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Procºnº340/97
1ª Secção Consº Vítor Nunes De Almeida
Acordam no Tribunal Constitucional:
1. -O ..., divorciado, gestor de empresas, residente em Matosinhos, viu rejeitado, pelo Acórdão nº 256/98, de 5 de Março de 1998, que decidiu dele não conhecer, o recurso que interpusera para este Tribunal ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
Vem agora requerer o esclarecimento daquele acórdão, com os fundamentos constantes do requerimento de fls.480/481.
Notificada para responder ao pedido de aclaração, a recorrida A..., S.A., veio dizer em síntese que, em seu entender, 'o Acórdão é suficientemente explícito não carecendo de qualquer aclaração', pois 'não tendo sido levantado o problema da inconstitucionalidade nas alegações para o Tribunal da Relação, e não se tendo aquela instância pronunciado sobre tal matéria, o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça fica limitado à decisão da Relação', não podendo esse Venerando Tribunal pronunciar-se sobre uma eventual interpretação inconstitucional dos Artigos 286º e 294º do C. C., pela primeira instância.'
Tendo ocorrido mudança de relator por o anterior ter deixado de exercer funções neste Tribunal, passa-se a apreciar e decidir.
2. - No que releva para a questão trazida pelo reclamante, importa referir que a acção por ele movida contra a recorrida foi julgada improcedente logo na primeira instância, entre outra razões, por se ter entendido como nulo, em aplicação do disposto no artigo 294º do Código Civil, determinado acordo com base no qual o Autor fundava determinados créditos sobre a outra parte. O recorrente, nas alegações do recurso de revista, para o Supremo Tribunal de Justiça (adiante, STJ), veio suscitar a questão da inconstitucionalidade da interpretação dada na primeira instância a essa norma do Código Civil (CC). Sobre esse ponto, o S.T.J. entendeu que a circunstância de, na primeira instância, se ter procedido à aplicação do artigo 294º, sem que as partes previamente e em contraditório se tivessem pronunciado sobre a ocorrida nulidade, era de todo irrelevante. Com efeito, considerou o S.T.J. que esse contraditório, especificamente sobre a aplicabilidade da norma em questão, tivera lugar na segunda instância, na apelação, e que, estando em causa na revista não a sentença mas apenas o acórdão tirado na Relação, no respeitante à sentença a questão perdera interesse efectivo e passara a ser meramente académica.
3. - Nas alegações do recurso de constitucionalidade, sustentou o recorrente que a decisão recorrida aplicara as normas dos artigos
294º e 286º do Código Civil de forma a 'permitir que o Tribunal conheça oficiosamente da nulidade de um negócio jurídico sem que as partes sejam notificadas para dizerem, acerca da alegada nulidade, o que tiverem por conveniente' com violação do artigo 20º, nº 1, da Constituição e do princípio do contraditório dele emergente.
Mas o Tribunal Constitucional não aderiu a esta perspectiva e em termos muito claros decidiu não conhecer do recurso. Com efeito, por forma que não deixa margem para dúvidas, entendeu que o STJ não aplicara as normas dos artigos 286º e 294º do Código Civil com o sentido inconstitucional que o recorrente lhes atribuía.
Na verdade, segundo o Acórdão nº 256/98 que o recorrente pretende ver aclarado, o Tribunal Constitucional entendeu que, sendo a questão de inconstitucionalidade instrumental em relação à questão de mérito, não podia conhecer-se de uma questão de inconstitucionalidade meramente «académica», pois já não subsistia no ordenamento jurídico a sentença de primeira instância que se achava consumida pelo acórdão da Relação (cfr. fls 476), assumindo o que no acórdão recorrido do STJ se escreveu: 'Porque as partes, na apelação, tiveram ocasião de se pronunciar, e pronunciaram-se efectivamente, o que a este respeito se passou na primeira instância deixou de poder ter influência na decisão da causa' (invocando jurisprudência deste Tribunal).
4. - Em face dos elementos que antecedem, não se descortina qualquer equivocidade ou ambiguidade na posição deste Tribunal e tornam-se dispensáveis quaisquer desenvolvimentos que em mais não consistiriam do que na transposição por outras palavras de termos técnicos utilizados com rigor e que são com certeza perceptíveis por qualquer profissional do foro.
No pedido de aclaração afirma-se não se entender 'o sentido da alegada «consumpção». Com efeito, tendo o Tribunal da Relação confirmado a decisão recorrida da 1ª instância, qual o sentido da «consumpção»
?' - pergunta o recorrente. E conclui:
'Assim, requere-se seja esclarecido o douto Acórdão em apreço no sentido de saber se o facto de o Ac. da Rel. de Coimbra ter confirmado o Ac. do Tribunal 'a quo' impede o Recorrente de invocar junto deste Colendo Tribunal a inconstitucionalidade das normas conjugadas dos artºs 286º e 294º do C. Civil com o entendimento constante das alegações e pondo em causa o direito a um julgamento em três instâncias.'
5. - Quanto à pergunta colocada de forma directa, não há nada a esclarecer. O Tribunal, com efeito, e dentro do contexto que se expôs transcrevendo o acórdão na parte pertinente, não conheceu do recurso pelos motivos indicados: por a decisão recorrida não ter aplicado as normas questionadas com o sentido inconstitucional que o recorrente lhes atribui.
Quanto à pergunta implícita bastará lembrar ao recorrente que o pedido de aclaração não é o meio apropriado para obter, por via oblíqua, a modificação do julgado (Alberto dos Reis).
Termos em que, pelos fundamentos expostos, se indefere o pedido de aclaração.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em
8 unidades de conta (oito).
Lisboa, 2 de Junho de 1998 Vítor Nunes de Almeida Alberto Tavares da Costa Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa