de se considerar que a questão da inconstitucionalidade foi suscitada tempestivamente de forma a que o Tribunal recorrido tivesse oportunidade de se pronunciar sobre a mesma'. C. A reclamação tem como único fundamento a afirmação da recorrente de que
'suscitou a questão da inconstitucionalidade no decurso do processo, de modo processualmente adequado e em tempo do Tribunal recorrido poder tomar posição sobre a questão', mas o certo é que ela não consegue abalar a transcrita Decisão Sumária. Aí ficou referenciado o requerimento de 7 de Junho de 1999, para dizer-se que só ele, 'quando muito', poderia aproveitar-se quanto a uma pretensa arguição de inconstitucionalidade, mas, mesmo assim, concluiu-se que não foi esse um modo processualmente adequado para tal suscitação. E esta conclusão tem de manter-se, pois a leitura desse requerimento, designadamente dos pontos 11 e 12, aliás, transcritos na Decisão Sumária, evidencia que a recorrente quer censurar o tal 'entendimento contrário', o que é uma censura dirigida ao acto de julgamento e não a uma norma jurídica (ou interpretação dela), em especial, o conjunto normativo do Código de Processo Civil identificado no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade e que nem sequer se colhe daquele requerimento de 7 de Junho de 1999. Com o que, e para encurtar razões, não merece atendimento a presente reclamação. D. Termos em que, DECIDINDO, indefere-se a reclamação e não se toma conhecimento do recurso, condenando-se a reclamante nas custas, com a taxa de justiça fixada em 15 unidades de conta. Lisboa, 17 de Maio de 2000 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa