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Proc. n.º67/98
2ª Secção Relator — Paulo Mota Pinto
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional: I. Relatório: A. L. e outros, todos devidamente identificados nos autos, intentaram, em 17 de Janeiro de 1996, acção emergente de contrato de trabalho, sob a forma ordinária, contra o Estado Português e a C..., E.P. (em liquidação), pedindo a sua condenação solidária na quantia total de 22128067$00, correspondendo tal quantia a indemnizações por despedimento, remunerações equivalentes aos períodos de aviso prévio em falta e correcção do valor da moeda, conforme a variação anual do índice de preços desde a data da extinção da empresa – que situam em 7 de Maio de 1985, por força do disposto no Decreto-Lei n.º 137/85, de 3 de Maio – até àquela data. Por despacho saneador-sentença do juiz do Tribunal do Trabalho de Lisboa, onde a acção fora proposta, foi, além do mais, julgada procedente a excepção peremptória da prescrição suscitada pelos Réus, absolvendo-os do pedido. Interposto recurso, pelos AA., para o Tribunal da Relação de Lisboa, veio este, por Acórdão de 26 de Novembro de 1997, a confirmar 'a decisão absolutória constante do despacho saneador-
-sentença recorrido.' Com fundamento em ter tal Acórdão feito aplicação implícita da alínea c) do n.º
1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 137/85, de 3 de Maio, norma já anteriormente declarada inconstitucional, com força obrigatória geral, pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 162/95, publicado no Diário da República, I Série-A, de 8 de Maio de 1995, vieram os AA. interpor recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro. Admitido o recurso, alegaram AA., Ministério Público e recorrida: os dois primeiros no sentido de que a decisão recorrida fez aplicação implícita da norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 137/85, de 3 de Maio, e de que, portanto, devia ser dado provimento ao recurso; a última – invocando igualmente outras formas de extinção da obrigação da recorrida que não cabe a este Tribunal apreciar no contexto do presente processo – no sentido de que a decisão recorrida não fez aplicação da norma declarada inconstitucional, nem sequer de forma implícita.
II. Fundamentos:
4. A exemplo do que aconteceu noutros processos, a decisão recorrida pronunciou-se expressamente sobre a questão de constitucionalidade suscitada, invocando inclusivamente os Acórdãos do Tribunal Constitucional de que resultou a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 137/85, e a interpretação do sentido de tal declaração (Acórdãos n.ºs 162/95 e 528/96, respectivamente). Entendeu, porém, que havia um fundamento autónomo da decisão: a prescrição dos créditos emergentes de uma relação de trabalho que teve um termo objectivo. O sentido das decisões do Tribunal Constitucional sobre a extinção da empresa pública C... não é, bem entendido, o de excluir que, por quaisquer razões de direito ou de facto, os trabalhadores que prestavam serviço a tal empresa possam ser excluídos do direito a uma indemnização de montante idêntico ao que lhes seria devido caso houvesse lugar a um despedimento colectivo. Mas já é, seguramente, o de excluir que possam perder esse direito por razões que dimanem da norma constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 137/85, justamente porque esta foi arredada do ordenamento jurídico, ex tunc, pela declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral. Assim, porque a extinção (válida) da C... não pode ter a virtualidade de determinar a extinção dos contratos de trabalho de quantos se encontravam ao seu serviço, prevista naquela norma, não se lhe pode atribuir a virtualidade de encetar um qualquer prazo prescricional que assente nessa extinção, que se inicie em momento anterior à declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral. É certo que se argumentou, em contrário, com o simile do despedimento inválido – que, ainda que posteriormente declarado nulo, não obsta
à contagem do prazo de prescrição desde o momento da cessação efectiva da relação laboral. Mas tal analogia não colhe: enquanto que ao trabalhador despedido à margem da lei está aberta a via de oposição jurisdicional, aos trabalhadores da C..., tal recurso só se tornou possível após a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral: havia antes uma aparência de legalidade que é o inverso da ilegalidade aparente de qualquer despedimento inválido. Assim, só aplicando implicitamente a norma declarada inconstitucional é possível construir a solução adoptada na decisão recorrida. E porque aquela norma não pode fundar nenhuma argumentação jurídica que pressuponha a produção dos efeitos que intencionava, conclui-se que a prescrição não é, afinal, um fundamento autónomo da decisão, isto é, que dispense a aplicação implícita da norma do artigo alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 137/85, de 3 de Maio. A questão a decidir afigura-se, assim, simples, tendo já sido objecto de decisões anteriores do Tribunal Constitucional, designadamente as dos Acórdãos n.ºs 513/97 e 179/98, juntos aos autos pelos AA. nas alegações produzidas neste Tribunal. III. Decisão:
5. Com os fundamentos de tais arestos, o Tribunal decide: a. fazer aplicação da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do Acórdão n.º 162/95 (publicado no Diário da República, I Série-A, de 8 de Maio de 1995), na parte em que ela tem por objecto a alínea c) do n.º 1 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 137/85, de 3 de Maio; b. em consequência, conceder provimento ao recurso e revogar o Acórdão recorrido, que deve ser reformado em conformidade com essa declaração de inconstitucionalidade, com o sentido e alcance que este Tribunal lhe fixou no Acórdão n.º 528/96 (publicado no Diário da República, II Série, de 18 de Julho de 1996), e que é o de que tal declaração de inconstitucionalidade 'impede, pelo menos, que a extinção ou cessação dos contratos de trabalho se faça sem que aos trabalhadores se pague uma indemnização – recte, a indemnização correspondente à que lhes seria devida se tivesse havido despedimento colectivo'.
Lisboa, 23 de Junho de 1998
Paulo Mota Pinto Guilherme da Fonseca Maria Fernanda Palma Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa